Análise jurisprudêncial dos princípios da prevenção e da precaução

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Resumo: O presente artigo tem como objetivo analisar a argumentação das decisões jurídicas, enfocando a aplicação do princípio da prevenção e o princípio da precaução, como fundamento para a defesa do meio ambiente nas mais diversas lides existentes em nossa sociedade.


Palavras-chave: princípio; prevenção; proteção; jurisprudência; lide.


Abstract: This article aims to analyze the arguments of legal decisions, focusing on the application of the precautionary principle and protection principle s a basis for environmental protection in several conflicts existing in our society.


Keywords: principle; precautionary; protection; case; conflicts.


Sumário: 1 Meio Ambiente. 2 Princípio da prevenção. 3 Princípio da precaução. 4 Posição jurisprudencial. 4.1 Posicionamento do Supremo Tribunal de Justiça. 4.2 Posicionamento do Tribunal do Estado do Rio Grande do Sul.


1 – Meio Ambiente


A Constituição Federal, determina no artigo 225 que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.


Envolto por inúmeras leis e códigos, o meio ambiente tornou-se, sem sombra de dúvida, motivo de grandes polêmicas e preocupações, visto os inúmeros problemas e impactos ambientais.


O Direito ambiental traz diversos princípios que demonstram a importância desse instituto, sendo eles, o desenvolvimento sustentável, precaução, prevenção, poluidor pagador, integração e diversos outros.


2 – Princípio da prevenção


O princípio faz-se presente a partir de uma brilhante percepção de que os danos geralmente quando atingem o meio ambiente, são irreversíveis, irreparáveis e, quando são reversíveis denotam alto custo e/ou muito tempo para o re-equilíbrio da saúde do meio ambiente.


Neste princípio “previne-se porque se sabe quais as conseqüências de se iniciar determinado ato, prosseguir com ele ou suprimi-lo. O nexo causal é cientificamente comprovado, é certo, decorre muitas vezes até da lógica”¹.


Tendo presente esse fundamento é realmente necessário, frente a idéia do risco, prevenir, visto que, é melhor prevenir do que futuramente tentar reverter um quadro duvidoso, de risco.


3 – Princípio da precaução


Objetiva esse princípio de que quando for impossível prevenir, dever-se-á utilizar a análise do que será implantado, valorando o meio ambiente, seguindo sempre a partir da lógica, in dubio pro meio ambiente.


Este princípio é a tradução da busca da proteção da existência humana, seja pela proteção de seu ambiente como pelo asseguramento da integridade da vida humana. A partir desta premissa, deve-se também considerar não só o risco eminente de uma determinada atividade, como também os riscos futuros decorrentes de empreendimentos humanos, os quais nossa compreensão e o atual estágio de desenvolvimento da ciência jamais conseguem captar em toda densidade¹.


Esse princípio está diretamente ligado à atuação preventiva. Ambos objetivam proporcionar meios para impedir que ocorra a degradação do meio ambiente, ou seja, são medidas que, essencialmente, buscam evitar a existência do risco1


Percebe-se com isso, que ele é prioritariamente utilizado quando o risco de degradação do meio ambiente é considerado irreparável, ou o impacto negativo ao meio ambiente é tamanho, que exige a aplicação imediata das medidas necessárias à preservação¹.


4 – Posição jurisprudencial


A jurisprudência primeiramente por ser uma das fontes do direito, apresenta-se como muito importante para acompanhar o posicionamento dos Tribunais, frente as decisões. Serão analisados os julgados do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal do Estado do Rio Grande do Sul.


4.1 Posicionamento do Supremo Tribunal de Justiça


Posiciona-se o STJ em julgado relevando que a proteção do meio ambiente, dá-se  com base nos princípios dentre os quais, está o princípio da prevenção.


PROCESSO CIVIL. DIREITO AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA TUTELA DO MEIO AMBIENTE. OBRIGAÇÕES DE FAZER, DE NÃO FAZER E DE PAGAR QUANTIA. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE PEDIDOS ART. 3º DA LEI 7.347/85. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA. ART. 225, § 3º, DA CF/88, ARTS. 2º E 4º DA LEI 6.938/81,  ART. 25, IV, DA LEI 8.625/93 E ART. 83 DO CDC. PRINCÍPIOS DA PREVENÇÃO, DO POLUIDOR-PAGADOR E DA REPARAÇÃO INTEGRAL.


1. O sistema jurídico de proteção ao meio ambiente, disciplinado em normas constitucionais (CF, art. 225, § 3º) e infraconstitucionais (Lei 6.938/81, arts. 2º e 4º), está fundado, entre outros, nos princípios da prevenção, do poluidor-pagador e da reparação integral. Deles decorrem, para os destinatários (Estado e comunidade), deveres e obrigações de variada natureza, comportando prestações pessoais, positivas e negativas (fazer e não fazer),  bem


como de pagar quantia (indenização dos danos insuscetíveis de


recomposição in natura), prestações essas que não se excluem, mas, pelo contrário, se cumulam, se for o caso.


