Resumo: Cuida salientar que o meio ambiente cultural é constituído por bens culturais, cuja acepção compreende aqueles que possuem valor histórico, artístico, paisagístico, arqueológico, espeleológico, fossilífero, turístico, científico, refletindo as características de uma determinada sociedade. Ao lado disso, quadra anotar que a cultura identifica as sociedades humanas, sendo formada pela história e maciçamente influenciada pela natureza, como localização geográfica e clima. Com efeito, o meio ambiente cultural decorre de uma intensa interação entre homem e natureza, porquanto aquele constrói o seu meio, e toda sua atividade e percepção são conformadas pela sua cultural. A cultura brasileira é o resultado daquilo que era próprio das populações tradicionais indígenas e das transformações trazidas pelos diversos grupos colonizadores e escravos africanos. Nesta toada, ao se analisar o meio ambiente cultural, enquanto complexo macrossistema, é perceptível que é algo incorpóreo, abstrato, fluído, constituído por bens culturais materiais e imateriais portadores de referência à memória, à ação e à identidade dos distintos grupos formadores da sociedade brasileira. O conceito de patrimônio histórico e artístico nacional abrange todos os bens moveis e imóveis, existentes no País, cuja conservação seja de interesse público, por sua vinculação a fatos memoráveis da História pátria ou por seu excepcional valor artístico, arqueológico, etnográfico, bibliográfico e ambiental.
Palavras-chaves: Meio Ambiente Cultural. Direitos de Terceira Dimensão. Princípio da Herança Cultural.
Sumário: 1 Ponderações Introdutórias: A construção teórica da Ramificação Ambiental do Direito; 2 Comentários à concepção de Meio Ambiente; 3 Meio Ambiente e Patrimônio Cultural: Aspectos Introdutórios; 4 Anotações ao Instituto do Tombamento Ambiental como Substancialização do Princípio da Herança Cultural
1 Ponderações Introdutórias: A construção teórica da Ramificação Ambiental do Direito
Inicialmente, ao se dispensar um exame acerca do tema colocado em tela, patente se faz arrazoar que a Ciência Jurídica, enquanto um conjunto multifacetado de arcabouço doutrinário e técnico, assim como as robustas ramificações que a integram, reclama uma interpretação alicerçada nos plurais aspectos modificadores que passaram a influir em sua estruturação. Neste alamiré, lançando à tona os aspectos característicos de mutabilidade que passaram a orientar o Direito, tornou-se imperioso salientar, com a ênfase reclamada, que não mais subsiste uma visão arrimada em preceitos estagnados e estanques, alheios às necessidades e às diversidades sociais que passaram a contornar os Ordenamentos Jurídicos. Ora, em razão do burilado, infere-se que não mais prospera o arcabouço imutável que outrora sedimentava a aplicação das leis, sendo, em decorrência dos anseios da população, suplantados em uma nova sistemática.
Com espeque em tais premissas, cuida hastear, com bastante pertinência, como flâmula de interpretação o “prisma de avaliação o brocardo jurídico 'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde está a sociedade, está o Direito', tornando explícita e cristalina a relação de interdependência que esse binômio mantém”[1]. Destarte, com clareza solar, denota-se que há uma interação consolidada na mútua dependência, já que o primeiro tem suas balizas fincadas no constante processo de evolução da sociedade, com o fito de que seus Diplomas Legislativos e institutos não fiquem inquinados de inaptidão e arcaísmo, em total descompasso com a realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta estrutural e robusta dependência das regras consolidadas pelo Ordenamento Pátrio, cujo escopo primevo é assegurar que não haja uma vingança privada, afastando, por extensão, qualquer ranço que rememore priscas eras em que o homem valorizava a Lei de Talião (“Olho por olho, dente por dente”), bem como para evitar que se concretize um cenário caracterizado por aspecto caótico no seio da coletividade.
Ademais, com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, imprescindível se fez adotá-la como maciço axioma de sustentação do Ordenamento Brasileiro, precipuamente quando se objetiva a amoldagem do texto legal, genérico e abstrato, aos complexos anseios e múltiplas necessidades que influenciam a realidade contemporânea. Ao lado disso, há que se citar o voto magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao apreciar a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF, “o direito é um organismo vivo, peculiar porém porque não envelhece, nem permanece jovem, pois é contemporâneo à realidade. O direito é um dinamismo. Essa, a sua força, o seu fascínio, a sua beleza”[2]. Como bem pontuado, o fascínio da Ciência Jurídica jaz, justamente, na constante e imprescindível mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo que reverbera na sociedade e orienta a aplicação dos Diplomas Legais e os institutos jurídicos neles consagrados.
