Resumo: O presente artigo tem por objetivo discutir a noção de populismo em Ernesto laclau, filósofo político argentino. Este nos apresenta um sentido de populismo diferenciado ao costumeiramente apresentado pelos teóricos políticos. Um significado não pejorativo, mas como expressão de uma construção política. Para esse fim, discutir-se-á a definição de povo, como um sujeito coletivo, fora das conceituações da ciência política normativa. Como pano de fundo exemplificador elegeu-se os acontecimentos pré-eleitorais do pleito ao cargo executivo municipal de 1996 na cidade do Rio Grande no RS, assim como as características de apelo ao eleitor, consubstanciada na figura de um individuo transcendente. Nesse sentido, procurou-se discorrer sobre a importância da figura do líder na teorização populista de Laclau e no comportamento do eleitor.
Palavras-chave: populismo; povo; liderança; eleições.
Sumário: 1. Introdução; 2. Do povo a razão populista; 3. Da teoria a aplicação; 4. A representatividade do líder; 5. Conclusão; 6. Bibliografia
1. Introdução
O artigo em tela tem a pretensão de discutir a noção de populismo de laclau inserindo e coadunando a essa discussão os fatores que levaram o PMDB da cidade do Rio Grande/RS a se eleger e a se manter no poder por quase 16 anos. Com isso pretende-se demonstrar o paralelismo do pensamento teórico moderno sobre o populismo e o discurso que mantém uma família no poder em Rio Grande por quase duas décadas. A linha teórica de abordagem constituir-se-á da leitura dos escritos de Ernesto Laclau e sua co-parceria com Chantal Mouffe.
Antes de adentrarmos ao desenvolvimento da questão, faremos algumas considerações iniciais a respeito, do autor e da vida sócio-política da cidade alvo dessa pesquisa.
Ernesto Laclau é um teórico político de nacionalidade argentina freqüentemente chamado de pós-marxista[1]. È professor da Universidade de Essex/UK onde ocupa a cátedra de Teoría política e também é diretor do programa de ideologia e análise discursiva. O livro mais citado de sua carreira literária é Hegemonia e Estratégia Socialista, que escreveu ao lado de Chantal Mouffe, a obra é para muitos a pedra fundacional do pós-marxismo. A vida de partizan de esquerda espraia-se pelos movimentos sociais e estudiantis dos anos 60. Laclau compartilhou do pensamento em unir a classe trabalhadora com novos movimentos sociais. Rechaçou o determinismo econômico marxista e a noção de que a luta de classes é o antagonismo crucial na sociedade.
Posto essa pequena digressão biográfica de Laclau passa-se a caracterizar o ambiente sócio-político da cidade do Rio Grande com a finalidade de revelar a assunção do PMDB local.
Nos idos de 1996, a cidade do Rio Grande, assim como a maioria dos municípios da zona sul do Estado do Rio Grande do Sul passava pelo auge da crise econômica. Situação essa desencadeada por muitos fatores político-econômicos, mas nos focaremos em torno de dois, um conseqüência do outro.
Rio Grande até meados da década de 50, era uma cidade em pleno desenvolvimento, detentora do único porto-marítimo do Estado, que gozava de posição privilegiada no cenário político e econômico do Estado gaúcho. No entanto, uma série de reveses começaram a se acumular, o norte do Estado cataliza os pesados investimentos do governo gaúcho em detrimento da zona sul gaúcha. Os historiadores apontam como uma das causas dessa mudança o germe da mentalidade latifundiária do sul do Estado. A elite política sul riograndense começa a perder prestígio econômico e político, o que poderia se traduzir em perda de combatitividade na busca pelas destinações orçamentária do governo do Estado Gaúcho.
Discussões a parte, a cidade do Rio Grande que já chegou a ter dezenas de fábricas de processamento de pescados, começa a ver o fechamento de um a um dos estabelecimentos industriais. O porto marítimo, antes o motor da cidade encontrava-se sucateado e desprestigiado. As cargas que escoavam das mega safras gaúchas eram exportadas pelos portos catarinenses, que tinham tarifas mais baratas, mão-de-obra mais qualificada, menos dispendiosa, menos numerosa e possuídores de equipamentos de transbordo mais modernos.
