Resumo: Neste trabalho se discute a aprovação da Lei Complementar nº 87, conhecida como Lei Kandir, que instituiu imunidade tributária a produtos primários e semielaborados destinados à exportação no ano de 1996. Da mesma forma, faz-se um apanhado sobre as normas que dispuseram sobre a compensação aos estados e municípios em decorrência da perda de receita tributária causada pela mencionada Lei. Passo seguinte, apresenta-se a inércia por parte do Congresso Nacional em editar uma norma que dispusesse definitivamente sobre a compensação aos estados e municípios, como estabelecido pela emenda constitucional nº 42, tendo em vista que as normas anteriores eram esporádicas e conjunturais. Ainda, expõe-se as providências judiciais tomadas pelos estados em face de tal inércia. Por fim, apresenta-se a situação fiscal dos estados nos últimos anos e como o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 25 pelo Supremo Tribunal Federal pode minimizar os efeitos da recente crise econômica e financeira das unidades da federação brasileira.
Palavras-chave: Lei Kandir – Dívida Pública – Estados – ADI – Crise Econômica – Finanças Públicas.
Abstract: In this paper, discusses the approval of Complementary Law No. 87, known as Kandir Law, which instituted tax immunity for primary and semi-finished products destined for export, in 1996. Likewise, is made a survey on the rules about compensation to the states and municipalities as a result of the loss of tax revenue caused by the aforementioned Law. Next step, will be introduced the inertia by the National Congress to issue a definitive rule about compensation to states and municipalities, as established by the constitutional amendment No. 42, given that the previous rules were sporadic and conjunctural. Also, will be exposed the judicial measures taken by the states against such inertia. Finally, the fiscal situation of the states in recent years is presented and also how the judgment of the Direct Action of Unconstitutionality No. 25 by the Federal Supreme Court can minimize the effects of the recent economic and financial crisis of the units of the Brazilian federation.
Keywords: Kandir Law – Public Debt – States – ADI – Economic Crisis – Public Financial.
1 INTRODUÇÃO
No presente trabalho, se discute as consequências advindas da promulgação da Lei Complementar nº 87, conhecida como Lei Kandir, que instituiu imunidade tributária aos produtos primários e semielaborados destinados à exportação, bem como os critérios estabelecidos para compensação aos estados e municípios. Além disso, verifica-se se tais critérios são adequados. Também, apresentam-se as medidas judiciais adotadas pelos estados em face da omissão por parte do Congresso Nacional em editar a norma que disciplinasse definitivamente a compensação aos estados e municípios, como preconizado pela emenda constitucional nº 42, tendo em vista que as normas anteriores eram esporádicas e conjunturais.
Na primeira seção, apresenta-se a Lei Complementar nº 87, abordam-se os motivos que justificaram sua aprovação e analisa-se a adequação dos critérios estabelecidos a fim de compensar eventuais prejuízos tributários experimentados em face da citada Lei.
Na segunda seção, são apresentadas as medidas judiciais adotadas pelos estados em decorrência da não edição da norma que dispusesse, em definitivo, sobre critérios adequados de compensação, como determinado pela emenda constitucional nº 42. Passo seguinte, busca-se apresentar um panorama sobre a situação fiscal dos estados nos últimos anos e como o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão nº 25 pelo Supremo Tribunal Federal pode contribuir com a mencionada situação.
Finalmente, em “Conclusões”, serão recuperadas as principais considerações deste estudo, que permitirá um posicionamento sobre a atual perspectiva dos entes federativos brasileiros em serem adequadamente recompensados em função da aprovação da Lei Kandir.