Ainda neste substrato de exposição, pode-se evidenciar que a concepção pós-positivista que passou a permear o Direito, ofertou, por via de consequência, uma rotunda independência dos estudiosos e profissionais da Ciência Jurídica. Aliás, há que se citar o entendimento de Verdan, “esta doutrina é o ponto culminante de uma progressiva evolução acerca do valor atribuído aos princípios em face da legislação”[3]. Destarte, a partir de uma análise profunda dos mencionados sustentáculos, infere-se que o ponto central da corrente pós-positivista cinge-se à valoração da robusta tábua principiológica que Direito e, por conseguinte, o arcabouço normativo passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho vinculante, flâmulas hasteadas a serem adotadas na aplicação e interpretação do conteúdo das leis, diante das situações concretas.
Nas últimas décadas, o aspecto de mutabilidade tornou-se ainda mais evidente, em especial, quando se analisa a construção de novos que derivam da Ciência Jurídica. Entre estes, cuida destacar a ramificação ambiental, considerando como um ponto de congruência da formação de novos ideários e cânones, motivados, sobretudo, pela premissa de um manancial de novos valores adotados. Nesta trilha de argumentação, de boa técnica se apresenta os ensinamentos de Fernando de Azevedo Alves Brito que, em seu artigo, aduz: “Com a intensificação, entretanto, do interesse dos estudiosos do Direito pelo assunto, passou-se a desvendar as peculiaridades ambientais, que, por estarem muito mais ligadas às ciências biológicas, até então era marginalizadas”[4]. Assim, em decorrência da proeminência que os temas ambientais vêm, de maneira paulatina, alcançando, notadamente a partir das últimas discussões internacionais envolvendo a necessidade de um desenvolvimento econômico pautado em sustentabilidade, não é raro que prospere, mormente em razão de novos fatores, um verdadeiro remodelamento ou mesmo uma releitura dos conceitos que abalizam a ramificação ambiental do Direito, com o fito de permitir que ocorra a conservação e recuperação das áreas degradadas, primacialmente as culturais.
Ademais, há de ressaltar ainda que o direito ambiental passou a figurar, especialmente, depois das décadas de 1950 e 1960, como um elemento integrante da farta e sólida tábua de direitos fundamentais. Calha realçar, com cores quentes, que mais contemporâneos, os direitos que constituem a terceira dimensão recebem a alcunha de direitos de fraternidade ou, ainda, de solidariedade, contemplando, em sua estrutura, uma patente preocupação com o destino da humanidade[5]·. Ora, daí se verifica a inclusão de meio ambiente como um direito fundamental, logo, está umbilicalmente atrelado com humanismo e, por extensão, a um ideal de sociedade mais justa e solidária. Nesse sentido, ainda, é plausível citar o artigo 3°., inciso I, da Carta Política de 1988 que abriga em sua redação tais pressupostos como os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direitos: “Art. 3º – Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária” [6].
Ainda nesta esteira, é possível verificar que a construção dos direitos encampados sob a rubrica de terceira dimensão tende a identificar a existência de valores concernentes a uma determinada categoria de pessoas, consideradas enquanto unidade, não mais prosperando a típica fragmentação individual de seus componentes de maneira isolada, tal como ocorria em momento pretérito. Com o escopo de ilustrar, de maneira pertinente as ponderações vertidas, insta trazer à colação o entendimento do Ministro Celso de Mello, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade N°. 1.856/RJ, em especial quando coloca em destaque que:
“Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os direitos de terceira geração (ou de novíssima dimensão), que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos, genericamente, e de modo difuso, a todos os integrantes dos agrupamentos sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem, por isso mesmo, ao lado dos denominados direitos de quarta geração (como o direito ao desenvolvimento e o direito à paz), um momento importante no processo de expansão e reconhecimento dos direitos humanos, qualificados estes, enquanto valores fundamentais indisponíveis, como prerrogativas impregnadas de uma natureza essencialmente inexaurível[7]”.
Ao lado disso, cuida reconhecer que os direitos de terceira dimensão são impregnados densamente pelo aspecto de solidariedade e fraternidade, extrapolando o indivíduo, mas compreendendo o gênero humano como algo singular que reclama a adoção de direitos que salvaguardem a espécie. “Têm primeiro por destinatários o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta”[8]. Com efeito, os direitos de terceira dimensão, dentre os quais se inclui ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, positivado na Constituição Federal de 1988, emerge com um claro e tangível aspecto de familiaridade, como ápice da evolução e concretização dos direitos fundamentais.
