Apontamentos gerais sobre o Direito Internacional Econômico

Resumo: No decorrer das últimas décadas e no quadro de um amplo processo de globalização sem precedentes na história da Humanidade, o Direito Internacional Econômico adquire uma importância crescente nas relações econômicas internacionais. A presente conferência tem por objetivo apresentar aos diferentes interlocutores da academia uma visão panorâmica sobre as origens, o conceito, a natureza, o sistema de fontes, o objeto e a função das sanções do Direito Internacional Econômico. Para alcançar modestamente tal objetivo adotou-se uma metodologia dedutiva. Sinteticamente, conclui-se pela importância do Direito Internacional Econômico como instrumento fundamental para o desenvolvimento mundial. Desde a perspectiva brasileira, urge que o Direito Internacional Econômico ocupe o lugar que merece nos debates acadêmicos, governamentais, empresariais e sociais num contexto de atitudes cooperativas e pró-ativas objetivando o contínuo desenvolvimento integral de nosso maravilhoso país. Finalmente, a formulação de uma “Ciência Jurídica Apropriada” aos interesses dos países em desenvolvimento que defenda princípios e posições sólidas baseadas na verdadeira Justiça e Eqüidade representa um desafio de alta magnitude e importância não somente para o Brasil, mas também para o MERCOSUL, para a América Latina, para os países em desenvolvimento e para a própria Humanidade.


Palavras-chaves: direito internacional público – direito internacional econômico – cooperação internacional – comércio internacional


Sumário: I. Apontamentos iniciais sobre as origens do Direito Internacional Econômico (DIE). II. O conceito em movimento. III. A natureza jurídica e econômica. IV. O sistema de fontes. V. O objeto. VI. A relevância das sanções. VII. Considerações finais. Bibliografia. Fontes bibliográficas na Internet


“…Não é o Direito que está hoje em declínio, mas a influência da ciência jurídica sobre a evolução do direito.” Mohammed Bedjaoui, 1979.


I. APONTAMENTOS INICIAIS SOBRE AS ORIGENS DO DIREITO INTERNACIONAL ECONÔMICO (DIE)


No decorrer das últimas décadas e no quadro de um amplo processo de globalização sem precedentes na história da Humanidade, o Direito Internacional Econômico (DIE) adquire uma importância crescente nas relações econômicas internacionais.


Considerando a existência de um Direito Internacional Público (DIP) a partir de 1648 com a Paz de Vestália, cumpre ressaltar que o Direito Internacional Econômico representa uma ramificação DIP que, fundamentalmente ao longo do último século, vem adquirindo uma importância crescente na vida dos Estados e Organizações Internacionais contemporâneos.


Etimológicamente, é possível identificar o aspecto econômico e a natureza internacional deste Direito.


Historicamente, é lícito afirmar que as idéias liberais de Adam Smith, David Ricardo, John Stuart-Mill evocam o comércio livre e a doutrina revela que até o início do século XX havia uma relativa despolitização da esfera econômica nas relações internacionais. Neste sentido, é oportuno anotar que o DIE começa a adquirir notoriedade e certa autonomia com o adensamento das relações econômicas internacionais a partir do final da Segunda Guerra Mundial favorecidas pela expansão das idéias relativas ao liberalismo pela via da liberdade de comércio e organização política.


Vale ressaltar que as primeiras obras sobre o DIE somente aparecem em 1956 com ERLER e 1957 com MANN. Durante os anos sessenta e setenta foi bastante discutido mas sem resultados imediatos para os países em desenvolvimento, sendo que no transcurso dos anos oitenta permanece relativamente adormecido em um cenário internacional bastante incerto dadas as características de uma nova ordem geopolítica mundial com o fim da Guerra Fría.


Nos anos noventa com as sucessivas ondas de liberalização, privatização e renegociação das dívidas externas por um lado e por outro lado com o advento da proliferação dos modelos de integração regional e da Organização Mundial de Comércio (OMC), o DIE adquire renovado status e imprescindibilidade nas relações internacionais vivendo um ponto de conexão entre o liberalismo e o protecionismo, em um cenário de equilíbrio instável derivadas destas duas polaridades que afetam diretamente alguns bilhões de cidadãos em nosso planeta Terra.


II. O CONCEITO EM MOVIMENTO


Doutrinariamente, existem diferentes conceitos sobre o Direito Internacional Econômico. Tais conceitos, dado o adensamento das relações econômicas internacionais, encontram-se em contínua reformulação pelo que se refere ao seu sistema.


Para efeitos didáticos, o DIE representa um ramo do Direito Internacional Público que busca regulamentar juridicamente os problemas referentes à produção, ao consumo e à circulação de diversos fatores de produção tais como bens, pessoas, capitais e serviços em escala macro-econômica. Abrange, portanto, o direito da cooperação, do comércio, dos investimentos, das instituições econômicas internacionais, da integração regional e multilateral, como também o desenvolvimento.


III. A NATUREZA JURÍDICA E ECONÔMICA


O DIE apresenta uma natureza jurídica internacional de carácter desenvolvimentista, econômico e cooperativo. Ainda, diferentemente do DIP que seria um direito de proteção da riqueza e independência dos Estados ancorado na idéia de soberania absoluta, o DIE seria um direito de expansão da riqueza e interdependência dos citados Estados baseado em uma relativa soberania operacional.


