“É que não são meros títulos e deferências o que nos torna mais ou menos nobres,
o que dá maior ou menor dignidade ao nosso ofício.
A nobreza suprema reside em nosso caráter
e na maneira como tratamos o próximo.”
Doutores e Drs., longe, muito longe de digladiar, acirrar, polemizar, estas linhas, alicerçadas na inteligência de uma dezena de profissionais, pesquisadores e seus respectivos e ricos artigos, com exaustivo trabalho de minha própria lavra sobre a temática, (que chega a ser propositadamente repetitivo justamente para evitar eventuais discussões), vale o mesmo, além de encerrar a discussão, como informação, pesquisa, cultura, respostas, reflexão. Jamais para embates.
Como nas bem lançadas palavras do ilustre Colega, Dr. JARBAS MACHIONI[1]:
“É impressionante como o tema ainda suscita polêmica diante do seu EMPREGO MULTISSECULAR E DA CLAREZA DO USO NA REALIDADE DO DIA A DIA.
Impressiona mais ainda verificar como certos pesquisadores, tendo obtido o seu título de “doutor” científico, agarram-se a ele passando a ostentá-lo e arvorar-se como “únicos” legitimados a seu uso, e assim, voltam-se contra a realidade, querendo corrigir pessoas, ir contra vários dicionários, com a pretensão de impor-se a todos numa jactância arrogante e irrealista. Não querem o título só para si, mas curiosamente querem interditá-lo a outrem.” (gn)
Advogados, Operadores do Direito e Médicos são, sim, Doutores, independentemente da defesa de teses de doutorados científicos.[2]
Assim, aos ilustres Doutores, com suas teses aprovadas, os nossos sinceros respeito e parabéns.
Ab initio ressalto que o artigo em tela se ampara em pesquisa aliada a argumentos e fundamentos singularmente exauridos por inúmeros outros estudiosos da matéria, dentre eles, o Professorado de Maria Helena Diniz; artigo este que vale, repito, como reflexão; não para respostas e confrontos.
Pois bem, pelo Alvará Régio, editado por Maria I, a Pia, de Portugal, os Bacharéis em Direito passaram a poder receber tratamento de Doutores. O Decreto Imperial (DIM), de 1º de agosto de 1825, exarado pelo Chefe de Governo de Dom Pedro I, deu origem à Lei do Império de 11 de agosto de 1827, que Cria dois cursos de Ciências Jurídicas e Sociais; introduz regulamento, estatuto para o curso Jurídico; dispõe sobre o título (grau) de doutor para o Advogado’.[3]. Dec. 17874A de 9/08/1927 declara feriado o dia 11 de Agosto (1827)[4] – Data em que se comemora o centenário da criação dos cursos Jurídicos no Brasil,[5].
Segundo leciona CARMEM POUBEL[6]:
“A Lei 8.906 de 04 de julho de 1994, no seu artigo 87 (EOAB – Estatuto da OAB), ao revogar as disposições em contrário, não dispôs expressamente sobre a referida legislação.
Revogá-la tacitamente também não o fez, uma vez que a legislação Imperial constitui pedra fundamental que criou os cursos jurídicos no país.
Ademais, a referida legislação Imperial estabelece que o título de Doutor é destinado aos bacharéis em direito devidamente habilitados nos Estatutos futuros.
Sendo assim, basta tecnicamente para ostentar o título de Doutor, possuir o título de bacharel em direito e portar a carteira da OAB, nos termos do Regulamento Estatutário em vigor”. (gn)
Nítido silogismo: A Lei do Império criou o curso e em seu bojo, afirmou que os acadêmicos que concluíssem o curso de Direito seriam bacharéis. O título de Doutor seria destinado aos habilitados nos Estatutos futuros (exatamente como ocorreu com a promulgação do Estatuto da OAB, atualmente usado). Assim, tendo o acadêmico completado seu curso de Direito, tendo sido aprovado e estando habilitado no Estatuto competente, terá ele o Título de Doutor.
