Algemas ainda não podem ser usadas

logo Âmbito Jurídico

Quase que diariamente vemos na televisão a condução de pessoas presas, das mais variadas categorias, em que os policiais fazem questão de aplicar algemas a todos, sem qualquer distinção, como se tal procedimento fosse obrigatório.  E assim parece que se sentem regozijados, principalmente quando tem câmeras  de filmagem pela frente, às quais exibem os coatos como se fossem troféus, inclusive ridicularizando-os.

Tal conduta dos policiais é de todo ilegal, pois o uso de algemas ainda não está legalmente autorizado, dependendo o mesmo da respectiva e futura regulamentação.

Com efeito, dispõe expressamente o art. 199 da Lei de Execução Penal (Lei n° 7.210, de 11/07/84) que  “O emprego de algemas será disciplinado por decreto federal”, ou seja, enquanto não tiver sido efetuada a respectiva regulamentação, é óbvio que ilegal será fazê-lo sponte propria.

A propósito, destacam ODIR ODILON PINTO DA SILVA e JOSÉ ANTÔNIO PAGANELLA BOSCHI que “No artigo 199, a lei institui regra não auto-aplicável referente ao emprego de algemas. Por decreto, o poder público federal deverá regulamentar o seu emprego. O sentido da norma é, exatamente, pela disciplina que se dará, evitar o vexame e o constrangimento públicos que os presos algemados sofrem junto à comunidade, quando assim são vistos no traslado do estabelecimento penal para o foro, a hospital, etc” (in Comentários à Lei de Execução Penal,  Aide Editora, 1986, págs. 223/224).

Por sua vez, JÚLIO FABBRINI MIRABETE discorre, verbis: “Mesmo em época anterior a Beccaria, já se restringia o uso de algemas (ferros), permitido apenas na hipótese de constituírem a própria sanção penal ou serem necessárias à segurança pública. No  Brasil, o artigo 28 do Decreto n° 4.824, de 22-11-11871, que regulamentou a Lei n° 2.033, de  20-9-1871, impunha sanção ao funcionário que conduzisse o preso “com ferros, algemas ou cordas”, salvo o caso extremo de segurança, justificado pelo condutor.”.  E acrescenta:  “Não há dúvida sobre a necessidade de regulamentação, pois o uso desnecessário e abusivo de algemas fere não só artigo 40 da Lei de Execução Penal, como o artigo 153, § 14, da Constituição Federal, que impõe a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral do preso” (in Execução Penal, Ed. Atlas, 1987, pág. 468)

Visando a disciplinar o assunto, o senador DEMÓSTENES TORRES apresentou ao Senado Federal o Projeto de Lei n° 185, de 2004, o qual se encontra em tramitação na Câmara Alta, tendo o seu último ato sido praticado no dia 07/12/05, quando, na Comissão de Constituição e Justiça, foi declarado como pronto para a pauta na Comissão, com parecer do Relator, Senador José Maranhão, pela sua aprovação.

Como se vê, o uso de algemas ainda não está legalmente permitido, por natureza admitido excepcionalmente apenas no caso da ressalva do  art. 284 do Código de Processo Penal, segundo o qual, “Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga de preso”. Mas, ao que se tem, forçoso é convir que os agentes policiais estão, a seu talante, agindo como se a LEP houvesse esdruxulamente dito que “Os casos em que não deve ser empregado o uso de algemas é que serão objeto de futura regulamentação” (!!!), destarte entendendo que algemar constitui integrativo ato procedimental da prisão de toda e qualquer pessoa, mesmo contra as que não oferecem nenhuma resistência, ou que não denotem a intenção de se evadir.

Ressalte-se que,  à falta de permissivo legal para o uso de algemas, defeso é aos policiais algemar quem quer que seja, daí porque, como insolentemente o vem fazendo “a-torto-e-a-direito”, certo é que estão cometendo flagrante ilegalidade, o que deve ser coibido.

Na verdade, não há nenhuma dúvida de que o emprego de algemas a pessoa de bem, – como atualmente está sendo indevidamente feito pelos policiais, – caracteriza evidente abuso de autoridade,  violência arbitrária e constrangimento ilegal, passíveis seus autores de serem responsabilizados administrativa e criminalmente.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Aristides Medeiros

 

Advogado