Apreciações sobre o fato e o direito

Do brocardo jus ex facto oritur sublinha-se a relação de criação existente entre direito e fato. Nas palavras de M. Virally há entre eles uma relação dupla. Também há entre eles uma relação de aplicação: o direito se realiza nos fatos. É mais evidente ao observarmos a atuação do juiz que aplica aos fatos as regras de direito que os regem.


Deve-se investigar como pode passar de uma certa situação fática para a regra de direito, ou vice-versa. Há um constante vaivém do direito aos fatos, registre-se a vocação dos fatos para serem regidos pelo direito e sendo este destinado a reger os fatos.


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É justificável, portanto que quando o direito e o fato sejam isolados um do outro em numerosos mecanismos jurídicos, como a prova, o princípio do dispositivo, o controle de constitucionalidade e, etc e que sejam muito freqüentemente confundidos na realidade, quando se trata de apreender situações concretas no sistema jurídico.


Na via traçada e consagrada pelos juristas desde da Antigüidade continuando adentro da Idade Média, o raciocínio jurídico continua baseado no silogismo sendo este um suporte genérico para qualquer aplicação do direito.


Segundo o Dicionário Básico de Filosofia de Hilton Japiassú e Danilo Marcondes  in litteris: o silogismo (do latim syllogismus, do grego syllogismós) Método de dedução de uma conclusão a partir de duas premissas por implicação lógica.


Para Aristóteles, considerado o primeiro formulador da teoria do silogismo, “o silogismo é um argumento em que, estabelecidas certas coisas, resulta necessariamente delas, por serem o que são, outra coisa distinta do anteriormente estabelecido.”(Primeiros analíticos, I, 24). Ex: “Todos os homens são mortais, todos os gregos são homens, logo, todos os gregos são mortais”.


A conclusão se obtém assim por um processo de combinação dos elementos contidos nas premissas através do termo médio (no exemplo, “homens”), que permite relacionar os outros termos (no exemplo; “gregos” e “mortais”) aí contidos formando uma nova proposição. Segundo as regras do silogismo não é possível que as premissas sejam, verdadeiras e a conclusão seja falsa.


Aristóteles classifica todos os tipos possíveis de silogismos válidos em três figuras ou esquemas. Na primeira figura, o termo médio é sujeito na premissa maior (a que contém o termo de menor extensão); na 2ª, o termo médio é predicado em ambas as premissas; na 3ª,o termo médio é sujeito em ambas as premissas.


Atribui-se ao filósofo e médico Claudico Galeno (c.130-c. 200) uma 4ª, figura em que o termo médio é predicado na premissa maior e sujeito na menor.No exemplo acima, temos um silogismo categórico, em que as premissas as asserções, isto é, proposições que afirmam ou negam algo.


Podemos ter também silogismos modais cujas premissas são proposições que envolvem modalidade e silogismos hipotéticos, cujas premissas incluem proposições hipotéticas.


A teoria do silogismo de Aristóteles sofreu uma série de modificações e desenvolvimentos na escola aristotélica e na escolástica. No período moderno sua importância vai sendo progressivamente menor até dar lugar no séc. XIX à lógica matemática e aos cálculos proposicional e dos predicados formulados inicialmente por Frege.


A premissa maior é a regra de direito e, a menor o caso concreto. A conclusão oriunda da comparação; constitui a sentença pela qual se aceita ou se rejeita a aplicação, no caso concreto, do efeito jurídico implicado pela maior.


A determinação de quais as regras jurídicas aplicáveis aos fatos pressupõe que tais fatos estejam estabelecidos e qualificados para que possam ser apreendidos pelo sistema jurídico. E seus efeitos jurídicos expressam a reação do direito positivo à situação que eles representam.


A dificuldade essencial reside na determinação das premissas, a lei leva em consideração um fato, um leque de circunstâncias no qual é colocado o homem, para daí se extrair as conseqüências jurídicas.


O fato primeiro é o ato humano que se prende por causalidade ao efeito jurídico que, conforme os casos, foram deliberadamente buscados ou, ao revés, não foram desejados.


Se for estabelecido o homicídio, seu autor é passível de pena de reclusão criminal.