IV. O SISTEMA DE FONTES


Pelo que se refere às fontes do DIE, estas são basicamente as mesmas do DIP com as seguintes particularidades, a saber: a) Tratados; b) Costumes; c) Princípios Gerais do Direito; d) a Jurisprudência Internacional; e) a Doutrina de eminentes publicistas; f) as normas das Organizações Internacionais, tais como o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial, a OMC e a própria Organização das Nações Unidas e demais Organismos especializados, entre outras; g) determinados atos unilaterias dos Estados[1] com influência no plano internacional; e h) os atos de empresas transnacionais que provocam repercussões de alta magnitude[2] em escala planetária. Quanto a esta última, portanto, percebe-se a característica de direito privado no sistema de fontes do DIE.


V. O OBJETO


O objeto último do DIE é o Desenvolvimento[3] e a Paz[4]. Neste sentido para alcançar estes objetivos últimos num longo processo evolutivo que se confunde com a própria humanidade, o DIE possui um conteúdo variável que demanda do internacionalista um amplo conhecimento do direito internacional da cooperação, do direito do comércio internacional, do direito internacional monetário, do direito das instituições econômicas internacionais, do direito internacional da integração, do direito comunitário, do direito internacional do desenvolvimento, bem como da história, da economia, das ciências políticas, da sociologia, da antropologia e das relações internacionais, entre outras áreas do conhecimento.


VI. A RELEVÂNCIA DAS SANÇÕES


Conforme se observa o instituto de solução pacífica de controvérsias no âmbito do DIP, verifica-se que o mesmo possui as seguintes características: soluções extra-jurisdicionais e jurisdicionais.


Contemporâneamente, no quadro do DIE, caso seja analisada a peculiaridade do sistema de solução de controvérsias da OMC pode-se afirmar que nos encontramos com um modelo sui generis pois o mesmo apresenta um caráter intermediário. Não cabe neste momento entrar em profundidade sobre este aspecto que apresenta características próprias, tais como a política, a economia e o próprio Direito e extravasaria o objeto deste estudo que trata de estabelecer noções genéricas sobre o Direito Internacional Econômico.


De modo que no quadro das sanções, o DIE considera antes de mais nada que o dano econômico é mais importante do que o ilícito jurídico e demanda portanto uma maior agilidade resolutiva.


As sanções no DIE são de cunho econômico-moral e no mais das vezes são aplicadas no sentido de privarem o autor da violação das vantagens econômicas eventualmente auferidas. As sanções igualmente apresentam duas características fundamentais, entre outras, a saber: i) obrigar o Estado ou Organização Internacional a cessar a infração e ii) restaurar o equilíbrio dos múltiplos interesses econômicos envolvidos.


VII. CONSIDERAÇÕES FINAIS


A modo de síntese, conclui-se pela importância do Direito Internacional Econômico como instrumento fundamental para o desenvolvimento e Paz mundial.


Desde a perspectiva brasileira, urge que o Direito Internacional Econômico ocupe o lugar que merece nos debates acadêmicos, governamentais, empresariais e sociais num contexto de atitudes cooperativas e pró-ativas entre si que objetive o contínuo desenvolvimento integral de nosso maravilhoso país.


Finalmente, o Brasil pode e deve contribuir ativamente na formulação de uma “Ciência Jurídica Apropriada” aos interesses dos países em desenvolvimento no quadro do Direito Internacional Econômico que se consolida dirariamente em importância e oportunidades.


Uma “Ciência Jurídica Apropriada” que defenda princípios e posições sólidas baseadas em uma Verdadeira Justiça e Eqüidade representa um desafio de alta magnitude e importância não somente para o Brasil, mas também para o MERCOSUL, para a América Latina, para os países em desenvolvimento e para a própria Humanidade.


 


BIBLIOGRAFIA

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Notas:
[1] Sejam atos administrativos, judiciários, entre os quais podem ser mencionados a alteração das taxas de juros por parte de um Estado. O caso das desvalorizações relativas à crise Mexicana e a desvalorização do Real ilustram a relevância dos atos unilaterais dos Estados no plano internacional.

[2] Tais atos constituem-se em delicado e controverso assunto nos debates acadêmicos. Como exemplo, podem ser mencionados os mercados privados de euro-bonus, as ações concertadas de empresas de telefonia no Cone Sul, entre outros casos.

[3] O Direito Internacional do Desenvolvimento consiste no conjunto de normas destinadas a proporcionar o Direito ao Desenvolvimento que é um Direito Síntese que implica

[4] . O exercício da Paz é um imperativo. Os diversos instrumentos jurídicos internacionais relativos aos sistemas de promoção e proteção dos Direitos Humanos, à defesa expressa das liberdades fundamentais, do Estado Democrático de Direito, do Dever de Cooperação, de Defesa do Meio Ambiente e ao Direito de Solidariedade igualmente ilustram o ideal “búdico-socrático-cristão-kantiano” finalmente positivado em documentos escritos que atestam um grande progresso da Humanidade cansada das lutas fraticidas no transcurso de sua história


Informações Sobre o Autor

Fernando Kinoshita

Doutor em Direito Internacional e Comunitário pela Universidad Pontificia Comillas, Espanha; Professor dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Santa Catarina; Pesquisador do CNPq e CAPES; Consultor em Direito Público Interno e Internacional, Cooperação e Negócios Internacionais.


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