Destarte, Advogado é Doutor.”[7]
Vê-se que, segundo Lei vigente[8] (e mesmo independentemente de qualquer Lei, o que também restará provado e comprovado neste texto), o título de Doutor é destinado ao bacharel em Direito que se habilitar ao exercício da Advocacia conforme os requisitos destinados.
Explicamos: atualmente, o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, de 1994, determina a necessidade de, além de preencher vasta série de requisitos, ser o bacharel em Direito aprovado em Exame de Ordem[9], para, só então, poder ser considerado Advogado.
Portanto, cultural, histórica, consuetudinária, tradicional e legalmente falando, além da corrente “gramático-pronominal”, o bacharel em Direito, aprovado em Exame de provas; regularmente habilitado segundo o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil é, sim, Advogado; é sim, Doutor.
Ledo engano dos, data venia, rasos de pensamento, insistirem que o tratamento de “Doutor” deva ser dado tão somente e exclusivamente àqueles que cursaram a pós-graduação e defenderam alguma tese científica que, repetimos, se trata de foco totalmente diverso da titulação aqui abordada, por força de lei, de tradição histórica milenar,“pronominal”[10], de usos e costumes e que não se confunde com o estabelecido pela Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação).
Ora, com renovado pedido de vênia, dizer que o tratamento “doutor” é privativo e único e exclusivo de quem efetuou o doutorado acadêmico é inverter a realidade e ancorar-se em um entendimento superficial, confundindo as coisas.
Pior ainda é chamar de “acepção técnica” uma utilização em relação a outra. Só se for “técnica” para titulação de pesquisa, o que é importante e obrigatório apenas e tão somente para os pesquisadores, afirma MACHIONI[11]. E continua:
“A palavra, obviamente e como tantas outras, comporta mais de um significado. Embora ligados pela ideia originária de autoridade para ensinar, o doutor do grau científico nada tem a ver com o doutor aplicado a profissionais, e este veio primeiro do que aquele.” (gn)
De um modo geral, o termo “doutor” empregado a Advogados e Juízes decorre de tradição, multissecular tradição. Surgiu na Europa aplicado primeiramente aos profissionais do Direito e, com o decorrer do tempo foi estendido também aos Médicos, Doutores. O surgimento dessa história dá-se no Século XI, há 1.000 anos.
E prossegue JARBAS ANDRADE:
“Com a complexidade crescente do comércio e das relações sociais nas cidades europeias e principalmente italianas, começaram a despontar profissionais Juristas, encarregados de interpretar as Leis, costumes e regras à luz da compilação de textos autorizados do Direito Romano, e eles ensinavam essa sua ciência aos que queriam segui-la. Esses primeiros Juristas apresentavam-se sob o titulo de “Doctor Legis”.
Podemos lembrar um trecho da peça “Mercador de Veneza, de Shakespeare (há outras passagens): his letter from Bellario “doth commend / A young and learned Doctor to our court . A peça escrita provavelmente em 1594, teria como fonte o conto Il Pecorone de 1558; o Jurista que soluciona o caso é tratado de Doctor ou Civil Doctor.
Na passagem do Século XI a XII, como assinalam tratadistas, os primeiros títulos de Doutor foram reconhecidos para Juristas praticantes pela Universidade de Bolonha, primeiramente a Inerius, depois para os chamados “Quatro Doutores”, a saber Martinius, Bulgarus, Hugo e Jacobus, todos no Século XII (entre outros textos de referência, ver http://www.cronologia.it/mondo38o.htm).” (gn)
Vejamos o professorado de JÚLIO CARDELLA:
“Aprofundei o estudo sobre o tema e descobri que não se trata tão somente de uma questão de lei, mas também de costume e de tradição. E referida tradição não é da história contemporânea ou exclusiva de nosso país, mas tem seu nascedouro em tempos antigos.
Pelas Universidades, o título foi outorgado pela primeira vez a um Advogado que passou a ostentar o título de Doctor legum, em Bolonha.