Diferentemente do que acontece, por exemplo, com uma lei física, a realização de um efeito jurídico supõe a reunião de várias e complexas condições. Com os fenômenos físicos, o efeito é automático já o vínculo de causalidade entre o fato e o direito opera-se somente no plano das representações intelectuais.


Na órbita jurídica, o efeito não segue inevitavelmente a causa, o homicida nem sempre é descoberto, preso e condenado, apesar do fato ser absolutamente punível.


Ademais, o fato não produz sozinho, os efeitos de direito. È curial que exista uma regra jurídica que se aplique a tais fatos, e então tais efeitos e assim se construa a premissa maior do silogismo.


É necessário também que a autoridade determine a regra aplicável á esses fatos e extraía dele suas conseqüências.


Com as premissas, erguem-se duas principais dificuldades: uma para determinar a menor, a situação de fato que tem de ser estabelecida. E para detectar a maior, identificar nessa situação, noções, regras e instituições jurídicas, ou seja, conceituá-las.


A prova, a priori, parece ser um mecanismo lógico de verificação da realidade de um fato ou de uma alegação. Tal concepção de prova despreza o contexto e a objetividade da prova judiciária e que a diferencia da prova científica.


Na Ciência do Direito, a investigação da verdade é muitas vezes ocultada por imperativos da segurança jurídica.


O objetivo da prova é maior que convencer o juiz do que o de estabelecer a verdade objetiva. A verdade é investigada na paixão do processo que se traduz num processo dialético. E não na serenidade fria de um laboratório.


A prova é administrada dentro dos limites de um prazo razoável necessário à intervenção de uma decisão e para qual deve ser considerada suficiente ou insuficiente. Já que ao juiz não é permitido sob pena de denegação de justiça, abster-se de julgar.


A prova judiciária não é como a científica obra de um pesquisador que a concebe e testa. A prova judiciária é resultado do concurso de várias pessoas, o juiz e as partes.(Lévy-Bruhl Aspects sociologiques du droit, M. Rivière et Cie, 1955).


Uma análise crítica do direito da prova baseada no efeito das técnicas jurídicas da prova e não nas finalidades do direito da prova que se concentra mais na legitimidade dos mecanismos de prova do que propriamente na investigação da verdade real e objetiva.


A existência de provas pré-constituídas e a determinação do ônus da prova servem para legitimar decisões judiciais ainda que a verdade processual ou judiciária seja tão-somente uma verdade relativa e condicionada.


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A prova com o objetivo central a criação de uma convicção no juiz foi por muito tempo uma “prova mística” notadamente em matéria penal.


Nas sociedades primitivas a prova era um apelo aos deuses, aos poderes sobrenaturais para lhes pedir que apontassem o culpado; consistente nas ordálias, nos juízos de Deus, onde as provas eram impostas aos suspeitos para se conhecer a verdade.


Nos julgamento de Deus aquele que triunfar nessas provas, é porque Deus assim o designou como quem diz a verdade ou defende uma causa justa. Tais julgamentos foi praticados até o Concílio de Latrão (1215) e até hoje as ordálias são praticadas em algumas sociedades primitivas. E o juramento se inspira no mesmo espírito.


Nas ditas sociedades evoluídas, o sistema de provas racionais substituiu progressivamente o sistema de provas místicas. O progresso culminou ou com a abolição da tortura e a rejeição da soberania absoluta da confissão (regina probatorum) em direito penal.


Os progressos tecnológicos e científicos demonstraram que tanto na seara cível como a penal, a fragilidade dos depoimentos, o valor dos indícios, a qualidade de novos meios de prova que já não visam apenas a convencer o juízo, mas também estabelecer a realidade objetiva.


Duas concepções de provas persistem possíveis conforme nos atermos à convicção do juiz baseado (no conjunto das informações que lhe puderam ser dado) ou exigimos verdadeiras provas materiais, diretas e objetivas conforme os moldes pré-constituídos.


Em toda matéria, não basta ter razão, ser titular de um direito ou estar em certa situação jurídica; é curial prová-lo; na ausência de provas, tudo passa como se o direito ou a situação invocada não existisse ou como se a pessoa estivesse errada.


Alegado e não provado; tratar-se-ia de mera alegação infundada. As noções distintas de direito e prova cuja independência se firma na proporção da liberdade de prova.