Rio Grande, a pesar de ser a célula inicial do processo civilizatório riograndense, encontrava-se ainda no início dos anos 90 a imensa maioria das da ruas sem pavimentação e esgoto.
Os governos municipais, até a métade dos anos 90 adotavam medidas paliativas no combate aos males que afligiam a população. Os discursos dos prefeitos até 1996 giravam em torno da irresponsabilidade do governo do Estado do Rio grande do Sul e na falta de gratidão para com a cidade do Rio Grande.
Nesse âmbito surge no cenário político riograndino um candidato que tinha como plataforma de governo o asfaltamento da cidade, ou melhor a construção de uma usina de asfalto. Segundo as reportagens jornalísticas da época era um candidato populista. Vide a origem humilde – era pescador, que conseguia mobilizar a população com seus discursos.
O candidato era Wilson Mattos Branco, que concorria ao governo municipal sob a sigla do PMDB. Os discursos do então candidato que versavam sobre diversas demandas populares poderiam ser aglutinadas inicialmente sob uma: “asfalto”.
Como resultado do embate dos discursos exarados pelos candidatos ao Executivo municipal, o candidato peemedebista elege-se prefeito da cidade. Muitos analistas de ocasião explicitaram que a vitória deveu-se a grande massa de desempregados que o municipio possuía e que se identificavam com a trajetória de vida do candidato agora eleito prefeito.
Nas eleições posteriores ao pleito do Executivo municipal, nos anos de 2000 e 2004 os discursos do PMDB riograndino mantiveram a linha central da necessidade com pequenas variações. Antes disso, em 1999 o então prefeito Wilson Mattos Branco tem morte súbita em sua residência, as vésperas de mais um ano eleitoral. No jogo político das forças locais lança-se a candidatura do sobrinho do falecido prefeito, apontado como continuísta da personalidade e das obras do tio. Mais uma vez o PMDB saiu vitorioso com ampla maioria dos votos no primeiro turno.
Em fins da gestão de 2000-2004 o prefeito eleito na ocasito Fábio Branco e candidato a reeleição, segundo dados veiculados na imprensa local envolve-se em operações ilícitas. Mais exatamente, uso da máquina do governo na sua campanha eleitoral, episódio conhecido como “o caso das ambulâncias”. Processado pelo Ministério Público e impedido pelo TRE/RS o candidato a reeleição teve que ceder a vez, desta feita ao primo e filho do “iniciador” fora “escolhido” candidato a prefeitura pelo PMDB nas eleições de 2004.
Deja vu, o candidato Janir Branco, outro membro da família Branco é eleito prefeito da cidade do Rio Grande com maioria esmagadora e assim como seu primo, fora eleito ainda no primeiro turno no pleito de 2004.
No que tange ao discurso, o continuísmo vêm carreando uma certa coerência com a linha de discurso primária desenvolvida pelo ex-prefeito Wison Mattos Branco. Todos os prefeitos da família Branco e peemedebistas mantiveram o mote de seus discursos.
A partir da caracterização desse cenário discursivo passaremos a tentativa de aplicar a teoria discursiva “laclauniana” ao caso da família “Branco”.
2. Do povo a razão populista
Na obra “A razão populista” Laclau faz uma original defesa do populismo como práxis política. Constata, primeiramente, que o populismo em geral é definido em termos negativos e preconceituosos, tais como: fenômeno transitório derivado da imaturidade dos atores sociais, manipulador, mera retórica, sendo contraposto à ação política racional. O apelo populista normalmente é visto como algo vago, sendo expressão de uma crise e fragilidade das instituições, como uma fórmula ambígua e instável que tende a se esgotar e a ser superado, como algo irracional.
