A utilidade da arbitragem como forma jurisdicional de resolução dos conflitos

Resumo: Este trabalho trata da utilidade da arbitragem como forma jurisdicional de resolução dos conflitos. Nele, analisa-se o instituto da arbitragem como possibilidade de resolução de conflitos através da intervenção de outrem que recebe seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nesta pactuação sem intervenções do Estado, sendo que a sentença proferida na utilização dela produz efeito judicial.A arbitragem também conhecida como justiça privada está amplamente caracterizada como atuação de efeito jurisdicional, ou seja, quando um terceiro, por meio da arbitragem resolve o conflito, e este atua como se o Estado fosse, sem duvida alguma há jurisdição. Contudo, é sabido na seara do Direito que a jurisdição não é monopólio do Estado, e que este tem participação fundamental na arbitragem, que é uma das formas de heterocomposição dos conflitos. Em linhas gerais, a utilização da arbitragem para resolver problemas cotidianos busca satisfazer os interesses do cidadão, com vistas a uma entrega célere da prestação jurisdicional. Por fim, o conteúdo deste mostra um caminho alternativo de solução de conflitos pouco utilizado pelos operadores do Direito e que a utilização da arbitragem é uma necessidade em momento de racionalização da atividade judiciária que os novos tempos exigem.


Palavras-chave: Utilidade, Arbitragem, Jurisdição, Resolução de conflitos.


Abstract: This work deals with the utility of the arbitration as jurisdictional form of resolution of the conflicts. In it, the institute of the arbitration is analyzed as resolution possibility of conflict solving by other’s intervention, that get powers of a private convention, deciding embased on this alliance without any intervention of the state, but the judgment given gets judicial effects. In the past, other countries like France, Italy, German, used other people out of the conflicts, to solve the discussion even members of the Catholic Church used to pass by arbiter. In the same sense, Brazil agreed with the use of arbitration with the filipines ordinations in 1824, it wasn’t well done until the Law 9.307/96. That made regular this institute. The arbitration is also know by private justice is characterized by jurisdiction effects actuation, or, when other person, solves the conflict by arbitration and acts like the State, with sure there is a jurisdiction. However, it is known on Law area that jurisdiction is not monopoly of the State, and it has participation on arbitration, that is one of the forms of heterocomposition of the conflicts.In general lines, The use of arbitration to solve daily problems try to satisfy the citizen’s interests and the well for everybody, selling a solution to save judiciary, and the fast delivery of the jurisdictional.Finally, the content of this sample an alternative way for conflicts solving, not much used by Law professionals and the use of arbitration is a need activity that is necessary nowadays.


Keywords: Utility, Arbitration, Jurisdiction, Conflict resolution.


1. INTRODUÇÃO


É sabido por todos que labutam na atividade jurídica que o Estado, através do Poder Judiciário não tem condições de solucionar a grande demanda de processos com a estrutura na qual se encontra.


Os estudos realizados até o momento apontam para a necessidade de um estudo critico e de uma reforma de todo o aparelho normativo e judicial, passando pela reforma dos procedimentos e dos próprios tribunais, que devem modernizar-se, bem como da simplificação do próprio direito positivo.


A tendência do direito processual para o futuro é voltada à busca de um direito e uma justiça mais acessível, essa busca de uma consciência jurídica para a dimensão social do processo é objeto de estudo de muitos juristas nacionais e estrangeiros.


É importante dizer que os meios ou formas alternativas de solução de conflitos não visam o enfraquecimento do Poder Judiciário. A solução do problema pela autodefesa, ou a escolha entre a solução do problema através da tutela estatal ou paraestatal não significa que é melhor ou pior, mas formas distintas em que as pessoas buscam a solução de problemas.


Demonstraremos que o conflito é algo importante na vida das pessoas e das sociedades das quais fazemos parte. Se a humanidade sempre demonstrou forte interesse por suas crises e por seus conflitos, é porque eles podem alterar substancialmente o rumo de nossa existência e o destino de nossas famílias, de nossas comunidades e de nossos países.


Boa parte das pessoas dedica-se a buscar segurança e proteção e a criar sistemas de solução de conflitos de todos os tipos, enquanto os demais trabalham para produzir os bens necessários à subsistência e à melhoria das condições de vida.


Todas as pessoas dedicam uma parte de suas vidas ao esforço de encontrar soluções as suas crises e para os seus conflitos. Quando estamos tristes, aborrecidos ou preocupados, estamos, ao mesmo tempo, em plena atividade para encontrar solução aos nossos conflitos com nós mesmos ou com os outros.


Veremos nesse trabalho, que a justiça também se estabeleceu com a finalidade de solucionar os litígios e conflitos que pudessem surgir entre pessoas de uma mesma comunidade. Quando alguém causa algum mal ou prejuízo a outro, em vez de permitir que os desejos de vingança dominem as respostas dos prejudicados, estabelece-se um sistema judicial, uma idéia de justiça, que procura elucidar quem está com a razão e tenta estabelecer soluções pouco onerosas, razoáveis e justas, visando a solução do problema em questão.


Por outro lado, encontramos a autocomposição, onde as parte podem renunciar e transacionar para obter o resultado mais satisfatório, esse modelo pressupõe que os conflitos entre as partes devam ser resolvidos autonomamente por elas próprias, cabendo ao Estado, preponderantemente, o papel de assegurar um ambiente institucional que propicie o maior equilíbrio de forças entre os conflitantes.


Já o modelo de heterocomposição de conflitos pressupõe a intervenção direta de um terceiro ator na relação, com o poder de julgar o impasse. Esse terceiro ator pode ser o juiz, como ente estatal, e um árbitro privado com delegação pelo Estado, de acordo com a Lei n° 9.307/96, para proferir a sentença, exercendo o papel do Estado na solução dos conflitos.


Nesses termos, é que se faz necessário uma abordagem eminentemente eficaz sobre a arbitragem e sua natureza jurídica, pois se existe uma lei criada pelo Estado, autorizando um terceiro a decidir um conflito, e este como se o Estado fosse, então há jurisdição.


Assim, a jurisdição é a composição da lide através do Estado, que faz às vezes do terceiro alheio às partes. Este, através de pessoas especialmente autorizadas para agir em seu nome, diz qual é a solução mais adequada para a resolução do problema instaurado, sempre se pautando no seu próprio direito objetivo, visando manter a paz social, única capaz de assegurar sua existência e a convivência mútua dos seres humanos.


