A validade jurídica dos documentos digitais


Sumário
: 1. Introdução. 2. O documento digital. 2.1 Conceito de documento digital. 2.2 Evolução do documento digital. 3. As condições básicas para o alcance da validade jurídica dos documentos digitais. 4. Arquivos digitais como instrumento e meio de prova. 5. As vantagens e desvantagens do uso dos documentos digitais. 6. O tratamento legislativo em outros países. 7. A regulamentação dos documentos digitais no Brasil. 8. Considerações finais.


1. Introdução


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O presente trabalho tem por finalidade analisar a possibilidade de atribuirmos validade jurídica aos documentos digitais.


Dentre as diversas questões em torno da informática jurídica, optamos por discorrer acerca dos documentos digitais e de sua validade perante o Direito brasileiro, bem como de seu desenvolvimento em ordenamentos jurídicos estrangeiros.


Com o uso dos meios eletrônicos de comunicação, utilizando como suporte principalmente a Internet, houve uma expansão comercial que não conhece fronteiras territoriais – o comércio eletrônico.


Sabemos que muitos ordenamentos jurídicos não estavam preparados para lidar com esse fenômeno, pois a maioria dos Estados preceitua regras de validade dos negócios jurídicos baseados em documentos escritos e memorizados sobre o papel. Assim, com essa nova forma de negociar e “assinar” alguns questionam a natureza jurídica, os efeitos, a segurança e, principalmente, a validade dos documentos digitais, diante da inicial insegurança do Direito e da sociedade perante eles.


A evolução da tecnologia aplicada à área da informática e telemática é visível nas sociedades globalizadas. Por isso, não podemos deixar de analisar as suas dimensões perante o Direito.


A falta de regulamentação dos documentos digitais representa hoje um dos maiores empecilhos ao desenvolvimento do comércio eletrônico. Por essa razão, os países precisam reformular suas leis, adequando-as à nova realidade, em busca de dar amparo legal e igualitário ao uso tanto da documentação tradicional quanto da digital.


As futuras legislações devem garantir, sim, a validade dos documentos digitais, e não repudiá-los, pois somente assim o Direito garantirá à sociedade global segurança total de que os negócios foram realmente concretizados, possuindo, desta forma, validade jurídica.


Admitindo-se a validade dos documentos digitais pelo ordenamento jurídico, não haverá como uma das partes se esquivar das obrigações por ela assumidas no negócio, alegando que este não foi efetivado, em razão do instrumento utilizado. Assim, se houver uma disputa judicial, a sociedade se sentirá segura de que as cláusulas que regem o negócio serão uma garantia para as partes.


O receio que existe ainda hoje de estabelecer pactos via documentos digitais, como é o caso da Internet, faz com que juristas e técnicos passem a se preocupar com a garantia da segurança e validade jurídica de tais negócios. De tal modo, ferramentas de apoio vão sendo criadas com a finalidade de impedir ataques às redes e também vão surgindo sistemas protetores contra operações ilegais.


As ferramentas mencionadas se estendem desde a criação de leis específicas, até recursos técnicos, que impeçam as possíveis fraudes, não deixando de mencionar o sistema de criptografia, que é amplamente utilizado.


Apesar de alguns autores entenderem que o documento digital não pode ser considerado válido, por não possuir forma exigida em lei, qual seja a forma escrita, ousamos divergir pelo fato de que contratos de várias espécies podem ser realizados e, da mesma forma, considerados válidos, quando celebrados até mesmo por telefone ou de forma oral. Com esse entendimento, questionamos a respeito da razão pela qual tais documentos digitais não podem ser equiparados aos documentos escritos e considerados válidos.


Se a preocupação que existe é quanto à segurança dos documentos digitais, com uma nova legislação, como foi o caso de outros países, tais como os Estados Unidos e a Itália, é certo que a realidade social se torna outra, pois se conferidos pela lei mecanismos que garantam a segurança nas transações, logicamente esses documentos terão como atributo a validade jurídica, principalmente como meio de prova de fato jurídico.


A Lei modelo da Uncitral[1] estabelece que os registros eletrônicos, para que recebam o mesmo nível de reconhecimento legal, devem satisfazer, no mínimo, o exato grau de segurança que os documentos em papel oferecem, o que deve ser alcançado por uma série de recursos técnicos. Em síntese, podemos dizer que essa lei, modelo para todos os países, estabelece uma série de requisitos que permitem que um documento digital tenha função equivalente ao documento escrito, assinado e original.


2. O documento digital


2.1. Conceito de documento digital


O documento digital pode ser denominado como documento eletrônico ou até mesmo como documento informático, mas todos com o mesmo sentido, sendo todo documento produzido por meio do uso do computador.


Defini-lo não é tarefa das mais fáceis, visto tratar-se de tema que envolve dados técnicos, bem como uma tecnologia nova, crescente e mutável. Torna-se difícil defini-lo com exatidão, por estar ele vinculado necessariamente a tais fatores. Da mesma forma, não podemos olvidar que o documento digital não pode ser abordado de forma estática, pois está sempre em evolução, assim como a técnica e a tecnologia.


Podemos conceituar o documento eletrônico como sendo o que se encontra memorizado em forma digital, não perceptível para os seres humanos senão mediante intermedição de um computador. Nada mais é do que uma seqüência de bits, que por meio de um programa computacional, mostrar-nos-á um fato.