2 Comentários à concepção de Meio Ambiente
Em uma primeira plana, ao lançar mão do sedimentado jurídico-doutrinário apresentado pelo inciso I do artigo 3º da Lei Nº. 6.938, de 31 de agosto de 1981[9], que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências, salienta que o meio ambiente consiste no conjunto e conjunto de condições, leis e influências de ordem química, física e biológica que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas. Pois bem, com o escopo de promover uma facilitação do aspecto conceitual apresentado, é possível verificar que o meio ambiente se assenta em um complexo diálogo de fatores abióticos, provenientes de ordem química e física, e bióticos, consistentes nas plurais e diversificadas formas de seres viventes. Consoante os ensinamentos de Silva, considera-se meio-ambiente como “a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas”[10].
Nesta senda, ainda, Fiorillo[11], ao tecer comentários acerca da acepção conceitual de meio ambiente, coloca em destaque que tal tema se assenta em um ideário jurídico indeterminado, incumbindo, ao intérprete das leis, promover o seu preenchimento. Dada à fluidez do tema, é possível colocar em evidência que o meio ambiente encontra íntima e umbilical relação com os componentes que cercam o ser humano, os quais são de imprescindível relevância para a sua existência. O Ministro Luiz Fux, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade N°. 4.029/, salientou, com bastante pertinência, que:
“[…] o meio ambiente é um conceito hoje geminado com o de saúde pública, saúde de cada indivíduo, sadia qualidade de vida, diz a Constituição, é por isso que estou falando de saúde, e hoje todos nós sabemos que ele é imbricado, é conceitualmente geminado com o próprio desenvolvimento. Se antes nós dizíamos que o meio ambiente é compatível com o desenvolvimento, hoje nós dizemos, a partir da Constituição, tecnicamente, que não pode haver desenvolvimento senão com o meio ambiente ecologicamente equilibrado. A geminação do conceito me parece de rigor técnico, porque salta da própria Constituição Federal”[12].
É denotável, desta sorte, que a constitucionalização do meio ambiente no Brasil viabilizou um verdadeiro salto qualitativo, no que concerne, especificamente, às normas de proteção ambiental. Tal fato decorre da premissa que os robustos corolários e princípios norteadores foram alçados ao patamar constitucional, assumindo colocação eminente, ao lado das liberdades públicas e dos direitos fundamentais. Superadas tais premissas, aprouve ao Constituinte, ao entalhar a Carta Política Brasileira, ressoando os valores provenientes dos direitos de terceira dimensão, insculpir na redação do artigo 225, conceder amplo e robusto respaldo ao meio ambiente como pilar integrante dos direitos fundamentais. “Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, as normas de proteção ambiental são alçadas à categoria de normas constitucionais, com elaboração de capítulo especialmente dedicado à proteção do meio ambiente”[13]. Nesta toada, ainda, é observável que o caput do artigo 225 da Constituição Federal de 1988[14] está abalizado em quatro pilares distintos, robustos e singulares que, em conjunto, dão corpo a toda tábua ideológica e teórica que assegura o substrato de edificação da ramificação ambiental.
Primeiramente, em decorrência do tratamento dispensado pelo artífice da Constituição Federal, o meio ambiente foi içado à condição de direito de todos, presentes e futuras gerações. É encarado como algo pertencente a toda coletividade, assim, por esse prisma, não se admite o emprego de qualquer distinção entre brasileiro nato, naturalizado ou estrangeiro, destacando-se, sim, a necessidade de preservação, conservação e não-poluição. O artigo 225, devido ao cunho de direito difuso que possui, extrapola os limites territoriais do Estado Brasileiro, não ficando centrado, apenas, na extensão nacional, compreendendo toda a humanidade. Neste sentido, o Ministro Celso de Mello, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ, destacou que:
“A preocupação com o meio ambiente – que hoje transcende o plano das presentes gerações, para também atuar em favor das gerações futuras […] tem constituído, por isso mesmo, objeto de regulações normativas e de proclamações jurídicas, que, ultrapassando a província meramente doméstica do direito nacional de cada Estado soberano, projetam-se no plano das declarações internacionais, que refletem, em sua expressão concreta, o compromisso das Nações com o indeclinável respeito a esse direito fundamental que assiste a toda a Humanidade”[15].
O termo “todos”, aludido na redação do caput do artigo 225 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, faz menção aos já nascidos (presente geração) e ainda aqueles que estão por nascer (futura geração), cabendo àqueles zelar para que esses tenham à sua disposição, no mínimo, os recursos naturais que hoje existem. Tal fato encontra como arrimo a premissa que foi reconhecido ao gênero humano o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao gozo de condições de vida adequada, em ambiente que permita desenvolver todas as suas potencialidades em clima de dignidade e bem-estar. Pode-se considerar como um direito transgeracional, ou seja, ultrapassa as gerações, logo, é viável afirmar que o meio-ambiente é um direito público subjetivo. Desta feita, o ideário de que o meio ambiente substancializa patrimônio público a ser imperiosamente assegurado e protegido pelos organismos sociais e pelas instituições estatais, qualificando verdadeiro encargo irrenunciável que se impõe, objetivando sempre o benefício das presentes e das futuras gerações, incumbindo tanto ao Poder Público quanto à coletividade considerada em si mesma.