Portanto, será mostrado nesse trabalho os antecedentes históricos da arbitragem, questões importantes, e as vantagens que faz com que seja possível fazer justiça em tempo hábil, além de que ela é essencial para o fim da crise no judiciário e uma alternativa para o fim do demandismo que se alastra pelo país.


2. ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA ARBITRAGEM


Conforme LEMOS (2001:23) o “instituto da arbitragem é bem antigo, e começou a ser difundido antes do cristianismo. Originou-se basicamente na cidade de Roma, onde os conflitos eram resolvidos com a autorização das partes, por um terceiro, denominado árbitro.”.


Desde tempos remotos, a humanidade busca caminhos que não sejam morosos, burocráticos e onerosos, pois os negócios envolvendo o direito privado exigem soluções rápidas e eficazes. A arbitragem como meio alternativo de solução de conflitos foi bastante utilizada nos tempos de conquista, quando os dominados recusavam os ordenamentos existentes e procuravam terceiros para dirimirem seus problemas, dando lugar a uma arbitragem consensual.


LEMOS (2001:25) afirma o seguinte:


“A historia nos revela que a solução dos litígios entre grupamentos humanos encontrou, por diversas vezes, procedimentos pacíficos através da mediação e da arbitragem, ao invés de optar pelas guerras.”


E ainda:


“De origem consuetudinária, a arbitragem remonta a mais de 3.000 a.Csendo, pois, um dos institutos mãos antigos. Tem-se noticia de soluções amigáveis entre os babilônicos, via arbitragem publica e, entre os hebreus, através das contendas de direito privado se resolviam com a formação de um tribunal arbitral.”


Em análise cronológica, o desenvolvimento da arbitragem se deu na Judéia, entre os sábios que preparavam o Talmud, que nada mais era do que repositório de tradições judaicas e interpretações da Lei proposta pelos livros do Pentateuco.


O fato era que existiam restrições impostas pelo conquistador romano ao funcionamento das corte rabínicas.


Na Babilônia, o outro grande centro jurídico dos judeus, nos séculos que antecederam e sucederam o aparecimento de Cristo, as comunidades judaicas tinham ampla autonomia e as cortes funcionavam sem maiores problemas.


A Mishnah, que era o ensino do povo hebreu determinava que a arbitragem se processasse da seguinte forma:


“Questões econômicas se dividem por três. Cada parte escolhe um julgador e ambas as partes escolhem um terceiro; esta a opinião de Rabbi Meir. Os sábios sustentam que os dois julgadores escolhidos escolhem mais um julgador.”


Se por ventura os árbitros escolhidos não forem de acordo com a escolha do terceiro arbitro, este poderia ser escolhido pela liderança da comunidade, circunstancia em que poderia ser nomeado sem a concordância das partes. A escolha dos árbitros recaia sobre as pessoas que não fossem parentes, e também era vedado escolher amigos íntimos ou inimigos de qualquer parte.


O sistema arbitral com a presença de três julgadores funcionou por muito tempo na historia do povo judeu.


Convém dizer que, nas comunidades onde havia um tribunal rabínico oficialmente instituído, as partes em demanda tanto podiam optar por um sistema ou pela arbitragem, a questão da escolha do terceiro árbitro era para se ter o desempate em caso de opiniões conflitantes, veja-se que naquela época já existia o voto Minerva.


Em Roma utilizava-se o instituto da arbitragem inicialmente nos conflitos entre Estados e, depois, entre particulares, principalmente na fase do jus peregrinus, quando o praetor peregrinus solucionava as questões entre os estrangeiros.


O juízo arbitral comparando à jurisdição togada, aquele levava vantagens, uma vez que era mais simples e informal e permitia ao árbitro decidir sem se submeter a qualquer lei, bastavam o compromisso e a cláusula compromissória destinados a acatar a decisão arbitral.


Observa SOARES (1996:63):


“Acentue-se o fato de que, especialmente nas corporações de ofícios e de profissões liberais, onde imperava rígida hierarquia entre os membros, era natural que se buscassem soluções de controvérsias, por meio de recursos que não saíssem do âmbito daquelas comunidades.”


No período Justiniano, o instituto da arbitragem aperfeiçoou-se com a legislação sobre o costume havia criado. A partir daí, os demandantes vinculavam-se à execução do laudo, e aos árbitros cabia a obrigação de bem desempenhar o encargo.


Na Constituição de Justiniano, do ano 531, ficou expresso que, caso fosse instituída a penalidade tanto na cláusula compromissória quanto no compromisso, haveria a interferência do magistrado na execução do laudo arbitral.


O tempo se passou, e o que era utilizado apenas no mundo dos negócios foi estendido ao setor religioso, passando a serem solucionadas as pendências entre leigos ou religiosos pelos bispos, na condição de árbitros. Quando acontecia uma simples divergência, as pessoas diziam para procurarem o bispo, pois este resolveria o problema.


Aponta VENOSA (2004:604) que:


“A Igreja Católica Apostólica Romana exerceu ao longo dos tempos um importante papel na solução pacifica de conflitos. O padre era o arbitro supremo e os bispos tinham a função eclética de resolver os litígios de fronteiras e questões privadas.”


Os árbitros de então eram investidos de poderes através do compromisso arbitral e utilizavam em constância as penas de cunho religioso, tais como a excomunhão e o interdito.


Quando uma pessoa recebia a sanção de excomunhão, a ela ficava vedado tomar sacramento pelo resto da vida.


Por outro lado, a sansão de interdito proibia o sacramento em determinada cidade ou região, podendo haver, também, a suspensão do oficio da missa, por longo período, sobre aqueles que desrespeitassem o compromisso assumido.


Em conseqüência desses fatos, em meados de 1794, por força da reforma protestante, ocorreu a homologação do Tratado Jay de Amizade, dispondo sobre comercio e navegação, que foi realizado entre os Estados Unidos e a Grã Bretanha. Na realização do Tratado, utilizou-se um numero impar de árbitros, nacionais de inúmeros lugares, no qual se buscava fixar a identidade do rio Santa Cruz, o pagamento aos credores ingleses e cuidar das presas marítimas. Como diz LEMOS (2001:28): “Esse Tratado fez renascer o procedimento de solução pacifica de controvérsias internacionais feito por terceiro alheio ao conflito”.