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 A Lei Complementar nº 87 e suas implicações
No dia 13 de setembro de 1996, foi promulgada a Lei Complementar nº 87, que dispõe sobre o imposto dos Estados e do Distrito Federal sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, e dá outras providências. (BRASIL, 1996) A mencionada norma é popularmente conhecida como Lei Kandir, em referência ao ex-deputado que a propôs, Antônio Kandir. (SOARES, 2007)
A Constituição da República de 1988 estabelecia imunidade tributária apenas aos produtos industrializados e permitia que Lei Complementar dispusesse sobre a imunidade tributária a produtos semielaborados. (SOARES, 2007) Em 15 de abril de 1991, foi promulgada a Lei Complementar nº 65, que define, na forma da alínea a do inciso X do art. 155 da Constituição, os produtos semielaborados que podem ser tributados pelos Estados e Distrito Federal, quando de sua exportação para o exterior. (BRASIL, 1991)
Contudo, apenas uma parte dos produtos semielaborados foi contemplada na Lei Complementar nº 65. Além disso, permanecia a competência de os estados tributarem a exportação de produtos primários. (SOARES, 2007)
Conforme dados da Secretaria de Comércio Exterior – SECEX do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços – MDIC, de 1938 a 1978, os produtos primários compunham majoritariamente a pauta de exportação brasileira. A partir de 1979, há uma inversão, de modo que os produtos manufaturados passam a prevalecer sobre os produtos primários, o que permaneceu até 2006. Os dados anteriores a 1938 e posteriores a 2006 não foram consultados. A título de ilustração, em 2006, os produtos manufaturados correspondiam a 54,3% da pauta de exportação, enquanto os produtos primários a 29,3%.
Quanto aos produtos semimanufaturados, estes sempre tiveram uma representatividade relativamente baixa na pauta de exportação brasileira, entre 1938 e 2006, com média igual a 11,8%, desvio padrão igual a 3,06% e coeficiente de variação equivalente a 25,87%.
Apesar dessa inversão na pauta de exportação brasileira a partir de 1979, fato é que os produtos primários continuaram a ter uma representatividade relevante na pauta, o que necessariamente não pode ser menosprezado em termos de política macroeconômica.
Disso tudo, pode-se concluir que o fato de os produtos primários não gozarem de imunidade tributária até 1996 constitui um fato relevante, pois os tornam menos competitivos no âmbito do comércio exterior e foi justamente este um dos pretextos para a promulgação da Lei Complementar nº 87.
Também, há de se apontar um fator conjuntural: com a implantação do Plano Real em julho de 1994 e sua “âncora cambial”, a balança comercial brasileira se tornou deficitária, indo de um superávit de 10,4 bilhões de dólares em 1994 para déficits de 3,4 e 5,6 bilhões de dólares em 1995 e 1996 respectivamente, o que demandava uma ação por parte do poder público. (SOARES, 2007)
Ao mesmo tempo em que resolvia dois problemas (competitividade da exportação de produtos básicos e desequilíbrio da balança comercial), a iniciativa consubstanciada na Lei Kandir criava um novo problema, que era um possível comprometimento das finanças estaduais e municipais em função da perda de arrecadação com o ICMS sobre a exportação de produtos antes tributados.
Por tal motivo, a Lei Complementar nº 87 estabeleceu um critério de compensação temporária aos estados a ser custeado pela União. Previsto a perdurar até 2002 e com a possibilidade de ser estendido até 2006, o art. 31 da Lei Kandir estabeleceu o denominado seguro receita, que considerava a arrecadação do ICMS pelos estados, determinados fatores de crescimento e atualização, e o desempenho da arrecadação de cada um dos estados em contraponto aos demais e à receita auferida pela União em seu território. Contudo, o valor global a ser pago estaria limitado a 3,6 bilhões de reais nos anos de 1996 e 1997, e de 4,4 bilhões de reais no ano de 1998 e seguintes. (SOARES, 2007)