Assim, decorrente de tal fato, produz efeito erga omnes, sendo, portanto, oponível contra a todos, incluindo pessoa física/natural ou jurídica, de direito público interno ou externo, ou mesmo de direito privado, como também ente estatal, autarquia, fundação ou sociedade de economia mista. Impera, também, evidenciar que, como um direito difuso, não subiste a possibilidade de quantificar quantas são as pessoas atingidas, pois a poluição não afeta tão só a população local, mas sim toda a humanidade, pois a coletividade é indeterminada. Nesta senda, o direito à interidade do meio ambiente substancializa verdadeira prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, ressoando a expressão robusta de um poder deferido, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mas num sentido mais amplo, atribuído à própria coletividade social.
Com a nova sistemática entabulada pela redação do artigo 225 da Carta Maior, o meio-ambiente passou a ter autonomia, tal seja não está vinculada a lesões perpetradas contra o ser humano para se agasalhar das reprimendas a serem utilizadas em relação ao ato perpetrado. Figura-se, ergo, como bem de uso comum do povo o segundo pilar que dá corpo aos sustentáculos do tema em tela. O axioma a ser esmiuçado, está atrelado o meio-ambiente como vetor da sadia qualidade de vida, ou seja, manifesta-se na salubridade, precipuamente, ao vincular a espécie humana está se tratando do bem-estar e condições mínimas de existência. Igualmente, o sustentáculo em análise se corporifica também na higidez, ao cumprir os preceitos de ecologicamente equilibrado, salvaguardando a vida em todas as suas formas (diversidade de espécies).
Por derradeiro, o quarto pilar é a corresponsabilidade, que impõe ao Poder Público o dever geral de se responsabilizar por todos os elementos que integram o meio ambiente, assim como a condição positiva de atuar em prol de resguardar. Igualmente, tem a obrigação de atuar no sentido de zelar, defender e preservar, asseverando que o meio-ambiente permaneça intacto. Aliás, este último se diferencia de conservar que permite a ação antrópica, viabilizando melhorias no meio ambiente, trabalhando com as premissas de desenvolvimento sustentável, aliando progresso e conservação. Por seu turno, o cidadão tem o dever negativo, que se apresenta ao não poluir nem agredir o meio-ambiente com sua ação. Além disso, em razão da referida corresponsabilidade, são titulares do meio ambiente os cidadãos da presente e da futura geração.
Em tom de arremate, é possível destacar que a incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresarias nem manter dependência de motivações de âmago essencialmente econômico, notadamente quando estiver presente a atividade econômica, considerada as ordenanças constitucionais que a norteiam, estando, dentre outros corolários, subordinadas ao preceito que privilegia a defesa do meio ambiente, que traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral. O corolário do desenvolvimento sustentável, além de estar impregnando de aspecto essencialmente constitucional, encontra guarida legitimadora em compromissos e tratados internacionais assumidos pelo Estado Brasileiro, os quais representam fator de obtenção do justo equilíbrio entre os reclamos da economia e os da ecologia, porém, a invocação desse preceito, quando materializada situação de conflito entre valores constitucionais e proeminentes, a uma condição inafastável, cuja observância não reste comprometida nem esvaziada do aspecto essencial de um dos mais relevantes direitos fundamentais, qual seja: o direito à preservação do meio ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações.
3 Meio Ambiente e Patrimônio Cultural: Aspectos Introdutórios
Em sede de comentários introdutórios, cuida salientar que o meio ambiente cultural é constituído por bens culturais, cuja acepção compreende aqueles que possuem valor histórico, artístico, paisagístico, arqueológico, espeleológico, fossilífero, turístico, científico, refletindo as características de uma determinada sociedade. Ao lado disso, quadra anotar que a cultura identifica as sociedades humanas, sendo formada pela história e maciçamente influenciada pela natureza, como localização geográfica e clima. Com efeito, o meio ambiente cultural decorre de uma intensa interação entre homem e natureza, porquanto aquele constrói o seu meio, e toda sua atividade e percepção são conformadas pela sua cultural. “A cultura brasileira é o resultado daquilo que era próprio das populações tradicionais indígenas e das transformações trazidas pelos diversos grupos colonizadores e escravos africanos”[16]. Desta maneira, a proteção do patrimônio cultural se revela como instrumento robusto da sobrevivência da própria sociedade.