3. A ARBITRAGEM


A arbitragem permaneceu dormente por décadas em nosso país. Muito embora prevista em lei, tínhamos as condições a ela relativa como uma espécie de letra morta. As dificuldades impostas por um modelo superado, jogaram-na num estado de perda de essência, sem que se tivesse qualquer esperança quanto à sua real utilidade.


No entanto, a promulgação e vigência, a partir de novembro de 1996, da Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 1996, fizeram como que num passe de mágica, a exemplo do que ocorreu no conto infantil, que a sociedade acordasse para a importância desse mecanismo extrajudicial de solução de controvérsias e nele encontrasse um meio eficiente de busca da estabilidade social.


Com o advento da nova Lei produziu-se um fenômeno de renascimento do instituto no Brasil, desenhada que foi de acordo com as mais modernas teorias e fundamentos desenvolvidos em paises que dela se servem há muito tempo. A nova Lei colocou o Brasil na dianteira da modernidade, dotando-o de uma legislação afinada com as conquistas obtidas pela arbitragem ao longo dos anos em que esta, no Brasil, estava dormente.


É certo, pois, dizer que a arbitragem é forma de solução dos conflitos na qual as partes envolvidas convergem as suas vontades no intuito de eleger uma ou mais pessoas, terceiro, distinto dos envolvidos, para que aprecie a demanda e profira uma decisão, que previamente, se comprometem a aceitar e cumprir.


Segundo afirmam TEIXEIRA e ANDREATTA (1997:30), a arbitragem é o: “compromisso através do qual as pessoas interessadas submetem um litígio à decisão de um ou mais árbitros, ficando antecipadamente a respeitar o resultado”.


Os autores referem-se à arbitragem como sendo:


“Uma técnica para a solução de controvérsia através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nesta convenção sem intervenção do Estado, sendo destinada a assumir eficácia de sentença judicial.”


No mesmo sentido CACHAPUZ (2000:12), parafraseando José Carlos de Magalhães, diz que a arbitragem é: “a instituição pela qual as partes confiam a árbitros que livremente designam a missão de resolver seus litígios”.


E ainda:


“Um foro privilegiado e propicio para a composição amigável ou para a convergência dos esforços dos litigantes no sentido de alcançarem rapidamente, sem descurar dos valores maiores que são a segurança e a justiça da decisão, a solução final da lide, tendo em vista que, quase sempre, ambos têm interesses na resolução do conflito, que não raras vezes, envolve quantias vultosas de dinheiro, com inúmeros efeitos diretos e reflexos.”


Enquanto isso NAZO (1997), obtempera que:


“A arbitragem em sentido amplo caracteriza-se todas as vezes que um conflito de interesses for solucionado através da decisão de um terceiro que não esteja investido das funções de magistrado. É a autonomia de vontade das partes, que podem escolher o direito material e processual aplicável à solução da controvérsia, assim como fazer decidir o litígio com base nos princípios gerais do direito, nos usos e costumes ou nas regras internacionais do comércio.”


3.1 A arbitragem no Brasil


A Constituição de 1824, previa em seu artigo 18, que as partes poderiam nomear juizes árbitros, e que, sendo acordado entre elas, as sentenças seriam executadas sem recurso.


A Constituição de 1937 extinguiu a existência de juízos arbitrais para resolução de conflitos territoriais entre os Estado brasileiros, contudo, a Constituição de 1946 voltou a instituir a faculdade das pessoas em utilizar o juízo arbitral.


A Magna Carta dispõe sobre a arbitragem como meio alternativo de solução de dissídios. No artigo 114, § 1° com nova redação dada pela emenda constitucional n° 45, que introduziu a reforma do judiciário, está implícito a eleição de árbitros para resolver litígios entre empregados e empregadores.


O Brasil não tem cultura na utilização desse instituto, muito embora ele esteve sempre presente no nosso ordenamento jurídico. Antes da edição da Lei n° 9.307/96, o Brasil assinou o Protocolo de Genebra, em 1923, participando igualmente do Código de Bustamante, da Convenção Interamericana sobre a Arbitragem Comercial Internacional do Panamá, em 1975, que fora promulgado em 09 de maio de 1996. Isso é o que afirma LEMOS (2001:32).


Também anterior à Lei da arbitragem, o Código de Processo Civil dispunha o instituto nos artigos 1.072 a 1.102, sendo esses considerados letras mortas, devida a sua inutilização no país.


Todavia, o instituto da arbitragem previsto no Código de Processo Civil ainda não trazia regras modernas, obrigando a homologação judicial do laudo arbitral e simplesmente ignorando a cláusula compromissória. Assim, como o advento da Lei n° 9.307/96, introduziu-se uma nova era para a implementação deste instituto em nosso ordenamento jurídico.


A Lei n° 9.099/95, Lei dos Juizados especiais, traz em seus artigos 24 a 26, a possibilidade da utilização da arbitragem nos juizados. Nesse procedimento dispensa-se o compromisso das partes, e o que se chama de sentença arbitral na Lei n° 9.307/96, neste a denominação é, tão somente, laudo arbitral, que é homologado por sentença irrecorrível.


Vale lembrar que o Código Civil de 2002, trouxe inovação, ao tratar da arbitragem nos artigos 851 a 853, sob o titulo “Do Compromisso”. A leitura do artigo 852nos reporta ao artigo 1° da Lei n° 9.307/96, sendo o artigo 3° correspondente ao artigo 853 do Código, que se refere à clausula compromissória para a solução de conflitos através do juízo arbitral.


O Código Civil Brasileiro prevê o compromisso judicial e extrajudicial, para solucionar litígios entre pessoas ligadas contratualmente.


O nosso código, não permite, entretanto, o compromisso para resolver questões de estado, de direito pessoal de família e de outras que não tenham caráter estritamente patrimonial.


É relevante citar, que contratos realizados entre imobiliárias e locadoras, atualmente, elegem as Cortes de Conciliação e Arbitragem, para resolver conflitos que porventura venham a acontecer. A maioria das cortes funciona nas Associações Comerciais das cidades.


A escolha pela arbitragem é no nosso ordenamento jurídico, voluntária ou facultativa, a teor da maioria das legislações estrangeiras. Ela é instituída através de cláusula compromissória ou do compromisso arbitral, aquela expressa no contrato, e esta consistente numa convenção entre as partes que submetem litígio atual aos termos da arbitragem.