Portanto, quanto maior for a maleabilidade do direito da proba, sendo maior liberdade de prova, mais a prova se aproximará da verdade. Porém, a liberdade favorece aos excessos, atrasos e falsas provas; falso testemunho e outras falsificações.


Conforme o particular das matérias, cumpre o direito modular as provas levando em contra a aptidão ou a resistência dos fatos à prova, conforme a natureza deles.


Certos fatos se furtam à prova, à míngua dos meios de investigação suficientemente seguros.Outros fatos escapam, pois ocorrem sem testemunhas, e não deixam vestígios, são cobertos pelo sigilo profissional ou técnico, e não se prestam bem a uma estimativa ou ainda, colidem com a consciência individual.


De certo quando a prova é dificílima ou impossível o direito renuncia à prova e recorre a presunções cuja utilidade depende do objeto da prova.


Para melhor identificarmos a presunção na sistemática cível brasileira, analisemos os arts. 8, 212, v, 1598, 1597 CC/2002 e, ainda o art. 335 do CPC.


É clássico o busilis do objeto da prova.A prova versa somente sobre os elementos de fato. As partes não precisam provar a existência ou o mesmo o alcance das regras jurídicas aplicáveis a tais elementos, supõe-se que o juiz conhece o direito, e a invocação das partes sobre certas regras é apenas para sugerir aplicação delas e, não para provar-lhes a existência. A indicação é meramente elucidativa e não forçosamente obrigatória a sua aplicação. Tanto que o juiz com seu livre convencimento pode extrair diverso entendimento da pretensão exposta.


Do brocardo “Da mihi factum, dabo tibi jus”, incumbe às partes estabelecer na justiça os fatos necessários ao sucesso de suas pretensões. E nisto, o Código de Processo Civil francês em seu art. 9º e 6º, menciona expressamente.


A princípio, o juiz não pode fundamentar sua decisão nos fatos que não estão em debate, ao menos no sistema acusatório.


É o juiz que diz o direito (art. 12 do CPC francês) e dispõe de lautos poderes de iniciativa e de qualificação.


As pretensões das partes se fundamentam em dois tipos de elementos, os de fato correspondente ao “edifício do direito”, dependem das partes, com uma participação maiôs ou menos ativa do juiz, seguindo os sistemas.


Os elementos do fato são constituídos pelos fatos e atos jurídicos que servem de base a uma pretensão, e deles depende o desfecho do processo.


Já os elementos do direito são as regras jurídicas suscetíveis de serem aplicadas, à esses fatos. A distinção entre o fato e o direito fica, porém, abalada quando se trata de aplicar as leis estrangeiras, regras consuetudinárias ou usos.


Quanto ao direito estrangeiro compete às partes que os invocam estabelecer a existência e o conteúdo deles.


Os fatos que se devem provar são somente os contestados. Um fato reconhecido ou não contestado não necessita de ser provado, pois é tido como verdadeiro. E nesse sentido corrobora o art.334 do CPC Brasileiro.


O que pode acarretar deformações da realidade objetiva, mas admite-se, em geral, que as partes devem ter o domínio do “edifício de fato” de seu processo. Exceto no caso de fraude processual engendrada pelos litigantes, o juiz cível não tem de controlar de ofícios as situações de fato sobre as quais estão de acordo as partes.


A prova de direito pode somente versar sobre fatos pertinentes e admissíveis. E a admissibilidade da prova depende de sua conformidade com o sistema de direito.


De um lado o sistema jurídico às vezes proíbe certas provas em nome de valores essenciais ou de ordem pública. Como, por exemplo, a autoridade da coisa julgada que proíbe contestar o que foi definitivamente julgado.


De outro lado, o direito da prova pode tanto se reportar a um sistema de liberdade no qual as partes possuem sem hierarquia de princípio livre escolha de procedimentos de prova, quanto a um sistema de prova legal que limita a prova a certos procedimentos e lhe impõe o alcance; já outros modos de produção de provas são inadmissíveis.


O direito anglo-saxão comporta várias exclusionary rules, apesar de reconhecerem a importância dos depoimentos. Ele reserva ao direito de prova (evidence law) um lugar considerável que se deve a razões históricas e técnicas a um só tempo.


Foi perante o juiz que o direito inglês conquistou muito das liberdades e forjou o sistema jurídico. Onde o adjective law (a lei adjetiva) conserva uma importância preponderante. E isto repercute nos países de direito misto como no Canadá.