Nesta toada, ao se analisar o meio ambiente cultural, enquanto complexo macrossistema, é perceptível que é algo incorpóreo, abstrato, fluído, constituído por bens culturais materiais e imateriais portadores de referência à memória, à ação e à identidade dos distintos grupos formadores da sociedade brasileira. Meirelles anota que “o conceito de patrimônio histórico e artístico nacional abrange todos os bens moveis e imóveis, existentes no País, cuja conservação seja de interesse público, por sua vinculação a fatos memoráveis da História pátria ou por seu excepcional valor artístico, arqueológico, etnográfico, bibliográfico e ambiental”[17]. Quadra anotar, por imperioso, que os bens compreendidos pelo patrimônio cultural compreendem tanto realizações antrópicas como obras da Natureza; preciosidades do passado e obras contemporâneas.
Nesta esteira, é possível subclassificar o meio ambiente cultural em duas espécies distintas, quais sejam: uma concreta e outra abstrata. Neste passo, o meio-ambiente cultural concreto, também denominado material, se revela materializado quando está transfigurado em um objeto classificado como elemento integrante do meio-ambiente humano. Assim, é possível citar os prédios, as construções, os monumentos arquitetônicos, as estações, os museus e os parques, que albergam em si a qualidade de ponto turístico, artístico, paisagístico, arquitetônico ou histórico. Os exemplos citados alhures, em razão de todos os predicados que ostentam, são denominados de meio-ambiente cultural concreto. Acerca do tema em comento, é possível citar o robusto entendimento jurisprudencial firmado pelo Ministro Ruy Rosado de Aguiar, ao apreciar o Recurso Especial N° 115.599/RS:
“Ementa: Meio Ambiente. Patrimônio cultural. Destruição de dunas em sítios arqueológicos. Responsabilidade civil. Indenização. O autor da destruição de dunas que encobriam sítios arqueológicos deve indenizar pelos prejuízos causados ao meio ambiente, especificamente ao meio ambiente natural (dunas) e ao meio ambiente cultural (jazidas arqueológicas com cerâmica indígena da Fase Vieira). Recurso conhecido em parte e provido.” (Superior Tribunal de Justiça – Quarta Turma/ REsp 115.599/RS/ Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar/ Julgado em 27.06.2002/ Publicado no Diário da Justiça em 02.09.2002, p. 192).
Diz-se, de outro modo, o meio-ambiente cultural abstrato, chamado, ainda, de imaterial, quando este não se apresenta materializado no meio-ambiente humano, sendo, deste modo, considerado como a cultura de um povo ou mesmo de uma determinada comunidade. Da mesma maneira, são alcançados por tal acepção a língua e suas variações regionais, os costumes, os modos e como as pessoas relacionam-se, as produções acadêmicas, literárias e científicas, as manifestações decorrentes de cada identidade nacional e/ou regional. Neste sentido, é possível colacionar o entendimento firmado pelo Tribunal Regional Federal da Segunda Região, quando, ao apreciar a Apelação Cível N° 2005251015239518, firmou entendimento que “expressões tradicionais e termos de uso corrente, trivial e disseminado, reproduzidos em dicionários, integram o patrimônio cultural de um povo”[18]. Esses aspectos constituem, sem distinção, abstratamente o meio-ambiente cultural. “O patrimônio cultural imaterial transmite-se de geração a geração e é constantemente recriado pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente”[19], decorrendo, com destaque, da interação com a natureza e dos acontecimentos históricos que permeiam a população.
O Decreto Nº. 3.551, de 04 de Agosto de 2000[20], que institui o registro de bens culturais de natureza imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial e dá outras providências, consiste em instrumento efetivo para a preservação dos bens imateriais que integram o meio-ambiente cultural. Como bem aponta Brollo[21], em seu magistério, o aludido decreto não instituiu apenas o registro de bens culturais de natureza imaterial que integram o patrimônio cultural brasileiro, mas também estruturou uma política de inventariança, referenciamento e valorização desse patrimônio.
Ejeta-se, segundo o entendimento firmado por Fiorillo[22], que os bens que constituem o denominado patrimônio cultural consistem na materialização da história de um povo, de todo o caminho de sua formação e reafirmação de seus valores culturais, os quais têm o condão de substancializar a identidade e a cidadania dos indivíduos insertos em uma determinada comunidade. Necessário se faz salientar que o meio-ambiente cultural, conquanto seja artificial, difere-se do meio-ambiente humano em razão do aspecto cultural que o caracteriza, sendo dotado de valor especial, notadamente em decorrência de produzir um sentimento de identidade no grupo em que se encontra inserido, bem como é propiciada a constante evolução fomentada pela atenção à diversidade e à criatividade humana.