Seu inicio se dá após a aceitação e nomeação do arbitro e termina com a sentença arbitral, irrecorrível, salvo nas hipóteses de embargos de declaração e ao visando à anulação da sentença arbitral.


Para CARMONA (1998:27), os motivos que levam as partes a escolher a solução arbitral são:


“A ausência de formas solenes, a possibilidade de julgar por equidade ou escolher livremente a lei a ser aplicada e ainda a neutralidade dos árbitros na solução de litígios envolvendo partes de nacionalidade diferentes, alem da especialização técnica dos julgadores.”


Nestes termos podemos afirmar que, após 9 (nove) anos da publicação da lei que instituiu as regras da arbitragem no ordenamento jurídico brasileiro, a sua utilização ainda é muito tímida e isto se deve, principalmente, pela falta de informação pela sociedade.


3.2 A arbitragem e sua diferença com o procedimento da Lei dos Juizados Especiais


A Lei dos Juizados Especiais, trouxe nos artigos 24 a 26 uma nova regra de arbitragem, utilizada somente no âmbito destes juizados. As regras ali instituídas diferentes da prevista na lei n° 9.307/96.


Na Lei n° 9.099/95, o arbitro é escolhido somente entre os conciliadores/ juizes leigos, quando na lei da arbitragem a escolha é livremente feita pelos interessados. A arbitragem terá o seu inicio conforme as regras do Juizado Especial após a conciliação frustrada, enquanto na regra da lei 9.307 as partes podem eleger estas vias arbitrais antes mesmo de existir o conflito.


Diante das regras da lei do Juizado, a sentença arbitral estará sujeita a homologação judicial, enquanto na lei da arbitragem fica excluída a necessidade da homologação judicial, pois ela própria tem força de sentença judicial.


3.3 Da constitucionalidade da Lei n° 9.307/96.


É sobremodo importante assinalar, que o instituto da arbitragem, posto em voga pela lei n/ 9.307/96 é de todo constitucional, e não ofende os princípios constitucionais da inafastabilidade de controle judicial, nem do juiz natural, a lei, simplesmente deixa a cargo das partes a escolha, ou seja, se querem elas ver sua lide julgada por juiz estatal ou por árbitros.


É preciso dizer, que o interesse é compor a lide, sendo que o arbitro será o representante Estatal na solução pacífica das controvérsias.


Sobre a constitucionalidade da Lei da Arbitragem, CASABONA (2001:45) afirma:


“Seria inconstitucional a Lei da Arbitragem se estipulasse arbitragem compulsória, excluindo do exame pelo Poder Judiciário, a ameaça ou lesão a direito. Não fere o juiz natural, pois as partes já estabeleceram, previamente, como será julgada eventual lide existente entre elas. O requisito da pré-constituição na forma da lei, caracterizador do principio do juiz natural, está presente no juízo arbitral.”


3.4 Pressupostos da arbitragem.


A lei n/ 9.307/96, traz no artigo 1° os pressupostos da arbitragem, quais sejam, capacidade das partes e o objeto litigioso. Quanto à capacidade das partes, determina a lei que somente pessoas “capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem”.


Determina a lei que somente poderá instituir a arbitragem pessoas capazes de contratar, não podem instaurar processo arbitral pessoas que detenham apenas poderes de administração e os incapazes, mesmo que representados ou assistidos.


Na questão do objeto, que também é pressuposto da arbitragem, a lei restringe somente a “direito patrimonial disponível”. De modo geral, estão afastados do âmbito do juízo arbitral as ações de família que versem sobre a capacidade das pessoas. É bem verdade que diante de uma ação de alimentos, por exemplo, as partes jamais poderiam pretender o decreto da procedência deste pedido perante a arbitragem.


Todavia, a lei permite a transação entre as partes a respeito do quantum dos alimentos prestados, assim, há de se entender que o quantum dos alimentos prestados não está na esfera do direito patrimonial indisponível, e, portanto, é arbitrável.


Para CARMONA (1998:33):


“Diz-se que um direito é disponível quando ele pode ser ou não exercido pelo seu titular, sem que haja norma cogente impondo o comprimento do preceito, sob pena de nulidade ou anulabilidade do ato praticado com sua infrigência. Assim, são disponíveis aqueles bens que podem ser livremente alienados ou negociados, por encontrarem-se desembaraçados, tendo o alienante, plena capacidade jurídica para tanto.”


E no mesmo sentido, afirma NERY (2005:1623):


“Não estão no âmbito do direito disponível as questões de direito de família, em especial ao estado das pessoas (filiação, pátrio poder, casamento, alimentos), aquelas atinentes ao direito de sucessões, as que têm por objeto as coisas fora do comercio, as obrigações naturais, as relativas ao direito penal, entre tantas outras, já que ficam estas matérias fora dos limites em que podem atuar a autonomia da vontade dos contendentes.”


Estes posicionamentos não são suficientes, porém, para excluir de forma absoluta do âmbito da arbitragem toda e qualquer demanda relacionada ao direito familiar ou o penal, pois as conseqüências patrimoniais tanto num caso como no outro podem ser objeto de solução extrajudicial. Dizendo de outro modo, se é verdade que uma demanda que verse sobre o direito de prestar e receber alimentos trata de direito indisponível, não é menos verdadeiro que o quantum dos alimentos pode ser livremente pactuado pelas partes, e isto torna arbitrável esta questão.


Partindo destas premissas, poder-se-ia concluir que as partilhas de bens em separação, divórcio e união estável, a quantum de alimentos devidos e as questões de direito sucessório são arbitráveis, desde que estivesse presente a capacidade dos contratantes, partes do processo arbitral, determinada no artigo 1° da Lei n/ 9.307/96.


Existem juristas que defendem que, na esfera dos direitos de família, o casamento e a guarda entre outros não são arbitráveis, assim como os de caráter patrimonial como alimentos e regime matrimonial de bens.


Embora seja louvável o posicionamento a respeito, discordamos do entendimento de que as ações de direito de família estão totalmente fora do âmbito do juízo arbitral, preferindo a inclusão deste instituto à parte patrimonial das demandas de direito da família.


Alguns países admitem a instituição do juízo arbitral nas ações de família, para aquelas demandas onde o objeto do litígio é direito patrimonial. Cabe aos operadores do direito a tentativa de estender a utilização dos meios alternativos de resolução de controvérsia a todos os meios possíveis, visando à desburocratização do direito e a efetivação da justiça.