A prova só deve ser produzida, caso revelar-se útil ao desfecho processual. A pertinência da prova é medida de economia processual e supõe uma adequação de seu objeto da prova ao objeto do litígio.


Os fatos alegados devem ter relação direta com que está sendo julgado e a prova deve obter uma demonstração apropriada.


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O juiz só admite prova dos fatos nos quais as partes fundamentam suas pretensões e dos elementos aptos para justificá-los.


Nos países da América do Sul especialmente os tribunais se omitem, de controlar a pertinência da prova, o que só avoluma o processo e favorece as manobras protelatórias.


A pertinência da prova depende do vínculo entre os fatos alegados e os fatos cuja prova é oferecida. Também se deve saber se é possível substituir uma prova direta por presunções.


A presunção é um modo de raciocínio jurídico em virtude do qual se induz, do estabelecimento de um fato, um outro fato que não resta privado.


Há uma distinção entre as presunções legais e as de fato (ou de homem). Legais ou de fato, as presunções correspondem a situações de resistência dos fatos à prova. Inferem-se fatos desconhecidos através de fatos conhecidos.


Algumas delas como a presunção de boa fé impõe a quem alega, prová-la nem que seja por exclusão. A presunção de inocência em direito penal proteger, as pessoas contra a arbitrariedade; a presunção de legalidade da coisa decidia pela administração pública facilita o exercício da função pública.


A presunção legal concede a uma das partes em nome de considerações  de política jurídica e de certos valores que se tende a proteger. As presunções interessam tanto ao fundo do direito quanto ao direito de prova.


Quando a lei presume que a criança nascida durante o casamento tem como o pai o marido da mãe, labora uma dispensa à criança de estabelecer sua filiação, o que seria muito difícil de fazer.


Desloca assim o objeto da prova, pois em vez de ter de estabelecer a filiação da criança, ela só impõe estabelecer o nascimento durante o casamento da mãe daí deduz-se a filiação a propósito do pai. Enfim tal presunção favorece a família legítima. Apesar de que tais adjetivos não mais se compadecem face ao texto constitucional brasileiro vigente.


As presunções simples ou juris tantum podem, contrariamente às presunções irrefragáveis, chamadas também de presunções absolutas, ou juris et jure.


Quanto maior o progresso técnico facilita a prova, mais fácil é o restabelecimento da verdade. Os progressos da genética permitem hoje estabelecer com quase exatidão a uma filiação colocando em xeque a presunção de paternidade.


A melhoria dos meios de provas atenua proporcionalmente o artifício das presunções simples. As verdadeiras presunções absolutas que não podem ser infirmadas nem mesmo pela confissão ou juramento, são fundadas em considerações de ordem pública.


É o caso da presunção da autoridade da coisa julgada que garante a segurança jurídica necessária à decisões judiciais definitivas.


Em compensação, as presunções de fato apenas são meros meios de prova. No terreno probatório, o juiz utiliza-as somente para forjar sua convicção. São, pois inumeráveis e aplicáveis a todos tipos de fatos, ao passo que as presunções legais devem ser especialmente previstas.


E se apóiam em diversos indícios que vão desde as constatações materiais, perícias até pareceres jurídicos. O juiz dispõe de plena liberdade de apreciação no tocante as presunções de fato. Em alguns casos, somente admissíveis nos casos em que a lei acolhe a prova testemunhal.


Em síntese, o estabelecimento dos fatos embora se procure atingir a realidade sobre a qual se deva aplicar-se a regra jurídica, é enquadrado pelo sistema jurídico que leva em conta as necessidades ou impossibilidades materiais e outros princípios de direito, considerações de políticas jurídicas e exigências puramente técnicas que acabam por deformar ou deturpar a imagem da realidade.


Tais diversos fatores de distanciamento são cada vez maiores uma vez que a apreensão do fato pelo direito pressupõe que, uma vez estabelecidos os fatos e consumada a descrição deles, eles recebem uma qualificação jurídica.


Um fato não pode galgar efeitos jurídicos por suas qualidades intrínsecas, é preciso que uma norma jurídica lhe atribua uma qualidade que lhe falta, ou seja, um significado particular.