4 Anotações ao Instituto do Tombamento Ambiental como Substancialização do Princípio da Herança Cultural
Em uma primeira plana, cuida salientar que o tombamento se apresenta como um dos instrumentos utilizáveis, pelo Poder Público, com o escopo de se tutelar e proteger o patrimônio cultural brasileiro. Neste sentido, já firmou entendimento o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais que “o tombamento é ato administrativo que visa à preservação do patrimônio histórico, artístico ou cultural das cidades, de modo a impedir a destruição ou descaracterização de bem a que for atribuído valor histórico ou arquitetônico”[23]. Fiorillo anuncia, com bastante propriedade, que “dizemos tombamento ambiental, porquanto este instituto tem a finalidade de tutelar um bem de natureza difusa, que é o bem cultural”[24]. Desta sorte, a utilização do tombamento como mecanismo de preservação e proteção do patrimônio cultural brasileiro permite o acesso de todos à cultura, substancializando verdadeiro instrumento de tutela do meio ambiente.
Com realce, o instituto em comento se revela, em sede de direito administrativo, como um dos instrumentos criados pelo legislador para combater a deterioração do patrimônio cultural de um povo, apresentando, em razão disso, maciça relevância no cenário atual, notadamente em decorrência dos bens tombados encerrarem períodos da história nacional ou, mesmo, refletir os aspectos característicos e identificadores de uma comunidade. À luz de tais ponderações, é observável que a intervenção do Ente Estatal tem o escopo de proteger o patrimônio cultural, busca preservar a memória nacional. Ao lado disso, o tombamento permite que o aspecto histórico seja salvaguardado, eis que constitui parte da própria cultura do povo e representa a fonte sociológica de identificação de vários fenômenos sociais, políticos e econômicos existentes na atualidade. “A escolha do bem de patrimônio cultural que será tombado com precedência aos demais se relaciona com o juízo de conveniência e oportunidade, e não é passível de análise judicial”[25].
Desta feita, o proprietário não pode, em nome de interesses particulares, usar ou fruir de maneira livre seus bens, se estes se traduzem em interesse público por atrelados a fatores de ordem histórica, artística, cultural, científica, turística e paisagística. “São esses bens que, embora permanecendo na propriedade do particular, passam a ser protegidos pelo Poder Público, que, para esse fim, impõe algumas restrições quanto a seu uso pelo proprietário”[26]. Os exemplos de bens a serem tombados são extremamente variados, sendo os mais comuns os imóveis que retratam a arquitetura de épocas passadas na história pátria, dos quais podem os estudiosos e pesquisadores extrair diversos meios de conhecimento do passado e desenvolver outros estudos com vistas a proliferar a cultura do país. Além disso, é possível evidenciar que é corriqueiro o tombamento de bairros ou até mesmo cidades, quando retratam aspectos culturais do passado. Com o escopo de ilustrar o expendido, mister se faz colacionar os arestos jurisprudenciais que acenam:
“Ementa: Direito Constitucional – Direito Administrativo – Apelação – Preliminar de não conhecimento – Inovação Recursal – Ausência de Documentos Indispensáveis para propositura da Ação – Não Configuração – Pedido de Assistência Judiciária – Indeferimento – Ação Civil Pública – Dano ao Patrimônio Histórico e Cultural – Edificação em imóvel localizado no Conjunto Arquitetônico de Ouro Preto – Tombamento – Aprovação do IPHAN – Inexistência. (…) – O Município de Ouro Preto foi erigido a Monumento Nacional pelo decreto nº. 22.928, de 12/06/33, e inscrito pela UNESCO na lista do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural em 21/09/80, e a cidade teve todo o seu Conjunto Arquitetônico tombado. Trata-se de fato notório, conhecido pela apelante e por qualquer pessoa, de forma que não se pode afirmar que o processo de tombamento do Conjunto Arquitetônico do referido Município seja um documento indispensável para a propositura da presente ação civil pública. – O imóvel que faz parte do Conjunto Arquitetônico de Ouro Preto, e integra o Patrimônio Mundial, Cultural e Natural da cidade, deve ser conservado por seu proprietário, e qualquer obra de reparo de tal bem deve ser precedida de autorização do IPHAN, sob pena de demolição.” (Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais – Quarta Câmara Cível/ Apelação Cível 1.0461.03.010271-3/001/ Relator: Desembargador Moreira Diniz/ Julgado em 12.06.2008/ Publicado em 26.06.2008).