3.5 A arbitragem no Direito Comparado


Na Argentina o Código de Processo Civil, Art. 737, determina o objeto da arbitragem às questões que podem ser de transação. E assim diz: “Cuestiones excluídas – No podrán comprometerse em árbitros, bajos pena de nulidade, lãs cuestiones que no pueden ser objeto de transacción”.


Não é diferente o Código de Processo Civil, Art. 476, do Uruguai, que determina: “Causas excluídas del arbitraje – no pueden someterse a processo arbitral la cuestione respecto a lãs cuales está prohibida la transacción”.


No México fica excluída do procedimento da arbitragem toda a matéria que envolve estado de capacidade das pessoas. As demandas decorrentes de relação familiar, de cunho eminentemente patrimonial são administrativas. Os tutores poderão optar pelo juízo arbitral para negócios de seus tutelados.


O artigo 613 do Código de Procedimentos Civiles do México, informa a autorização da utilização da arbitragem nas ações de herança, desde que autorizado por todos os herdeiros.


Autoriza, também esta legislação, a inserção de cláusula compromissória instituída pelo autor da herança, vejamos:


“Art. 613. Los albaceas necesitam del consentimento unânime de los herdeiros para comprometer em árbitros los negócios de la herencia y para nombrar árbitros, salvo el caso em que se tratara de cimplimentar el compromiso a cláusula compromisoria pactados por el autor. En este caso, si no hubiere árbitro nombrado se hará necesariamente con intervención judicial.”


Na Bélgica a arbitragem é admitida em todos os litígios que versem sobre direitos e relações que admitem a transação, e assim prevê o Code Judiciaire:


“Art. 1676. Tout différend déjà né ou qui pourrait naître d’un rapport de droit determine et sur lequel il est permis de transiger, peut faire objet d’uneconvention d’arbitrage.”


A lei espanhola n° 36 de 05 de dezembro de 1988, determina em seu artigo 1, a possibilidade da arbitragem nas matérias de livre disposição conforme o direito. Determina ainda o Art. 7, as validades da arbitragem por disposição do testador, vejam:


“Art. 1. Mediante el arbitraje, lãs personas naturales o jurídicas puedem someter, prévio convenio, a la decisión de uno o varios árbitros las cuestiones litiosa, surgidas o que puedan surgir, en materias de su libre disposición conforme a derecho”.


Art. 7. Excepcionalmente, será valido el arbitrage instituído por la sola voluntad del testador que lo estabeleza para solucionar las diferencias que puedan surgir entre ferederos no forzosos u/o legatarios para cuestiones relativas a la distribuición a administración de la herencia.”


O artigo 1.030 do Código de Processo Civil Alemão com a devida tradução determina que:


“Admissibilidade da arbitragem. Toda pretensão legal sobre bens pode ser objeto de convenção arbitral. A convenção arbitral será válida sempre que as partes tiverem o direito de transigir sobre o objeto da disputa.”


Também temos a disposição do Código de Processo Civil italiano, que em seu artigo 806, proíbe a utilização da arbitragem para os processos trabalhistas e previdenciários, além daqueles que resguardam questões de Estado e de separação pessoal entre cônjuges e as outras que não podem formar objeto de transação.


Nos Estados Unidos da América a arbitragem pode ser instituída em questões que envolvam direito disponível em larga escala nas separações e divórcio. A razão do grande crescimento da utilização da arbitragem nos EUA reside no fato de que neste país existe um grande número de câmaras arbitrais especializadas em direito da família, o que leva ao termino do conflito com mais celeridade que as vias judiciais, com uma boa qualidade de decisões.


Uma forma muito comum é a utilização de uma forma de arbitragem, onde as partes, após a colheita probatória, formulam seus pedidos de acordo e o arbitro decidirá escolhendo uma das propostas.


Assim, o juízo arbitral é utilizado por mais legislações no âmbito do direito de família e nada justifica que em nossa legislação, este instituto não venha a ser utilizado para dirimir estas questões, mormente para os litígios de cunho patrimonial.


Um grande avanço na utilização deste instituto no país é a autorização legal para a inserção de cláusula compromissória em acordo de vontade entre as partes antes de ser instaurado um litígio, como aquelas inseridas nos contratos de convivência e nos pactos antenupciais. É sobremodo importante dizer, que as sentenças arbitrais proferidas no estrangeiro só serão reconhecidas executadas no Brasil se homologadas pelo Supremo Tribunal Federal.


4. A ARBITRAGEM E SUA FORMA JURISDICIONAL


Muito se tem dito sobre a natureza jurídica da arbitragem após o advento da Lei 9.307/96. Opiniões de peso, tais como Sérgio Benevudes, Vicente Greco e Alexandre Freitas Câmara afirmam que se trata de natureza jurídica contratual. Já Nelson Nery Júnior, Humberto Teodoro e Carlos Alberto Carmona, com igual autoridade, propugnam pelo caráter jurisdicional da arbitragem. Diferente desses entendimentos, ainda há aqueles que sustentam pela natureza jurídica mista, isto é, contratual e jurisdicional, defendida por Sérgio Pinto Martins.


Questão fundamental para se deferir se algum instituto é jurisdicional ou não, é se ter o exato conceito do que é jurisdição. Jurisdição é uma das formas de heterocomposição de litígios. A heterocomposição, por sua vez, acontece quando a solução é determinada por um terceiro alheio ao conflito.


A jurisdição caracteriza-se especialmente pela composição da lide através do Estado, que faz as vezes do terceiro alheio às partes. Este, através de pessoas especialmente autorizadas para agir em seu nome, diz qual é a solução mais adequada para a resolução do problema instaurado, sempre se pautando no seu próprio direito objetivo, visando manter a paz social, única capaz de assegurar sua existência e a convivência mutua dos seres humanos.


O surgimento da jurisdição foi uma necessidade. Antes do seu surgimento, uma disputa de interesses havida pelos homens resolvia-se, como explica TORNAGUI (1967:5), por uma solução puramente física ou caritativa (consiste na renuncia do próprio interesse), que, “nem sempre assegura a justiça” e somente induz ao caos social.


Por esse motivo, pelo seu senso natural de autopreservação, rapidamente, tendeu a procurar um modo mais utilitário de resolver seus conflitos.


