Alienação de bens públicos imóveis municipais sem licitação

Resumo: O presente artigo buscou solucionar o grande problema que os municípios brasileiros vêm sofrendo sobre as ocupações irregulares de imóveis públicos municipais por particulares. Desta maneira, fora analisado o conceito de bens públicos, bem como suas classificações e destinações. Nessa linha, foi explanado que antes de qualquer procedimento, o bem deve ser desafetado para que possa ser iniciado o processo de alienação; uma vez desafetado, esse determinado bem já não atende mais uma finalidade específica, ou seja, não atende mais o interesse público, podendo ser assim alienado. Outrossim, procurou avaliar a real aplicabilidade da Lei nº 8.666/93, mais conhecida como Lei de Licitação e Contratos Administrativos, diante de todas as esferas governamentais, haja vista, que a referida Lei apresenta um caráter geral de suas normas. Traçou um paralelo sobre a importância do direito social à moradia e a utilização do processo de regularização fundiária. Por fim, buscou apresentar forma jurídica que possibilita a regularização urbano-municipal, permitindo que os bens ocupados sejam registrados diretamente aos ocupantes particulares. Desse modo, para a realização da presente revisão bibliográfica foi feito um breve estudo acerca da legislação, bem como dos ensinamentos doutrinários e jurisprudenciais, com o intuito de avaliar, analisar e sugerir a real necessidade do procedimento licitatório ou da contratação direta para os Entes Federativos.

Palavras-Chave: Alienação. Bens Públicos Municipais. Desafetação. Lei. Licitação. Moradia. Regularização Fundiária.

Abstract: This artig sought to solve the major problem that the municipalities have suffered over the illegal occupation of municipal public property by private individuals. Thus, outside analyzed the concept of public goods as well as their ratings and destinations. In this line, it was explained that before any procedure, the well should be unaffected so that the process of transfer can be started; once unaffected, this particular well no longer serves a more specific purpose, ie, no longer serves the public interest, and may be like this alienated. Moreover, sought to assess the actual applicability of Law No. 8,666 / 93, better known as Bid and Administrative Contracts Law, before all levels of government, given that this law has a general character of its standards. He drew a parallel about the importance of social housing rights and the use of the land regularization process. Finally, it sought to present legal form that enables urban-municipal regulation, allowing busy goods are recorded directly to private occupants. Thus, for the realization of this literature review was done a brief study on the legislation and the doctrinal teachings and jurisprudence, in order to evaluate, analyze and suggest the real need of the bidding process or direct contracting for loved Federative.

Keywords: Alienation. Municipal Public Goods. Disaffection. Law. Bid. House. Regularization Land.

Sumário 1.Introdução. 2. Bens. 2.1. Conceito de Bens. 2.2. Bens Públicos. 2.3. Classificação dos Bens Públicos. 2.4. Quanto à Disponibilidade dos Bens. 2.5 Afetação e Desafetação. 2.6. Regime Jurídico dos Bens. 3. Licitação. 3.1. Do Conceito de Licitação. 3.2. Os Princípios da Licitação. 3.3. Das Modalidades de Licitação. 3.4. Da Contratação Direta sem Licitação. 3.5. Do Caráter Geral da Lei nº 8.666/93.  4. Da Alienação de Bens Públicos Imóveis Municipais sem Licitação. 4.1. Do Direito Social à Moradia. 4.2. Da Regularização Fundiária. 4.3. Da Possibilidade de Inexigir Licitação na Alienação de Imóveis Públicos Municipais com o fim de Regularização Fundiária. 5 Considerações finais.  Referências

1. Introdução

Os municípios brasileiros vêm sofrendo grande problema com as ocupações irregulares de imóveis públicos municipais por particulares. Invariavelmente, essas ocupações, muitas vezes perduram por décadas. Diante disso, faz-se necessário implementar medidas que permitam estabelecer critérios e procedimentos de regularização fundiária do solo urbano, cominada com o interesse social.

A falta de regularização fundiária causa graves prejuízos diretos ou indiretos à municipalidade, dentre eles cita-se; a diminuição da arrecadação tributária, ausência de consolidação e implementação de Plano Diretor e normas de ocupação do solo. Além do mais, a falta de regularização fundiária pode causar graves prejuízos à sustentabilidade ambiental, na medida em que não são implementadas ações coordenadas pela Administração Pública.

Considerando tais informações, o presente trabalho tem como objetivo preponderante apontar bases epistemológicas para resolução do problema, juridicamente e socialmente. Em outras palavras, o trabalho visa conjugar alternativas jurídicas com a preservação do interesse público, consubstanciado na concretização do direito fundamental à moradia.

Num primeiro momento, analisar-se-á o conceito de bens, com enfoque no significado e características dos bens públicos. Concluir-se-á que os bens de uso comum e uso especial, enquanto estiverem afetados ao uso da Administração Pública não poderão ser alienados, no entanto, os bens dominicais já encontram-se inseridos no rol de bens que podem ser alienáveis, desde que devidamente desafetados.

Posteriormente, serão apresentados os conceitos sobre Licitação, os princípios que regem tal procedimento, seus casos de dispensa e inexigibilidade autorizados por Lei e todas suas modalidades. Nesse momento, evidenciará que em regra os imóveis públicos poderão ser alienados mediante prévia autorização legal e realização de processo administrativo licitatório competente.

Ocorre que, conforme será demonstrado, alguns casos excepcionais de alienação de imóveis públicos, poderão ser feitos sem que haja o processo licitatório, é o caso que se propõe para eventual implementação de programa de regularização fundiária de solo urbano.

Assim, finalmente, adentra-se ao cerne do questionamento do trabalho, que é a possibilidade da contratação direta, o direito à uma moradia digna e a importância da regularização urbano-municipal.

Nesse diapasão, a presente monografia, com respaldo na legislação, assim como na doutrina, tem como meta principal mostrar como proceder-se à contratação direta, sem prévio processo licitatório, com segurança e eficiência guiada pela Lei de Licitações e Contratos e pela jurisprudência dos órgãos de controle, a fim de que seja implementado programa de regularização fundiária do solo urbano municipal, conferindo aos particulares ocupantes de propriedade pública a garantia constitucional à moradia.

2. Bens

2.1 – Conceito de Bens

Antes da concepção mais especifica, faz-se necessário conceituar bens de uma maneira geral. Em seu artigo 98, o Código Civil os reparte inicialmente entre públicos e particulares, esclarecendo que são públicos os do domínio nacional, das pessoas jurídicas de direito público interno; e particulares todos os outros, seja qual for à pessoa que pertencerem.

César Fiuza (2008, p. 181) entende bem como tudo aquilo que é útil às pessoas.

Para que os bens possam ser considerados como objeto do direito precisam ter os seguintes pressupostos; “ser representados por um objeto capaz de satisfazer um interesse econômico, ser suscetíveis de gestão econômica autônoma, e; ter capacidade para ser objeto de uma subordinação jurídica.” (FIUZA 2008, p. 181).

Assim, bem pode ser conceituado como todo objeto de valor material ou imaterial, que é capaz de ser instrumento para uma relação jurídica.

2.2 – Bens Públicos

Continuando a construção do entendimento, analisar-se-á definição de bens públicos.

A expressão bens públicos pode ser entendida em duplo sentido, ora designando um valor material ou imaterial que pode ser objeto de direito relativamente ao seu proprietário (União, Estado, Distrito Federal ou Municípios), ora poderá ser entendida de acordo com seu usuário, ou seja, bem usado pelo povo. (GASPARINI 2012, p. 957).

Para Hely Lopes Meirelles (2004 apud GASPARINI 2012, p. 956), bens públicos são:

 “Todas as coisas, corpóreas ou incorpóreas, imóveis, móveis e semoventes, créditos, direitos e ações, que pertençam, a qualquer título, às entidades estatais, autárquicas, fundacionais e empresas governamentais.”

Celso Antônio Bandeira de Mello (2008, p. 904), por sua vez, vai além, inserindo no rol não somente os bens que compõe o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, mas também os que estiverem afetados à prestação de serviços públicos, mesmo se pertencentes às pessoas jurídicas de direito privado.

Diogenes Gasparini, (2012, p. 957) entende que bens públicos “são todas as coisas matérias ou imateriais pertencentes ou não às pessoas jurídicas de Direito Público e as pertencentes a terceiros quando vinculadas à prestação de serviço público”.

Nessa esteira torna-se fácil concluir que alguns elementos do conceito de bens públicos foram excluídos pela redação do artigo 98 do Código Civil Brasileiro. Assim, estabelece a Lei no artigo em comento:

“Art. 98 – São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem.” 

Em síntese, bens públicos são todos aqueles bens que, pertencem às pessoas jurídicas de direito público, e os que mesmo pertencentes às pessoas jurídicas de direito privado, estejam afetados à prestação de certo serviço público.

