Análise dos atos administrativos realizados pelas agências reguladoras frente ao poder judiciário

Resumo: O presente trabalho tem por finalidade estudar e analisar a competência do Poder Judiciário de rever e invalidar atos administrativos discricionário das Agências Reguladoras. Para isto, tratou das características que tornam tais autarquias em regime especial. Aborda, ainda, suas funções (fiscalizadora, normativa e reguladora) como órgão regulador de setores econômicos e serviços públicos não estatais, e os atos discricionários técnicos editados pelas agências reguladoras. Desta maneira, conclui que todos os atos discricionários, técnicos ou não, das agências executivas são passíveis de apreciação judicial, em consonância com a Constituição Federal, quando ilegítimos, ilegais e quando lesam direitos dos administrados.[1]

Palavras-chave: Ato administrativo; Poder Judiciário; Agências Reguladoras.

Abstract: Thisstudy aims tostudy and analyzethe competenceof the judiciaryto review andinvalidatediscretionaryadministrative actsof Regulatory Agencies.For this,it treatedthe features that maketheseauthoritiesfor special duties. Addressesalsoits functions(supervisoryandregulatory) as regulatorofeconomic sectorsandpublic servicesnon-state and technicaldiscretionaryacts issuedby regulatory agencies. Thus, we conclude that alldiscretionaryactions,technical or otherwise, the executive agenciesare subject tojudicial review, in line with theFederalConstitution, asillegitimate, illegaland whenharmingrights of citizens.
Keywords:Administrative act; Judicial power;Regulatory Agencies.

Sumário: Introdução. 2. Objetivo. 3. Metodologia. 4. Desenvolvimento. Conclusão.

Introdução

Em decorrência da globalização no Brasil, principalmente na década de 90, o Estado passou ainiciativa privada a prestação direta de alguns setores econômicos e de serviços públicos, a chamada desestatização. Houve a descentralização do Estado, que criou pessoa de personalidade jurídica de direito público e privado, para realização dos serviços por sua conta e risco, com fundamento no artigo 37, inciso XIX da Constituição Federal.

Surgem neste período as primeiras agências reguladoras previstas na Lei Maior nos artigos 21, inciso XI e 177, §2º, inciso III, e na década de 2000 tem-se um boom com a criação de outras mais.São elas órgãos responsáveis pela execução, pela fiscalização, normatização, regulação, e em alguns casos, fomento, de setores econômicos e de prestação de serviços públicos que foram privatizados, com o objetivo de garantir o equilíbrio do mercado.

Atuando, para isto, por meio de edição de atos administrativos, vinculados e discricionários, que mesmo diante da autonomia legal que possuem tais órgãos, deverão ser editados em conformidade com as normas legai, sob pena de serem invalidados ou anulados, pela própria administração pública (princípio da autotutela) ou pelo Poder Judiciário, quando provocado.

2. Objetivo

Estudar as características gerais e específicas que tornam as Agências Executivas autarquias de regime especial, para verificar a possibilidade de apreciação de seus atos administrativos discricionários pelo Poder Judiciário.

3. Metodologia

Este trabalho tem como método a pesquisa bibliográfica documental de doutrinas, artigos científicos e da legislação sobre o assunto.

4. Desenvolvimento

A pretensão do Estado com a criação das agências executiva foi de disciplinar os setores econômicos, não os deixando ao bel prazer das concessionárias e prestadoras de serviços públicos. Nas palavras de Sundfeld (2000, apud ALEXANDRINO; PAULO, 2011, p. 161),

“Se o Estado abdicasse totalmente do poder se interferir na prestação de serviços públicos privatizados e na correspondente estrutura empresarial, correria o risco de assistir passivamente, ao colapso de setores essenciais para o País, como o setor elétrico e o de telecomunicações.”

A verdade é que as agências reguladoras não são novidade no Brasil, o termo agência que é novo no país, copiado das famosas agências federais dos Estados Unidos, segundo o ilustre Celso Antonio Bandeira de Mello (2001, p. 133-134),

“Apareceu no ensejo da tal “Reforma Administrativa”, provavelmente para dar sabor de novidade ao que é muito antigo, atribuindo-lhe, ademais, o suposto prestígio de ostentar a terminologia norte-americana (“agência”). A autarquia Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica – DNAEE, por exemplo, cumpria exatamente a finalidade ora irrogada à ANEEL, tanto que o art. 31 da lei transfere à nova pessoa todo o acervo técnico, patrimonial, obrigações, direitos ereceitas do DNAEE”.