A transação, em que há concessões recíprocas, assim como a mediação, “em que se usa a intermediação de um agente, não para dita e impor a solução autoritária do conflito, mas para conduzir negocialmente os litigantes e a reduzirem suas divergências e a encontrarem, por eles mesmos, um ponto de entendimento”, como diz o mesmo autor, são líricas, anódinas, quando desrespeitadas, pois “a simples solução teórica dos antagonismos, ainda quando perfeitamente justa, será inócua se não for imposta coativamente. Por isso, o Estado fiador da segurança comum, chamou a si a função de declarar e impor o direito, isto é, a jurisdição”.


Em principio, como se nota, a jurisdição foi concebida como monopólio do Estado, pois somente seus órgãos diretos a exerciam. Contudo, tempos houve em que este a concedeu a particulares ou as outras instituições, como era o caso da jurisdição feudal e da eclesiástica, vigente no Brasil durante o período monárquico, segundo preleciona José Afonso da Silva (1991:475).


AMARAL (1968:93/94) ressalta que:


“Entre os povos germânicos, ao conquistarem Roma e ainda por largo tempo, a jurisdição pertencia ao povo, que deliberava nas assembléias populares”; “que na Idade Média, dispunham de poder jurisdicional os senhores feudais”.


E por fim, conclui:


“Fragmentava-se a jurisdição em conseqüência das deformações da soberania, que não deixava, entretanto, de ser a força de que emanava.”


Daqueles dias até hoje, muita coisa mudou. O mundo se globalizou e a organização do Estado evoluiu e se complicou. Diante da ineficiência pratica das diversas tentativas deste em manter a paz social e aplicar o direito objetivo, o Estado se viu obrigado a deixar de reconhecer a jurisdição exercida pelos particulares e pelas outras instituições, e chamou este encargo unicamente para si.


Dentre as varias maneiras teorizadas para, então cumprir as suas precípuas funções, afirma MORAES (1999:340), destacou-se o modelo da separação dos poderes concebido por Montesquieu, na obra “O espírito das Leis”, “que consiste em distinguir três funções estatais, quais sejam, legislação, administração e jurisdição, que devem ser atribuídas a três órgãos autônomos entre si, que as exercerão com exclusividade”.


Com a instalação deste modelo de organização, o poder soberano estatal destina a função jurisdicional ao poder Judiciário; como é o caso do Brasil.


A Constituição atribui o “dizer o direito” unicamente a determinados órgãos pertencentes ao judiciário, cercando-os de varias garantias e, ao mesmo tempo, exigindo-lhes alguns comportamentos, tais como: imparcialidade, preparo técnico e exclusividade, para que realmente impere a vontade da lei, ultima expressão do próprio povo.


Entretanto, casos há em que o próprio poder soberano, pela Constituição, permite que outros poderes, também representantes do Estado, exerçam a função jurisdicional, ou mesmo que, o poder judiciário exerça, por exemplo, função legislativa.


São exemplos disto o julgamento pelo Senado dos crimes de responsabilidade do Presidente da Republica (art. 52, I, CF), a elaboração dos regimentos internos pelos próprios tribunais (art. 96, CF), dentre outros. É o que MORAES (1999:346) conceitua como função típica e atípica dos poderes.


Disto se conclui que, no modelo nacional, não há uma exclusividade absoluta do Poder Judiciário para o exercício da jurisdição, uma vez que foi o próprio legislativo constituinte que também a atribuiu a outros “órgãos” do Estado.


Somente após termos claras todas estas considerações de organização do Estado, poderemos focar a questão principal desta monografia, que é de comprovar que a arbitragem é uma forma jurisdicional de solução de conflitos.


Jurisdição, como já exposto, é a composição de um conflito através de um terceiro desinteressado; este necessariamente sendo representante do Estado e aplicando o ordenamento jurídico por ele criado.


No dizer sempre expressivo de NERY (2005:986):


“A natureza jurídica da arbitragem é de jurisdição. O árbitro exerce jurisdição porque aplica o direito ao caso concreto e coloca fim à lide que existia entre as partes. A arbitragem é instrumento de pacificação social. Sua decisão é exteriorizada por meio de sentença, que tem qualidade de título executivo judicial (CPC, 584, III), não havendo necessidade de ser homologada pela jurisdição estatal. A execução da sentença arbitral é aparelhada por titulo judicial, sendo passível de embargos do devedor com fundamento no CPC 741 (título judicial), segundo artigo 33, § 3° da lei n° 9.307/96.”


A propósito, existe um alei, regularmente criada, aprovada e emanada pelo poder soberano competente, a instituir a arbitragem.


Nestas condições, seguindo os exatos termos deste ordenamento jurídico, o arbitro escolhido pelas partes segundo as regras instituídas e que preenche os requisitos exigidos (art. 13 a 18) pode julgar, através de sentença (arts. 23 a 34), irrecorrível, o conflito de interesses lhe apresentado.


O árbitro está autorizado pelo Estado a julgar, através de uma Lei, manifestações perfeitas de sua vontade e que traduz também a vontade do seu povo.


A autorização deferida pelo Estado, quer dizer que houve um consentimento no sentido de reconhecer as decisões proferidas como justas e perfeitamente úteis ao desígnio maior de manter a paz social.


É certo que, a arbitragem, para ser reconhecida pelo estado, deve ser exatamente instaladas nas formas prescritas pela lei que a autorizou e pelas demais normas que compõem o ordenamento jurídico.


Assim, se o próprio Estado a reconhece e a autoriza, a função jurisdicional, que continua sendo monopólio seu, esta sendo exercida, pois há a participação de um terceiro, e que o próprio Estado, pôs o arbitro para atuar validamente, como exige a Lei de Arbitragem, tem que agir aplicando o mesmo ordenamento jurídico adotado e aceito pelo poder soberano (equidade, leis, convenções).


E nesse sentido, então, é que afirmamos, se há um terceiro a compor o conflito e este atua como se o Estado fosse, há jurisdição.


Por essas razoes, partindo do conceito primário de jurisdição, o árbitro quando resolve um conflito age jurisdicionalmente.


Poder-se-ia indagar ainda que a jurisdição é função soberana, a qual nenhuma Lei Ordinária poderia atribuir ou autorizar a outro, indo além daqueles expressamente definidos na Constituição Federal.