2.3 – Classificações dos Bens Públicos

Consonante com o artigo 99 do Código Civil os bens públicos possuem as seguintes classificações abordadas abaixo.

Primeiramente os Bens de uso comum, que são todos aqueles móveis e imóveis destinados ao uso de todas as pessoas.

Depois os Bens de uso especial que são os “afetados a um serviço ou estabelecimento público, como as repartições públicas, isto é, locais onde se realiza a atividade pública ou onde está à disposição dos administrados um serviço público, como teatros, universidades, museus e outros abertos à visitação pública”. (MELLO 2008, p. 904).

Por fim, os Bens dominicais[1] que são os bens próprios do Estado que constituem o patrimônio deste como objeto de direito real. (MOTTA 2004, p. 988) [2].

Dispõe o artigo 99 do Código Civil:

“Art. 99 – São bens públicos:

I – os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças;

II – os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias;

III – os dominicais, que constitui o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal ou real, de cada uma dessas entidades;

Parágrafo Único – Não dispondo a lei em contrário, consideram-se dominicais os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado.”

Deve-se relembrar que tanto os bens de uso comum, quanto os de uso especial, são por força de Lei inalienáveis; ou seja, enquanto permanecerem afetados pelo uso da Administração Pública eles não são passíveis de alienação.

Nesse sentido, dispõe o artigo 100 do Código Civil/2002:

“Art. 100 – Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar.”

Outrora, os bens dominicais já estão inseridos no rol de bens, observadas as exigências legais que podem ser alienáveis. Assim estabelece o artigo 101 do Código Civil:

Art. 101 – Os bens dominicais podem ser alienados, observadas as exigências da lei.

De todo modo, vale frisar que, em regra, a alienação de bem público deve realizar-se conforme os mandamentos legais, ou seja, deverá ser precedida de avaliação e do devido procedimento licitatório, imposto pela Lei n. 8.666/93.

2.4 – Quanto à Disponibilidade dos Bens

Os bens públicos podem ser indisponíveis, patrimoniais indisponíveis ou patrimoniais disponíveis. 

 São Bens indisponíveis os de uso comum do povo, aqueles que não ostentam caráter patrimonial. Segundo José dos Santos Carvalho Filho (2014, p. 1166) bens indisponíveis são:

“Os bens de uso comum do povo, porquanto se revestem de característica não patrimonial. Incluem-se, então, os mares, os rios, as estradas, as praças e lougradoros, o espaço aéreo etc., alguns deles, é óbvio, enquanto mantiverem essa destinação.”

Os Bens patrimoniais indisponíveis são aqueles que possuem caráter patrimonial, porque, mesmo sendo indisponíveis, admitem em tese uma correlação de valor, sendo, por isso, suscetíveis de avaliação pecuniária. (C. FILHO 2014, p.1166). 

Em suma são aqueles bens que estão sendo efetivamente utilizados para a atuação da Administração Pública, o que não impede, como já dito, que eles sejam avaliados de forma pecuniária, mas não estão disponíveis. Esses bens são aqueles chamados bens de uso especial.

Já os Bens patrimoniais disponíveis são os dominicais, pois nem são destinados à coletividade nem estão sendo efetivamente utilizados pela Administração Pública. Por esse motivo eles podem ser alienados de acordo com a lei e normas pré-fixadas.

2.5 – Afetação e Desafetação

A interpretação do tema exposto a seguir é determinante para verificar os fins aos quais está sendo utilizado o bem.

Se um bem está sendo utilizado para determinado fim público, seja diretamente do Estado, seja pelo uso dos indivíduos em geral, diz-se que está afetado a determinado fim público. (C. FILHO 2014, p. 1167). Ainda nesse sentido, “afetar é atribuir ao bem uma destinação; é consagrá-lo ao uso comum do povo ou ao uso especial”. (GASPARINI 2012, p. 963).

Segundo Fernanda Marinela (2013, p. 846) “o instrumento da afetação dá maior proteção aos bens públicos em razão de sua vinculação à finalidade pública, transformando-o em indisponível, inalienável”.

Por outro lado, a desafetação é o não uso do bem para qualquer fim público. É a desativação, a perda da destinação pública.

Afetação e desafetação são os fatos administrativos que indicam a modificação das finalidades do bem público. Se o bem está afetado e passa a desafetado, ocorre a desafetação; se, ao revés, um bem desativado passa a ter alguma utilização pública, poderá dizer-se que ocorreu afetação. (C. FILHO 2014, p, 1167).

Vale consignar que a desafetação de um bem público deve se dar por meio de procedimento administrativo formal que culmine com a elaboração de decreto de desafetação.

2.6 – Regime Jurídico dos Bens

Algumas características tipificam e diferenciam os bens públicos. São elas: inalienabilidade, impenhorabilidade, imprescritibilidade e não onerabilidade. A análise destes atributos, sobretudo a inalienabilidade, é relevante para a orientação do tema em análise, pelo que seguem considerações sucintas sobre os mesmos.

É de suma importância compreender que, como pode os bens públicos caracterizar-se como inalienáveis, enquanto a própria Lei 8.666/93 destina um capítulo no qual regula sobre as alienações de bens públicos móveis e imóveis? É a partir desta indagação que nota-se com clareza, que não há como falar de inalienabilidade, mas sim de uma possível alienabilidade condicionada as regras aludidas na referida disciplina normativa.

A alienação de um bem público está condicionada à função que o mesmo destina-se atualmente. Assim, podemos concluir que, se um bem está afetado para um fim da Administração Pública, este bem não é passível de alienação, em contra partida, não é menos certo que, na maioria das vezes, podem ser alteradas tais situações em que se encontram os bens de modo a tornar possível a alienação. Desta maneira, os bens de uso comum do povo e o de uso especial se forem desafetados podem-se tornar bens dominicais e por esse motivo passam a ser passíveis de alienação.

Anota-se, à guisa de complementação, que alienação é um fato jurídico. “Indica a transferência da propriedade de determinado bem móvel ou imóvel de uma pessoa para outra”. (CARVALHO FILHO 2014, p. 1169). Além do mais, consigna-se que a alienação pode ser gratuita (doação) ou onerosa (compra e venda).

Portanto, conectando ao tema central do presente trabalho, tem-se que os bens públicos desafetados podem ser alienados em regra por meio de processo administrativo de licitação, mas, excepcionalmente, conforme restará demonstrado, referidos bens podem inclusive serem alienados diretamente, ou seja, sem um procedimento de licitação.

A impenhorabilidade resguarda os bens públicos de serem penhorados, assim define o inciso I do artigo 649 do Código de Processo Civil Brasileiro, in verbis:

“Art. 649 – São absolutamente impenhoráveis:

I – os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução”.

A isto, agrega-se o previsto no artigo 100 da Constituição Federal que exclui, de modo implícito, a penhora sobre qualquer bem público, ao determinar regime especial de execução em face da Fazenda Pública.

A imprescritibilidade significa que os bens públicos não podem ser suscetíveis de usucapião. Ao disciplinar tal norma, quer-se, dessarte, imunizar o bem do próprio descaso administrativo. Há entendimentos controversos sobre o tema; alguns fundamentam em face do princípio constitucional da função social da propriedade, outrora, há entendimentos no sentido de que “os bens dominicais seriam usucapivéis e que o artigo 188 da Constituição Federal, por ter se referido conjuntamente a terras públicas e terras devolutas teria criado outra categoria de bens públicos, admitindo o usucapião dessas ultimas”. (C. FILHO 2014, p. 1172).

Onerar um bem significa deixá-lo como garantia para o credor no caso de inadimplemento da obrigação. No direito público, não podem bens públicos ser gravados com esse tipo de direitos reais em favor de terceiros, daí a não onerabilidade. (C. FILHO 2014, p. 1173).

Diogenes Gasparini (2012, p. 967) informa que:

“Só quem pode alienar a propriedade pode hipotecar, dar em anticrese e empenhar, conforme estatui o artigo 1.420 do Código Civil, e referidas autoridades não são, seguramente, as proprietárias desses bens”.

Ademais, o regime jurídico dos bens públicos é utilizado como ferramenta de proteção ao patrimônio público, além do mais, através deles se determinam quais as regras aplicáveis a esses bens, quais os rigores e proteções que terão que ser observados.

3. Licitação          
No capítulo anterior, em suma, foram analisados os conceitos de bens públicos, suas classificações e características. Oportunamente, foi visto que os bens públicos desafetados podem ser alienados, em regra, por meio de um devido processo administrativo de licitação e que, excepcionalmente, podem inclusive serem alienados sem referido procedimento.

Nesta toada, tem-se importante apontar alguns conceitos sobre licitação e verificar a aplicação normativa nos casos que envolvem a alienação de bens públicos.

3.1 – Do conceito de Licitação

Por força do inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal, a regra é que as contratações sejam precedidas de licitação. Somente à lei é permitido abrir exceções.

