APAC: Um Modelo de Humanização do Sistema Penitenciário

Resumo: O presente artigo procura demonstrar a possibilidade de humanização do sistema penitenciário brasileiro. Para tanto, discorre sobre a Associação de Proteção e Assistência aos Condenados – APAC –, que possui uma metodologia de valorização humana, oferecendo, aos condenados, condições de recuperar-se. A referida entidade tem o propósito de proteger a sociedade, socorrer as vítimas e promover a justiça.


Palavras chave: Apac; humanização do sistema penitenciário; humanização da execução penal.


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Sumário: 1. Introdução. 2. APAC – Associação de Proteção e Assistência aos Condenados. 3. Elementos fundamentais para o método APAC. 4. Porque o método APAC é inovador. 5. Conclusão


1. Introdução


Há muito se discute o aumento de pena para determinados crimes, a maioridade penal, punições mais severas para menores infratores, a construção de presídios de segurança máxima, dentre outras medidas que não apresenta na integralidade a eficácia almejada.


Por isso, fortalece-se, a cada dia, a corrente vinculada à defesa dos direitos humanos, que coloca a necessidade de novas práticas de ressocialização do preso e a humanização das cadeias. Para atender a essa proposta, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais criou o Projeto Novos Rumos na Execução Penal, cuja missão é propagar a metodologia APAC como ferramenta para humanizar a execução penal e contribuir para a construção da paz social.


2. APAC – Associação de Proteção e Assistência aos Condenados


A Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC) é uma entidade civil, sem fins lucrativos, que se dedica à recuperação e reintegração social dos condenados a penas privativas de liberdade, bem como socorrer a vítima e proteger a sociedade. Opera, assim, como uma entidade auxiliar do Poder Judiciário e Executivo, respectivamente na execução penal e na administração do cumprimento das penas privativas de liberdade. Sua filosofia é ‘Matar o criminoso e Salvar o homem’, a partir de uma disciplina rígida, caracterizada por respeito, ordem, trabalho e o envolvimento da família do sentenciado.


A APAC é amparada pela Constituição Federal para atuar nos presídios, trabalhando com princípios fundamentais, tais como a valorização humana. E sempre tem em Deus a fonte de tudo.


O objetivo da APAC é gerar a humanização das prisões, sem deixar de lado a finalidade punitiva da pena. Sua finalidade é evitar a reincidência no crime e proporcionar condições para que o condenado se recupere e consiga a reintegração social.


A primeira APAC nasceu em São José dos Campos (SP) em 1972 e foi idealizada pelo advogado e jornalista Mário Ottoboni e um grupo de amigos cristãos. Hoje, a APAC instalada na cidade de Itaúna/MG é uma referência nacional e internacional, demonstrando a possibilidade de humanizar o cumprimento da pena.


O método socializador da APAC espalhou-se por todo o território nacional (aproximadamente 100 unidades em todo o Brasil) e no exterior. Já foram implantadas APACs na Alemanha, Argentina, Bolívia, Bulgária, Chile, Cingapura, Costa Rica, El Salvador, Equador, Eslováquia, Estados Unidos, Inglaterra e País de Gales, Latvia, México, Moldovia, Nova Zelândia e Noruega. O modelo Apaqueano foi reconhecido pelo Prison Fellowship International (PFI), organização não-governamental que atua como órgão consultivo da Organização das Nações Unidas (ONU) em assuntos penitenciários, como uma alternativa para humanizar a execução penal e o tratamento penitenciário.


Dados estatísticos apresentados em 2009[1]:


– O custo de cada preso para o Estado corresponde a quatro salários mínimos enquanto na APAC a um salário e meio;


– O índice nacional de pessoas que voltam a praticar crimes é, aproximadamente, de 85% e na APAC corresponde a 8,62%.


A Apac não é remunerada para receber ou ajudar os condenados. Ela se mantém através de doações de pessoas físicas, jurídicas e entidades religiosas, de parcerias e convênios com o Poder Público, instituições educacionais e outras entidades, da captação de recursos junto a fundações, institutos e organizações não governamentais, bem como das contribuições de seus sócios. 


