Aplicabilidade e eficácia das normas constitucionais

Resumo: O propósito deste artigo é apresentar ao leitor a classificação das normas constitucionais quanto a sua aplicabilidade e eficácia. Fundamentado por ampla e reconhecida doutrina e através de exemplificações, relativas à análise de artigos da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, pretendemos auxiliar o leitor na maior aquisição de conhecimento para, com isto, facilitar a distinção entre as normas positivadas, no que tange a aplicabilidade e a eficácia, em nossa Lei Maior.

Palavras-chave: Constituição; Brasil; normas constitucionais; aplicabilidade; eficácia.

Abstract: The purpose of this article is to introduce the reader to the classification of constitutional norms as to their applicability and effectiveness. Based on a broad and recognized doctrine and by means of exemplifications related to the analysis of articles of the Constitution of the Federative Republic of Brazil of 1988, we intend to assist the reader in the greater acquisition of knowledge in order to facilitate the distinction between the positive norms in which applicability and effectiveness, in our Greater Law.

Keywords: Constitution; Brazil; constitutional norms; applicability; efficiency

Sumário: introdução. 1. Normas constitucionais de eficácia plena; 2. Normas constitucionais de eficácia contida; 3. Normas constitucionais de eficácia limitada; 3.1. Normas constitucionais de eficácia limitada de princípio programático; 3.2 Normas constitucionais de eficácia limitada de princípio institutivo; 4. Considerações finais; 5. Referência

Introdução

Ao abordarmos normas constitucionais é inconcebível pensarmos que sejam desprovidas de aplicabilidade e eficácia. O que se apresenta, de fato, nas normas constitucionais, é a variação de eficácia e aplicabilidade de acordo com a elaboração normativa do legislador constituinte.

A doutrina clássica e, boa parte da doutrina moderna adota a divisão da aplicabilidade das normas em apenas duas espécies: auto executáveis e não auto executáveis. Para melhor compreensão, cabe apresentar o ensinamento de Manoel Gonçalves Ferreira Filho:

“A doutrina clássica distingue a este respeito duas espécies. É o que Rui Barbosa já ensinava, com arrimo em Cooley, Story e outros onstitucionalistas norte-americanos. Esta ainda é a lição da doutrina moderna, da estrangeira, por exemplo, de Jorge Miranda, e de parte da brasileira, por exemplo, a do autor deste livro. São elas as normas exequíveis por si sós (normas autoexecutáveis, self executing) e as normas não exequíveis por si sós.[1]

Segundo leciona José Afonso da Silva, quanto às normas auto executáveis e não auto executáveis, segue:

“[…]são auto executáveis “as determinações, para executar as quais, não se haja mister de constituir ou designar uma autoridade, nem criar ou indicar um processo especial, e aquelas onde o direito instituído

se ache armado por si mesmo, pela sua própria natureza, dos seus meios de execução e preservação”. As normas não auto executáveis são as que “não revestem dos meios de ação essenciais ao seu exercício os direitos, que outorgam, ou os encargos, que impõem: estabelecem competências, atribuições, poderes, cujo uso tem de aguardar que a Legislatura, segundo o

seu critério, os habilite a exercerem”.[2]

Diante do objetivo delineado deste artigo, para melhor didática, preferimos a adoção dos ensinamentos do constitucionalista José Afonso da Silva, que classifica as normas constitucionais quanto a sua aplicabilidade e eficácia em três espécies: plena; contida ou limitada.

Destarte, cabe complementar a classificação em três espécies com trecho significativo do livro de Direito Constitucional de Luís Roberto Barroso:

“De acordo com José Afonso, as normas constitucionais, no tocante à sua eficácia e aplicabilidade, comportam uma classificação trico-tômica, assim enunciada: a) normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade imediata; b) normas constitucionais de eficácia contida e aplicabilidade imediata, mas passíveis de restrição; c) normas constitucionais de eficácia limitada ou reduzida, que compreendem as normas definidoras de princípio institutivo e as definidoras de princípio programático, em geral dependentes de integração infraconstitucional para operarem a plenitude de seus efeitos”.[3]

Desta feita, nos resta, a partir deste momento, aprofundarmos em cada uma das espécies caracterizadas pelo postulado de José Afonso da Silva.