O direito contemporâneo reconhece importantes efeitos jurídicos ao concubinato, que continua, porém, uma simples situações de fato, com exceção dos direitos reconhecidos ao concubinos por diversos textos legais recentes e da provável consagração próxima de um estatuto jurídico específico; ele aproxima a união livre do matrimônio quando lhe toma as aparências mais peculiares que são a estabilidade e a notoriedade.


Assim as exigências da proteção jurídica conduzem a fazer o fato triunfar sobre o direito, portanto, a corrigir os efeitos normais deste, em circunstâncias em que a ordem social o exige.


Mas acontece também que para sua coerência técnica ou para proteção de certos valores ou de certas instituições, a ordem jurídica em vez de acatá-las, rejeite as realidades concretas.


É comum o direito substituir a realidade pela ficção que corresponde a um procedimento de técnica jurídica pelo qual se considera como existente uma situação manifestamente contrária à realidade e que permite deduzir dela conseqüências jurídicas diferentes daquelas que resultariam da simples constatação dos fatos.


No direito sucessório temos a ficção da continuação da pessoa do falecido pela dos herdeiros que permite evitar toda  a ruptura na propriedade dos bens sucessórios.


Assim também o filho natural legitimado ou mesmo o filho adotado é apresentado como filho legítimo. Destaque-se que a Constituição Federal Brasileira equiparou todos os filhos suprimindo os adjetivos discriminatórios e os equiparando em direitos e deveres para todos os fins.


Portanto, a ficção consiste em submeter uma realidade social ao poder da mente, absorvendo-a num conceito de maior ou menor artificialidade.


É uma alteração voluntária do real, um artifício jurídico destinado a produzir resultados úteis.


François Geny bem assevera que falseando deliberadamente a realidade das coisas, as ficções redundam em sujeitar a vida social a preceitos julgados desejáveis.


As funções das ficções jurídicas nos mais variados sistemas jurídicas e, principalmente pela larga utilização feita pelo direito romano.


Classicamente é reconhecidas uma função histórica e uma dogmática. Na primeira, a ficção teria permitido introduzir na vida social, regras jurídicas novas.


Seria assim uma extensão do direito existente. O direito une assim o futuro ao passado com a vantagem de manter o estatismo do direito.


Pela ficção da personalidade moral das sociedades, a propriedade dos bens pertencentes À sociedade pôde ser considerada uma propriedade individual.


A ficção é uma homenagem prestada aos princípios jurídicos servindo para enquadrar as soluções jurídicas nos sistemas do direito positivo fechado. Assim as ficções teriam, portanto, uma ficção dogmática permanente.


Também cumprem funções de técnica jurídica por sua utilidade dogmática e mecânica conforme os casos de naturezas histórica e teleológica.


Por sua função teleológica as ficções tendem proteger ou promover certas instituições, certos princípios, certos valores. A adoção ou a naturalização são bons exemplos dessas ficções.


As ficções podem, assim, contribuir para represar a derivada dos fatos sociais e para salvaguardar valores julgados essenciais.


A doutrina alemã mostrou com Savigny e Ihering os preciosos serviços que as ficções prestaram ao direito romano. Também o direito inglês mostra tal importante contribuição.


Importantes autores como Ihering e Windscheid, os franceses, como Saleilles e Demogue reconheceram-lhe um lugar importante na elaboração do direito.


Gény mostrou que, embora a ficção deva ser rejeitada quando se trata de descobrir”dado”, ela conserva um papel importante de instrumento terminológico e deve-se mesmo conservá-la no terreno conceptual.


Ripert sustentou também que é preciso desconfiar de uma habilidade técnica grande demais que permite dissimular a violação dos princípios e introduzir no direito, elementos artificiais que lhe modificam o sentido e o alcance.


As ficções não podem ser aprovadas, se são apenas um procedimento contrário ao bom senso.


A factividade material do direito sua, praticabilidade pressupõem evitar um sério divórcio entre direito e os fatos. Nossa era vivencia a revolta dos fatos contra o direito que arruína a efetividade do direito e consagra a anarquia ou provoca o autoritarismo.


Mas na indispensável continuidade do direito no ajuste que se impõe entre o positivismo sociológico e o idealismo e dentro da perspectiva da coerência dos sistemas jurídicos, as ficções continuam sendo uma preciosa ferramenta e o que melhor opera a conjunção harmônica do fato com o direito.