Contrariamente, Laclau considera que o populismo é um modo de construir o político que nasce quando demandas sociais não encontram respostas no sistema institucional, e que a vaguidade dos discursos populistas é expressão da “vaguedade” e indeterminação da própria realidade social.
A luz do pós-estruturalismo e da teoria psicanalítica (especialmente de Freud e Lacan), o populismo é pensado por Laclau como uma prática política específica, uma lógica do social e um modo específico de construir o político. Olhados por esse prisma, a imprecisão e indeterminação da linguagem populista, sua retórica, a paixão que desperta e seus símbolos, constituem objetos de análise que são legítimos, em vez de ser meras expressões de sua suposta natureza patológica. Deste modo, o foco de análise é o conjunto de estratégias discursivas e as condições que tem feito historicamente possível à emergência do discurso populista e a identidade coletiva povo.
Uma das características do populismo segundo Laclau (2005) é a presença de uma dimensão anti-institucional, um certo desafio à normalização política, à ordem usual das coisas, um “chamado aos de baixo”. Laclau discorda de que o momento institucional seja o único válido, afirmando a legitimidade do movimento de mobilização. Entende Laclau que não existe nenhuma intervenção política que não seja, até certo ponto, populista. O contrário a isto é transformar o ato político em ato administrativo, em pura manipulação elaborada por marqueteiros. O populismo é um ponto de partida para a reconstrução mais ou menos radical de uma nova ordem política, uma vez que a anterior se encontra debilitada.
Depois de Laclau ter esclarecido e retirado o significado pejorativo de populismo passamos a “criação” do povo. A idéia é que o populismo se origina em uma forma de articulação que permite a multidão iniciar um processo de subjetivação em direção a um sujeito povo.
Desta maneira cobra sentido a referência aos lugares comuns e aos especiais, o povo é um processo de articulação não antagônica de posições de sujeitos subalternos (em sua particularidade), é uma construção permanente a partir desses lugares especiais que põe em questão os lugares comuns. Quando o lugar comum nega os lugares especiais e essas situações opressivas passan a ser vistas como uma dominação, o deslocamento da significação dessa relação social produz um conflito. No marco desse conflito produzido tem origem a articulação populista.
O populismo é uma forma de articulação política, é um processo que necessita e constitui ao povo, assim “O povo nunca é senão um fazer-se povo, ou seja, sujeito. Ser povo significa ter uma voontade comum como articulação de millares de milões de vontades, não meramente por individuos, por particulares sim por coletividades, por grupos que se constróem como sujetos”. (Laclau, 2005) Desta maneia o povo, como uma construção histórica de sujeitos vinculados pela práctica e um sentido compartilhado (discurso) não necessariamente homogeniza e dissolve a diferença cultural, ma as sintetiza, isto é, conserva as identidades particulares em uma forma articulatória dinâmica emoldurada em relações sociais, apropiações coletivas da história e relações com a alteridade.
Se não for desse modo estaremos atrás das pegadas de certo populismo que como diz Laclau “consiste na apresentação das interpretações popular-democráticas como conjunto sintético antagônico a respeito da ideologia dominante” (1978:201)
Em suma, Laclau aborda o tema do populismo principalmente a partir da ideologia, e esta como discurso, que deve entender-se no marco da luta de classes. Para Laclau o populismo não é um movimento sociopolítico, nem um tipo particular de organização, nem tão pouco um regime estatal. Para este intelectual se trata de um fenômeno de ordem ideológica que pode estar presente no interior de movimentos, organizações e regimes de variada base social e orientações políticas muito divergentes. O populismo começa no ponto em que os elementos popular-democráticos se apresentan como opção antagônica frente à ideología do bloco dominante. Depois desse breve exercício descritivo, podemos concluir assim com base no discorrido que o populismo se define em fórmulas políticas, pelas quais o povo, considerado como conjunto social homogêneo e depositário exclusivo de valores positivos, específicos e permanentes, é fonte principal de inspiração e objeto constante de referência.