O intuito dessa compensação era o de preservar a receita de estados e municípios com o ICMS sobre os mencionados produtos no período de julho de 1995 a junho de 1996, acrescido de correção pelo IGP e de uma taxa de real de 3% em 1996 e 1997, e de 2% em 1998 e 1999, com a possibilidade de manutenção do crescimento real a partir de 1999, se não houvesse redução do esforço fiscal por parte dos estados. (MEDEIROS NETTO apud SOARES, 2007)
Em 11 de julho de 2000, a Lei Complementar nº 102 estabeleceu teto para a compensação na ordem de R$ 3,864 bilhões em 2000, e R$ 3,148 bilhões para 2001 e 2002, corrigidos pelo IGP-DI. Em 26 de dezembro de 2002, a Lei Complementar nº 115 estabeleceu o teto de R$ 3,9 bilhões para o ano de 2003. (SOARES, 2007)
Com a Emenda Constitucional nº 42, de 19 de dezembro de 2003, os preceitos da Lei Kandir foram incorporados ao texto constitucional e ganharam um status de maior estabilidade normativa, porquanto seja exigido quórum ainda mais qualificado para alterações em comparação aos dispositivos de Lei Complementar. Para projetos de Lei Complementar, se exige a aprovação pela maioria absoluta de deputados e senadores, em turno único em cada uma das casas. Para projetos de emenda constitucional, se exige aprovação por três quintos de deputados e senadores, em dois turnos em cada uma das casas. (BRASIL, 1988)
Além disso, a emenda constitucional nº 42, acrescentou ao ato das disposições constitucionais transitórias – ADCT o artigo 91, que institucionalizou a possibilidade de compensação aos estados e municípios, segundo os seguintes critérios: volume de exportação de produtos primários e semielaborados, relação entre exportações e importações, créditos decorrentes de aquisições de ativo permanente e manutenção e aproveitamento dos créditos dos exportadores. Contudo, a matéria deveria ser disciplinada por lei complementar, o que nunca foi feito. Enquanto houvesse a vacatio legis, prevaleceria o anexo da Lei Complementar nº 87/96, com redação dada pela Lei Complementar nº 115/2002. (SOARES, 2007)
Acrescenta-se que a União também efetuaria os repasses ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério – FUNDEF, no que cabia aos estados e municípios (15%). Com a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB, em 1º de janeiro de 2007, o percentual foi de 16,66% em 2007, 18,66% em 2008 e 20% nos anos seguintes, conforme artigos 3º, § 1º, e 31, §1º, I, da Lei nº 11.494, de 20 de junho de 2007. (SOARES, 2007)
Como a Lei Complementar mencionada no ADCT não foi editada, o tema foi tratado por Medidas Provisórias e Leis Ordinárias nº 10.966, de 9 de novembro de 2004, 11.131, de 1º de julho de 2005, e 1.289, de 30 de março de 2006, cada uma destinando 900 milhões de reais anuais a estados e municípios, cabendo, aos primeiros, três quartos do montante e, aos segundos, o quarto restante, o que ficou conhecido como “auxílio financeiro”. (SOARES, 2007)
Verifica-se, pois, que a contrapartida decorrente da Lei Kandir, em grande medida, ficou a cargo da boa vontade por parte de a União e seus legisladores em destinar quantias adicionais às estabelecidas nas mencionadas normas aos estados e municípios. Tal boa vontade não se refere apenas a destinar recursos orçamentários, como também a executá-los. Soares, por exemplo, indica que, em relação ao ano de 2006, havia créditos orçamentários para compensação na ordem de 5,2 bilhões de reais, contudo apenas 3,9 bilhões de reais foram liquidados. (SOARES, 2007)
Nos estudos de Leitão, defende o autor que a promulgação da Lei Kandir acirrou ainda mais a guerra fiscal entre os estados, em função da perda de arrecadação com o ICMS sobre a exportação de produtos primários e semielaborados. Além disso, estima o autor que, para haver uma compensação adequada em face da Lei Kandir, a União deveria ter efetuado repasses 2 a 2,5 vezes maior que os efetivamente realizados, tendo como parâmetro a arrecadação do estado do Ceará com ICMS sobre a exportação de produtos primários e semielaborados. (LEITÃO, 2009)