Diz o artigo:

“Art. 37 – Omissis…

XXI –  ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

 Este procedimento segundo José dos Santos Carvalho Filho (2013, p. 238) é conceituado como:

“Procedimento administrativo vinculado por meio do qual os entes da Administração Pública e aqueles por ela controlados selecionam a melhor proposta entre as oferecidas pelos vários interessados, com dois objetivos – a celebração de contrato, ou a obtenção do melhor trabalho técnico, artístico ou cientifico.”

Mello (2008, p. 519) define licitação como sendo:

“O procedimento administrativo pelo qual uma pessoa governamental, pretendendo alienar, adquirir ou locar bens, realizar obras ou serviços, outorgar concessões, permissões de obra, serviço ou de uso exclusivo de bem público, segundo condições por ela estipulada previamente, convoca interessados na apresentação de propostas, a fim de selecionar a que se revele mais conveniente em função de parâmetros antecipadamente estabelecidos e divulgados. “

Diogenes Gasparini (2012, p. 533) conceitua licitação da seguinte forma:

“É procedimento administrativo através do qual a pessoa a isso juridicamente obrigada seleciona, em razão de critérios objetivos previamente estabelecidos, dentre interessados que tenham atendido à sua convocação, a proposta mais vantajosa para o contrato ou ato de seu interesse.”

Na lição de Fernanda Marinela (2013, p.353):

“Licitação é um procedimento administrativo destinado à seleção da melhor proposta dentre as apresentadas por aqueles que desejam contratar com a Administração Pública. Esse instrumento estriba-se na ideia de competição a ser travada, isonomicamente, entre os que preenchem os atributos e as aptidões, necessários ao bom cumprimento das obrigações que se propõem assumir.”

O artigo 3º da Lei n. 8.666/93, dispõe que:

“Art. 3º – A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos”.

Consubstanciado nos conceitos acima explanados, pode-se concluir que o procedimento licitatório visa atender primeiramente a três exigências públicas, sendo elas; a proteção aos interesses públicos e seus recursos, respeito aos princípios que regem a licitação, e por fim, observância às exigências da probidade administrativa.

Dessa forma, o procedimento licitatório é um certame que o Poder Público deve promover desde que pretenda adquirir, alienar, locar bens, contratar serviços ou executar obras, devendo a lei expressamente dispor sobre os casos em que não serão exigidos a observância da licitação.

Neste sentido, a não realização de licitação é punida severamente. Inclusive a Lei nº. 8.666/93, na seção que trata Dos Crimes e das Penas, dispõe nos seguintes termos:

“Art. 89 – Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:

Pena – detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.

Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.”

Diferente dos particulares, que detém de vasta liberdade para promover as compras, vendas e contratações que julgam precisar, o Poder Público, por gerir coisa pública, necessita adotar um procedimento próprio. Daí a obrigação, em regra, de licitar dentro de parâmetros estabelecidos em lei própria.

Assim, é possível Estados e Municípios disporem em sentido diferente quanto ao procedimento legal para alienação de bens públicos.

3.2 – Os Princípios da Licitação    

De acordo com a Constituição Federal, a Administração Pública deve sempre observar os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência. Não distante disto, também estabelece a Lei nº. 8.666/93 em seu artigo 3º, que todo procedimento licitatório será processado e julgado em conformidade com tais princípios nele expresso.

“Não raras vezes, a verificação da validade ou invalidade dos atos do procedimento leva em consideração esses princípios, razão por que devem eles merecer comentário em apartado”. (CARVALHO FILHO 2014, p. 245).

Nesta réstia, o artigo 4º da Lei nº. 8.666/93 concretiza o Princípio da Legalidade quando determina:              

“Art. 4º – Todos quantos participem de licitação promovida pelos órgãos ou entidades a que se refere o art. 1º têm direito público subjetivo à fiel observância do pertinente procedimento estabelecido nesta lei, podendo qualquer cidadão acompanhar o seu desenvolvimento, desde que não interfira de modo a perturbar ou impedir a realização dos trabalhos.

Parágrafo único. O procedimento licitatório previsto nesta lei caracteriza ato administrativo formal, seja ele praticado em qualquer esfera da Administração Pública.”

Hely Lopes Meirelles (2004 apud MOTTA 2004, p. 361) ensina que:

“A legalidade, como princípio de administração, significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato invalido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. A eficácia de toda atividade administrativa está condicionada ao atendimento da lei.”

Segundo Edimur Ferreira de Faria (2011, p. 308) a legalidade é “o princípio segundo o qual o procedimento licitatório deve operar-se segundo regras jurídicas positivas. As leis e os regulamentos sobre licitação devem ser rigorosamente observados”.

Em sendo assim, pode-se concluir que o princípio da legalidade é de suma importância não somente no tocante ao procedimento licitatório, mas sim, para toda a Administração Pública. É, portanto, inadmissível comportamento contrário com o ordenamento jurídico, decorre este, do já sacramentado disposto no inciso II do artigo 5º da Constituição Federal[3].

No que tange ao Princípio da Impessoalidade, não obstante do descrito acima, este também discorre do artigo 37 da Lei Maior Federal. Em suma, ele impõe que a Administração Pública destine tratamento igual à todos os participantes do procedimento licitatório que estejam em paridade jurídica, visando sempre o interesse coletivo e não o interesse individual.

Pelo Princípio da Moralidade, decorre que a Administração Pública é obrigada a conduzir o procedimento licitatório devendo sempre obediência aos conceitos éticos, honestos e probos. Tal princípio está estreitamente ligado ao Princípio da Probidade Administrativa.

O Princípio da Igualdade tem sua origem no artigo 5º da Constituição Federal como sendo direito fundamental. No que tange à licitação tal princípio significa que todos os concorrentes são obrigados a competir em iguais condições, sem que haja nenhuma vantagem não extensiva a outro.

Nesse sentido é o que assegura o artigo 37, XXI da Constituição Federal:

“Art. 37 – Omissis…

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”.   
 

Nessa linha também dispõe o §1º do artigo 3º da Lei 8.666/93:

“Art. 3º – Omissis…

§1º – É vedado aos agentes públicos: admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, inclusive nos casos de sociedades cooperativas, e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato.”

Em regra, o princípio da igualdade garante a todos os participantes do certame que detenham as mesmas qualidades, iguais oportunidades; assegurando-se assim, o mesmo tratamento para os licitantes sem nenhum tipo de discriminação. Salvo os casos expressamente autorizados pela Constituição e por Lei, tal como o tratamento diferenciado à Micro Empresas e Empresas de Pequeno Porte, previstos na Lei Complementar nº 123/2006.

No que concerne ao Princípio da Publicidade, também consignado no artigo 37 da Constituição Federal, listado como Princípio básico da Administração Pública, este estabelece que os atos administrativos devam ser levados ao conhecimento de toda sociedade. E é dessa forma, dando publicidade ao ato, sem exceções, que é possível exercer o controle de sua regularidade.

Assim completa Benedicto de Tolosa Filho (2010, p. 6), ensinando que:

“O princípio da publicidade somente se completa na medida em que, além da divulgação dos atos oficiais, seus termos sejam franqueados ao cidadão, através da permissão de sua presença ou da obtenção de certidões de atos oficiais.”

No tocante ao Princípio da Vinculação ao Instrumento Convocatório, tal obriga a total obediência dos proponentes e da entidade licitante aos termos e condições previstos no edital. Nesse sentido dispõe o artigo 41 da Lei 8.666/93:

“Art. 41 – A Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada.”

Enfatizado no artigo 45 da Lei 8.666/93, o Princípio do Julgamento Objetivo prevê que o julgamento deve ser promovido segundo critérios objetivos, visando sempre assegurar aos licitantes o cumprimento dos termos do edital. Diz o artigo:

“Art. 45 – O julgamento das propostas será objetivo, devendo a Comissão de licitação ou o responsável pelo convite realizá-lo em conformidade com os tipos de licitação, os critérios previamente estabelecidos no ato convocatório e de acordo com os fatores exclusivamente nele referidos, de maneira a possibilitar sua aferição pelos licitantes e pelos órgãos de controle”.

Por fim, além dos princípios elencados acima, foram previstos outros, que se correlacionam com os princípios básicos. São eles; Princípio da Probidade Administrativa, da Competitividade, da Celeridade, da Indistinção, da Inalterabilidade do Edital, da Obrigatoriedade; entre outros.

Assim, os princípios básicos não apenas se complementam na medida em que a ausência de um deles dificulta o andamento de uma licitação, mas também informam a elaboração dos diplomas licitatórios das pessoas governamentais, como estabelece o artigo 173, §1º, III da Constituição Federal, in verbis:

“Art. 173 – Omissis…

§1º – Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

III – licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública.”

Corroborando o que foi dito, Mello (2008, p. 530) aduz que “os Cânones em causa devem obrigatoriamente informar qualquer licitação”.