Existia também o título denominado Doctores es loix, mais específico aos versados na ciência do Direito.(gn)
Depois disso, a Universidade de Paris passou a conceder a honraria tão somente aos diplomados em Direito, chamando-os de Doctores canonun et decretalium. Após a fusão do Direito com o Direito Canônico, os diplomados eram chamados de Doctores utruisque iuris.
(…) HONRARIA LEGÍTIMA, EXCLUSIVA E ORIGINÁRIA DOS ADVOGADOS OU JURISTAS, E NÃO DE QUALQUER OUTRA PROFISSÃO.” (gn)
GILBERTO SCARTON[12], com fundamentos legais históricos, conclui igualmente que o “Doutor” do Advogado é legítimo, pois surgiu, fixou-se e se mantém por longa tradição, e por especial e espontânea deferência dos cidadãos:
“Entre nós, a tradição de se chamar o Advogado de “Doutor” remonta ao Brasil Colônia. Naquela época, as famílias ricas prezavam sobremaneira ter em seu meio um Advogado. O acesso a esses postos era a educação.”
Senhoras, senhores, e doutores em sede acadêmica, a tradição é antiquíssima, a questão do “Doutor” vem do séc XI e se faz presente até hoje, em pleno século XXI; isto é, nada mais que mil anos! Mil anos de tradição! Mil anos de costume! Nada mais a discutir. Advogados são, sim, Doutores. Fato.
Dando continuidade à pesquisa, DR. LUIZ CARLOS CARVALHO DE MELO nos socorre reafirmando em linhas gerais e com propriedade que, em todo o Brasil Colônia e República, os filhos dos Senhores de Engenho se formavam em Direito ou Medicina. O Advogado, conhecedor de leis, detentor de, digamos, “poder” de solicitar para a concessão à liberdade de um ser humano… bem como de ceifá-la… assenhoreava-se desse poder mediante formação privilegiada, e esta tradição logo transformou o termo em sinônimo de posição superior na escala social.
O “Doutor” do Advogado e do Médico surgiu, fixou-se, e se mantém por longa tradição, por especial e espontânea deferência histórica dos cidadãos, dos utentes da língua; destarte, de uso legítimo.
Bem mais antiga[13] – XVIII a.C. – é a sentença de Horácio ao se referir ao uso preponderante na interação linguística: (…) “est et ius et norma loquendi” (Em tradução livre, algo como “o uso é a lei e a norma do falar”.)Entende-se, pois, pelos sábios, estudiosos e cultos, que A LÍNGUA É UMA QUESTÃO DE USOS E COSTUMES. Que os falantes são os senhores absolutos de seu idioma.
Cabe ressaltar que até o Manual de Redação da nossa PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA faz menção com destaque especial justamente ao tratamento de Doutor ao Direito e à Medicina, por costume (fonte do direito), senão vejamos:
“É costume designar por DOUTOR os bacharéis, ESPECIALMENTE em DIREITO e em MEDICINA. Nos demais casos, o tratamento Senhor confere a desejada formalidade às comunicações.”[14](gn)
A fonte do Direito contempla o direito positivo pela via do “uso e costume”; ´in casu´, a referência é ao português do Brasil, no tratamento de “Doutor” dado aos Advogados, desde os idos de 1800.
CARDELLA[15] ressalta e enfatiza que ‘Doutor’ seria honraria legítima apenas de Advogados e Juristas, e não aos Médicos, que deveriam adotar a postura Estadunidense do “M.D.” – ‘Medical Degree’ – passando a assinar: “Fulano de Tal, Médico” em vez de “Dr. Fulano…”. E continua:
“Houve, portanto, afirma CARDELLA, um caso de “usucapião” por posse violenta” de parte dos médicos que passaram a ostentar a honraria, que no Brasil, é uma espécie de “collier a toutes les bêtes”, pois qualquer um que se vê possuidor de um diploma universitário, se “auto-doutora”…
Sendo essa honraria por Lei, tradição autêntica apenas dos Advogados e Juristas, entendemos que a mesma só poderia ser estendida aos diplomados por Escola Superior, após a defesa da tese doutoral.”
Ademais, todo Advogado tem, como tarefa diária, a defesa de teses.