A distinção entre o fato e o direito é, porém, artificial em alguns casos como na interpretação dos contratos. Ou em casos de lei estrangeira é uma questão de fato, o que é contestável.


Tal artifício talvez ateste a indissociabilidade essencial entre o fato e o direito.


A confissão é o reconhecimento que uma pessoa faz, quanto ao fato alegado pela outra, e, em benefício desta. Pode ser judicial ou extrajudicial, conforme se realize no curso do processo ou fora dele. No primeiro caso, constitui prova plena para todos os atos cuja validade não seja dependente de requisito formal.


È, sem dúvida, a mais convincente das provas daí reputar-se como probatio probantissima, pois que a adesão da parte à veracidade do fato invocado contra ela própria é em si mesmo a negação da contradita e da controvérsia. Deve ser pronunciada pela própria parte, mas vale também a que é efetuada por seu procurador ou representante desde que munido de poderes especiais.


A confissão uma vez feita em juízo, reputa-se indivisível, no sentido de que a parte que invoca a confissão do adversário tem de aceitá-la por inteiro. Não lhe é lícito cindi-la e, aproveitar o que lhe convém, repudiando-a na parte que lhe seja desfavorável.


Não obstante o peculiar valor da confissão há fatos que a lei não admite que se provem por meio desta. Assim, nas ações de divórcio e anulação de casamento, como nas de nulidade de testamento, não pode o juiz proferir sentença baseada em confissão real ou ficta do fato alegado, porque há aí um interesse público em jogo, insuscetível de transação privada.


Ao lado da confissão, admitia o direito o juramento sendo um meio probatório solene e consistente numa afirmação ritual da veracidade do fato invocado, era existente em nosso direito positivo anterior (Regulamento 737, de 25 de novembro de 1850), e guarda reminiscência da era medieval, quando o utilizava com freqüência e proveito em razão do fervor religioso e podia-se realizar em Juízo em caráter supletivo.


Todavia, este mesmo caráter religioso perdeu sua razão de ser com a laicização do direito ainda que existe excepcionalmente em algumas legislações.


A presunção segundo o grande mestre Caio Mário da Silva Pereira é a ilação que se tira de um fato certo, para prova de um ato desconhecido inspirado em Clóvis Beviláqua. Não é propriamente uma prova, e, sim um processo lógico por via do qual a mente atinge a uma verdade legal.


Na base de uma presunção há de estar sempre um fato, provado e certo; não tolera o direito que se presuma o fato, e dele se induza a presunção, nem admite que se deduza a presunção da presunção.


Segundo a tradicional divisão, estas podem ser comum (praesumptio homins) aquela que a lei não estabelece, mas funda-se no que ordinariamente acontece, de outro lado, as presunções legais, criadas pelo direito positivo para valerem como prova do fato, ou da situação jurídica.


Resultam as presunções legais da experiência e correspondem àquilo que normalmente acontece, e assim tem-se erigido em técnica legal probatória.


As presunções legais, a seu turno se subdividem em absoluta e relativa. As primeiras são aquelas que não se admite prova em contrário. É uma dedução que a lei extrai, necessariamente, de um fato certo, e que não comporta contradita, ainda mesmo no caso de não corresponder à verdade.


Há um interesse de ordem pública em que seja tido pro veritate, e impede apareça o interesse privado fundado na prova de que não é verdade.


Já a praesumptio iuris tantum (relativa) pode ser ilidida, e só prevalece enquanto não contraditada por outra prova. Vigora muito freqüentemente a presunção relativa em matéria de interesse privado (como no caso de remissão de dívida decorrente da devolução do título ao devedor)


Entre as irrefragáveis presunções se inscreve a coisa julgada que na definição da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, art. 6º, §3º, é a decisão judiciária de que já não caiba recurso. Compete ao processo civil formular os requisitos da res iudicata, cabe ainda à Ciência do Direito processual definir o que é coisa julgada material e formal, sendo do campo do direito judiciário a incumbência de precisar as condições subjetivas e objetivas da res iudicata, e, ainda a lei processual estabelecer quando a sentença não é mais atacável.


O civilista estuda a res iudicata dentro da escala de provas, e, estatui que importa numa presunção de verdade. O fato afirmado, ou a relação jurídica declarada pela decisão definitiva, não comporta contradita.