2. A ação civil pública é o instrumento processual destinado a propiciar a tutela ao meio ambiente (CF, art. 129, III). Como todo instrumento, submete-se ao princípio da adequação, a significar que deve ter aptidão suficiente para operacionalizar,  no plano jurisdicional, a devida e integral proteção do direito material. Somente assim será instrumento adequado e útil.


3. É por isso que, na interpretação do art. 3º da Lei 7.347/85 (“A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer”), a conjunção “ou” deve ser considerada com o sentido de adição (permitindo, com a cumulação dos pedidos, a tutela integral do meio ambiente) e não o de alternativa excludente (o que tornaria a ação civil pública instrumento inadequado a seus fins). É conclusão imposta, outrossim, por interpretação sistemática do art. 21 da mesma lei, combinado com o art. 83 do Código de Defesa do Consumidor (“Art. 83. Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela.”) e, ainda, pelo art. 25 da Lei 8.625/1993, segundo o qual incumbe ao Ministério Público “IV – promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei: a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente (…)”.


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4. Exigir, para cada espécie de prestação, uma ação civil pública autônoma, além de atentar contra os princípios da instrumentalidade e da economia processual, ensejaria a possibilidade de sentenças contraditórias para demandas semelhantes, entre as mesmas partes, com a mesma causa de pedir e com finalidade comum (medidas de tutela ambiental), cuja única variante seriam os pedidos mediatos, consistentes em prestações de natureza diversa. A proibição de cumular pedidos dessa natureza não existe no procedimento comum, e não teria sentido negar à ação civil pública, criada especialmente como alternativa para melhor viabilizar a tutela dos direitos difusos, o que se permite, pela via ordinária, para a tutela de todo e qualquer outro direito.


5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido.” 2


O STJ frente ao princípio da precaução, demonstra seu entendimento no recurso especial 972902, quando faz menção a inversão do ônus da prova, conforme segue:


PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DANO AMBIENTAL – ADIANTAMENTO DE HONORÁRIOS PERICIAIS PELO PARQUET – MATÉRIA PREJUDICADA – INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA – ART. 6º, VIII, DA LEI 8.078/1990 C/C O ART. 21 DA LEI 7.347/1985 – PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO.


1. Fica prejudicada o recurso especial fundado na violação do art. 18 da Lei 7.347/1985 (adiantamento de honorários periciais), em razão de o juízo de 1º grau ter tornado sem efeito a decisão que determinou a perícia.


2. O ônus probatório não se confunde com o dever de o Ministério Público arcar com os honorários periciais nas provas por ele requeridas, em ação civil pública. São questões distintas e juridicamente independentes.


3. Justifica-se a inversão do ônus da prova, transferindo para o empreendedor da atividade potencialmente perigosa o ônus de demonstrar a segurança do emprendimento, a partir da interpretação do art. 6º, VIII, da Lei 8.078/1990 c/c o art. 21 da Lei 7.347/1985, conjugado ao Princípio Ambiental da Precaução.


4. Recurso especial parcialmente provido3.


3.2. Posicionamento do Tribunal do Estado do Rio Grande do Sul.


O Tribunal do Rio Grande do Sul, sempre pioneiro em seus julgados, tem inúmeros casos em que trata dos princípios supra descritos, demonstrar-se-á a seguir, relevando o princípio da prevenção e o princípio da precaução:


AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONSTRUÇÃO DE RESIDÊNCIA SEM ANTERIOR LICENCIAMENTO JUNTO AO ÓRGÃO AMBIENTAL. SUSPENSÃO DAS ATIVIDADES DE CONSTRUÇÃO. LICENCIAMENTO QUE SE APRESENTA IMPRESCINDÍVEL, POIS VISA GARANTIR QUE AS MEDIDAS PREVENTIVAS E DE CONTROLE ADOTADAS NO EMPREENDIMENTO SÃO COMPATÍVEIS COM O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO, DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO E DO DEVER DE TODA A COLETIVIDADE E DO PODER PÚBLICO DE DEFENDÊ-LO E GARANTI-LO. SUSPENSÃO DA CONSTRUÇÃO QUE ENCONTRA AMPARO NO DECRETO Nº 6.514/08, QUE DISPÕE SOBRE AS INFRAÇÕES E SANÇÕES ADMINISTRATIVAS AO MEIO AMBIENTE. NEGARAM PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.”4


“AGRAVOS DE INSTRUMENTO. CONDUTA LESIVA AO MEIO AMBIENTE. ENGENHO DE ARROZ. DOCUMENTOS ACOSTADOS AO FEITO QUE NÃO COMPROVAM QUE A EMPRESA TENHA DADO CUMPRIMENTO AOS PROJETOS QUE PRETENDIA REALIZAR PARA MINIMIZAR A EMISSÃO DE POLUENTES. LICENCIAMENTOS AMBIENTAIS JUNTO À FEPAM QUE SE ENCONTRAM VENCIDOS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO E DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO. NEGARAM PROVIMENTO AOS AGRAVOS DE INSTRUMENTO.”5