Agora, ao bacharel em Direito, que se vê aprovado em Exame de Ordem, e milita e exerce a profissão de Advogado, por direito e tradição de usos e costumes lhe é atribuída a qualidade de Doutor.
Vejamos agora o que leciona o ‘DICIONÁRIO DE TECNOLOGIA JURÍDICA’, de Pedro Nunes, que coloca muito bem a matéria.
Eis o verbete:
“Bacharel em Direito – Primeiro grau acadêmico, conferido a quem se forma numa Faculdade de Direito. O portador deste título, que exerce o ofício de ADVOGADO, goza do privilégio de DOUTOR.”
(Aos que gostam de pesquisas minuciosas, citamos as fontes dessa definição: Ord. L. 1° Tit. 66§42; Pereira e Souza, Crim. 75. e not. 188; Trindade, pág. 157, nota 143 in fine, e pág. 529 § 2°; Aux. Jur., pág. 355 Ass93.)”
Segue, na mesma linha, o não menos conhecido “DICIONÁRIO MICHAELIS da Língua Portuguesa”:
“DOUTOR: (…) 2. por ext Bacharel, ADVOGADO.”.
Ainda, nada menos que o renomado “DICIONÁRIO JURÍDICO Universitário” da Doutrinadora, Professora MARIA HELENA DINIZ[16], identificando 2 acepções para a palavra “DOUTOR”:
“(1) a de tratamento honorífico a Advogados, juízes, promotores, delegados, e médicos, e
(2) titulo daquele que defendeu tese de doutorado em universidade”
No mesmo diapasão, JOSEVAL MARTINS VIANA[17]:
“A primeira informação inconsistente que ouvi é de que não se poderia colocar a palavra “Doutor” no cabeçalho, porque “Doutor” é título acadêmico e o Juiz de Direito não teria feito um doutorado…
Nas petições, a palavra Doutor é pronome[18] de tratamento que foi, por Lei, atribuído ao Operador do Direito.
Mesmo que se descartasse o Decreto n. 17.874 de 09 de agosto de 1827, o pronome de tratamento “Doutor” sempre; mas sempre foi utilizado no cabeçalho das petições e tratamento entre os pares e cidadãos no cotidiano.
Não se pode tirá-lo somente porque algum desconhecido disse que não se deve usar a palavra “Doutor”. Nunca li um artigo que fundamentasse a exclusão da palavra “Doutor” do endereçamento”.
Também assim leciona JARBAS ANDRADE MACHIONI, lembrando, no trabalho, a importância da tradição na linguagem:
“Esses títulos não correspondiam a um procedimento de pesquisa moderna (algo que se assemelhasse ao nosso sistema atual de mestrado ou doutorado) mas de habilitação seja à docência, seja à pratica, visando principalmente à entrada do titulado para uma corporação de ofícios (“guild”, no texto original – conforme Reinildis van Ditzhuyzen, em http://ugle.svf.uib.no/svfweb1/filer/1309.pdf – esse texto é um estudo sobre o projeto Bolonha, tendente a unificar os programas de doutoramento na Europa. Nossas raízes remontam, obviamente, a Portugal. Podemos identificar que em 1400, o mítico Jurisconsulto português João das Regras é nomeado Reitor na Universidade de Coimbra, já ostentando o titulo de Doutor em Leis, pela Universidade de Bolonha.
O tratamento se estendeu aos Juízes.
No Brasil, a literatura do século XIX, desde Machado de Assis até José de Alencar, reflete a prática do tratamento de Doutor ao Advogado. Prática essa que diuturnamente se confirma até hoje, em Bancas de Escritórios, Congressos, Juizados, Fóruns, Tribunais e perante o público em geral.”[19] (gn)
Em igual sentido, a lição de DENIS C. DA CRUZ[20]: “Antes de tudo, cumpre esclarecer que tradição, usos e costumes são fonte legítima de Direito.”