3. Da teoria a aplicação
Metodologicamente, assim como Laclau, com o fito de análise do discurso do PMDB em Rio Grande, adotaremos como unidade de análises as demandas populares. Conforme o exposto e fazendo uma breve recapitulação Laclau afirma que a unidade do objeto, povo é um efeito retroativo do ato de nomeá-lo.
Aqui encontramos a agudeza metodológica de sua proposta, a condição social do dito nomeamento, que o constitui em um significante vazio capaz de dar unidade a cadeias equivalenciais diferenciadas, se encontra na existência de demandas preexistentes reunidas em dita cadeia. Deste modo, existe o povo na medida em que esse nome se esvazia de conteúdo e se converte em catalisador de demandas que, se bem antes eram heterogêneas, agora se reúnem e estabelecem entre si una relação equivalencial. A estrutura deste processo é de natureza retórica.
A partir de um exemplo in concreto exposto em sequência visualizar-se-á na prática a teoria em alume.
Em Rio Grande, no período pré-eleitoral de 1996 ocorreu uma série de protestos num bairro da periferia da cidade denominado Getúlio Vargas, nome peculiar quando se fala em populismo. Os manifestantes reivindicavam legalização dos imóveis e melhores condições sanitárias para a localidade, tendo em vista ser um bairro de trabalhadores portuários, muito próximos ao centro da cidade, precário em urbanização, o que comprometia a salubridade da população lá residente.
A prefeitura municipal da época não atendia a demanda daquele grupo de moradores, ocorrendo uma frustração da mesma. Na área em que a demanda teve origem existiam outras demandas acerca de habitação (regularização dos terrenos por ser área de marinha), escolaridade (abertura de uma creche), criação de postos de trabalho etc. Estas demandas em conjunto com a demanda inicial criaram um sentimento vago de solidariedade entre todas as demais. Criando-se assim, uma comunidade de oposição a respeito de algo chamado “o sistema”, esse é o terreno fértil para o populismo.
No que concerne a suas especificidades, essas demandas são muito distintas, todavia, no que se refere à oposição ao sistema, elas passam a estabelecer entre si uma relação de equivalência. Em outras localidades de Rio Grande, existiam outras demandas populares advinda da mobilização da população pela melhoria das condições de vida. Assim podemos ter a extensão de um conjunto indefinido de demandas.
Segundo a lógica de Laclau se as demandas forem individualmente satisfeitas por meios administrativos não há equivalência entre elas, porém se não são satisfeitas tem-se a possibilidade de se criar uma relação equivalencial e essa passa a se constituir num sentido de homogeneidade. E é o que aconteceu no município do Rio Grande, onde a cadeia equivalencial se estendeu o suficiente a ponto de simbolicamente poder se representar como um todo. Isso aconteceu porque formada por demandas individuais, uma delas se destacou, mais especificamente, a demanda pelo asfaltamento das ruas da perféria da cidade, assumindo esta a função de representar sua totalidade. Entretanto, a demanda que faz isso não pode diretamente representar a cadeia como um todo, pois que passa a representar algo que é muito maior que ela.
O que se tem é certa particularidade assumindo a função de uma totalidade que lhe excede, o que segundo Laclau implica uma relação hegemônica. Para o mesmo, hegemonia é uma particularidade que assume certa função universal. Introduz, assim também Laclau, a noção da dimensão do significante vazio. Sobre a idéia de significante vazio sustenta que quanto mais ampla certa cadeia de equivalência for, menos a demanda que assume a responsabilidade de representá-la como um todo vai possuir um laço estrito com aquilo que constituía originariamente como particularidade.
Quer dizer, para ter a função de representação universal, a demanda vai ter que se despojar de seu conteúdo preciso e concreto, afastando-se da relação com seu(s) significado(s) específico(s), transformando-se em um significante puro que é o que conceitua como sendo um significante vazio.