O Poder Judiciário é o que tipicamente foi investido da jurisdição pelo Poder Constituinte Originário e as exceções à esta regra foram claramente mencionadas na própria Carta Magna, das quais nenhuma é a arbitragem.


Todavia, há nesta afirmação certa impropriedade, pois no Preâmbulo da nossa Magna Carta está escrito:


“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça, como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacifica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da Republica Federativa do Brasil.”


Quando o poder constituinte se reuniu para instituir a Constituição Federal em 1988, os nossos legisladores disseram, como vimos no preâmbulo citado, que a sociedade brasileira está comprometida interna e internacionalmente com a solução pacifica das controvérsias.


A arbitragem é uma solução pacifica das controvérsias.


Portanto, a utilização da arbitragem, tem o aval do Poder Constituinte Originário, suprema força de qualquer Estado, e atua em nome deste para resolver os conflitos a ela apresentada.


Como afirma VENOSA (2004:600):


“O árbitro é juiz de fato – dada a natureza de sua investidura – e de direito, pois, neste caso, aplica as regras legais ao caso concreto. Nesse lanço, tanto os julgadores estatais, quanto os particulares, são investidos de suas funções pelo povo, indiretamente, no caso dos togados, e diretamente, no caso da arbitragem.”


Se o cidadão opta pela jurisdição privada e nomeia árbitro para dirimir a pendência, o faz com autorização do Estado, que possibilita e Poe à disposição do interessado essa forma de solução do conflito, hodiernamente mais célere e simples.


Na convenção de arbitragem, uma vez firmada, e constituído o juízo arbitral, passa a deter o árbitro o poder de dizer o direito a ser aplicado à controvérsia, e a dirimir todas e quaisquer questões relacionadas ao caso em exame, ressalvadas, obviamente, as matérias de direito indisponível das partes, pois, neste caso, há interesse público em voga e, como tal, pelo Estado-juiz deve ser analisado.


A supressão da via judicial que se perfaz por acordo expresso das partes na convenção de arbitragem é realmente de natureza privada; todavia, os efeitos que dela se originam, e que se irradiam nos atos exercidos pelo árbitro, como conseqüência do pacto arbitral, são de caráter público.


O árbitro é nomeado pelas partes, para pôr fim ao conflito, aplicando o direito ao caso concreto, conforme autoriza e assegura o Estado, através da lei n/ 9.307/96.


A lei da arbitragem, a nosso ver, tornou marcante o seu aspecto jurisdicional, como se denota de contorno jurídico conferido a esse instituto (art. 31 da lei) e o grau de liberdade e autoridade do árbitro perante as partes, e frente ao poder judiciário, cujas hipóteses de revisão de decisão final arbitral são remotas, e ainda menores, quando se trata de determinações cautelares ou coercitivas.


Nesses casos, o juiz togado é acionado para praticar, unicamente, ato de império, cabendo-lhe indeferir, apenas, em caso de violação da ordem publica ou por ausência de formalidade essencial.


Hoje, os grandes processualistas defendem uma visão mais moderna da jurisdição, que não mais seja restrita ao seu escopo jurídico, mas vista sob os ângulos social e político, numa visão ampla e teleológica, cujo denominador final e comum é a pacificação dos conflitos.


Por essas razoes, a arbitragem instituída pela Lei n/ 9.307/96, constitui meio pacifico de solução de controvérsias que se situam entre a transação e a decisão judicial, contudo, com o advento da lei, adquiriu, em definitivo, o foro jurisdicional privado. Privado como a transação, porém o delegado a um terceiro que não é parte, o juízo arbitral passa a angular procedimentalmente o dialogo entre as partes conflitantes até proferir a decisão pela qual se obrigaram no compromisso.


Se a jurisdição pode ser considerada como poder no plano da soberania estatal; como função nos limites das atribuições que caracterizam o sistema orgânico do Estado; como atividade, no âmbito do processo, poder-se-ia dizer que a jurisdição arbitral é atribuída pela lei n° 9.307/96, como função a ser desenvolvida pelo árbitro, no exercício de seu poder, sem prejuízo da soberania do Estado na prestação da tutela jurídica processual de execução da sentença proferida por aquele.


É preciso, também entender, que em matéria de direitos patrimoniais disponíveis, a decisão arbitral produz os mesmos efeitos da tutela jurídica processual prestada pelo Estado através do poder judiciário, o que lhe atribuiu idêntica eficácia, assecuratória da certeza jurídica sobre a lide.


É relevante que lembremos a disposição legal do artigo 18 da Lei n° 9.307/96: “O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recursos ou à homologação pelo Poder Judiciário”. Nesse sentido, sendo árbitro, ainda que despido de toga, juiz nos termos explícitos da lei, é conveniente concluir que o mesmo decide a dar certeza jurídica a lide, e sua decisão possuindo, inclusive, natureza de titulo executivo.


5. A UTILIDADE DA ARBITRAGEM


Dispõe o artigo 1° da Lei n° 9.307/96 que pelos compromissos, “as pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais”.


Pensa-se que a arbitragem, que pode superar muitos dos entraves criados pelo estado na organização de sua máquina burocrática, seja a melhor opção em termos de rapidez na solução dos litígios, com a vantagem de não haver perda de qualidade.


Não se pode negar, em principio, que a arbitragem tem condições de superar o processo estatal em termos de rapidez, principalmente porque as partes podem escolher o procedimento a seguir e inclusive, se a decisão deve basear-se na lei ou nos princípios gerais do direito, por exemplo.


O espírito interpretativo da lei é, sem duvida, incentivar a utilização do instituto da arbitragem, com o objetivo de evitar o ajuizamento da ação perante o Poder Judiciário, haja vista, ser tal instituto timidamente usado no Direito atual.


A arbitragem se apresenta útil, pois tem grande aceitação, como vimos, no direito comparado e na esfera internacional.


Também, sobre a utilidade da arbitragem observamos feliz resumo de REALE (1996), à par da entrada em vigor da lei n° 9.307/96:


“O habito da arbitragem pressupõe certo desenvolvimento econômico, e mais do que isso, a verificação de que a crescente necessidade de conhecimentos técnicos, envolvendo atualmente perícias altamente especializadas, torna cada vez mais inseguros os julgamentos proferidos por juizes togados, por mais que estes, com a maior responsabilidade ética e cultural, procurem se inteirar dos valores técnicos, em jogo. Além disso, questões há que, pela própria natureza, não comportam rígidas respostas positivas ou negativas, implicando largo campo de apreciação eqüitativa, ou, por outras palavras, de um eqüitativo balanceado de valores econômicos.”