Assim, não pode a coisa julgada ser altera nem sequer por norma legislativa porque na sistemática brasileira é defeso ao legislador votar leis retroativas e, a Constituição Federal em art. 5º, XXXVI, assenta expressamente que a lei não prejudicará a coisa julgada.


Não pode nem mesmo ser alterada por outra sentença, porque a exceptio rei iudicate, levantada como prejudicial, requer a apreciação liminar do juiz e constitui obstáculo a novo iudicum de mérito.


E não pode ser negada pela parte a quem é oponível, porque é uma garantia oferecida pela ordem jurídica ao indivíduo, no sentido de facultar-lhe a dispensa de comprovar, em Juízo ou fora dele, aquilo que constituiu objeto da parte dispositiva do julgado.


A autoridade da res iudicata reside perante as partes ou seus sucessores, enquanto o mesmo objeto, e pela mesma causa petendi por traduzir a presunção de verdade inexorável, significando que o que foi decidido é verdade – res iudicata pro veritate habetur.


Não cabe argumentar erro judiciário, e nem mesmo a falibilidade do homem que sentenciou porque, não se pode ambicionar a construção da verdade absoluta ou verdade ideal.


Deve se contentar com a verdade legal ou judicial que é a resultante do que ficou apurado no processo e proclamado pelo juiz, e é esta a verdade que é tida como insuscetível de alterada, acrescentando in verbis: “A coisa julgada faz, do branco, preto, e do quadrado, redondo”. Para acentuar-se a ineficácia de qualquer tentativa em contraditá-la dispensado de dar outra prova em cujo favor milita.”


Modernamente se reflete sobre a apreciação de processos técnicos como meio probatório, a reprodução de voz por gravadores eletrônicos, a exibição de película cinematográfica, a fotografia, o video-tape e o videocassete.


Em princípio seu valor probante é inegável. A gravação de som e mesmo de imagens se pode fixar as conversas e depois reproduzi-las na vivacidade dos diálogos, presta-se, entretanto, a deturpações, supressões de trechos, enxerto de declarações e, uma série de edições que podem produzir sem deixar o menor vestígio.


Por tal fato, não é tão possível aceitá-la como meio probatório, senão com o máximo de cautela. Também a filmagem e a fotografia são suscetíveis de alterações. Todavia, a quem tiver de fazer uso desses e de outros processos técnicos, agir com moderação e prudência, e, sobretudo não se impressionar com sua aparente exatidão, pois podem facilmente ocultar manipulações e fraudes.


Tanto assim que o Anteprojeto de Código de Obrigações laborado pelo brilhante professor Caio Mário e outros doutrinadores insignes em seu art. 19 previa “que a prova resultante da reprodução mecânica de som e imagem, admitida como plena, somente se confirmada pela confissão”


Fora daí, recebe-se tais meios probatórios com extrema cautela, e o CPC neste assunto inferiu expressamente que se admitindo a reprodução mecânica da imagem e do som, ressalvando que, se for impugnada à autenticidade o juiz ordenará perícia (ex vi art. 383 do CPC).


De todo jeito, enfim, o direito e o fato se entrelaçam e justificando sua missão maior de propiciar a pacífica convivência social.


 


Referências

Roger, J.C. La preuve civile. 2ª.ed.,Y Blais, 1995.

Lévy-Bruhl, H. Aspects sociologiques du droit, ed. M. Rivière et Cie, 1955.

Motulsky, H. Príncipes d`une  réalisation méthodique du droit prive, Lyon, 1948

Virally, M. La pensée juridique., ed., L.G.D.J, 1960.

Marty, G. La distinction du fait du droit, Toulouse, 1929.

Gény, F. Sciense et technique en droit privé postif, tomo III, 1955

Perelman, Chaim Le fait est le droit, 1961; Logique juridique – nouvelle  rhétorique, 1965.

Japiassú, H., et Marcondes, Danilo. Dicionário básico de filosofia 3ª, edição ver.ampliada, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editores, 1996, págs 247,248.

Pereira, Caio Mário da Silva Instituições de direito civil. Rio de Janeiro. Forense. 2000.


Informações Sobre o Autor

Gisele Leite

Professora universitária, Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, pedagoga, advogada, conselheira do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas.


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