Estas entidades reguladoras possuem regime especial, o que lhes atribuem características peculiares e lhes garantem maior autonomia, se comparadas as autarquias comuns, proporcionadas pela sua lei instituidora.

A primeira singularidade é que os dirigentes das Agências Reguladoras são nomeados pelo Presidente da República após aprovação do Senado, com mandatos por tempo determinado, de três ou quatro anos. Possuem estabilidade no cargo, ou seja, não podem ser despedidos conforme a conveniência dos governantes, mas somente se cometerem falta grave, apurada mediante devido processo legal (BARROSO, 2005).

A característica mais expressiva destes entes públicos encontra-se na Carta Política de 1988no caput do artigo 174, quegarante ao Estado o poder normativo e regulador da atividade econômica, poder que, em geral, é exercido pelas agências reguladoras devido a descentralização administrativa. No exercício de seu poder normativo, estes entes administrativo, não poderão inovar primariamente a ordem jurídica, ou seja, não poderão regulamentar matéria da qual inexiste conceito genérico em sua lei instituidora, tão pouco poderá criar ou aplicar sanções que não estejam em lei(MORAES, 2003).

Além da função normativa, as agências tem a regulatória, na qual fiscalizam, atuam na composição de conflitos e eventualmente aplicam as sanções, prevista em lei. A atividade regulatória tem por objetivos manter a competitividade no mercado ou garantir que não haja abuso do poder econômico sobre a sociedade. Para isto, as agências executivas controlam as tarifas, assegurando o equilíbrio econômico-financeiro; evitam a constituição de monopólios; fiscalizam os contratos de concessão e permissão de prestação de serviços públicos; e, arbitram os conflitos entre consumidores, concessionários, poder concedente, a comunidade como um todo, etc. (BARROSO,2005).

Outra característica, que torna as agências reguladoras autarquias em regime especial, é que suas decisões não são submetidas à revisão por órgão hierarquicamente superior, isto quer dizer que possuem independência decisória. (BUENO FILHO, 2003).

O ato administrativo é meio utilizado pela Administração Pública para realização de suas funções sociais, e podem ser vinculados ou discricionários, dependendo do tipo de atividade ou serviço que deverão desenvolver.Nas palavras do saudoso professor Helly Lopes (2006, p.149),“Ato administrativo é toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública, que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direito, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria.”

Não é diferente para as Agências Reguladoras, mesmo sendo autarquias em regime especial, são parte da Administração Pública e, portanto, suas atividades, em geral, são feitas por meio de atos administrativos.

“[…]os atos praticados pelas agências são administrativos, independentemente de sua substancia, pouco importando a forma. Tanto podem ser atos concretos e específicos, como podem assumir o aspecto normativo e expressar regras gerais e abstratas”.(BUENO FILHO, 2003 p. 29)

Os atos administrativos praticados pelas agências reguladoras, muitas vezes, se fundam na discricionariedade técnica, fato que se deve por cada um destes órgãos trabalharem em setores específicos e diferentes da economia. A discricionariedade ocorre quando o agente público tem liberdade para determinar “se, quando e como” o ato administrativo deve ser realizado.Para professora Maria Sylvia (2007, p. 5):

“[…] existem casos em que a referida apreciação exige a utilização de critérios técnicos e a solução de questões técnicas que devem realizar-se conforme as regras e os conhecimentos técnicos, como, por exemplo, quando se trata de ordenar o fechamento de locais insalubres […].”

Os atos administrativos são considerados perfeitos, válidos e eficazes quando reúnem os cinco requisitos impostos pela norma, direta ou indiretamente,competência, finalidade, forma, motivo e objeto (FARIA, 2011). Porém quando algum destes elementos apresentarem defeito poderá ser revogado ou anulado.

A Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal traz que a Administração Pública poderá revogar ou anular o ato administrativo de editou, pelo princípio da autotutela, com efeitos ex nunc. Contudo a referida Súmula não afasta a apreciação pelo Judiciário, quando houverindícios de ilegitimidade ou ilegalidade do ato praticado, que poderá anulá-lo, produzindo efeito ex tunc. Desta Forma, pautados no artigo 5º, XXXV da Constituição Federal, nossos Magistrados poderão apreciar atos administrativos, declarando ou não sua legalidade quando evidente que o ato lesa ou ameaça direitos.