Ademais, resta salientar que a regra para qualquer tipo de contratação, compra e alienação é o procedimento licitatório, somente este podendo ser dispensado se houver previsão legal e no tocante aos princípios, os mesmo devem sempre ser observados em todas as fases do certame.

3.3 – Das Modalidades de Licitação

As modalidades são as várias espécies de licitação conforme os respectivos regimes jurídicos. O artigo 22 da Lei nº 8.666/93 elenca em sua redação cinco, sendo elas; concorrência, tomada de preço, convite, concurso e leilão, no entanto, pela Lei nº 10.520/2002 decorrente da Medida Provisória nº 2.026/2000, foi criado o pregão como nova modalidade de licitação. Tais modalidades podem ser assim conceituadas de conformidade com o já citado artigo.

A primeira é a concorrência, definida como:

“Art. 22 – São modalidades de licitação:

§ 1o – Concorrência é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir os requisitos mínimos de qualificação exigidos no edital para execução de seu objeto.”

Em regra, a concorrência é a modalidade adequada para contratações de grande vulto. É a modalidade que apresenta maior rigor e ampla publicidade, por seus contratos administrarem serviços e obras de grande valor.

A supracitada Lei estabeleceu que, em regra, a concorrência é a modalidade de licitação adequada para a alienação de bens imóveis, todavia ensina Jacoby (2011, p. 102) que:

“Essa regra, assentada na doutrina e jurisprudência, foi radicalmente modificada pela Lei nº 8.883/1994, que alterou a Lei nº 8.666/1993. Em decorrência das modificações experimentadas pela lei, passou a ser admissível o leilão para a alienação de imóveis quando a aquisição do bem haja derivado de procedimentos judiciais ou de dação em pagamento”.

A segunda é a tomada de preço, conceituada como:

“Art. 22 – Omissis…

§ 2o – Tomada de preços é a modalidade de licitação entre interessados devidamente cadastrados ou que atenderem a todas as condições exigidas para cadastramento até o terceiro dia anterior à data do recebimento das propostas, observada a necessária qualificação.” 

Essa modalidade é menos formal quando comparada à concorrência, devido às contratações cujas faixas de valores são medianas e já pré-fixadas. Dispõe também que podem participar do certame os licitantes cadastrados, quanto os que atenderem a todas as condições para o cadastramento até o terceiro dia anterior à data do recebimento das propostas, com isso, a Lei nº 8.666/93 buscou ampliar a competitividade e garantir a isonomia durante todo o procedimento licitatório.

A terceira é o convite, consagrada como:

“Art. 22 – Omissis…

§ 3o – Convite é a modalidade de licitação entre interessados do ramo pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados em número mínimo de 3 (três) pela unidade administrativa, a qual afixará, em local apropriado, cópia do instrumento convocatório e o estenderá aos demais cadastrados na correspondente especialidade que manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas da apresentação das propostas”.

Esta é a única modalidade de licitação em que a lei não obriga a publicação de um edital, possui o procedimento mais simplificado e com menores prazos para sua realização. O instrumento convocatório é a carta-convite.

Fernanda Marinela (2013, p.385) completa ensinando que “para os contratos com valores até 10% desses limites, a licitação é dispensável, todavia, se o administrador entender por bem, ele poderá realizá-la, utilizando essa modalidade”.

A quarta modalidade é o concurso, definido como:

“Art. 22 – Omissis…

§ 4o  Concurso é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na imprensa oficial com antecedência mínima de 45 (quarenta e cinco) dias.”

Nesta, a Administração deverá fixar com objetividade os critérios seletivos. A sua publicidade é assegurada por meio da publicação de seu edital.

A quinta e última modalidade elencada pelo artigo é o leilão, esta qualificada como:

“Art. 22 – Omissis…

§ 5o  Leilão é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para a venda de bens móveis inservíveis para a administração ou de produtos legalmente apreendidos ou penhorados, ou para a alienação de bens imóveis prevista no art. 19, a quem oferecer o maior lance, igual ou superior ao valor da avaliação.”

A regra, portanto, é que o leilão seja a modalidade escolhida para a alienação de bens móveis, e eventualmente os imóveis. Para a alienação de bens imóveis, a regra, como já mencionado, será a escolha da modalidade concorrência, conforme dispõe o artigo 23, § 3º da Lei 8.666/93:

“Art. 23 – Omissis…

§ 3o – A concorrência é a modalidade de licitação cabível, qualquer que seja o valor de seu objeto, tanto na compra ou alienação de bens imóveis, ressalvado o disposto no art. 19, como nas concessões de direito real de uso e nas licitações internacionais, admitindo-se neste último caso, observados os limites deste artigo, a tomada de preços, quando o órgão ou entidade dispuser de cadastro internacional de fornecedores ou o convite, quando não houver fornecedor do bem ou serviço no País.”    

Neste contexto, insta ressaltar, que somente em situações indicadas na lei poderá ser utilizado o leilão para a alienação de bens imóveis. É o que consagra o artigo 19 inciso III da referida Lei:     

“Art. 19 –  Os bens imóveis da Administração Pública, cuja aquisição haja derivado de procedimentos judiciais ou de dação em pagamento, poderão ser alienados por ato da autoridade competente, observadas as seguintes regras:

III – adoção do procedimento licitatório, sob a modalidade de concorrência ou leilão.”

Por fim, o pregão, que está previsto na Lei nº 10.520/2002. Edimur Ferreira de Faria (2011, p. 333) elucida tal modalidade como sendo:

“A modalidade de licitação adotada para a aquisição de bens e serviços comuns, promovida por entidades e órgãos públicos da Administração direta e da indireta, qualquer que seja o valor do objeto a ser contratado, em que a disputa dos licitantes com vistas à classificação e a adjudicação, se realiza por meio de propostas e lances em sessão pública ou por meio eletrônico, denominado pregão eletrônico”.

Por sua vez, Marinela (2013, p. 389) estabelece que:

“A nova modalidade foi instituída com o escopo de aperfeiçoar o regime de licita­ções, permitindo o incremento da competitividade e a ampliação das oportunidades de participação nas licitações, além de desburocratizar os procedimentos para a habilitação e o cumprimento da sequencia de etapas do procedimento, contribuindo para a redução de despesas e concedendo uma maior agilidade nas aquisições”.

Verifica-se, portanto, que o principal aspecto a ser observado é a possibilidade de se conferir maior presteza à contratação de bens e serviços comuns. Contudo, há que se observar que os procedimentos praticados pela Administração Pública para realização do pregão devem também obedecer aos princípios norteadores de todo ato administrativo, em especial, aqueles previstos no artigo 37, caput, da Lei Maior.

Vale ressaltar que, a grande novidade trazida pelo Pregão é a inversão de fases sendo que inicialmente é feita a análise das propostas e por fim, após sessão de lances verbais, tem-se a abertura do envelope de habilitação. Referida inversão torna o procedimento menos burocrático e mais célere, haja vista que somente serão analisados e conferidos os documentos dos licitantes que oferecerem o menor preço.

Outrossim, Di Pietro (2015, p. 456) complementa ensinando que:

“O procedimento é mais complexo na concorrência, tendo em vista o maior vulto dos contratos a serem celebrados; é um pouco menos complexo na tomada de preço, em que o valor dos contratos é médio; e simplifica-se ainda mais no convite, dado o pequeno valor dos contratos”.

Resta dizer que, as modalidades licitatórias não se confundem com os tipos de licitação a que se refere o §1º do artigo 45 da referida Lei. As modalidades relacionam-se com os valores dos contratos, enquanto os tipos com o julgamento do procedimento. Ademais, insta salientar que a Lei de Licitações e Contratos Administrativos, preza a competição e a segurança na contratação.

Para melhor compreensão das modalidades de licitação segue abaixo duas tabelas referentes aos valores e prazos de publicação:

16519a 

*Nas modalidades concurso, leilão e pregão não existe valores pré-fixados.

16519b

3.4 – Da Contratação Direta sem Licitação

Este tópico busca analisar a possibilidade de contratação direta sem licitação. Também apresentará a distinção teórica sobre licitação dispensada e inexigível.

Por força da Constituição Federal, no já aludido artigo 37 inciso XXI, a regra é a obrigatoriedade do procedimento licitatório, pois só por meio deste pode-se conceder iguais oportunidades a todos. Todavia, apesar de ser regra, há casos em que o mesmo pode ser dispensado ou inexigido.