1. Normas constitucionais de eficácia plena

As normas de eficácia plena caracterizam-se por serem auto executáveis, ou seja, de aplicabilidade imediata, integral e direta. Sendo assim, não dependem e não são restringidas por atos normativos de legislação infraconstitucional.

Conforme Luciano Dutra: “as normas constitucionais de eficácia plena, desde sua gênese, produzem, ou ao menos possuem a possibilidade de produzir, todos os efeitos visados pelo constituinte (originário ou derivado). São, portanto, autoaplicáveis”.[4]

Como exemplos de normas constitucionais de eficácia plena positivadas na Constituição da República Federativa do Brasil, expomos os seguintes artigos: 2º; 14, §2°; 17, §4°; 19; 20; 21; 22; 24; dentre outros.

José Afonso da silva cita como exemplos de normas constitucionais de eficácia plena:

“[…]as hipóteses contempladas nos arts. 21 (competência da União), 25 a 28 e 29 e 30 (competências dos Estados e Municípios), 145, 153, 155 e 156 (repartição de competências tributárias), e as normas que estatuem as atribuições dos órgãos dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário (arts. 48 e 49, 51 e 52, 70 e 71, 84 e 101-122).”[5]

2. Normas constitucionais de eficácia contida

Caracterizam-se por possuírem aplicabilidade direta, imediata, porém não integral, visto que, são restringidas através de normas infraconstitucionais.

Segundo Michel Temer, em relação as normas de eficácia contida: “[…]são aquelas que têm aplicabilidade imediata, integral, plena, mas que podem ter reduzido seu alcance pela atividade do legislador infraconstitucional. Por isso mesmo, aliás, preferimos denominá-las de normas constitucionais de eficácia redutível ou restringível”.[6]

Por seu turno, Luciano Dutra leciona: “normas constitucionais de eficácia contida, enquanto não restringidas, não são iguais às normas constitucionais de eficácia plena, tão somente, produzem os mesmos efeitos”.

Como exemplo de norma de eficácia contida podemos citar o art. 133 da CF/88: “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.

Desta feita, haverá lei infraconstitucional que limite o exercício da advocacia.

Mantendo os ensinamentos de Luciano Dutra, que nos apresenta exemplos de norma constitucional de eficácia contida na própria Constituição Federal:

“[…]alguns exemplos em que a própria Constituição de 1988 diminuiu o âmbito de incidência de uma norma constitucional de eficácia contida: a) direito de propriedade: da leitura dos incisos XXII e XXIV do art. 5º, percebe-se que o próprio legislador constituinte originário limitou o exercício do direito de propriedade; b) restrições a direitos fundamentais impostas pela decretação de estado de sítio: o art. 139 restringiu o âmbito de incidência de diversos direitos fundamentais, dentre os quais a liberdade de locomoção, a intimidade, a inviolabilidade domiciliar e a propriedade. Importante que se diga, ademais, que a restrição pode ser operada por conceitos ético-jurídicos, como no caso do art. 5º, XXV, em que o “iminente perigo público” autoriza à autoridade competente a imposição de restrições ao direito de propriedade, a partir do instituto da requisição administrativa”.[7]

3. Normas constitucionais de eficácia limitada

Por seu turno, a norma constitucional de eficácia limitada possui aplicabilidade mediata e indireta, visto que, necessita da interposição do legislador através de uma norma infraconstitucional.

Desta feita, as normas de eficácia limitada não produzem seus efeitos essenciais e é dependente de regulamentação posterior a fim de lhe tornar eficaz.

Luís Roberto Barroso, sobre a norma constitucional de eficácia limitada, dispõe:

“[…]normas de eficácia limitada são as que não receberam do constituinte normatividade suficiente para sua aplicação, o qual deixou ao legislador ordinário a tarefa de completar a regulamentação das matérias nelas traçadas em princípio ou esquema. Estas normas, contudo, ao contrário do que ocorria com as ditas não autoaplicáveis, não são completamente desprovidas de normatividade. Pelo contrário, são capazes de surtir uma série de efeitos, revogando as normas infraconstitucionais anteriores com elas incompatíveis, constituindo parâmetro para a declaração da inconstitucionalidade por ação e por omissão, e fornecendo conteúdo material para a interpretação das demais normas que compõem o sistema constitucional”.[8]

As normas constitucionais de eficácia limitada, são subdivididas em: de princípio programático e de princípio institutivo.