Os atos administrativos passíveis de serem analisados e serem anulados por nossos Tribunais são os discricionários, pois quanto aos vinculados basta que se verifique a inconformidade com a norma para que sejam declarados nulos. É a autonomia conferida ao administrador para praticar atos diante de casos concretos que pode gerar ilegitimidades e ilegalidades, que poderão ser arguidas perante o Poder Judiciário, que verificará os requisitos de validade do ato e os motivos de sua existência, podendo declará-lo nulo ou não (DO VAL; GIOSA, 2009).

Logo, os atos discricionários técnicos ou não, normativos ou meramente de expediente, editados pelas agências reguladoras também estão sujeitos a apreciação pelo Poder Judiciário, quanto sua legalidade, legitimidade e motivação. Esta passou a ser exigida pelo controle judicial para verificação da racionalidade da decisão em relação aos fatos, pois em hipótese alguma, o Judiciário realizará juízo de oportunidade e conveniência, tão somente objetiva observar se a agência levou em consideração entre os fatos (motivo) e a limitação legal (DI PIETRO, 2007).

Considerações finais

Devido ao processo de descentralização administrativa estes entes públicos ficaram incumbidos de fiscalizar, normatizar e regular certos setores econômicos e de prestação de serviços públicos.

Assim como os demais órgãos da Administração Pública, as agências executivas desempenham suas atribuições e funções por meio de atos administrativos vinculados e discricionários, em seus casos, há ainda, utilizam-se muito da discricionariedade técnica.

Porém, a autonomia garantida a estas autarquias especiais não é prerrogativa absoluta, portanto, quando se verifica que um ato administrativo expedido por estas, discricionários ou não, é ilegítimo ou ilegal, e passível de lesar direitos, também estarão sujeitos ao controle jurisdicional, como defendido pela Constituição Federal vigente.

Referências
ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. 19ª ed. rev. e atual. São Paulo: Método, 2011.
BANDEIRA DE MELLO, Celso  Antonio. Curso de direito administrativo. 13 ed. São Paulo: Malheiros, 2001.
BARROSO, LuisRoberto. Constituição, ordem econômica e agências reguladoras. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico – REDAE – n.1 fev./ mar./ abr. 2005. Disponível em : www.direitodoestado.com.br. Acesso em 02 jul. 2014.
BRASIL. Constituição Federal de 1988. Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05 de outrubro de 1988. Portal da Legislação – Senado Federal. Disponível em: http://www4.planalto.gov.br/legislacao.
BUENO FILHO, Edgard Silveira. Agências reguladoras e concorrências e o controle jurisdicional dos atos. Rev. CEJ, Brasília n. 23 out./ dez. 2003 p. 26 – 30.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade técnica e discricionariedade administrativa. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico – REDAE n. 9 fev./ mar./ abr. 2007. Disponível em : www.direitodoestado.com.br. Acesso em 09 ago. 2014.
DO VAL, Caroline Teno Ribeiro; GIOSA, Angélica. Da ação discricionária do administrador público. Universidade Estadual de Maringá – UEM. Graduação em Direito. Maringá: 2009.
FARIA, Edimur Ferreira de.Curso de direito administrativo positivo. 7ª ed. rev e ampl. – Belo Horizonte: Del Rey, 2011.
MEIRELLES, Hely Lopes et al. Direito administrativo brasileiro. 32ª ed. – São Paulo: Malheiros, 2006.
MORAES, Alexandre de. Agências Reguladoras. Site: Mundo Jurídico. Disponível em: www.mundojuridico.adv.br. Publicado em 10 mai. 2003. Acesso em 05 set. 2014.
 
Nota:
[1]Trabalho orientado pela Profa. Angélica Giosa Cândido Professora e Coordenadora do Curso de Direito da UNIPAR/Paranavaí; Mestranda em Direito Processual Civil e Cidadania na UNIPAR/Umuarama.


Informações Sobre o Autor

Juliana Luiza Mazaro

Acadêmica de Direito da UNIPAR/Paranavaí; Policial Científica do Paraná – Auxiliar de Perícia Oficial; Bacharel em Enfermagem pela Faculdade Estadual de Ciências e Letras de Paranavaí


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