Isso implica no fato de que um significante perde sua referência direta a um determinado significado porque os símbolos têm necessariamente que ser vagos e imprecisos para poder representar uma totalidade que não pode ser representada de forma direta tendo em vista que representa uma totalidade de elementos que são essencialmente heterogêneos entre si. Aqui, para Laclau é onde encontramos o ponto oculto dessa cadeia equivalencial, ou seja, encontramos o significante que não tem significado preciso, pois se refere a uma extensão que lhe é maior.
Com isso, coloca que temos os três elementos importantes para entender como um povo constitui-se como ator coletivo, isto é, temos a relação equivalencial, o vínculo hegemônico e o significante vazio.
Assim, afirma que, se encontramos na sociedade distintos graus de pobreza, insegurança, marginalidade precisamos entender isso dentro de uma lógica de homogeneidade e de heterogeneidade que entra num processo de contaminação mútua. Neste aspecto a recomposição das identidades coletivas por meio dessa combinação entre o homogêneo e o heterogêneo passa constitutivamente pelo momento de articulação política. Por articulação política Laclau entende certa heterogeneidade que se restringe por lógicas homogeneizantes que partem da heterogeneidade mesma para assim poder criar novas identidades coletivas.
Para o filósofo político, os grupos de inclusão referem-se a experiências muito precisas que ocorrem em distintos lugares do mundo, mas cuja linguagem é universal e essa universalidade opera por meio da diversidade. Tendo-se que pensar num tipo de universalidade hegemônica que é uma universalidade que se constrói equivalencialmente através da própria heterogeneidade.
4. A representatividade do líder
Segundo Laclau (2005) o requerimento de uma ordem social demanda um representante. Esse representante é um pressuposto dessa ordem. O representante seria um elo da cadeia equivalencial. De acordo com o autor uma vez que tem tido lugar algumas identificações políticas básicas, ou seja, através da retórica, podem dar-se as razões das decisões e eleições particulares, mas estas últimas requerem como ponto de partida uma identidade que não precede, senão que é o resultado do processo de representação.
Seria a representação um movimento que vai do representante aos representados. Para Laclau é necessária uma investidura ontológica, vale dizer um líder. Assim, a identificação como um pressuposto da representação, somente procede através da investidura ontológica, ou seja, um líder. Não existindo identificação, nem representação sem a presença de um líder, “como a encarnação de uma universalidade vazia”, que transcende a particularidade da força hegemônica que o é somente porque se identifica em virtude dessa encarnação.
O professor argentino continua a afirmar que não é o caso de que exista uma particularidade que simplesmente ocupe um espaço vazio, senão uma particularidade que, porque ter triunfado em uma luta hegemônica para converter-se no significante vazio da comunidade, tem um direito legítimo a ocupar esse lugar.
O líder seria a encarnação plena de uma ausente comunidade, tem legítimo direito porque soube homogeneizar através da retórica as diferentes demandas. Frente à questão democrática o autor afirma: a lógica da encarnação continua operando sob condições democráticas. A democracia somente pode fundar-se na existência de um sujeito democrático, cuja emergência depende da articulação vertical, ou seja, de cima para baixo entre demandas equivalenciais, que o são por ter algo vazio em comum.
Um conjunto de demandas equivalenciais articuladas por um significante vazio, leia-se um líder que maneje bem a retórica, é o que constitui um “povo”. Portanto, a possibilidade mesma da democracia depende da constituição de um “povo” democrático[2].
Ernesto Laclau em entrevista ao Jornal El Clarín expõe que quando as demandas das bases não encontram inscrição nos modelos institucionais normais se dá a identificação com um elemento trascendente que é a figura aglutinante do líder. Esse seria um traço geral de todos os regimes populares.
Nesse sentido o autor expõe que no populismo estão presente dois elementos centrais: a mobilização de baixo e a identificação do elemento acima. Sendo que os discursos da direita tratam de dizer que somente é a identificação desde cima com o lídero que conta e não vêem o processo de mobilização de baixo. Mas os dois elementos estão em tensão. Muitas vezes a identificação com o líder se confunde com autoritarismo, mas pode haver identificação com o líder e mobilização de massas ao mesmo tempo que aumenta a participação democrática[3].