Conforme Riani e Albuquerque, em estudos relacionados ao estado de Minas Gerais, defendem os autores que, na verdade, todos os estados foram afetados pela Lei Kandir. Contudo, os que exportavam relativamente mais foram os que tiveram maiores perdas de arrecadação, exemplificando com São Paulo, Minas Gerais e Pará. Além disso, acrescentam os autores que o mecanismo do “seguro-receita” penaliza os estados que apresentam maior eficiência tributária e estimula a sonegação, se constituindo como um verdadeiro estímulo invertido, de forma que os estados mais displicentes com a sua arrecadação tributária seriam relativamente melhor recompensados. (RIANI; ALBUQUERQUE, 2000)
Também, não há indicativos seguros de que a Lei Kandir tenha efetivamente estimulado as exportações e de que os investimentos aumentaram em função do aproveitamento de créditos decorrentes da aquisição de ativos. No caso de Minas Gerais, as oscilações nas exportações foram explicadas em grande medida por fator externo, qual seja a variação do preço do produto no mercado internacional, e não por causa da Lei Kandir. (RIANI; ALBUQUERQUE, 2000)
Tendo como foco o estado de São Paulo, Dall’Acqua (2001) também indica inadequações por parte do seguro-receita, que prejudicaram fortemente as finanças paulistas. Aponta o autor que nos anos de 1997-2001, o estado de São Paulo teve perdas decorrentes da Lei Kandir na ordem de 5,051 bilhões de reais, contudo somente obteve ressarcimento de 3,334 bilhões de reais, ficando com um déficit de 1,717 bilhões de reais no período. (DALL’ACQUA, 2001)
Batista Jr. apresenta um cenário desolador em relação às perdas experimentadas pelo estado de Minas Gerais em decorrência da desoneração tributária instaurada pela Lei Kandir, especialmente em relação à produção e exportação do minério de ferro, importante commodity mineira, conforme o seguinte:
“Se a receita da CFEM destinada aos Estados é baixíssima, o ICMS decorrente da exploração de minérios não mereceu melhor sorte, em virtude da desoneração heterônoma levada a cabo pelo Governo Federal. Apesar da exportação de minério de ferro responder por 44,89% do valor total exportado por Minas Gerais, em 2011, a arrecadação do ICMS consolidada para o Estado de Minas Gerais advinda da indústria extrativa foi de apenas R$ 767 milhões, cifra esta que representa apenas 2,71% do total acumulado de arrecadação do ICMS. Esse resultado decorre das desonerações impostas pela Lei Kandir, bem como do fato das mineradoras promoverem o beneficiamento do minério de ferro fora de Minas Gerais. Como avalia MOURÃO, em números, as receitas decorrentes de transferências da União para a compensação pelas isenções das exportações (Lei Kandir) mantiveram, para 2012 a 2013, as cifras de R$189 milhões por ano.16 Entretanto, em 2011, na efetivação das transferências compensatórias previstas na Lei Kandir, pode-se observar um montante de perdas da ordem de R$ 2,607 bilhões, havendo apenas sido recebido a título de transferências o valor irrisório de R$ 151 milhões. A verdade é que, embora sendo Minas Gerais um Estado produtor de minérios, sendo responsável por cerca da metade de tudo que se explora no Brasil, a atividade extrativa não se traduz em benefícios significativos para a economia mineira.” (BATISTA JR, 2014, p. 458)
Marta Arretche denuncia, a partir da aprovação da emenda constitucional nº 15, que devolveu à União a competência para legislar sobre a criação de novos municípios, e da Lei Kandir, uma ingerência abrupta sobre o pacto federativo brasileiro:
“Embora expressivas por seu conteúdo – visto que justificam decisões que suprimiram autoridade decisória dos governos estaduais –, a EC no 15/1996 e a Lei Kandir foram apenas parte de um conjunto de leis federais que impôs expressivas perdas de receita aos Estados e municí- pios brasileiros, assim como regulou o exercício de suas competências tributárias, de gasto e de implementação de políticas públicas. De fato, não foram de pequena monta as mudanças no status quo federativo brasileiro dos anos 1990. Elas implicaram “expressivo fortalecimento do controle exercido pelo governo federal” (Melo, 2005:845), aproximando o Brasil de “um regime hierárquico, estreitamente administrado, não distinto daquele encontrado em muitos sistemas unitários” (Rodden, 2006:247). A maior parte dos analistas interpretou a aprova- ção dessa legislação como um processo de recentralização federativa (Abrucio e Costa, 1999; Almeida, 2005; Arretche, 2005; Melo, 2005; Rodden, 2006; Souza, 2002). Mudanças dessa magnitude requerem explicação, uma vez que esses resultados apontam para a direção oposta àquela esperada por postulados do federalismo comparado, segundo os quais a formação de uma federação supõe um contrato constitucional entre unidades constituintes, que definem proteções institucionais a fim de evitar futuras expropriações por parte das demais unidades ou do governo central. Assim, como foi possível ao governo federal “expropriar” receitas, bem como autoridade sobre impostos, gastos e políticas dos governos subnacionais, sob condições de perfeita normalidade democrática?” (ARRETCHE, 2009, p. 378)
As críticas, portanto, são muito contundentes em relação à Lei Kandir, que perpassam pela sua inocuidade em relação ao estímulo das exportações, pelo comprometimento pernicioso do pacto federativo e, principalmente, pelo comprometimento expressivo das receitas tributárias estaduais e municipais, em função da imunidade tributária do ICMS incidente sobre os produtos primários e parte dos produtos semielaborados destinados à exportação.
2.2 A recente situação fiscal dos estados e o alento gerado pelo julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão nº 25
Em 27 de agosto de 2013, o Governo do Estado do Pará propôs uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão em face do Congresso Nacional, autuada com o número 25, tendo como sustentação principal eventual omissão legislativa por parte do Congresso em legislar da forma como preconizado no artigo 91 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, como informa o sítio eletrônico do Supremo Tribunal Federal.
“A ação direta de inconstitucionalidade por omissão, modalidade de controle concentrado de constitucionalidade, almeja suprir as lacunas inconstitucionais que obstam a eficácia das normas constitucionais. A ADO visa combater uma doença, denominada pela doutrina como síndrome da inefetividade das normas constitucionais.” (LENZA apud RABELO, 2015)
Segundo José Afonso da Silva, a omissão inconstitucional se dá:
“(…) nos casos em que não sejam praticados atos legislativos ou administrativos requeridos para tornar plenamente aplicáveis normas constitucionais (art. 103, § 2º). Muitas destas, de fato, requerem uma lei ou uma providência administrativa ulterior para que os direitos ou situações nelas previstos se efetivem na prática. Se esses direitos não se realizam porque o legislador não produziu a lei, ou o administrador não criou o ato, dá-se uma omissão inconstitucional, surgindo daí o pressuposto para a propositura de uma ação de inconstitucionalidade por omissão, visando a obter a elaboração da lei ou a prática do ato.” (SILVA, 2010, p. 569)
Nas suas razões, o Governo do Estado do Pará argumentou que, caso pudesse efetuar a cobrança do ICMS sobre os produtos indicados na emenda constitucional nº 42, obteria um montante na ordem de 20,5 bilhões de reais entre 1996 e 2012. Contudo a União efetuou repasses, nesse período, na ordem de 5,5 bilhões de reais a título de compensação, o que evidencia um prejuízo de 15 bilhões de reais em 15 anos. (PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA, 2014)
Ingressaram na ação como amicus curiae os estados de Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Maranhão, Bahia, Paraná, Sergipe, Rondônia, Santa Catarina, Distrito Federal, Mato Grosso, Rio Grande do Norte, Espírito Santo, além da Ordem dos Advogados do Brasil, seção do Pará, segundo o sítio eletrônico do STF.