Neste sentido, alerta Adilson de Abreu Dallari (2011 apud FERREIRA, p. 340):

“É um princípio fundamental de hermenêutica que as exceções devem ser tratadas de maneira restrita. Quando houver alguma dúvida quanto à exigibilidade ou dispensa de licitação, é preciso não esquecer que a regra geral é a exigibilidade, e que a exceção é a dispensa. A legislação vigente cuida, em artigos separados, da dispensa e da inexigibilidade. Os casos de inexigibilidade são aqueles onde, logicamente, não existe possibilidade de licitação, uma circunstância relevante autoriza uma discriminação. É preciso, porém, deixar uma coisa bastante clara: não é dado ao legislador, arbitrariamente, criar hipóteses de dispensa de licitação, porque a licitação é uma exigência constitucional.”

A priori, a diferença básica entre a dispensa e a inexigibilidade de licitação, é que nesta não há possibilidade de competição, portanto tornando a licitação inviável; e naquela existe a possibilidade de competição, mas a lei faculta à Administração o procedimento. Nesse contexto, resta claro que a contratação direta é aquela realizada sem licitação, em situações excepcionais, expressamente previstas em lei.

A Lei nº 8.666/93 em seus artigos 17 e 24 estabelece hipóteses em que a Administração Pública não está obrigada a licitar, ora, a licitação nesses casos é dispensada, todavia, há situações em que é utilizada a expressão licitação dispensável. Nesse sentido, ensina Lucas Rocha Furtado (2013, p 81):

“É de se observar que a distinção básica entre licitação dispensada e dispensável reside no fato de que, nesta última, o administrador poderá, se assim o desejar, realizar a licitação. Nas hipóteses de licitação dispensada, o administrador não pode licitar em face de que a pessoa com quem será celebrado o contrato com a Administração já está definida em razão do próprio objeto do contrato.”

Enumera a Lei nº 8.666/93 em seu artigo 17, todas as hipóteses em que a licitação é considerada dispensada. A lista proposta é taxativa, não podendo ser modificada pelo aplicador da norma.

 Os casos de licitação dispensada são aqueles que dizem respeito à alienação de bens móveis e imóveis. Nessas situações, diante das peculiaridades do contrato a ser celebrado, ao gestor não cabe optar pela licitação, mas proceder à contratação direta, na forma da lei.

Assim, estabelece Gasparini (2012, p. 568) que “licitação dispensada é a ocorrência na realidade da hipótese legal em que a Administração está liberada de licitar por expressa determinação dessa lei”.

Nessa mesma linha, o artigo 24 da Lei em comento, elenca em sua redação situações em que há dispensabilidade de licitação. Tal como na licitação dispensada, a lista aqui também é categórica, não podendo sofrer modificações. Nas hipótese de dispensa, a exclusão da obrigação de licitar requer precedente ato da Administração Pública, conforme determina o §2º do artigo 54 da Lei nº 8.666/93:

“Art. 54.  Os contratos administrativos de que trata esta Lei regulam-se pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público, aplicando-se-lhes, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito privado.

§ 2o  Os contratos decorrentes de dispensa ou de inexigibilidade de licitação devem atender aos termos do ato que os autorizou e da respectiva proposta”.

A licitação é dispensável em algumas situações, tais como; obras e serviços de engenharia de pequeno valor, compras de pequeno valor, guerra e grave perturbação da ordem, emergência e calamidade pública; entre várias outras hipóteses.

Nessa linha, dispõe o ilustre doutrinador Marçal (2005, p. 233):

“A dispensa de licitação verifica-se em situações em que, embora viável competição entre particulares, a licitação afigura-se objetivamente inconveniente com os valores norteadores da atividade administrativa”.

Nesse contexto, conforme exposto alhures, embora seja a regra, existem hipóteses em que a licitação seria impossível ou frustraria a realização adequada das funções estatais, daí, autoriza-se a Administração Pública a adotar outro procedimento, qual seja, a contratação direta.

É sabido que a competição é um dos fundamentos básicos da licitação. Cumpri-se esta a fim de que se possa alcançar a proposta mais benéfica para a Administração, desta maneira, a licitação não pode ser efetivada quando não houver competitividade em relação ao objeto licitado.

 A marcante característica da inexigibilidade de licitação é, portanto, a inviabilidade de competição, conforme dispõe o artigo 25 da Lei de Licitações:

“Art. 25 – É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:

I – para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes;

II – para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;

III – para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.

§ 1o  Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato.

§ 2o  Na hipótese deste artigo e em qualquer dos casos de dispensa, se comprovado superfaturamento, respondem solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o fornecedor ou o prestador de serviços e o agente público responsável, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis.”

As hipóteses arroladas no artigo 25 da Lei nº 8.666/1993 autorizam o gestor público, depois de demonstrada e justificada a inviabilidade de competição, contratar diretamente o objeto da licitação, todavia é importante observar que o rol descrito no supracitado artigo da referida Lei apresenta elenco exemplificativo das situações de inexigibilidade, ou seja, diferentemente da dispensa, as situações prevista para a inexigibilidade de licitação não são taxativas.

E nesse contexto, torna-se imperioso concluir que podem sim ser verificadas outras situações que justifiquem a contratação direta; sempre que a Administração Pública se deparar com a inviabilidade de competição, a licitação será inexigível. Nesse sentido, se manifestou o Tribunal de Contas do Estado do Paraná, “os casos de inexigibilidade de licitação não se exaurem nas disposições legais, as quais consignam, apenas exemplificativamente, algumas situações[4]”.

Mister informar também que, por mais que não exista um procedimento licitatório com todos os seus requisitos peculiares, é dever do administrador ao contratar diretamente justificar a escolha do fornecedor ou prestador de serviço bem como o preço aceito. É o que dispõe o artigo 26 da Lei de Licitações e Contratos Públicos:

“Art. 26 – As dispensas previstas nos §§ 2o e 4o do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8o desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos. 

Parágrafo único.  O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:

I – caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa, quando for o caso;

II – razão da escolha do fornecedor ou executante;

III – justificativa do preço.

IV – documento de aprovação dos projetos de pesquisa aos quais os bens serão alocados.”

 Logo, entende-se que, mesmo nas hipóteses de dispensa e inexigibilidade, a Administração deve praticar, por imposição legal, uma sucessão de atos para que possa ser concretizada de maneira correta a contratação direta, ou seja, a ausência do procedimento licitatório não pressupõe uma contratação informal.

Outrossim, é o que ensina Marçal Justen Filho (2005, p. 228), “a contratação direta exige um procedimento prévio, em que a observância de etapas e formalidades é imprescindível”.

Por fim, diante de todo o exposto, faz-se necessário esclarecer que a referida contratação só deve se dar em casos excepcionais, e nesse sentido é imperioso observar fielmente os preceitos contidos na Lei de Licitações e Contratos Administrativos.

3.5 – Do Caráter Geral da Lei 8.666/93

O artigo 22 inciso XXVII da Constituição Federal trás em sua redação o seguinte entendimento:

“Art. 22 – Compete privativamente à União legislar sobre:

XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III.”

 Não obstante disto, a Lei de Licitações e Contratos Administrativos estabelece em seu artigo 1º:

“Art. 1º – Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Parágrafo único.  Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.”

 Nessa mesma linha o artigo 118 da referida Lei determina que:

“Art. 118 – Os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as entidades da administração indireta deverão adaptar suas normas sobre licitações e contratos ao disposto nesta Lei.”

À luz do exposto nos artigos acima, fica nítido que o legislador limitou à União a competência privativa para legislar sobre normas gerais de licitações e contratos. Ademais, resta esclarecer que quando a União estabelece uma norma geral, esta legislação goza da condição de lei nacional, portanto, de aplicação geral, em sendo assim, deve esta ser observada não apenas pela própria União, mas sim por todos os Entes Federados. Vale frisar então, que tal norma deverá ser norteadora para os demais Entes.

Assim é o entendimento do STF, referente a ADI 927-3:

“EMENTA: CONSTITUCIONAL. LICITAÇÃO. CONTRATAÇÃO ADMINISTRATIVA. Lei n. 8.666, de 21.06.93. I. – Interpretação conforme dada ao art. 17, I, "b" (doação de bem imóvel) e art. 17, II, "b" (permuta de bem móvel), para esclarecer que a vedação tem aplicação no âmbito da União Federal, apenas. Idêntico entendimento em relação ao art. 17, I, "c" e par. 1. do art. 17. Vencido o Relator, nesta parte. II. – Cautelar deferida, em parte.