Por fim na diferença com o discurso institucionalista, o discurso populista tem uma exclusão radical dentro do espaço comunitário, assim nele a plebe (os menos privilegiados) reclama ser o único populus (corpo de todos os cidadãos) legítimo. Com isso, uma particularidade aspira a funcionar como totalidade comunitária em um espaço fraturado pelo antagonismo constitutivo.
Neste caso a hegemonia é produto de uma identidade popular e esta última se encontra internamente dividida, por um lado é uma demanda particular, por outro é o significante de uma universalidade mais ampla. Logo, se a cadeia equivalencial como totalidad é extensa, a identidade popular funciona como um significante com tendência ao vazio. Isto acontece porque toda unificação populista acontece em um terreno social heterogêneo e alí, o nome do líder na singularidae da identificação dá certa unidade do grupo[4].
5. Conclusão
No populismo de Laclau há o valor passional e afetivo que é tão próprio da construção de identidades coletivas e da luta política. Laclau faz uso desses fatores não-racionais das análises sociais e políticas. Em conseqüência, apresenta-nos a lógica hegemônica da política. O que por si só diferencia-o de qualquer outro teórico político.
O populismo, segundo a ótica do teórico, significa a articulação política de setores subalternos, inscrito como povo, uma construção hegemônica no plano do simbólico, uma operação de sutura (re)constituinte do sujeito em um projeto coletivo da orden social. Desta maneira o populismo produz a reabertura do político sobre as ruínas da política, e é reconstitutivo do social.
Não existe nenhuma ordem pública sem exclusões, e o pleito eleitoral não é mais do que uma tentativa de impor um discurso hegemônico em face de outras tentativas semelhantes. Podemos dizer que a essência da política é a luta contra ou a favor de determinada ordem hegemônica. Gramsci deu o mote e Laclau e Mouffe ontologizaram a coisa, universalizando-a. Laclau defende que esta luta constante por um determinado mundo público de significados (a possibilidade de existir política depende da existência de uma contestabilidade permanente) pressupõe que não exista uma verdade por detrás das aparências (das diferentes lutas particulares que vão animando a história) e que, à esquerda e à direita, é isto, e só isto, que existe.
Nesse panorama o uso de um discurso aglutinador pelo então prefeito Wilson Mattos Branco, que abarcou a universalidade de demandas atraiu não somente o eleitorado como cooptou partidos teoricamente de oposição. Numa sistema discursiva que hodiernamente ultrapassa as fronteiras discursivas enveredando-se criação de uma burocracia administrativa municipal organicamente dependente dos cargos criados na municipalidade.
Notas:
[1] Em “Desconstrução, Hegemonia e Democracia: o Pós-Marxismo de Ernesto Laclau”, Burity expõe que: “pós-marxismo” é um esforço para dar conta rigorosamente do status das “apropriações”, “influências” ou “articulações” entre o arsenal analítico e político do marxismo e as correntes e movimentos externos àquele com os quais se buscaram alianças para enfrentar aspectos do desenvolvimento da sociedade capitalista ausentes ou mal trabalhados nos clássicos do marxismo. Dentre esses campos teóricos, salientam-se aqueles que se ocupavam de questões ligadas à subjetividade (ex. psicanálise), à crítica da concepção positivista de realidade, do “dado” (ex. fenomenologia e filosofia analítica), à relação entre linguagem e o social (linguística estrutural), e mais significativamente, enquanto moldura da própria empreitada laclauiana, a crítica da tradição onto-teo-lógica da metafísica de Heidegger (e sua radicalização em Derrida).
Informações Sobre o Autor
Paulo Sérgio Mansija Pinto
Advogado; Professor Universitário. Graduado em Direito e formando em Letras-português – FURG, Especialista em: Ciência Política – UFPEL, Sociologia – UFPEL, Direito Ambiental – UFPEL, Mestre em Sociologia – UFPEL, Mestrando em Gerenciamento Costeiro – FURG