A própria BÍBLIA – O Livro dos Livros – que teve o seu 1º exemplar impresso por Johannes Gutenberg, em 1455 – há mais de 555 anos – já se referia dezenas de vezes aos doutores da lei,[21]mormente no Capítulo do Apóstolo “Lucas”, dentre outras passagens[22].
Não resta dúvida que a advocacia possui o teor da excelência intelectual, e, também por força de costume histórico milenar, os profissionais que a exercem ostentam a condição de Doutores.
Saliente-se que isso não ocorre apenas no Brasil.
Em meio a pesquisas no Direito comparado, verifica-se que, de longa tradição e deferência especial, é costume em muitos países dar-se um título diferenciado a Juristas, seja no trato com a sociedade, seja nos Fóruns e Tribunais, como em Portugal, Áustria, Argentina, Chile, Uruguai, dentre outros.
Até mesmo nos Estados Unidos, onde comumente não se usava a terminologia de “Doutor” para Advogados, hoje, há posicionamentos nesse sentido em vários Estados.[23]
Retornando à temática pátria, nada mais forte do que aquilo que deriva de uma Fonte.
Didática e resumidamente “Fontes” seriam as ‘origens’ do direito, a ‘matéria prima’ da qual nasce o direito”.[24]
Várias são as Fontes, dentre elas, além das Leis, os “USOS & COSTUMES.” (Costume, por exemplo, de se tratar um Advogado e um Médico por Doutor.)
Leis, resumidamente, são normas ou o conjunto de normas jurídicas impressas, criadas através de processos próprios, estabelecidas pelas autoridades competentes e a merecer destaque, já que a principal fonte do direito pátrio.[25]
Costume: norma jurídica não escrita explicitamente e que o uso consagra como se por ‘força de lei’. O costume é oriundo de uso social.
“COSTUME: regra social derivada de prática reiterada, generalizada e prolongada no tempo, o que resulta na CONVICÇÃO DA OBRIGATORIEDADE de acordo com a sociedade e cultura em particular. O costume, enquanto PRÁTICA SOCIAL REITERADA, INVOLUNTARIAMENTE CRIA UM DIREITO “[26];
Segundo o professorado da Mestre em Direito, Rosane Barcellos Terra,[27], interpretando-se suas bem lançadas linhas, O COSTUME DA ADOÇÃO DA PRÁTICA DE SE TRATAR MÉDICOS E ADVOGADOS POR DOUTOR SE DÁ, E ASSIM O DEVE SER, uma vez que:
“COSTUME é a prática reiterada de determinado ato, com a convicção de sua necessidade jurídica. A lei, por mais completa que tente ser, jamais poderá abrigar todos os fatos sociais que necessitam de uma proteção jurídica, por isso, O COSTUME TEM PAPEL FUNDAMENTAL NO DIREITO, HAJA VISTA A INSUFICIÊNCIA LEGAL, forte se infere do art. 4º da LINDB – (Decreto-Lei no 4.657, de 4 de setembro de 1942) –
Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro – ‘proeter legem’, de caráter supletivo e importância singular já que aplicável aos campos omissos, preenchendo as lacunas legais, dispondo que, quando a Lei for omissa, o Magistrado decidirá o caso de acordo com a analogia, os COSTUMES e os princípios gerais de direito.”
Versando ainda sobre o costume, agora na seara Penal, no chamado “Princípio da adequação social”, vejamos a lição de ninguém menos que LUIZ FLÁVIO GOMES[28]:
“As mães perfuram as orelhas das suas filhas. Muitas pessoas fazem tatuagem.
Essas condutas são formalmente típicas, ou seja, acham-se descritas na lei penal, em razão da ocorrência de uma lesão corporal.
Apesar disso, não são consideradas um crime. Por quê?
Porque são socialmente aceitas e não atentam contra a Constituição Federal.
Estamos falando do princípio da adequação social, que é instrumento de interpretação das leis em geral, o que significa que vai além do Direito penal.
A partir de Hans Welzel o princípio da adequação social passou a ganhar muita força dentro do direito penal, mais especificamente dentro da teoria do delito (e da tipicidade).