Quanto ao princípio da precaução, posiciona-se o Tribunal:


AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. DIREITO ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA RETIRADA DE ESTAÇÃO RÁDIO-BASE. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. PRESENÇA DOS REQUISITOS DA VEROSSIMILHANÇA E DO FUNDADO RECEIO DE DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO. AUSÊNCIA DE LICENCIAMENTO PARA A INSTALAÇÃO DE ERB. PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO. A Lei Municipal n. 4.083/06 prevê a necessidade de obtenção de duas licenças para a instalação de Estação Rádio-Base. Ausente, no caso, a licença fornecida pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, bem como a licença fornecida pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano. O princípio da precaução determina a necessidade de se evitar o exercício de atividades cujos efeitos maléficos à saúde humana ainda não tenham sido comprovados cientificamente. A legislação municipal, ao prever requisitos para a instalação de ERBs, não usurpa competência da União. A competência privativa da União restringe-se aos serviços de telecomunicações em si. O estabelecimento de regras para a construção das antenas de telefonia diz respeito precipuamente a interesses locais, sendo cogente a observância da legislação municipal para a instalação de equipamentos necessários aos serviços de telefonia, nos termos do art. 74 da Lei n. 9.472/97. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO, À UNANIMIDADE.”6


“AGRAVO DE INSTRUMENTO. ACAO CIVIL PUBLICA. LIMINAR PARA CESSACAO DE ATIVIDADE NOCIVA AO MEIO AMBIENTE. LIMINAR IMPONDO PRAZO A EMPRESA DE FABRICACAO DE RACOES ANIMAIS PARA CESSACAO DE ATIVIDADE POLUENTE, SOB PENA DE MULTA DIARIA, ARRIMADA EM VEEMENTES ELEMENTOS DE CONVICCAO COLETADOS EM INQUERITO CIVIL PUBLICO. DECISAO QUE SE JUSTIFICA CABALMENTE, TANTO PELOS FATOS NELA CONSIDERADOS, QUANTO PELO DIREITO APLICAVEL (ART. 12 DA LEI 7.347/85). PREVALENCIA DO PRINCIPIO DA PRECAUCAO, DADA A FREQUENTE IRREPARABILIDADE DO DANO AMBIENTAL.”7


Conclusão


Percebeu-se que, como afirmado outrora, os Tribunais tem demonstrado que realmente há que se relevar a necessidade de cuidar do meio ambiente e portanto protegê-lo.


Confirma-se a idéia de que é sempre melhor prevenir do que remediar, é melhor evitar do que posteriormente tentar buscar a correção de dano causado por falta de medidas protetivas, ou pior, quando não é possível reparar o dano causado.


Portanto, essas são as razões à aplicação dos princípios da precaução e da prevenção entre os mais diversos existentes, sempre buscando cumprir o disposto na Lei Magna, ou seja, um meio ambiente ecologicamente equilibrado.


 


Notas:

1 COLOMBO, Silvana Brendler. O principio da precaução no Direito Ambiental . JusNavigandi, Teresina, ano 9, n. 488, 7 nov. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5879>. Acesso em: 20 mar. 2010.

2 BRASIL. STJ. 2005a. REsp 605323 / MG RECURSO ESPECIAL 2003/0195051-9 Relator(a) Ministro JOSÉ DELGADO (1105) Relator(a) p/ Acórdão Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI (1124) Órgão Julgador T1 – PRIMEIRA TURMA Data do Julgamento 18/08/2005. Data da Publicação/Fonte DJ 17/10/2005 p. 179 RNDJ vol. 73 p. 87.

3 BRASIL. STJ. 2009a. Resp972902 / RS. RECURSO ESPECIAL. 2007/0175882-0 Relator(a) Ministra ELIANA CALMON (1114) Órgão Julgador T2 – SEGUNDA TURMA Data do Julgamento 25/08/2009 Data da Publicação/Fonte DJe 14/09/2009. RSTJ vol. 216 p. 257

4 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. 2009a. Agravo de Instrumento Nº 70031234164, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Matilde Chabar Maia, Julgado em 19/11/2009.

5 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. 2009b. Agravo de Instrumento Nº 70029892866, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Matilde Chabar Maia, Julgado em 03/09/2009.

6 ESTADO  DO RIO GRANDE DO SUL. 2009c. Agravo de Instrumento Nº 70029623295, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em 17/06/2009.

7 ESTADO  DO RIO GRANDE DO SUL. 2002a. Agravo de Instrumento Nº 70004725693, Primeira Câmara Especial Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Uhlein, Julgado em 25/09/2002.


Informações Sobre o Autor

Pablo Juarez Viera Czyzeski

Pós graduando em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Verbo Jurídico. Juiz Arbitral da 8ª Camara de Mediação, Conciliação e Arbitragem do Tribunal de Arbitragem do Rio de Janeiro.


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