“Ementa: Ação popular. Instalação de quiosques no entorno de praças municipais. Tombamento preservado. Inocorrência de ofensa ao patrimônio ambiental cultural. O fato de as praças municipais serem tombadas, como partes do Patrimônio Histórico e Cultural do Município de Paraisópolis, não podendo, consequentemente, serem ocupadas ou restringidas em sua área, para outras finalidades (Lei Municipal n. 1.218/89) não impede a instalação, ao arredor delas, de quiosques de alimentação, porquanto o tombamento se limitou às praças, e não ao entorno delas. Assim, não há ofensa ao patrimônio ambiental cultural. A instalação dos referidos quiosques não configura abalo de ordem ambiental, visto que não houve lesão aos recursos ambientais, com consequente degradação – alteração adversa – do equilíbrio ecológico do local.” (Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais – Quinta Câmara Cível/ Apelação Cível/Reexame Necessário N° 1.0473.03.000617-4/001/ Relatora: Desembargadora Maria Elza/ Julgado em 03.03.2005/ Publicado em 01.04.2005).
É verificável que a proteção dos bens de interesse cultural encontra respaldo na Constituição da República Federativa do Brasil[27], que impõe ao Estado o dever de garantir a todos o exercício de direitos culturais e o acesso às fontes da cultura nacional. “Por outro lado, nela se define o patrimônio cultural brasileiro, composto de bens materiais e imateriais necessários à exata compreensão dos vários aspectos ligados os grupos formadores da sociedade brasileira”[28]. O Constituinte, ao insculpir, a redação do §1° do artigo 216 da Carta de Outubro estabeleceu que o Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação. “Independentemente do tombamento, o patrimônio cultural e histórico merece proteção, e, neste caso, ainda que precária – até definitiva solução da questão em exame – essa proteção, se não for dada, inviabilizará qualquer ação futura, pois a demolição é irreversível”[29].
Resta patentemente demonstrado que o tombamento é uma das múltiplas formas utilizadas na proteção do patrimônio cultural brasileiro. Como bem anota Meirelles, “tombamento é a declaração do Poder Público do valor histórico, artísticos, paisagístico, turístico, cultural ou científico de coisas ou locais que, por essa razão, devam ser preservados, de acordo com a inscrição em livro próprio”[30]. O tombamento é um dos institutos que têm por objeto a tutela do patrimônio histórico e artístico nacional, que implica na restrição parcial do imóvel, conforme se verifica pela legislação que o disciplina. Ao lado disso, com o escopo de explicitar a proeminente natureza do instituto em comento, é possível transcrever os arestos que se coadunam com as ponderações estruturadas até o momento:
“Ementa: Constitucional e Administrativo. Mandado de segurança. Imóvel. Valor histórico e cultural. Declaração. Município. Tombamento. Ordem de demolição. Inviabilidade. São deveres do Poder público, nos termos dos arts. 23, III e IV; 30, I e IX e 216, §1º, da Constituição Federal, promover e proteger o patrimônio cultural, artístico e histórico, por meio de tombamento e de outras formas de acautelamento e preservação, bem como impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de bens de valor histórico, artístico e cultural. Demonstrada, no curso do mandado de segurança, a conclusão do procedimento administrativo de tombamento do imóvel, com declaração do seu valor histórico e cultural pelo Município, inviável a concessão de ordem para sua demolição. Rejeita-se a preliminar e nega-se provimento ao recurso.” (Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais – Quarta Câmara Cível/ Apelação Cível 1.0702.02.010330-6/001/ Relator: Desembargador Almeida Melo/ Julgado em 15.04.2004/ Publicado em 18.05.2004).
“Ementa: Tombamento – Patrimônio Histórico e Cultural – Imóvel reputado de valor histórico pelo município onde se localiza – Competência Constitucional dele para aferi-lo e tombá-lo. Nada impede que o Município, mediante tombamento, preserve imóvel nele situado e que considere de valor histórico-cultural, ""ex vi"" do art. 23, inciso III, da Lei Fundamental da República, que a ele – Município, atribui a competência para fazê-lo. Ademais, a cada comunidade, com seus hábitos e culturas próprios, cabe aferir, atendidas as peculiaridades locais, acerca do valor histórico-cultural de seu patrimônio, com o escopo, inclusive, de também preservá-lo.” (Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais – Quarta Câmara Cível/ Embargos Infringentes 1.0000.00.230571-2/001/ Relator: Desembargador Hyparco Immesi/ Julgado em 09.10.2003/ Publicado em 03.02.2004)
O diploma infraconstitucional que versa acerca do tombamento é o Decreto-Lei N° 25, de 30 de novembro de 1937[31], que organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional, trazendo à baila as disposições elementares e a fisionomia jurídica do instituto do tombamento, inclusive no que toca aos registros dos bens tombados. Sobreleva anotar que o diploma ora aludido traça tão somente as disposições gerais aplicáveis ao fato jurídico–administrativo do tombamento. Entrementes, este se consumará por meio de atos administrativos específicos, destinados a propriedades determinadas, atento às particularidades e peculiaridades do bem a ser tombado.