Desde então, condutas que são aceitas pela sociedade [e que não ofendam a CF], seja pelos COSTUMES, folclore ou cultura, passaram a ser excluídas da esfera penal.
Ainda que determinada conduta aparentemente seja típica (formalmente típica), estará no âmbito da atipicidade, uma vez que está amparada pela aceitação social, fora da seara do proibido.”
Ora, o uso do “Doutor” é, à explícita e primária OBVIEDADE, um COSTUME milenar de direito à classe dos Advogados e Operadores do Direito (Advogados, Ministros, Juízes, Procuradores, Promotores, Delegados, Defensores Públicos dentre tantos outros, e, lembremo-nos, os Médicos.)
Repetimos: cultural, histórica milenar, consuetudinária, tradicional, pronominal[29] e ainda legalmente falando, Advogados são Doutores. (Médicos também.)
O Il. Advogado e Escritor LUIZ CARLOS CARVALHO DE MELO leciona com propriedade que, não obstante o supracitado, pela praxe de usos e costumes, não anual, sequer secular, mas MILENAR, nunca se viu ou se verá Médico nem Advogado que não seja tratado por Doutor, salvo, ‘data máxima venia’, pelos invejosos e mesquinhos.
Assim, agora, podemos refletir em porque não afirmar que, se ligado ao “trato” com as pessoas, por que não dizermos que é um pronome de “tratamento” (bastando, talvez, o bom senso).
Entretanto, para quem quiser, e desejar, há, como sabemos, outras várias explicações a embasar e explicar e obrigar o uso do “Doutor” no trato para com os Advogados e Operadores do Direito (e Médicos, no Brasil) – senso comum, frise-se,que aqui não possui o menor nexo causal com o título de doutorado acadêmico.
Pelos usos, costumes, praxe, e, como dissemos, ‘pronome de um tratamento milenar’ – já que na complexa língua portuguesa, para alguns, e, nas bem lançadas linhas de CARVALHO DE MELO [30] o ‘por que’, que é partícula interrogativa se transforma em um substantivo quando de um ‘o porquê’!´ – (relembrando ainda a questão do pronome de tratamento ‘você’, antigo ‘vosmecê’… oriundo do ainda mais antigo “Vossa Mercê”) – na prática já se fala “ocê” e “cê”!
“Doutor é usado regularmente e usualmente para Operadores do Direito e Médicos, POIS A LÍNGUA É VIVA MAS O TÍTULO ACADÊMICO É DÍSPAR; peça apartada e sem nexo com a matéria aqui ora tratada e inquestionável.”
Mais, prossegue o ilustre Escritor: reza a Constituição da República Federativa do Brasil, nossa Carta Maior, que o Advogado é imprescindível à aplicação da Justiça, assim como o Juiz e o Promotor, numa Teoria Tridimensional do Direito, em que nenhum deles exerce autoridade alguma sobre os outros dois; são independentes. os três equilibram a justiça, e, sendo de sabença comezinha que 100% dos juízes, delegados e promotores são tratados por ‘Doutor’, o mesmo o deve ser ao Advogado e Defensor Público.
É o Advogado que, enquanto profissional do Direito, deve a si mesmo o questionamento interior de estar à altura de tão elevada honraria, por mérito e competência.
Teses, teses e mais teses, eis a função diária dos Operadores de Direito.
O Advogado é Doutor por excelência.
Ainda: demagogias à parte, é bem sabido que os próprios insurgentes, quando precisam de Advogado ou diante de um magistrado, nunca os tratam por “vocês”, mas, provável e educadamente por “Drs.” …
Aos ínvidos e infensos, e àqueles que detêm o título de doutorado científico mas acreditam que ninguém mais no planeta Terra pode ser chamado de “doutor”, querendo questionar o inquestionável e talvez menosprezar Médicos, Juízes e Advogados, leciona LUIZ CARLOS CARVALHO DE MELO[31] que, em audiências Forenses, os detentores de diplomas de Doutorados científico-acadêmicos que defenderam suas complexas teses (e que porventura se recusem a tratar Advogado por “Doutor”), bem como outros profissionais, são sempre tratados nas audiências por “o acusado’, “o investigado”, “o requerido”, “o réu”, “o depoente”, “o autor”, etc, NUNCA são chamados e tratados por seus Títulos Acadêmicos de Mestrados e Doutorados…
Verdade. É praxe constar em atas de audiência, juízes dirigindo-se à parte por “sr. e sra.” e aos Advogados por “Dr.”, independentemente da referida parte ter doutorado ou não.