Para que possamos entender melhor esse conceito, Marcacini nos explica de forma elucidativa:


“A assimilação desse conceito de documento eletrônico exige um certo grau de abstração. Trilhando na mesma linha de raciocínio de um dos gurus da informática moderna, Nicholas Negroponte, pode-se dizer que experimentamos hoje um mundo virtual onde, no lugar de átomos, agora temos que nos acostumar com uma realidade de coisas formadas tanto por átomos como por bits. O documento tradicional, em nível microscópico, não é outra coisa senão uma infinidade de átomos que, juntos, formam uma coisa que, captada pelos nossos sentidos, nos transmite uma informação. O documento eletrônico, então, é uma das seqüências de bits que, captada pelos nossos sentidos com o uso de um computador e um software específico, nos transmite uma informação”. [2]


 


Podemos conceituar documento digital como sendo uma representação da realidade, podendo apresentar-se em forma textual, gráfica, sonora ou outra admitida pela técnica, tendo como base qualquer suporte que possa garantir sua certeza e imutabilidade, e que possa ser atribuído a um sujeito determinado.


2.2 Evolução do documento digital


De acordo com dados históricos, podemos verificar que o Direito não acompanha imediatamente a evolução social, econômica e, também, a tecnológica, estando sempre retardatário perante os acontecimentos da sociedade.


O impacto revolucionário da informação está apenas começando a ser notado; desta forma, em se tratando de documento eletrônico, a ordem jurídica nacional não se ajustou à nova realidade existente em nível mundial e, inclusive, em nosso País.


O maior pensador contemporâneo do mundo dos negócios, Peter Drucker, sintetiza que:


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“A Revolução da Informação se encontra no ponto em que a Revolução Industrial estava no início da década de 1820, cerca de 40 anos depois de a máquina a vapor se aperfeiçoar por James Watt. E a máquina a vapor era para a Revolução Industrial aquilo que o computador vem sendo pra a Revolução da Informação”.[3]


Augusto T. R. Marcacini enfoca as mudanças sociais decorrentes da revolução tecnológica:


“O progresso da ciência sempre traz consigo uma mudança nos hábitos e comportamentos das pessoas. E destes novos relacionamentos humanos surgem novas relações jurídicas, ou novos fatos jurídicos a serem objeto de regulação por parte do Direito. Nunca, porém, o avanço da tecnologia se fez tão presente no cotidiano como ocorre nos dias de hoje, com a informática”. [4]


Sabemos que o Direito não pode se isolar do ambiente em que vigora; assim sendo, se uma norma positiva não é alterada para corresponder à realidade social e econômica em que vivemos, o magistrado deve adaptar o texto preciso às condições emergentes e imprevistas.


Rosana Ribeiro da Silva[5] entende que as sociedades são dinâmicas, ou seja, evoluem continuamente com o passar do tempo, de forma que o Direito, quando visa a regular os hábitos e atividades sociais, deve necessariamente acompanhar esta evolução, de forma a alterar ou dar novas interpretações às regras jurídicas existentes. Como compete ao Direito regular as relações entre indivíduos, dando-lhes segurança e estabilidade nas relações jurídicas que estabelecem, também a ele é conferida a regulamentação das relações que se originam das facilidades proporcionadas pela Internet.


A razão da necessidade de criação de novas regras que regulamentem o documento eletrônico se dá porque a informação está intimamente ligada à documentação, que aos poucos deixa de ser escrita para assumir a forma digital. Ante o volume e a necessidade de recuperação e disseminação das informações, o uso do papel começa a nos dar mostras de suas limitações.


Pesquisas nos informam que os documentos impressos estão sendo gradualmente substituídos por arquivos eletrônicos, mesmo diante do fato de que por mais de quinhentos anos todos os conhecimentos humanos e as informações foram armazenados em documentos de papel.


Segundo Bill Gates, as companhias de sucesso no futuro serão as que utilizarem ferramentas digitais para reinventar sua maneira de trabalhar, convertendo os documentos de papel em arquivos digitais. A respeito, o mesmo autor assegura que:


“O papel estará conosco infinitamente, mas sua importância como meio de encontrar, preservar e distribuir informação já está diminuindo(…) À medida que os documentos ficarem mais flexíveis, mais ricos de conteúdo de multimídia e menos presos ao papel, as formas de colaboração e comunicação entre as pessoas se tornarão mais ricas e menos amarradas ao local onde estão instaladas”.[6]


Temos de ter consciência de que o amadurecimento das tecnologias de digitalização dos documentos deve reduzir muito o uso do papel, mas dificilmente irá eliminá-lo.


O documento eletrônico está sendo amplamente utilizado principalmente na rede mundial conhecida por Internet, que possibilita a mobilidade das informações necessárias para que o comércio eletrônico se desenvolva e gere inúmeras transações, efetivando os modernos negócios jurídicos.


Os recursos eletrônicos, em alguns casos, suprimem as reais limitações verificadas com o uso da documentação tradicional, que é o papel, tornando o documento mais seguro, confiável e seu armazenamento e recuperação mais bem administrados, bem como sua transmissão eficiente, rápida e segura.


O trabalho com documentos digitais tende a ser mais fácil do que com o papel, permitindo que possamos transmitir informações de forma instantânea e recebê-la de volta quase que de imediato. Por isso, as organizações estão substituindo o papel pelo armazenamento eletrônico de documentos em redes, permitindo cada vez mais agilidade na obtenção da informação.


A diferença básica entre o documento tradicional e o documento eletrônico consiste na sua forma de materialização.


O documento tradicional está descrito em nosso ordenamento jurídico. Assim, por sua materialidade e reconhecimento pelo Direito garante a vontade das partes, bem como a sua inalterabilidade.


Nosso país está começando a seguir a direção que muitos outros países vêm seguindo, que é a busca da atualização legislativa em relação ao desenvolvimento tecnológico da humanidade, com uma legislação moderna e compatível com nossas experiências cotidianas, visando a proteger nossa sociedade das inúmeras e novas conseqüências jurídicas oriundas do progresso conquistado.


3. Validade jurídica dos documentos digitais.


Um documento eletrônico não pode ser assinado no modo tradicional, pelo qual o autor se identifica. Desta forma, é impossível que ele tenha a mesma forma que um documento tradicional, mas nada impede que determinados mecanismos informáticos possam trazer aos documentos digitais as três funções fundamentais dos documentos tradicionais, que são a função identificativa, a declarativa e a probatória.