Assentadas estas ponderações, cuida salientar que o tombamento ambiental configura clara materialização do corolário da herança cultural, o qual, conforme construção de Michael Decleris[32], coloca em especial atenção a imperiosa necessidade de se ofertar, por meio de institutos robustos, preservar os mais importantes conjuntos feitos pelo homem, alcançando, pois, os singulares monumentos, conjuntos arquitetônicos e sítios arqueológicos. Com efeito, em sede de desenvolvimento, em nível cultural da humanidade, uma vez que por meio daquele que o homem adquire a sua adaptação ao meio ambiente natural. Cuida anotar que o princípio da herança cultural visa assegurar a estabilidade e a continuidade histórica da espécie humana, logo, admitir situações diversas coloca em risco a identidade cultural dos povos. Assim, o corolário da herança cultural e do patrimônio natural são as condições para a estabilidade dinâmica (equilíbrio) e interdependência dos ecossistemas e sistemas em seu desenvolvimento perene ao longo do tempo pelo homem.
Ao lado disso, a consciência da relação entre os dois princípios é relativamente recente, enquanto o interesse do homem na preservação da memória do seu passado histórico recebeu maior proeminência na contemporaneidade, tanto em esfera nacional, como na órbita internacional. Além disso, a proteção do patrimônio cultural, compreendendo os monumentos, conjuntos arquitetônicos e sítios, deve ser completa e deve apresentar um objetivo importante no ordenamento do território da cidade. De igual modo, o regime jurídico de proteção deve ser eficaz, ou seja, incorpora os controles e equilíbrios adequados para assegurar que o monumento protegido, não permitindo que seja alterado, demolido ou destruído. Da mesma maneira, o meio ambiente cultural reclama proteção contra grande perigo ambiental e danos pela poluição, assim como é imprescindível um ambiente de alta qualidade tem de ser mantido na área em torno de monumentos e conjuntos arquitetônicos e dentro dos sítios arqueológicos. Neste sentido, o Supremo Tribunal Federal já consagrou visão:
“Ementa: Recurso Extraordinário. Limitação administrativa. Prédio urbano: Patrimônio Cultural e Ambiental do Bairro Cosme Velho. Decreto Municipal 7.046/87. Competência e legalidade. 1. Prédio urbano elevado à condição de patrimônio cultural. Decreto Municipal 7.046/87. Legalidade. Limitação administrativa genérica, gratuita e unilateral ao exercício do direito de propriedade, em prol da memória da cidade. Inexistência de ofensa à Carta Federal. 2. Conservação do patrimônio cultural e paisagístico. Encargo conferido pela Constituição (EC 01/69, artigo 15, II) ao Poder Público, dotando-o de competência para, na órbita de sua atuação, coibir excessos que, se consumados, poriam em risco a estrutura das utilidades culturais e ambientais. Poder- dever de polícia dos entes estatais na expedição de normas administrativas que visem a preservação da ordem ambiental e da política de defesa do patrimônio cultural. Recurso extraordinário conhecido e provido.” (Supremo Tribunal Federal – Segunda Turma/ RE 121.140/ Relator: Ministro Maurício Corrêa/ Julgado em 26.02.2002/ Publicado no DJ em 23.08.2002).
Mesmo sendo insipiente a temática no Direito Brasileiro, de maneira indireta, o princípio da herança cultural vem recebendo, de modo paulatino, consagração no entendimento jurisprudencial. Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou que “a grave crise habitacional que continua a afetar o Brasil não será resolvida, nem seria inteligente que se resolvesse, com o aniquilamento do patrimônio histórico-cultural nacional. Ricos e pobres, cultos e analfabetos, somos todos sócios na titularidade do que sobrou de tangível e intangível da nossa arte e história como Nação” (Extraído do Superior Tribunal de Justiça – Segunda Turma/ REsp 808.708/RJ/ Relator: Ministro Herman Benjamin/ Julgado em 18.08.2009/ Publicado no DJe em 04.05.2011). Logo, em se tratando de patrimônio cultural, mutilá-lo ou destruí-lo a pretexto de dar casa e abrigo a uns poucos corresponde a deixar milhões de outros sem teto e, ao mesmo tempo, sem a memória e a herança do passado para narrar e passar a seus descendentes.
Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense. Especializando em Práticas Processuais – Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo-ES
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