E na exposição do artigo, conclui:


“Como se vê, vamos aos poucos, também no Brasil, superando o formalismo tradicional, uma das pesadas heranças da cultura portuguesa, o que vem ao encontro das novas doutrinas que pregam a aplicação do Direito em concreção ou como experiência concreta, o que se causa arrepios a certos magistrados, que qualificam tais imperativos como meros exercícios de retórica como, ainda recentemente, tive oportunidade de ler, perplexo.”


O procedimento com a arbitragem sofre uma espécie de sumarização, com redução de prazos e especialmente com a eliminação de atos desnecessários.


Por outro lado, os árbitros terão mais tempo para decidir especificamente á questão posta sob sua análise.


Ainda mais, não sendo previsto recurso da decisão que põe fim a controvérsia, o procedimento encerrar-se-á com a decisão dos árbitros, não estando as partes sujeitas à espera decorrente dos procedimentos recursais, que geralmente suspendem os efeitos da decisão recorrida, pelo menos em nível de apelo, até julgamento pela instancia superior.


As audiências arbitrais apresentam-se de modo mais solene que aquelas que se processam perante os juizes estatais. Isto permite que as partes envolvidas dirijam-se sem intermediários ao árbitro, participando ativamente do processo.


A livre escolha da lei a ser aplicada no litígio, por sua vez, feita de comum acordo entre as partes, resolve muitas vezes, na arbitragem comercial internacional, o problema crucial da lei aplicável ao caso concreto.


Os árbitros escolhidos são neutros, de forma a garantir, sob o aspecto da imparcialidade, maior justiça na decisão.


Por fim, a liberdade das partes para escolher os árbitros que a nomeação recaia sobre pessoas dotadas de necessário conhecimento, o que lhes permitirá resolver os complexos problemas econômicos, jurídicos e técnicos trazidos pelos litigantes, pois não há dúvida que é sempre melhor designar sábios, que podem, mais, facilmente diluir a questão e encontrar quem realmente possui razão.


6. CONCLUSÃO


A questão central deste trabalho foi mostrar que a arbitragem como forma jurisdicional de solução dos concílios, é essencial para o fim da crise no judiciário, posto que é preciso incentivar as conciliações, a fim de reverter um quadro alarmante de demandismo que cada vez mais ocorre no Brasil.


Numa análise perfunctória, essencialmente, a arbitragem, e arbitragem se apresenta como uma alternativa de rapidez, economia e segredo. Esses três motivos, segundo a doutrina, é que levam as partes ao juízo arbitral, ao invés do recurso ao juiz togado.


A demora, às vezes oriunda do inafastável principio do contraditório, às vezes oriundo da sobrecarga de processos em relação à quantidade de juízos disponíveis, sem duvida alguma, serve de desestimulo àqueles que pretendem obter a prestação jurisdicional, servindo, ao final, como meio de descrença no poder jurisdicional como hábil para solucionar controvérsias.


Ao ensejo da conclusão, verifica-se que o acumulo de processos que abarrotam o judiciário, as dificuldades no acesso, na administração e na realização da justiça e a própria desmistificação do estado levar-nos-ão, cedo ou tarde, obrigatoriamente, a adotar mecanismos mais práticos e informais dos aspectos que envolvem a administração da justiça, com tendência transparente e convergente para a utilização, e aprimoramento, dos instrumentos alternativos de solução de conflitos.


Um levantamento (In site web), realizado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, recentemente, conclui que mais de 250.000 (duzentos e cinqüenta mil) casos já foram resolvidos pelo juízo arbitral.


Com esta noticia verificada no site do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, há de se concluir que do ponto de vista dos litigantes, existe uma aceitação da arbitragem, desde que oferecida esta possibilidade.


A arbitragem, e mais especificamente, a nova lei arbitral brasileira parece dar conta de que o Brasil, mesmo que de forma sutil, está no encalço das pegadas da evolução jurisdicional.


Esse instituto pode ser considerado uma excelente opção a jurisdição estatal, mas será preferível que as partes tenham posição de igualdade jurídica dentro da lide. Talvez por isso, tal juízo seja melhor aplicado em relações jurídicas entre empresas, Estados e outras entidades que tenham igualdade na relação contratual.


Com relação à imparcialidade, motivos existem para gerar desconfiança, visto que o árbitro não é investido das mesmas garantias do magistrado. Não obstante, o julgador arbitral poderá sofrer sanções penais e civis, se atuar com parcialidade, favorecendo um dos pólos.


Além disso, não é este um problema somente da arbitragem, até mesmo em órgãos estatais que deveriam selar pela igualdade entre os indivíduos, constata-se casos de corrupção ou favorecimento.


Portanto, observadas as considerações supra citadas, a arbitragem se faz uma opção à jurisdição estatal, configurando-se como meio de contribuir para o desafogamento da jurisdição convencional.


Todavia, é mister que se realizem varias discussões em torno do juízo arbitral para chegar-se a uma melhor aplicabilidade da Lei 9.307/96, e que a sociedade seja conduzida a sua utilização, através da divulgação da existência destas formas de  solução de litígios.


O que nos parece certo, é a necessidade de reavaliarmos a nossa justiça e, em sintonia com o contido no preâmbulo da Constituição Federal, isto é, o comprometimento da sociedade, na ordem interna e internacional, com a solução pacifica das controvérsias, implementar, de vez, o sistema que se coaduna, perfeitamente, com os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito.




Referências bibliográficas:

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LEMOS, Eduardo Manoel. Arbitragem & Conciliação – reflexões jurídicas para juristas e não-juristas. Brasília – DF: Editora Consulex, 2001.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 5° ed., São Paulo: Atlas, 1999.

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NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 4° Edição. Vol. II. Atlas, 2004.

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Site do Tribunal de Justiça. www.tj.go.gov.br

Legislação Internacional da Arbitragem. Direito Comparado. Site do Jus. www.jusnavigandi.com.br

Informações Sobre o Autor

Hebert Mendes de Araújo Schütz

Mestre em Direito Agrário pela Universidade Federal de Goiás analista judiciário do Tribunal de Justiça de Goiás e professor da FAR – Faculdade Almeida Rodrigues em Rio Verde-GO


Equipe Âmbito Jurídico

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