Costuma-se atribuir aos documentos eletrônicos as seguintes características: volaticidade, alterabilidade e fácil falsificação.


Os documentos digitais, mesmo com todas estas implicações, podem ter validade jurídica, desde que preencham determinados requisitos, que são os mesmos exigidos para os documentos tradicionais; contudo, aqueles continuarão diferenciando-se destes pela forma prática de seu suprimento e verificação. Os requisitos acima mencionados são a integridade, a autenticidade e a tempestividade.


Entende-se por integridade a estimativa que se faz se um documento foi ou não modificado após sua concepção. Será verificada a existência ou não de contrafação (rasuras, cancelamentos, escritos inseridos posteriormente etc). Portanto, a integridade diz respeito ao conteúdo, às informações inseridas no documento.


A autenticidade é a verificação de sua proveniência subjetiva, determinando-se com certeza quem é seu autor. No documento em papel, o que demonstra a autoria geralmente é a assinatura. Naqueles documentos que não se costuma assinar, serão feitas análises grafológicas.


Quanto à tempestividade, é ela que garante a confiabilidade probatória do documento analisado. Será conferida pela verificação das formas de impressão, do tipo de tinta, os quais deverão estar compatíveis com a tecnologia disponível quando da feitura do documento.


César Viterbo Santolim enfoca a questão da validade jurídica dos documentos eletrônicos, mais especificamente com relação aos contratos realizados por computador, da seguinte forma:


“Para que a manifestação de vontade seja levada a efeito por um meio eletrônico, é fundamental que estejam atendidos dois requisitos de validade, sem os quais tal procedimento será inadmissível: a) o meio utilizado não deve ser adulterável sem deixar vestígios, e b) deve ser possível a identificação do(s) emitente(s) da(s) vontade(s) registrada(s)”.[7]


Primeiramente, tem que haver condições para se demonstrar a “paternidade” de determinado documento eletrônico, para somente depois discutir acerca de seu valor jurídico e sobre a possibilidade de equiparação ao documento tradicional.


Num primeiro plano temos de analisar se esse documento possui integridade, evitando, assim, que haja adulterações não detectáveis. Posteriormente, deve ser um documento autêntico; isso significa que devem necessariamente estar presentes mecanismos aptos a identificar seu autor e sua proveniência, para que, dessa forma, garanta o seu não repúdio. Por último, a data atribuída aos documentos eletrônicos é de suma importância, pois é assim que saberemos se há tempestividade, possibilitando sobremaneira a almejada segurança.


No âmbito jurídico, o maior obstáculo em aceitar um documento, petição ou certidão, enviado por computador ou até mesmo por fax, é a verificação da assinatura, ou seja, é quanto à segurança na identificação do autor.


Destarte, podemos considerar que a validade jurídica dos documentos digitais dependerá da prévia garantia de sua segurança, pois primeiramente a lei deverá atribuir a tais documentos mecanismos que garantam a segurança da autoria, da autenticidade e da tempestividade, para, assim, dar-lhes validade jurídica.


4. Arquivos digitais como instrumento e meio de prova.


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Ao tratarmos da validade dos documentos digitais, não podemos deixar de abordar especificamente o seu caráter probatório, pois os grandes questionamentos jurídicos incidentes sobre tais documentos estão exatamente em sua validade como meio e instrumento de prova, ou seja, se os documentos digitais são aptos a provar a existência de um determinado fato e, ainda, provar a sua autoria.


Segundo ensinamentos de Davi Monteiro Diniz[8], os arquivos digitais não precisam necessariamente ser considerados como documentos para que sejam aceitos no processo como meio de convencimento do juízo, isto é, como meio e instrumento de prova. Devem eles, sim, ser inseridos na categoria geral chamada de provas atípicas.


Porém, não há como se negar que o documento digital ainda causa um abalo na certeza quanto à integridade de seu conteúdo e quanto à sua autoria, o que, conseqüentemente, gera uma fragilidade diante de uma fundamentada impugnação.


Não podemos olvidar que quando se afere o valor probatório de um documento digital, avalia-se, também, a idoneidade dos instrumentos que serão utilizados para a leitura do conteúdo daqueles (hardwares e softwares).


Com relação às regras insertas em nosso ordenamento jurídico, existem algumas questões que devem ser ressaltadas. A primeira é quanto à obrigatoriedade, pelo artigo 366 do Código de Processo Civil, de que a prova dos fatos jurídicos seja feita obrigatoriamente por documentos. Partindo dessa premissa, restará ao julgador a decisão de qualificar ou não o documento digital como um documento validamente inserido nas regras processuais para que, assim, se possa utilizá-lo como meio de prova de um fato jurídico, dentro do processo.


A segunda questão a ser analisada é quanto aos critérios selecionados pela lei para dar certeza jurídica aos documentos, critérios esses estritamente calcados no interesse público; daí terem sido protegidos inclusive no âmbito do Direito Criminal, como é o caso dos crimes tipificados nos artigos 293 a 305 do Código Penal.


Podemos, então, concluir que os elementos autoria, integridade de conteúdo e corporalidade do documento são relevantes para o Direito e, por conseqüência, para a sociedade de um modo geral, por trazerem informações diretas sobre os limites dos direitos de seus proprietários. Da mesma forma, o Direito, visando a proteger a autenticidade de tais informações, protege o documento em si, sempre prezando o interesse público na segurança das relações jurídicas, bem como na administração da justiça.


Com relação às assinaturas, estas são consideradas pelas normas pátrias como sendo meio geral de imputação de autoria do documento. Mas, em determinados casos, como os livros mercantis e assentos domésticos, a lei faculta o seu lançamento (artigo 371, do CPC, e seus incisos), sendo que a prova, nesse caso, dependerá de perícia grafotécnica.