Se você é um Advogado, um Juiz, nada mais normal que receber um “Oi, Dr. Fulano de Tal?”. Sé é Médico, “Olá, Dr. Beltrano?”… Nunca ouvi um “Boa tarde, Sicrano com Doutorado em X, Y ou Z “ ?…
Advogado – Autoridade com “munus publicus” FEDERAL – é Doutor.
Certa feita, uma jornalista defendeu de maneira ferrenha um, digamos, ”movimento” para literalmente banir o tratamento de “Doutor” aos Advogados e Médicos. E o fez em revista de circulação nacional com tiragem de quase 400 mil exemplares.
Afirmou a mesma que nas cidades grandes não se trataria mais o Médico ou o Advogado de “Doutor”… e seguiu afirmando “que isso é coisa de gente do interior”…
Rebatendo o artigo, o renomado Escritor, Filósofo, e Professor da UFRJ, ZELMAR GUIOTTO afirmou que[32]:
“A jornalista percebe, mas interpreta errado. Ela diz que nas cidades grandes não se chama mais o médico ou o Advogado de “doutor”, que isso é coisa de gente do interior.
Ora, nas cidades grandes o uso de “doutor” existe e assim continua exatamente porque não se vê nenhuma opressão velada em algo que é sabidamente, ao menos para essas pessoas da cidade grande, pronome de tratamento.
Por essa percepção quase correta, mas acobertada por interpretação errada, a jornalista acaba então criando seu movimento infanto-juvenil que visa a estancar o uso de “Dr.” em nossas relações.
É RIDÍCULO.
Os gramáticos se dividem nessa questão: uns acham que doutor é pronome de tratamento e outros acham que doutor é título. Ora, doutor é as duas coisas. (…)
O comportamento da Jornalista é aquele comportamento típico de quem escuta o galo cantar e não sabe onde.”
E segue o conceituado Professor da UFRJ:[33]
“O eterno aluno tem agora com tal jornalista uma nova militância. Pois esse pessoal vai, durante bom tempo, descobrir origens malditas em palavras. Afinal, falar não é outra coisa senão, em boa medida, amaldiçoar e abençoar!
Encontrar pecado no nascedouro de cada palavra é fácil, mas É TAMBÉM IMBECIL SE NÃO SE VÊ A HISTÓRIA DA PALAVRA NO DESDOBRAMENTO DA VIDA DE DETERMINADA LÍNGUA E LINGUAGEM.
Quando surgiram os primeiros doutorados no Brasil, então poderíamos ter escrito, a título de provocação, algo como “doutor é quem tem doutorado”. MAS ISSO, DITO HOJE, SOA RIDÍCULO.
Doutor é quem tem doutorado, por título, e doutor é quem recebe o pronome de tratamento “Dr.”.
A jornalista não percebe isso e daqui uns dias ela irá conquistar mais garotas e garotos de quarenta anos para uma outra batalha, a de eliminar o “você” que, diferente do “tu”, tem origem oligárquica: trata-se do “Vossa Mercê” que virou “você”. Querem apostar?
Poderia falar mais sobre esse assunto. Mas creio que para o bom leitor já basta. (…)”
“È vero…”
Não é difícil encontrar quem infelizmente tente menosprezar a classe dos Advogados, Magistrados, Delegados, Procuradores, Defensores Públicos, Auditores, Promotores, e tantos outros Operadores do Direito bem como os Médicos, tentando expurgar dos seus membros o título legítimo de Doutor, distorcendo, deturpando a verdade dos fatos e a história milenar… pura e simplesmente para desdenhar de mera palavra de seis letras, enquanto há assuntos mais sérios a se tratar.