“(…) Penso que essas ‘normas gerais’ devem apresentar generalidade maior do que apresentam, de regra, as leis. Penso que ‘norma geral’, tal como posta na Constituição, tem o sentido de diretriz, de princípio geral. A norma geral federal, melhor será dizer nacional, seria a moldura do quadro a ser pintado pelos Estados e Municípios no âmbito de suas competências (…) Não são normas gerais as que se ocupem de detalhamentos, pormenores, minúcias, de modo que nada deixam à criação própria do legislador a quem se destinam, exaurindo o assunto de que tratam (…) São normas gerais as que se contenham no mínimo indispensável ao cumprimento dos preceitos fundamentais, abrindo espaço para que o legislador possa abordar aspectos diferentes, diversificados, sem desrespeito a seus comandos genéricos, básicos.(…) Dessa forma, a despeito da inexistência de um critério preciso para a caracterização de “norma geral” e “norma específica”, é possível depreender, a partir da análise jurisprudencial, que a suprema corte reputa enquadrarem-se como “normas gerais” os princípios, os fundamentos e as diretrizes conformadoras do regime licitatório no Brasil.[5]

A esse respeito, José dos Santos C. Filho (2014, p. 176) se pronuncia no seguinte sentido:

“É importante anotar, todavia, que a referida competência se limita à edição de normas gerais, e sendo assim, às demais entidades da federação foi conferida a competência para editar normas específicas. Na verdade, nem sempre tem sido fácil identificar quando um dispositivo encerra norma geral ou específica, e talvez por essa razão muitos Estados e Municípios adotem a Lei 8.666/93, deixando, pois de criar normas específicas, para evitar o risco de eventuais impugnações. Por outro lado, muitas objeções têm sido levantadas em relação a alguns dispositivos da lei federal, os quais, segundo o entendimento de diversos estudiosos, não contêm regras gerais, mas sim específicas. De fato, se o dispositivo da lei federal contiver norma específica, estará fatalmente em contrariedade com a Constituição Federal, e em consequência, maculado de vício de inconstitucionalidade”.

Conforme o exposto acima, percebe-se que há profundo dissenso tanto pela doutrina, como pela jurisprudência do STF sobre o que seriam normas gerais e normas específicas.

Outrossim, corroborando com tal percepção, elucida Leonardo Godoy Drigo[6]:

“Um esboço conceitual, portanto, pode ser dado a partir de tais constatações: normas gerais são princípios jurídicos, contidos em leis de caráter nacional (e não no interesse exclusivo da União enquanto ente federativo) voltados à atividade do legislador e que pautarão sua atuação na concretização dessas próprias normas, conforme a pluralidade dos interesses regionais ou locais envolvidos.”

Nessa esteira, salienta-se que as normas gerais devam ser observadas por todos, mas que deve haver complementação mediante normas específicas e é a partir desta concepção que, resta claro que não foi intenção do legislador federal esgotar na Lei 8.666/93 toda a matéria inerente à licitação, suprimindo dos demais entes a necessidade de especificar a disciplina no tema de acordo com as suas particularidades.

Referida constatação tem grande relevância para o tema que ora se discute, pois, conforme se irá sustentar, mesmo que a Lei nº 8.666/1993 em seu artigo 17 estabeleça regras sobre alienação de bens da Administração Pública, tem-se que este comando se aplica exclusivamente a União Federal, por se tratar de uma norma específica da União, podendo, desta maneira, Estados e Municípios regulamentarem a matéria de forma diferente, por meio de suas próprias normas específicas.

4 – Da Alienação de Bens Públicos Imóveis Municipais sem Licitação

Resta cristalino, depois de todo o estudo, que há possibilidade de todas as esferas de governo, sejam elas, União, Estados, Municípios ou Distrito Federal, legislarem sobre a alienação de seus bens. Da mesma forma, restou evidenciado que o disposto no artigo 17 da Lei de Licitação e Contratos Administrativos, relativamente à alienação de bens públicos, se aplica restritivamente à União Federal, eis que decorre de competência restritiva de cada Ente Federado. Sendo assim, reafirma-se que no tocante a alienação de bens públicos, cada Ente Federal poderá regulamentar a matéria atendendo às peculiaridades regionais e locais devendo, no entanto, adotar a Lei nº 8.666/93 como norma geral.

Pôde-se aprender ainda, que a partir do momento em que a Administração Pública se depara com situações exemplificadas em Lei, esta, detém a escolha de proceder com a licitação ou, em outros casos, realizar somente a contratação direta; esses são os casos de dispensa e inexigibilidade de licitação, todos delineados pela Lei nº 8.666/1993.

Diante deste contexto, afirma-se a importância do Poder Público Municipal em elaborar mecanismos que conduzam à regulamentação desses imóveis públicos ocupados por terceiros, com o intuito de promover a regularização urbano-municipal e, dessa forma, trazendo não só aos moradores ocupantes desses imóveis maior segurança, mas também, conferindo ao Ente Municipal a preservação de seus interesses.

É que, como já abordado anteriormente, a falta de regularização fundiária causa sérios prejuízos às cidades, tanto para o ente público como para os particulares que vivenciam esse problema. Muitas famílias vivem em situação irregular por décadas, algumas delas de baixa renda e outras tantas possuem situação econômico-financeira estável, mas se encontram na mesma condição de não proprietários.  

Isto posto, o presente capítulo integra a parte final do trabalho, buscando analisar a possibilidade de inexigir a licitação para a alienação direita de imóveis públicos municipais aos ocupantes particulares.

4.1 – Do Direito Social à Moradia

A consagração do direito à moradia como direito social ocorreu por meio da Emenda Constitucional nº 26 do ano 2000, que alterou o artigo 6º da Constituição Federal de 1988. Elucida o referido texto Constitucional:

“Art. 1o – O art. 6o da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:

Art. 6º – São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.

Destarte, assegurado no artigo 6º da Lei Maior, o direito à moradia passou a compor direto básico e fundamental do cidadão, e vai além, sendo requisito de efetivação do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

Residir irregularmente constitui situação de insegurança permanente; por esse motivo, além de um direito social, certifica-se que a moradia regular é condição para a efetivação de outros direitos essenciais; como o trabalho, o lazer, a educação e a saúde.

Diante da problemática exposta, surge com o objetivo de assegurar a moradia, o processo de regularização fundiária, que visa permitir às pessoas habitantes de assentamentos irregulares o registro de suas devidas áreas.

4.2 – Da Regularização Fundiária

O conceito de regularização fundiária está previsto na Lei 11.977/09, em seu artigo 46, que estabelece:

“Art. 46 – A regularização fundiária consiste no conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais que visam à regularização de assentamentos irregulares e à titulação de seus ocupantes, de modo a garantir o direito social à moradia, o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.”

Ainda nesse sentindo, Balbim[7] sedimenta a regularização fundiária como:

“O processo que visa garantir a segurança jurídica do uso do solo a quem de fato o ocupa, adequando-o urbanisticamente. O reconhecimento do uso como princípio gerador do processo de regularização em meio urbano está, na maior dos casos, associado à moradia.”

Além da Constituição Federal e da Lei 11.997/09, deve-se destacar a Lei 10.257/01 denominada como Estatuto das Cidades, que traz em seu artigo 2º a regularização fundiária como uma das diretrizes gerais de política urbana.

Diz o artigo em comento:

“Art. 2º – A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais:

XIV – regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação, consideradas a situação socioeconômica da população e as normas ambientais”.

Necessário se faz compreender que cabe a todos os entes federados atuar nos programas de regularização fundiária, tal cooperação é indispensável, tendo em vista a quantidade de moradias irregulares no Brasil, o que dificulta o desenvolvimento das cidades e do próprio País. Segundo a Constituição Federal, em seu artigo 23 inciso IX, é competência comum executar a política de desenvolvimento e de expansão urbana, e dessa forma minimizar os efeitos das ocupações irregulares.

Reza o artigo:

“Art. 23 – É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

 IX – promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico”.        
 

Os motivos que sustentam a juridicidade desse texto normativo ligam-se ao interesse social, fundamento básico do interesse público; pois ao Poder Público cabe fomentar o acesso ao direito à moradia pelos cidadãos, utilizando-se para isso de políticas públicas que proporcionem a regularização fundiária dos imóveis irregularmente ocupados.

Sob outro prisma, a própria Constituição Federal foi clara em afirmar o papel relevante do município na proteção e no desenvolvimento urbano, pois ao reservar capítulo próprio para a política urbana destacou o papel determinante do Poder Público Municipal.

Assim consagra o artigo 182 do texto constitucional, ora mencionado:

“Art. 182 – A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.”
 

As políticas públicas de regularização fundiária, no âmbito municipal, estão voltadas principalmente às normas urbanísticas e de parcelamento de uso do solo. São de extrema importância tais normas, pelo fato de serem pressupostos para o registro imobiliário, constituindo a propriedade do imóvel.[8] Nesse sentido, estabelece o artigo 30 da Carta Magna:

“Art. 30 – Compete aos Municípios:

VIII – promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano”.

À vista do exposto acima, o Município, então, situa-se como o principal responsável pela questão da regularização fundiária urbana, justamente pelo fato de ser o ente mais próximo dos problemas urbanos, assim sendo, deve agir visando o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade.