Pela lei, cessará a fé do documento se a integridade de seu conteúdo for violada, mediante alteração, ou se diante da contestação de sua assinatura, não se conseguir provar a sua veracidade (artigos 387, II, e 388, ambos do CPC).


Por isso, podemos notar que as regras processuais que protegem os documentos são de caráter público, ou seja, a integridade destes é considerada bem público indisponível, não integrando os poderes patrimoniais dos particulares (direitos não disponíveis).


Reportando-nos ao documento digital, conferimos na doutrina de Davi Monteiro Diniz[9] uma posição bastante prática. Assevera o ilustre jurista que o julgador, quando da composição de uma determinada lide e de acordo com a natureza dos interesses que ali estejam sendo discutidos, poderá atribuir a um arquivo digital os efeitos probatórios de um documento particular, caso a lei não exija outros requisitos formais para seu aperfeiçoamento. Ainda, tal efeito probatório poderá ser particularmente reforçado pela aquiescência das partes, emanada nos autos ou em outro instrumento negocial, desde que não esteja presente nenhuma desigualdade leonina.


Questão que vem se tornando comum na doutrina e na jurisprudência é com relação ao comércio eletrônico, que vem sendo largamente praticado principalmente por meio da Internet. Nesta rede mundial, vários arquivos digitais são utilizados para a celebração de negócios jurídicos contratuais.


Quando a lei exige para o negócio jurídico determinada forma não suportada pelos meios eletrônicos, há aí fortes empecilhos legais para que o documento digital seja considerado como prova do negócio firmado. Mas, em outras negociações que admitem a forma livre, a comunicação da proposta e da aceitação entre contraentes capazes e legítimos, por documentos digitais, é plenamente adequável às normas pátrias, não restando, destarte, qualquer óbice para que tais documentos sejam utilizados com tal escopo.


Com relação à sua natureza probatória, como já exposto acima, o Direito e a sociedade ainda não “confiam” plenamente nos documentos digitais, exigindo como prova do negócio firmado por tais arquivos eletrônicos outros elementos de prova que o confirmem, tais como a confirmação do pagamento da fatura do cartão de crédito, pela financiadora, ou comprovantes de envio da mercadoria comprada.


Porém, há determinadas espécies de contratos em que a obtenção de meios indiretos de prova não é uma boa solução, por acarretar uma lentidão contrária aos interesses dos contraentes. Para estes, a fim de garantir o reconhecimento da autoria e da integridade do conteúdo das declarações de vontade insertas no documento digital, está sendo utilizada a nova tecnologia denominada assinatura digital. Assim, as assinaturas digitais podem ser consideradas como meio direto de prova dos contratos entre ausentes, celebrados por documento digital.


Essa “assinatura” tem função de lacrar o conteúdo do documento, fazendo com que este permaneça íntegro, ou se for minimamente alterado, que isso possa ser constatado; também garante a autenticidade e a tempestividade.


Bill Gates explica o fenômeno da assinatura digital da seguinte forma:


“Quando você mandar uma mensagem pela estrada da informação, ela será “assinada” pelo seu computador, ou outro dispositivo de informação, com uma assinatura digital que só você será capaz de aplicar, e será codificada de forma que só seu destinatário real será capaz de decifrá-la. Você enviará uma mensagem, que pode ser informação de qualquer tipo, inclusive voz, vídeo ou dinheiro digital. O destinatário poderá ter certeza quase absoluta de que a mensagem é mesmo sua, que foi enviada exatamente na hora indicada, que não foi nem minimamente alterada e que outros não podem decifrá-la”.[10]


Importante salientar que a assinatura digital não tem por escopo tornar a mensagem ilegível, visto que ela em si não é encriptada, mas sim apenas é acrescentada à mensagem eletrônica, o que a mantém ilesa. Assim, podemos dizer que sua função precípua é a de elevar o estado de segurança do documento assinado.


Ao analisarmos os documentos tradicionais, podemos constatar que os requisitos essenciais que lhe conferem efeito probatório estão de modo notável apostos em um suporte material. Nos documentos eletrônicos não há a necessidade obrigatória desse suporte material, pois sua própria substância ou conteúdo já o comprovam.


A autenticidade pode ser garantida pela chave codificadora, como nos ensina Bill Gates:


“A chave codificadora permite mais do que privacidade. Ela pode também garantir a autenticidade de um documento, porque a chave privada pode ser usada para codificar uma mensagem que só a chave pública pode decodificar. Funciona assim: se eu tenho uma informação que quero assinar antes de mandar de volta para você, meu computador usa minha chave privada para codificá-la. Agora a mensagem só pode ser lida se minha chave pública-que você e todo mundo conhece – for usada para decifrá-la. Essa mensagem é com certeza minha, pois ninguém mais tem a chave privada capaz de codifica-la dessa forma”.[11]


Diante de tudo, podemos considerar que todo o corpo normativo que busca combater, com eficácia, eventuais tentativas de fraude ou abuso poderá ser considerado como inaplicável em determinadas situações que envolvam os documentos digitais, em razão da inadequação objetiva dos instrumentos jurídicos acima apresentados.


5. As vantagens e desvantagens do uso dos documentos digitais


Nesse tópico, apresentaremos uma breve síntese sobre as vantagens e desvantagens do uso dos documentos digitais.


Inúmeras são as vantagens oferecidas pelo uso dos documentos digitais em relação aos documentos tradicionais.


Vantagens:


· Maior celeridade em sua elaboração, bem como redução de custos de impressão;


· Arquivamento de forma simples e fácil recuperação de dados;


· Alta capacidade de armazenamento, sendo seu custo reduzido;


· Retorno às exigências ecológicas e de tutela do meio ambiente;


· Duplicabilidade imediata, não havendo a figura da cópia;


· Transmissão imediata;


· Dificuldade de fraude, mediante mecanismos que a impeçam;


· Capacidade de resistência ao envelhecimento e deterioração.