3.1. Normas constitucionais de eficácia limitada de princípio programático

Limita-se em traçar princípios que requerem o cumprimento pelos órgãos executivos e legislativo, p.ex., em relação a programas, visando a realizações de fins sociais pelo Estado, no que compete as atividades de cada órgão.

Luciano Dutra as define da seguinte maneira:

“São as que estabelecem programas, metas, objetivos a serem desenvolvidos pelo Estado, típicas das Constituições Dirigentes. Impõe um objetivo de resultado futuro ao Estado, direcionando as ações legislativas dos órgãos estatais. Não diz como o Estado deverá agir, mas o fim a ser atingido. Como exemplos, os arts. 3º e 7º, IV.”[9]

Com intuito de melhor exemplificação, citamos também os artigos 196, 205, 215 e 217 da Constituição Federal.

3.2 Normas constitucionais de eficácia limitada de princípio institutivo

As normas constitucionais de eficácia limitada de princípio institutivo caracterizam-se por delinear as atribuições e estruturação geral dos órgãos, institutos e entidades, para posterior estruturação definitiva, definida por lei.

Por fim, com brilhantismo Luciano Dutra define:

“São aquelas que dependem de lei posterior para dar corpo a institutos jurídicos e aos órgãos ou entidades do Estado previstos na Constituição. Como exemplos, os arts. 88 e 102, § 1º. Essas normas podem assumir a natureza impositiva ou facultativa. As impositivas estabelecem um dever de legislar (arts. 33 e 88). Por seu turno, as facultativas trazem uma mera faculdade para o legislador (art. 22, parágrafo único). Acresça-se que as normas constitucionais de eficácia limitada definidoras de princípios institutivos possuem caráter subsidiário, isto é, se a norma constitucional depender de legislação infraconstitucional que lhe complete a eficácia e não for uma norma programática será institutiva.”[10]

Podemos citar também, a fim de exemplificação, os artigos 98 e 224 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

4. Considerações finais

As normas constitucionais possuem, conforme exposto, eficácia jurídica, todavia em grau de intensidade diversificado aplicáveis a determinado objetivo.

Apesar da existência de outras formas de classificação, aqui não abordadas, como é o caso do exposto na doutrina de Maria Helena Diniz. A partir deste artigo o leitor restará alicerçado para maior aprofundamento sobre o tema que não se esgota somente neste trabalho.

 

Referência
BRASIL. Constituição Federal de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acessado em: 06/10/2017.
BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo – Os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva 2ªed. 2010.
DUTRA, Luciano. Direito Constitucional Essencial. Rio de Janeiro: Forense. 2ªed. 2016.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva. 38ed. 2012.
SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais, São Paulo: RT, 1982.
SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. São Paulo. Malheiros. 1998.
TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros. 1990.
Notas
[1] FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva. 38ed. 2012. p.319.
[2] SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais, São Paulo: RT, 1982, p. 63 e segs.
[3] BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo – Os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva 2ªed. 2010. p. 250.
[4] DUTRA, Luciano. Direito Constitucional Essencial. Rio de Janeiro: Forense. 2ªed. 2016. p.46
[5] SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. São Paulo. Malheiros. 1998, p. 89.
[6] TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros. 1990. p. 27
[7] DUTRA, Luciano. Direito Constitucional Essencial. Rio de Janeiro: Forense. 2ªed. 2016. p.48
[8] BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo – Os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva 2ªed. 2010. p. 251.
[9] DUTRA, Luciano. Direito Constitucional Essencial. Rio de Janeiro: Forense. 2ªed. 2016. p.48
[10] DUTRA, Luciano. Direito Constitucional Essencial. Rio de Janeiro: Forense. 2ªed. 2016. p.48

Informações Sobre o Autor

Paulo Byron Oliveira Soares Neto

Licenciado e Bacharel em Matemática pela Universidade Ibirapuera; especialista em Gestão Escolar e Coordenação Pedagógica pela Uniasselvi; graduando em Direito (UNIP); Graduando em Engenharia de Produção (UNIVESP); Pós graduando em Ensino de Filosofia (UNIFESP); pós graduado em Direito Tributário e mestrando em Direito e Negócios Internacionais pela Universidade del Atlântico – Espanha.


Equipe Âmbito Jurídico

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