Nesse diapasão Alfonsin[9] (2007, p. 78) preleciona que:

“Regularização fundiária é um processo conduzido em parceria pelo Poder público e população beneficiária, envolvendo as dimensões jurídica, urbanística e social de uma intervenção que, prioritariamente, objetiva legalizar a permanência de moradores de áreas urbanas ocupadas irregularmente para fins de moradia e, acessoriamente, promove melhorias no ambiente urbano e na qualidade de vida do assentamento, bem como incentiva o pleno exercício da cidadania pela comunidade sujeito do projeto”.

Destarte, esclarece-se que cabe ao Município identificar áreas nas quais, por razões sociais, haja interesse público em ordenar, e por fim, conclui-se que não se trata de uma faculdade do Ente Municipal, mas sim, de uma obrigação, já que a ele cabe legislar e agir especificamente para regularizar a situação urbanística em seu território.

4.3 – Da Possibilidade de Inexigir Licitação na Alienação de Imóveis Públicos Municipais com o fim de Regularização Fundiária.

Atualmente grande parte dos municípios brasileiros sofrem com o problema de ocupação irregular de imóveis públicos municipais por particulares. A licitação para atribuir a cada família o respectivo lote seria conflitante com o interesse público, consistente na ocupação desses invasores. Com efeito, a licitação poderia levar a outro interessado o imóvel, fracassando assim, o projeto de regularização fundiária, pois quem deveria ser assentado não o foi na medida em que o outro acabou como vencedor do certame.

É a partir dessas percepções, que o presente trabalho buscou forma jurídica que possibilita tal regularização, permitindo assim, que os bens ocupados sejam registrados diretamente aos ocupantes particulares.

Como já exposto alhures, a Lei 8.666/93 conduz normas gerais sobre licitação, portanto a União não dispõe de competência privativa, ficando a cargo dos demais Entes Federativos disporem sobre normas específicas para disciplinarem suas licitações.

Corroborando com tal percepção, Marçal (2005, p. 13) afirmar que:

“É inquestionável que a Constituição reservou competência legislativa especifica para cada esfera política disciplinar licitação e contratação administrativa. A competência legislativa sobre o tema não é privativa da União.”

Existem hipóteses em que a licitação formal seria impossível ou impediria a realização adequada das funções estatais; é daí que surge a possibilidade da contratação direta. No caso específico do presente trabalho, seria incoerente destinar um imóvel público municipal, ocupado por particulares há vários anos, à qualquer interessado. De certo modo, a Administração não obteria o resultado satisfatório ao seu mister constitucional de consecução do bem-estar social, ao contrário, poderia provocar graves injustiças, a medida em que os imóveis, objeto do procedimento de regularização, poderiam ser destinados à pessoas que já possuem propriedades.

A própria Lei de Licitações e Contratos Administrativos, reserva em seu artigo 17, regramento legal para alienação de bens públicos, chegando inclusive autorizar a dispensa de licitação quando se tratar de regularização fundiária de interesse social, ou seja, destinada especialmente ao assentamento de famílias de baixa renda.

Dispõe o artigo:

“Art. 17 – A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:

I – quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada esta nos seguintes casos:

f) – alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens imóveis residenciais construídos, destinados ou efetivamente utilizados no âmbito de programas habitacionais ou de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública. “       

Ocorre que, conforme se depreende da norma acima citada, a dispensa de licitação se restringe à regularização fundiária de interesse social (famílias com menor poder econômico-financeiro – em vulnerabilidade social), não alcançando assim, ocupantes de áreas públicas que possuem boa condição financeira.

Levando em consideração referido fato normativo, torna-se inviável a concretização de determinada regularização em muitos municípios, isto porque, muito embora grande parte dos particulares ocupantes desses lotes sejam de baixa renda, na mesma situação encontram-se também famílias que possuem poder aquisitivo, mas que sob o aspecto concernente à irregular ocupação se encontram na mesma condição de insegurança, por não serem proprietários das áreas ocupadas.

A partir da referida constatação, a dispensa de licitação seria impossível, uma vez que, a relação proposta no artigo 17 da Lei nº 8.666/1993 é taxativa, não podendo adaptar novas hipóteses, ou seja, não haveria argumentos jurídicos que justificasse tal escolha.

 É sabido que concorrência é a modalidade de licitação destinada à compra e alienação de bens imóveis, entretanto, tem-se que no caso do presente trabalho seria impossível. Como já discutido anteriormente, a licitação no caso especifico poderia atrapalhar a intenção do Poder Público de promover a regularização urbano-municipal e consequentemente o registro imobiliário de cada área pública ocupada aos particulares.

 No entanto, no que diz respeito à inexigibilidade, a redação proposta pelo artigo 25 é meramente exemplificativa, podendo ser enquadrados novos casos, desde que comprovada a impossibilidade de competição frente à um processo licitatório, tal como o tema da presente monografia. Desta maneira, ressalta-se que, em qualquer situação que a Administração Pública se depare com a impossibilidade de competição, esta poderá deixar de realizar a licitação, por meio de inexigibilidade.

Nesse sentido, ensina Di Pietro (2015, p. 429) que “nos casos de inexigibilidade, não há possibilidade de competição, porque só existe um objeto ou uma pessoa que atenda às necessidades da Administração; a licitação é, portanto, inviável”.

Pois bem, o direito constitucional à moradia, o interesse coletivo, o interesse Municipal e, principalmente, o preponderante objetivo do Poder Público de promover a regularização fundiária, são elementos constituidores de inevitável impossibilidade de competitividade, configuradores de inexorável hipótese de inexigibilidade.  

Em outras palavras, a regularização fundiária municipal, como mecanismo concretizador do direito fundamental à moradia e do interesse social, torna a competitividade inviável, o que justifica a adoção do procedimento administrativo de inexigibilidade, seja em qual for o caso – assentamento de particulares de baixa renda ou não.

Neste sentido é o entendimento esposado pelo Supremo Tribunal Federal – STF, que em caso análogo proferiu a seguinte decisão:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 3º, §§, DA LEI N. 9.262, DE 12 DE JANEIRO DE 1.996, DO DISTRITO FEDERAL. VENDA DE ÁREAS PÚBLICAS PASSÍVEIS DE SE TORNAREM URBANAS. TERRENOS LOCALIZADOS NOS LIMITES DA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL – APA DA BACIA DO RIO SÃO BARTOLOMEU. PROCESSO DE PARCELAMENTO RECONHECIDO PELA AUTORIDADE PÚBLICA. VENDAS INDIVIDUAIS. AFASTAMENTO DOS PROCEDIMENTOS EXIGIDOS NA LEI N. 8.666, DE 21 DE JUNHO DE 1.993. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO. INEXIGIBILIDADE E DISPENSA DE LICITAÇÃO. INVIABILIDADE DE COMPETIÇÃO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 37, INCISO XXI, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. INOCORRÊNCIA.

1. A dispensa de licitação em geral é definida no artigo 24, da Lei n. 8.666/93; especificadamente — nos casos de alienação, aforamento, concessão de direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens imóveis construídos e destinados ou efetivamente utilizados no âmbito de programas habitacionais ou de regularização fundiária de interesse social, por órgãos ou entidades da administração pública — no seu artigo 17, inciso I, alínea f. Há, no caso dos autos, inviabilidade de competição, do que decorre a inexigibilidade de licitação (art. 25 da lei). O loteamento há de ser regularizado mediante a venda do lote àquele que o estiver ocupando. Consubstancia hipótese de inexigibilidade, artigo 25”[10].

Vale consignar que seja a regularização fundiária de interesse social ou de interesse específico, resta evidente a importância da intervenção jurídica para poder conceder o título de propriedade àqueles que ocupam os lotes públicos, todavia, estes necessitam vir combinados com outras políticas públicas que possam promover a segurança adequada, o meio ambiente ecologicamente equilibrado e por fim, a ordem urbanística das cidades.

Lado outro, e não menos importante, o fato de inexigir o procedimento licitatório não significa que haverá arbitrariedade, ou seja, a ausência de licitação não pressupõe contratação informal, pelo contrario; a Lei nº 8.666/93 em seu já citado artigo 26 estabelece um procedimento prévio, em que a observância de formalidades é imprescindível. Senão, vejamos as etapas a serem seguidas de forma mais didática:

a) Desafetação do bem público;

b) Lei autorizando a alienação do bem público;

c) Lei autorizando e prevendo a possibilidade de inexigibilidade;

d) A demarcação da área e dos imóveis a serem objeto da regularização;

e) Avaliação prévia do imóvel;

f) Justificativa do Poder Público ao inexigir a licitação.   

Por tudo que foi expendido, tem-se que os Municípios podem proceder pela inexigibilidade de licitação com o fim de adotar mecanismos de regularização fundiária, desde que sejam respeitadas as formalidades acima apontadas, pois neste caso o interesse público é a concretização do direito fundamental à moradia e seus consectários lógicos, da estabilidade familiar e social, do lazer, do trabalho e do bem-estar, configuradores inarredáveis do fundamento estatal da dignidade humana.