Douglas Leme de Riso salienta acerca das vantagens dos documentos eletrônicos em face à preservação da natureza:


“Atrelado aos objetivos da lei americana ou qualquer outro diploma legal de países do globo, atrevemos a citar, também o apelo ambiental positivo provocado pelo uso eletrônico de documentos: a preservação da fauna e flora do planeta, que irá, com certeza, minimizar desmatamentos com a finalidade de abastecimento da indústria de papel e celulose”. [12]


Os documentos tradicionais, apostos em papel, não mais correspondem às necessidades rápidas de agilidade na circulação das informações. São evidentes as suas limitações, nos dias atuais, seja no que se refere à simples conservação, transmissibilidade ou segurança.


Como sabemos, o documento tradicional é feito por meio corpóreo, isto é, lançado no papel em forma escrita e assinado pelas partes. Já o documento eletrônico tem várias formas, não podendo ser classificado como escrito. Ele pode ser representado por desenho, som, vídeo ou tudo aquilo que representar um fato e que esteja armazenado em um arquivo digital.


Desvantagens


Uma das principais desvantagens do documento digital é a ligação que ele possui com a tecnologia, computadores e tudo mais que o envolve. A necessidade de intermediação é um dos pontos fracos dessa forma de documentação, uma vez que para que possamos ter conhecimento de determinada informação que se encontra memorizada em forma de bits, faz-se mister a intermediação com o auxilio de um computador.


Também quanto à sua leitura, para que possa ser visualizado o conteúdo de um documento digital, devemos submetê-lo ao computador para a decifragem.


Com o uso constante da informática no quotidiano, mudanças em nossos hábitos serão verificadas, mostrando-nos que somos capazes de nos adequar às situações novas, bem como à tecnologia que a cada dia se aperfeiçoa.


Uma questão que deve ser considerada neste tópico é a insegurança, presente na sociedade, na realização de transações pela Internet. Se houvesse uma campanha nacional de informação sobre o bom uso dos meios informáticos, elaborada por todos os interessados no comércio eletrônico, esse obstáculo poderia ser superado.


6. O tratamento legislativo em outros países


Muitos países, nos últimos anos, criaram normas que disciplinam a validade jurídica dos documentos digitais, dando-lhes, para isso, a segurança de sua autoria e integridade.


Porém, cada país preferiu regular a matéria de sua maneira, visto que alguns simplesmente criaram mecanismos certificadores das assinaturas, enquanto outros, além disso, trataram da qualificação legal dos arquivos digitalmente assinados, atribuindo-lhes, assim, a qualidade documental.


Douglas Leme de Riso aponta o posicionamento da legislação dos Estados Unidos sobre a validade jurídica dos documentos digitais:


“Nesse sentido, o governo americano em ato pioneiro e corajoso, por meio de seu presidente Bill Clinton, sancionou recentemente lei sobre assinatura eletrônica com vistas a: (i) estimular o uso deste meio de comunicação, mesmo conhecendo as dificuldades em outorgar às transações desta espécie, a devida segurança; (ii) reduzir drasticamente as despesas administrativas; e (iii) reduzir o tempo consumido nas transações”.[13]


Vários estados federados dos Estados Unidos já dispuseram sobre a matéria, como Utah, que atribuiu a mesma validade jurídica tanto aos documentos assinados digitalmente quanto aos assinados manualmente. Diferentemente, o Estado da Califórnia subordinou a validade dos documentos digitais à aquiescência daqueles que o produzirem.


Já em outros países, como a Itália, pioneira em seu continente, legislou-se sobre a matéria atribuindo-se a mesma validade jurídica dos documentos assinados manualmente aos documentos com assinaturas digitais.


Na Alemanha, a legislação limitou-se a definir a estrutura necessária ao uso das assinaturas digitais, não lhes atribuindo a mesma validade legal que o documento assinado manualmente.


Em artigo jurídico, Ângela Bittencourt dispõe sobre a regulamentação dos documentos eletrônicos na Alemanha:


“Na mesma esteira, a Alemanha já tem a sua” Informations Und Kommunikationsdienste Gesetz Iukdg”, lei federal que estabelece condições gerais para o uso das assinaturas digitais, tanto ao seu aspecto de segurança  e se baseia no mesmo sistema de criptografia. E assim,outros países,como a Itália e a Bélgica, adotaram procedimentos semelhantes”.[14]


A Argentina, pelo Decreto nº 427/98, criou um programa de uso das assinaturas digitais no âmbito da administração pública; porém, para serem utilizadas somente em atos internos que não produzam efeitos jurídicos “individuales en forma directa”.


A Lei Modelo expedida pela UNCITRAL, da ONU, que visa a promover a uniformidade das regras sobre o tema entre todos os países, apresenta alguns pontos interessantes a respeito da validade dos documentos digitais.


Em seu artigo 1º, a Lei Modelo trata do reconhecimento jurídico dos contratos eletrônicos, não negando a sua validade e força obrigatória, como um contrato firmado na forma tradicional. No artigo 6º, a Lei discorre a respeito da necessidade do documento digital apresentar-se na forma escrita, quando a lei exigir a forma escrita para aquele negócio, além de ter que permanecer disponível e acessível para consultas posteriores.


O artigo 7º dispõe sobre a assinatura dos contratos eletrônicos, nos quais a assinatura manual, quando exigida pela lei, poderá ser substituída por outros métodos eficazes de identificação das partes contratantes, desde que confiáveis e apropriados para as finalidades do negócio jurídico.


Com relação à formação do contrato eletrônico, a Lei Modelo dá validade à oferta e à aceitação, expressas por meios eletrônicos, desde que as partes não tenham convencionado de maneira diversa.