Felizmente acreditamos que a celeuma se encerrará com a lavratura deste artigo, restando claro que um “dr.” em nada interfere no outro “doutor” e que os dois convivem harmônica e pacificamente há anos, e assim o será ad eternum.
Nesse vértice, POUBEL[34] esclarece aos que se rebelam contra o tratamento de Dr. outorgado aos Operadores de Direito, afirmando que:
“(…) é inerente a capacidade intelectual compreender QUE O IGNORANTE FALA, e só, nos domínios dos conhecimentos seus, e, portanto, não detém nenhum domínio. Apenas energia desperdiçada inutilmente! A joia encravada no seu crânio é estéril.
As razões de direito e argumentos jurídicos aduzidos, fincam convicção de que OSTENTAR O TÍTULO DE DOUTOR, PARA O ADVOGADO, É UM DIREITO, E NÃO MERA BENEVOLÊNCIA.” (gn)
A história milenar consolidou e solidificou o “Doutor” como costume e adquiriu um significado paralelo ao outro uso que é para designar aqueles que têm doutorado acadêmico-científico quando da defesa de complexas teses. Estamos diante de palavras homônimas, e não sinônimas!
E neste diapasão, CARMEM DO VALE:
“O título acadêmico-científico e o título dado à classe Advocatícia não se confundem; possuem naturezas diversas e sustentar qualquer um dos dois é sem dúvida um ato de imensa coragem e determinação.
Exige do ser humano o mínimo de capacidade intelectual em concatenar ideias, assimilar conhecimentos, fatos e atos, correlacionar, verbalizar, o todo, a parte… etc. Melhor ir além.. .e, no caso do Advogado, sem dúvida, exige mais… independência de caráter, isenção, continuidade, credibilidade, responsabilidade.
Aos Doutores Advogados por tanto e tanto, deve-se, seguramente, elevada estima e grande consideração, por entregarem suas vidas profissionais à resolução de conflitos de interesses, dando muitas vezes a casos insolúveis, admirável solução.”[35]
E conclui Dr. JÚLIO CARDELLA[36]:
“Muitos colegas não têm o hábito de antepor ao próprio nome, em seus cartões e impressos, o título de DOUTOR, quando em verdade, devem fazê-lo, porque a História nos ensina que SOMOS OS DONOS DE TAL TÍTULO, POR DIREITO E TRADIÇÃO, e está chegada a hora de reivindicarmos o que é nosso(…)”
No Brasil, esta matéria definitivamente não deveria suscitar debate diante da imensa prática e tradição apontadas à exaustão (e, ainda, a questão legal e da linguagem). Tampouco deve-se confundir o doutorado de pesquisa com o título dado ao já referidos profissionais do direito e médicos.
Reconhecemos, sim, que o assunto não deveria ter grande relevo, mas convém ser tratado por dois motivos:
O primeiro é relembrar a importância e a força da história, dos costumes e da tradição, não só no Brasil mas em todo o mundo, principalmente como singular fonte do Direito.
O segundo é constatar como estamos perdendo a memória e ignorando a necessidade de pesquisar, o que nos tem levado a manter debates superficiais e inconsistentes, ainda mais para quem deveria ser, ou gaba-se de ser ‘doutor’ e pesquisador…
Finalmente, para reflexão, vale anotar que não basta ter o legítimo direito de ser chamado de “Doutor”, mas existe a necessidade de que cada um de nós, Advogados, Operadores do Direito, e Médicos, entenda qual o verdadeiro significado da titulação que, infelizmente, desperta inveja em certos acadêmicos e profissionais de outras áreas ou de alguns poucos que detêm a titulação díspar; científica.[37]
É que não são meros títulos e deferências o que nos torna mais ou menos nobres, o que dá maior ou menor dignidade ao nosso ofício.
A nobreza suprema reside em nosso caráter e na maneira como tratamos o próximo.
Informações Sobre o Autor
Marco Antônio Garcia de Pinho
Advogado