A Procuradoria Geral da República se manifestou pelo provimento parcial do pedido, a fim de reconhecer a omissão legislativa por parte do Congresso Nacional e determinar prazo razoável de modo que essa instituição possa suprir a omissão. (PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA, 2014)
No dia 30 de novembro de 2016, o Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, que contempla todos os ministros da corte, julgou procedente a ação, por unanimidade, para reconhecer a mora do Congresso Nacional em regulamentar a forma de compensação aos estados e municípios em face da imunidade tributária concedida aos produtos primários e semielaborados destinados à exportação pela emenda constitucional nº 42. (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2016)
Pelo julgamento, concedeu-se o prazo de doze meses para que o Congresso Nacional edite a Lei Complementar dispondo sobre a matéria, sendo que, neste ponto, divergiu o Ministro Marco Aurélio Mello. (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2016)
Caso transcorra o prazo concedido sem que o Congresso Nacional tenha expurgado a mora, o pleno do STF, por maioria de votos, decidiu que caberá ao Tribunal de Contas da União fixar o montante a ser repassado aos estados e municípios de acordo com os critérios indicados na emenda nº 42, bem como indicar o montante que cabe a cada ente federativo. (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2016)
Tal decisão foi bastante comemorada por vários estados da federação, tendo em vista que muitos anos se passaram sem que tenha sido apresentada uma norma que estipule uma maneira justa de a União compensar os entes federativos acerca dos prejuízos experimentados em decorrência da Lei Kandir, especialmente ao se considerar a grave crise econômica e financeira que assola tais entes.
Segundo Trevizan, os 26 estados e o Distrito Federal acumulavam juntos um déficit de 56 bilhões de reais no primeiro semestre de 2016, sendo que 20 das 27 unidades da federação estavam “no vermelho”. (TREVIZAN, 2016)
Os dados mostram uma piora em comparação ao primeiro semestre de 2015, que já tinha resultados ruins, impactando a disponibilização e a qualidade de serviços públicos e projetos. No primeiro semestre de 2015, 18 unidades da federação acumulavam déficits. Segundo Trevizan, dezesseis estados e o Distrito Federal já tinham cortado investimentos e quatorze estados tinham obras públicas paralisadas ou atrasadas por falta de recursos em 2016. (TREVIZAN, 2016)
Verificou-se também que, em 2016, oito UFs atrasavam salários, seis tinham problemas de caixa para saldar o décimo terceiro salário, dezesseis tinham atrasos com fornecedores, uma tinha declarado estado de calamidade financeira e outras quatro avaliavam fazê-lo. (TREVIZAN, 2016).
Portanto, o julgamento da ADI por omissão nº 25 se dá em boa hora, uma vez que pode aliviar a situação fiscal de estados e municípios. Segundo informa Juliana Cipriani, o estado de Minas Gerais lançou movimento no intuito de utilizar os créditos decorrentes da Lei Kandir para compensar com a dívida que tem com a União. Para o estado, há um crédito a receber na ordem de 135 bilhões de reais e a dívida acumulada é de 88 bilhões de reais. (CIPRIANI, 2017)
3 CONCLUSÕES
A aprovação da Lei Kandir, embora tivesse motivos razoáveis, contudo questionáveis, se mostrou um duro golpe no pacto federativo e, principalmente, nas receitas tributárias de estados e municípios. A prometida compensação em face da mencionada Lei nunca se deu nos parâmetros adequados.
Em face deste cenário, foi alentadora a decisão do Supremo Tribunal Federal em reconhecer a mora do Congresso Nacional a editar a lei complementar que dispusesse adequadamente sobre a forma de compensação a estados e municípios, como preconiza a emenda constitucional nº 42.
Os entes federativos brasileiros vivem dias difíceis nos últimos anos em função da grave crise financeira, o que acarretou déficits públicos e atrasos em pagamentos de servidores e fornecedores.
Com o julgamento da ADI por omissão nº 25, estados e municípios vêm um horizonte melhor, sendo que alguns já planejam utilizar os créditos da Lei Kandir para compensar com a dívida que têm com a União.
possui graduação em Administração Pública pela Escola de Governo Prof. Paulo Neves de Carvalho (2009), graduação em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (2011), aperfeiçoamento em Direito Público aplicado ao Controle Externo pela Escola de Contas Prof. Pedro Aleixo (2015) e especialização em Gestão Pública pela Escola de Contas Prof. Pedro Aleixo (2015). Desde 2009, é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental da Controladoria-Geral do Estado de Minas Gerais. Advogado e membro da OAB-MG desde 2011
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