Ainda, a mesma Lei trata do tempo e lugar de envio e recepção de uma mensagem eletrônica, determinando que se as partes não convencionarem de maneira diversa, a mensagem será considerada enviada quando ela entra em um sistema de informação fora do controle do emissor e recebida nos seguintes casos: se o destinatário designou um sistema de informação para receber mensagens eletrônicas, a recepção acontecerá:


a)      no momento em que a mensagem entrar no sistema designado;


b)      ou no momento em que a mensagem foi recuperada pelo destinatário, quando esta entrar noutro sistema que não o designado. Caso o destinatário não designou um sistema de informação, a recepção acontecerá no momento de entrada da mensagem no sistema de informação do destinatário.


Concluindo, Paulo Sá Elias pondera que países como Estados Unidos, Canadá, Argentina, Colômbia, e mesmo a União Européia, já criaram leis disciplinando a matéria. Porém, é necessário que tal regulamentação se faça presente o quanto antes, “por se tratar de assunto de interesse universal, que não pode ficar a espera de que o mal aconteça, para só então se tomarem as providências”. [15]


7. A validade e a regulamentação dos documentos digitais no Brasil


No Brasil, algumas regras já foram acrescentadas em nosso ordenamento jurídico acerca da validade dos documentos digitais. Essa nova realidade que paira na sociedade mundial e, principalmente, na sociedade brasileira, faz com que busquemos nos adaptar à tecnologia crescente e regulamentar a questão de forma a não permitir a estagnação econômica do País, além de amparar a sociedade com mecanismos jurídicos aptos, nas relações jurídicas tratadas pelos meios eletrônicos.


Alguns foram os casos em que nossos tribunais puderam decidir sobre a validade jurídica de certos documentos digitais. Podemos citar como exemplo o caso do 1º interrogatório em videoconferência do Brasil, realizado pelo juiz de direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de Campinas/SP, Dr. Edison Aparecido Brandão, em 27 de agosto de 1996, sendo que tal ato foi julgado válido pelo Supremo Tribunal Federal (RHC 0006272-97/0010034-0).


No Brasil, há três projetos de lei tramitando no Congresso Nacional, sobre a matéria. O primeiro é o Projeto de Lei do Senado nº 22, que dispõe sobre os documentos produzidos e os arquivados em meios eletrônicos, que tramita desde 1996. O segundo é o recente PL nº 1483, que institui a fatura eletrônica e a assinatura digital nas transações de comércio eletrônico, que tramita desde 1999. Ainda há o Projeto de Lei nº 1589, proposto em agosto de 1999 pela Ordem dos Advogados do Brasil, Secção São Paulo, dispondo sobre o comércio eletrônico, a validade jurídica do documento eletrônico e a assinatura digital, que segue algumas regras da Lei Modelo da UNCITRAL.


Em 29 de julho de 2001 foi editada pelo Presidente da República a Medida Provisória de nº 2.200, que trata da segurança jurídica do comércio eletrônico e do documento eletrônico. Entretanto, tal Medida Provisória foi largamente criticada pela comunidade jurídica pelo fato de que esta não mantinha paralelo com nenhuma legislação de país democrático, nem na proposta da ONU (Lei Modelo da UNCITRAL), nem nos projetos de lei que tramitavam no Congresso. Também se critica a criação do Comitê Gestor da Infra-Estrutura de Chaves Públicas, dominado pelo Poder Executivo, cujas funções, dentre outras, são as de definir os requisitos dos documentos eletrônicos e os modos de certificar as chaves que o assinam, emitindo certificados pelas Autoridades Certificadoras, que serão definidas pelo mesmo Comitê acima mencionado. Tratam-se, para muitos, de funções normativas, completamente inconstitucionais.


Com relação à validade dos documentos digitais, a Medida Provisória obrigou que este deva ser assinado com chaves certificadas por uma Autoridade Certificadora credenciada pelo Comitê. Neste ponto, difere-se, p. ex., das leis da Diretiva Européia e do Projeto de Lei da OAB/SP, que dão valor jurídico e probatório aos documentos digitais mesmo que a assinatura eletrônica não se baseie em um certificado reconhecido ou expedido por um certificador credenciado.  A crítica feita pelos membros da OAB está no sentido de que o credenciamento obrigatório das autoridades certificadoras dos documentos digitais no Comitê foi elaborado para gerar “lucro fácil” às certificadoras credenciadas. Ainda, nada mais oportunista ao Governo Federal do que manter em seu poder um cadastro geral (banco de dados) de todas as pessoas que utilizam tais serviços, além de poder interceptar e ler as mensagens, mesmo que cifradas, retirando-lhes a segurança, ao invés de garanti-la.


Em 27 de julho de 2001, o Presidente da República reeditou a MP 2.200 com algumas alterações, numa tentativa de “corrigir” os abusos apontados pela OAB/SP. Dentre outras mudanças, admitiu mais um representante da iniciativa privada no Comitê Gestor da ICP-Brasil, esclareceu e consignou que a privacidade da pessoa certificada estará garantida; estipulou que ninguém será obrigado a obter certificados, pois “a validade jurídica é um atributo ligado a qualquer meio de prova, seja eletrônico ou não, desde que obtido por meio lícito”; previu que haverá presunção de veracidade dos documentos digitais, com a possibilidade de utilização de meios comprobatórios diversos para se demonstrar a sua autoria e integridade.


Dando continuidade à regulamentação do tema, em 25 de setembro de 2001, o Comitê Gestor de Infra-estrutura de Chaves Públicas – ICP-Brasil editou a Resolução nº 2, que aprova a Política de Segurança da ICP-Brasil. Foram estabelecidas diretrizes que devem ser adotadas pelas entidades participantes da ICP-Brasil, entre elas a segurança humana, física, lógica e segurança dos recursos criptográficos na Internet.