5 – Conclusões Finais

Diante de todo o estudo até o presente momento, pode-se concluir a real importância do processo de regularização fundiária urbano-municipal no intuito de legalizar aos particulares ocupantes suas respectivas áreas, e nesse sentido, garantir aos mesmos, a concretização do direito fundamental à moradia e todos os seus consectários lógicos.

Nesse contexto fora esclarecido que os bens de uso comum e os de uso especial são por força de Lei inalienáveis, enquanto conservarem sua destinação pública, outrora, no que diz respeito aos bens dominicais, estes já se encontram na lista de bens que podem ser alienados, caso não estejam afetados a uma finalidade pública.

Assim, é o que ensina Marinela (2013, p. 845):

“Para concluir a ideia, é possível identificar os bens de uso comum do povo e os bens de uso especial, que têm destinação pública e, por essa razão, são indisponíveis para o Estado, não podendo ser alienados. De outro lado, os bens dominicais, que são assim classificados por não terem finalidade pública, portanto são disponíveis para o Estado, podendo ser alienados, respeitadas as exigências legais para tanto.”

Noutro momento, evidenciou-se que, em regra, todo ato da Administração Pública que vise comprar, alienar, contratar bens ou serviços, deve ser precedido do devido procedimento administrativo de licitação.

Segundo o disposto acima, Di Pietro (2015, p. 408) defende que “ao falar-se em procedimento administrativo, está-se fazendo referencia a uma série de atos preparatórios do ato final objetivado pela Administração”.

Nessa toada, importante o esclarecimento feito a respeito do caráter geral da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, de que caberá à União a definição das normas gerais sobre o assunto, tendo todos os entes competência para legislar sobre normas específicas. Nesse sentido é o entendimento de Marçal (2005, p. 13) ao esclarecer que:

“Apenas as “normas gerais” são de obrigatória observância para as demais esferas de governo, que ficam liberadas para regular diversamente o restante, exercendo competência legislativa irredutível para dispor acerca de normas especificas”.

Dessa forma, o que ora se defende é que o processo de licitação deva sempre beneficiar o Ente Administrativo, facilitando seus objetivos. Assim, corroborando com tal entendimento, Marinela (2013, p. 367) preleciona que:

“A licitação tem que ser um meio apto para a Administração perseguir o interesse público. Caso o procedimento coloque em risco esse interesse, ele será inviável, já que a licitação não pode prejudicar o que deve proteger. Ela não é um fim em si mesma, mas, um meio, um instrumento para a proteção do interesse coletivo, não devendo jamais prejudicá-lo.”

Percebeu-se também que a regra é a Administração Pública manter em seu patrimônio os seus bens. Contudo, em determinadas e excepcionais situações, a alienação pode ser conveniente e até mesmo mais vantajosa.

A problemática exposta pelo presente trabalho buscou mostrar de maneira jurídica a possibilidade da contratação direta e os argumentos que justificam a Administração Pública optar pela não realização do processo licitatório frente às regularizações urbano-municipais.

Nesse réstia, importante observação da doutrinadora Fernanda Marinela (2013, p. 366):

“A contratação direta, sem a realização de licitação, não é sinônimo de contratação informal, não podendo a Administração contratar quem quiser, sem as devidas formalidades, o que é denominado procedimento de justificação, previsto no art. 26 da Lei.”

Não obstante disto, é o que ensina o Senhor Ministro Joaquim Barbosa em seu voto na ADIn 2.990-8:

“É certo que a Constituição prevê que a lei poderá estabelecer exceções à regra geral da obrigatoriedade de licitação. Contudo, apenas excepcionalmente o legislador ordinário é autorizado a criar situações em que a licitação será dispensa ou inexigível”[11].

Nesse diapasão, fora esclarecido o quão importante e necessário é o processo de inexigibilidade de licitação, frente ao interesse público municipal de legitimar as áreas ocupadas, pois só por meio dela pode-se assegurar a efetividade das medidas de regularização fundiária, uma vez que, os lotes ocupados serão registrados diretamente aos seus ocupantes.

Nesse sentido, é o que relata os Ministro Sepúlveda Pertence e Eros Grau em debate sobre a ADIn ora comentada:

Sepúlveda Pertence:Se é o ocupante que tem adquirido lote em loteamento irregular, mas reconhecido, desta ou daquela maneira, pela Administração Pública (…). Vai chegar satisfeitas as suas condições, a identificar só um possível comprador, sem licitação, de determinado lote”.

Eros Grau: “Passa a ser inexigibilidade, não é nem dispensa[12].

Ainda nessa esteira, o Ministro Eros Grau, enfatiza em seu voto:

“Para reforçar esse meu entendimento, diria ainda que a situação não é de dispensa de licitação. Porque nessa, o dever de licitar incide, mas é afastado. A situação é anterior, porque o pressuposto da licitação é a competição. E aqui não é possível competir: o loteamento será regularizado exatamente com a venda para aquele que ocupar o lote”[13].

Ademais, conforme vastamente já exposto e fundamentado alhures, restou evidenciado a importância do Ente Municipal em elaborar meios para realização de políticas públicas de regularização fundiária, afastando a licitação quando o objeto for a regularização fundiária, pois neste caso a licitação poderia causar prejuízo ao interesse público e não vantagens.

No mesmo sentido é o pensamento do Ministro Cezar Peluso:

“Seja por modulação da interpretação, seja pela procedência parcial, teríamos como resultado prático, hoje, anular todos os casos de regularização e reinstalar, mediante licitação, o caos social, onde o recurso a manobras pouco nobres não teria nenhum anteparo”[14].

Por fim, vale ressaltar que o objetivo do Poder Público não pode ser tão somente garantir, juridicamente a propriedade aos seus ocupantes, mas sim, dar continuidade ao exercício do direito de moradia à população e todos os demais direitos constitucionais, o que indubitavelmente será perquirido por meio do processo de regularização fundiária que permita a alienação de imóvel público diretamente ao possuidor, mesmo que este não se encontre dentro das condições que o classifique como de interesse social.

Estudando-se o presente trabalho monográfico, pôde-se constatar o papel fundamental dos municípios, conforme previsão constitucional e sedimentado pela Lei 11.977/09 (PMCMV) e Lei 10.257/01 (Estatuto das Cidades), na formulação de diretrizes de planejamento urbano e na condução do processo de gestão das cidades.

Referido procedimento é de suma importância para a organização das cidades, e sobretudo, para a efetivação de direito fundamentais, como a moradia, saúde, segurança, lazer e meio ambiente sustentável.

Mais do que nunca, cabe aos municípios e às comunidades urbanas promoverem a materialização da garantia constitucional ao direito à moradia, por meio da reforma da ordem jurídico-urbanística.

Nesse contexto, os programas de regularização fundiária devem ter por objetivo não apenas o reconhecimento da segurança individual da posse para os ocupantes, mas principalmente a integração socioespacial das áreas públicas ocupadas.

Outrossim, tem-se que a inexigibilidade de licitação faz-se não somente oportuna, mas, especialmente necessária, pois ela pode assegurar a efetividade das medidas de regularização fundiária, já que não haverá risco do imóvel público ocupado por particulares ser alvo de investida de pessoas estranhas ao processo, munidas de relevante condição financeira capaz de ensejar vitória a uma virtual competitividade.

Ora, é que, a finalidade do ato administrativo de regularização fundiária é a concretização do interesse público-social (bem estar social) pelo implemento de medidas que assegurem aos atuais ocupantes de áreas públicas o direito constitucional à moradia, o que inarredavelmente pode não ser alcançado caso haja competitividade, como no caso de uma licitação pública.

Desta maneira, é com base na farta doutrina e jurisprudência colacionada, é que chega-se a conclusão de que é possível inexigir o procedimento de licitação nos casos de regularização fundiária, desde que observados os requisitos estabelecidos pelas normas de direito pátrio.

 

Referências
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Notas:
[1] Também chamados de DOMINIAIS.

[2] Denominados também bens disponíveis ou bens do domínio privado do Estado.

[3] Inciso II do artigo 5º/ CF: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

[4] http://jus.com.br/artigos/11996/dispensa-e-inexigibilidade-de-licitacao-uma-visao-geral/3

[5]Voto   do relator, ministro Carlos Velloso. Disponível em http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=346697

[6] http://jus.com.br/artigos/24557/competencias-legislativas-concorrentes-o-que-sao-normas-gerais/2

[7] Disponível em: http://www.ipea.gov.br/ppp/index.php/PPP/article/view/176

[8]Disponível em: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=8957

[9] Disponível em: http://www.urbanismo.mppr.mp.br/arquivos/File/Livro_Regularizacao_Fundiaria_Plena_Referencias_Conceituais.pdf

[10] Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=481968.


Informações Sobre os Autores

Lorena Saraiva Teixeira

Advogada

André Luiz Peruhype Magalhaes

Advogado. Mestre em Direito pela FUMEC


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