3. Elementos fundamentais para o desenvolvimento do método APAC


O método apaqueano parte do pressuposto de que todo ser humano é recuperável, desde que haja um tratamento adequado. Para tanto, trabalha-se com 12 elementos fundamentais. Vale ressaltar que, para o êxito no trabalho de recuperação do condenado, é imprescindível a adoção de todos eles, quais sejam:


1) participação da comunidade;


2) recuperando ajudando recuperando;


3) trabalho;


4) religião;


5) assistência jurídica;


6) assistência à saúde;


7) valorização humana;


8) a família;


9) o voluntário e sua formação;


10) Centro de Reintegração Social – CRS (O CRS possui três pavilhões destinados ao regime fechado, semi-aberto e aberto);


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11) mérito do recuperando;


12) a Jornada de Libertação com Cristo.[2]


4. Porque o método APAC é inovador?


Algumas diferenças entre o Sistema Penitenciário comum e a APAC fazem desta uma metodologia inovadora e eficaz, capaz de dissipar as ‘mazelas das prisões’, ressocializar os condenados e inseri-los na sociedade.


Porque o método Apac é inovador:


– Todos os recuperandos são chamados pelo nome, valorizando o indivíduo;


– Individualização da pena;


– A comunidade local participa efetivamente, através do voluntariado;


– É o único estabelecimento prisional que oferece os três regimes penais: fechado, semiaberto e aberto com instalações independentes e apropriadas às atividades desenvolvidas;


– Não há presença de policiais e agentes penitenciários, e as chaves do presídio ficam em poder dos próprios recuperandos;


– Ausência de armas;


– A religião é fator essencial da recuperação;


– A valorização humana é a base da recuperação, promovendo o reencontro do recuperando com ele mesmo;


– Os recuperandos têm assistência espiritual, médica, psicológica e jurídica prestada pela comunidade;


– Além de frequentarem cursos supletivos e profissionais, os recuperandos praticam trabalhos laborterápicos no regime fechado; no regime semiaberto cuida-se da mão de obra especializada (oficinas profissionalizantes instaladas dentro dos Centros de Reintegração); no regime aberto, o trabalho tem o enfoque da inserção social, pois, o recuperando trabalha fora dos muros do Centro de Reintegração prestando serviços à comunidade;


– Oferecem assistência à família do recuperando e à vítima ou seus familiares;


– Há um número menor de recuperandos juntos, evitando formação de quadrilhas, subjugação dos mais fracos, pederastia, tráfico de drogas, indisciplina, violência e corrupção;


– A escolta dos recuperandos é realizada pelos voluntários da Apac.


Como destacado acima, no Centro de Reintegração Social de Itaúna não há agente da Polícia Civil ou Militar, sendo administrado por funcionários e voluntários e é a segunda instituição prisional no mundo a cuidar dos presos sem a polícia (a primeira foi a de São José dos Campos). Os reeducandos são co-responsáveis pela sua recuperação, organizando-se através dos Conselhos de Sinceridade e de Solidariedade (CSS), um para cada regime, e por coordenadores de cela. Os Conselhos cuidam da administração, limpeza, manutenção, disciplina e segurança. Problemas internos de disciplina são resolvidos pelos próprios reeducandos, pelos CSS e pela direção.


5. Conclusão


A participação da comunidade é um dos desafios, pois, romper com os preconceitos demanda um preparo da equipe de trabalho, bem como dos voluntários, juntamente com uma discussão com a comunidade sobre qual a responsabilidade de cada um. Ressalte-se que a conjugação de esforços de todos os envolvidos (Poder Judiciário, Ministério Público, Prefeitura, comunidade – empresários, comunidades religiosas, voluntários – etc.) é fundamental para que o projeto dê certo.


O método apaqueano tem transformado os reeducandos em cidadãos, reduzindo a violência fora e dentro dos presídios, conseqüentemente, diminuindo a criminalidade e oferecendo à sociedade a tão sonhada paz.


 


Referências bibliográficas

BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. São Paulo: Saraiva 3ª Ed., 2004.

OTTOBONI, Mário. Vamos matar o criminoso? : método APAC. São Paulo: Paulinas, 2001.

TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios Básicos do Direito Penal. São Paulo: Saraiva 5ª Ed., 10ª tiragem, 2002.

Cartilha NOVOS RUMOS NA EXECUÇÃO PENAL – Projeto do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Cartilha editada pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, lançado em dezembro de 2001.

 

Notas

[1] Dados colhidos no site www.apacitauna.com.br.

[2] Dados apresentados na ‘Cartilha NOVOS RUMOS NA EXECUÇÃO PENAL’ – Projeto do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, lançado em dezembro de 2001.


Informações Sobre o Autor

Ana Paula Faria

Advogada. Mediadora de Conflitos. Professora de Direito Penal. Membro da Comissão de Mediação e Arbitragem da OAB/MG. Mestranda no Programa DDMRC – Master em Resolución de Conflictos y Mediación. Universidad de Léon/Espanha. Aluna no Mestrado Interdisciplinar do Programa de Pós Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF/Rio de Janeiro). Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade de Itaúna – MG. Graduada em Direito pela Universidade FUMEC/FCH


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