Inovando na ordem jurídica, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, pelo Provimento GP nº 07, de 10 de agosto de 2001, criou o SIPE – Sistema de Petição Eletrônica. Estabeleceu que as petições poderão ser enviadas pela Internet, exigindo o cadastramento prévio do advogado e a escolha de sua senha, que funcionará como uma assinatura eletrônica (por criptografia). A petição será certificada pelo TRT através do SIPE, que funcionará como uma Autoridade Certificadora. Ficou estipulado que a petição assinada digitalmente terá validade jurídica, não necessitando de ratificação posterior, nem de remessa de cópia com assinatura física. A tempestividade deste documento digital ficou determinada pelo horário de recebimento da petição pelo SIPE, observados os limites do artigo 172, § 3º, do CPC.


A normatização da questão indubitavelmente traz segurança nas relações negociais, possibilitando uma maior demanda nos negócios virtuais, gerando uma maior celeridade para os vários setores, além de provocar a captação de novos investimentos para o país.


Concluindo, citamos os ensinamentos de Ângela Bittencourt Brasil:


“Tomando-se a Internet como uma realidade e compreendendo-se as facilidades que ela traz a todos que a utilizam como instrumento de trabalho e negocial, vimos que está reservado ao Direito uma importante parcela dos seus resultados, pois incumbe a ele a tarefa de estabelecer regras para essa relação, reprimir o abuso prejudicial dos contratos e, acima de tudo, encarar a rede como um meio eficaz e rápido para o crescimento econômico. E é entre os atos jurídicos que podem ser efetuados pela Web e que já estão sendo feitos, é que surge a necessária segurança para o estabelecimento completo dessas relações. Se o Brasil ainda não tem as chaves necessárias para a concepção da Assinatura Digital, essa é a hora de faze-la através dos seus técnicos. Se ainda não possui uma Autoridade Certificante para dar credibilidade aos documentos, que reúna os nossos matemáticos para que possam se transformar em Ciber Notários. E finalmente, que os nossos legisladores entendam a premência do estabelecimento das normas reguladoras do espaço virtual e ponham as mãos à obra”.[16]


8. Considerações finais


1 – Dentro do campo da informática jurídica, o presente trabalho buscou discorrer acerca da validade jurídica dos documentos digitais, bem como de seu regramento em ordenamentos jurídicos estrangeiros, tendo em vista o crescente uso dos meios eletrônicos de comunicação, principalmente através da Internet, com a expansão comercial, que hoje é denominada de comércio eletrônico.


2 – O Direito não acompanha a evolução social, econômica e, também, a tecnológica, estando sempre atrasado perante os acontecimentos da sociedade. Como o impacto revolucionário da informação está apenas começando a ser notado, em se tratando de documento eletrônico, a ordem jurídica nacional ainda não se ajustou plenamente à nova realidade existente em nível mundial e, inclusive, em nosso País. Diante disso, a razão da necessidade de regulamentação da matéria se dá porque a informação está intimamente ligada à documentação, que aos poucos deixa de ser escrita para assumir a forma digital e, como o uso do papel começa a nos mostrar suas limitações, os recursos eletrônicos vêm a suprimi-lo, em alguns casos, tornado o documento mais seguro, confiável e seu armazenamento e recuperação mais bem administrados, bem como sua transmissão eficiente, rápida e segura.


3 – Um documento eletrônico não pode ser assinado no modo tradicional, através do qual o autor se identifica. Por isso, costuma-se atribuir aos documentos eletrônicos as características da volaticidade, alterabilidade e fácil falsificação. Apesar da impossibilidade de os documentos digitais terem a mesma forma que um documento tradicional, determinados mecanismos informáticos podem trazer aos documentos digitais as três funções fundamentais dos documentos tradicionais, que são a função identificativa, a declarativa e a probatória, bem como os seus três requisitos básicos, quais sejam a integridade, a autenticidade e a tempestividade. No âmbito jurídico, o maior obstáculo em aceitar um documento, petição ou certidão, enviado por computador ou até mesmo via fax, é a verificação da assinatura, ou seja, é quanto à segurança na identificação do autor.


4 – Quanto ao caráter probatório dos documentos digitais, a obrigatoriedade que o artigo 366 do Código de Processo Civil traz de que a prova dos fatos jurídicos seja feita obrigatoriamente por documentos, deixa ao julgador a decisão de qualificar ou não o documento digital como um documento validamente inserido nas regras processuais para que, assim, possa utilizá-lo como meio de prova de um fato jurídico, dentro do processo. Entretanto, podemos dizer que estes não precisam necessariamente ser considerados como documentos para que sejam aceitos no processo como meio de convencimento do juízo, isto é, como meio e instrumento de prova; podem eles ser inseridos na categoria geral das provas atípicas. Porém, os pontos ainda existentes, que obstacularizam o caráter probatório dos documentos digitais, são o abalo na certeza quanto à integridade de seu conteúdo e quanto à sua autoria.


5 – As assinaturas digitais podem ser consideradas como meio direto de prova dos contratos entre ausentes, celebrados por documento digital. Essa “assinatura” tem função de lacrar o conteúdo do documento, fazendo com que este permaneça íntegro, ou, se for minimamente alterado, que isso possa ser constatado; também garante a autenticidade e a tempestividade.


6 – Os elementos autoria, integridade de conteúdo e corporalidade do documento são relevantes para o Direito e, por conseqüência, para a sociedade de um modo geral, por trazerem informações diretas sobre os limites dos direitos de seus proprietários. Da mesma forma, o Direito, visando a proteger a autenticidade de tais informações, protege o documento em si, sempre prezando o interesse público na segurança das relações jurídicas, bem como na administração da justiça.


7 – Quando a lei exige para o negócio jurídico determinada forma não suportada pelos meios eletrônicos, há aí fortes empecilhos legais para que o documento digital seja considerado como prova do negócio firmado. Mas, em outras negociações que admitem a forma livre, a comunicação da proposta e da aceitação entre contratantes capazes e legítimos, por documentos digitais, é plenamente adequável às normas pátrias, não restando, destarte, qualquer óbice para que tais documentos sejam utilizados com tal escopo.


8 – Ao analisarmos os documentos tradicionais, podemos constatar que os requisitos essenciais que comprovam seu efeito probatório estão de modo notável apostos em um suporte material. Nos documentos eletrônicos não há a necessidade obrigatória desse suporte material, pois sua própria substância ou conteúdo já o comprovam.


9 – A insegurança presente na sociedade com relação à efetuação de transações pela Internet poderia ser sanada com uma campanha nacional de informação sobre o bom uso dos meios informáticos, elaborada por todos os interessados no comércio eletrônico.


10 – No Brasil, algumas regras já foram acrescentadas em nosso ordenamento jurídico, a fim de dar validade jurídica aos documentos digitais. Assim, há três projetos de lei tramitando no Congresso Nacional, sobre a matéria, um é o Projeto de Lei do Senado nº 22, outro é o recente PL nº 1483, e, ainda, há o Projeto de Lei nº 1589, proposto em agosto de 1999 pela OAB/SP, que segue algumas regras da Lei Modelo da UNCITRAL. Foi editada a Medida Provisória de nº 2.200/2001, que trata sobre o tema da segurança e validade jurídica do comércio eletrônico e do documento eletrônico. Diante das inúmeras críticas que a cercaram, a Medida Provisória foi reeditada, porém, com algumas alterações. O Comitê Gestor de Infra-estrutura de Chaves Públicas – ICP-Brasil editou a Resolução nº 2/2001, que estabelece diretrizes a serem adotadas pelas entidades participantes da ICP-Brasil, para garantir a segurança e a validade jurídica dos documentos digitais. 


11 – A falta de regulamentação e atribuição de validade jurídica aos documentos digitais representa hoje um dos maiores empecilhos ao desenvolvimento do comércio eletrônico. Assim, os países devem adotar legislações que garantam a validade dos documentos digitais, ao invés de repudiá-los, pois somente assim o Direito garantirá à sociedade global segurança de que os negócios foram realmente concretizados, visto que não haverá como uma das partes se esquivar das obrigações por ela assumidas no negócio, alegando que este não foi efetivado, em razão do instrumento utilizado. Assim, se houver uma disputa judicial, a sociedade se sentirá segura de que as cláusulas que regem o negócio serão uma garantia para as partes.


12 – Apesar de alguns autores não admitirem a validade do documento digital, por não possuir a forma escrita, conforme exigida em lei, nosso posicionamento é no sentido da validade, visto que contratos de várias espécies podem ser realizados e, da mesma forma, considerados válidos, quando celebrados até mesmo por telefone ou de forma oral.


13 – Como a preocupação que existe é quanto à segurança dos documentos digitais, o Direito, como o grande provedor das regras aplicáveis à sociedade, tem o dever de resolver tal impasse. Destarte, podemos considerar que a validade jurídica dos documentos digitais dependerá da prévia garantia de sua segurança, pois primeiramente a lei deverá atribuir a tais documentos mecanismos que garantam a segurança da autoria, da autenticidade e da tempestividade, para, assim, dar-lhe validade jurídica.



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Notas:


[1] A UNCITRAL (United Nations Commission on International Trade Law) consiste em uma comissão especial da ONU (Organização das Nações Unidas), que trata da legislação comercial intenacional, elaborou e tem divulgado uma lei modelo de comércio eletrônico, que tem sido um ponto de partida para a legislação de muitos países. Tal lei seria aplicável a todos os tipos de informação em forma de mensagem de dados, utilizados no contexto de atividades comerciais. Tem caráter internacional e vida promover a uniformidade de sua aplicação e a observância da boa-fé.

[2] O documento eletrônico como meio de prova Disponível em: <http://www.members.xoom.com/marcacini/docelet.pdf> Acesso em: 14 dez. 2000.

[3] Revista Exame Digital. São Paulo, 710. ed., ano 34, n. 6, mar. 2000, p 113.

[4] Op. cit.

[5] Contratos Eletrônicos. Disponível em: <http://www.jus.com.br/doutrina/contrele.htm> Acesso em: 13 jan. 2001.

[6] A estrada do futuro. São Paulo: Companhia das Letras: Schwarcz, 1995, p. 145-173.

[7] Formação e eficácia probatória dos contratos por computador. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 33.

[8] Documentos eletrônicos, assinaturas digitais.  São Paulo: LTr, 1999, p. 39.

[9] Op. cit., p. 41.

[10] Op. cit., p.138.

[11] Op. cit., p.142.

[12] Assinatura eletrônica; certeza ou insegurança? Disponível em: http://cbeji.com.br/artdouglas02.htm> Acesso em: 01 jan. 2001.

[13] Disponível em: <http://www.cbeji.com.br/artigos/artdouglas2.htm> Acesso em: jan. 2001.

[14] Disponível em: <http:// www.elogica.com.br/assinatura_digital.htm> Acesso em: jan. 2001.

[15] ELIAS, Paulo Sá. Alguns aspectos da informática e suas conseqüências no direito. Disponível em: <http://www.jus.com.br/doutrina/infomode.htm> Acesso em: 25 set. 2000.

[16] Disponível em: <http://www.elogica.com.br/assinatura_digital.htm> Acesso em: jan. 2001.


Informações Sobre os Autores

João Agnaldo Donizeti Gandini

Juiz de Direito titular da 2ª Vara da Fazenda Pública da comarca de Ribeirão Preto-SP. Mestre em Direito pela UNESP. Coordenador e professor do curso de especialização lato sensu em direito processual civil da FAAP – Fundação Armando Álvares Penteado, campus Ribeirão Preto-SP

Diana Paola da Silva Salomão

Advogada em Ribeirão Preto/SP.

Cristiane Jacob

Bacharelanda em Direito pela Universidade de Ribeirão Preto.


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