Art. 64 da ADCT: exemplar, gratuito e integral da constituição como elemento garantidor da democratização da Norma Constitucional

Resumo: Será apresentada na pesquisa assunto que infelizmente quase não é cogitado pela doutrina brasileira, refere-se ao artigo 64. da ADCT – Atos das Disposições Constitucionais Transitórias. A pesquisa analisará o presente artigo trazendo para o leitor curiosidades e solucionando dúvidas aparentes, já que será comentado as disposições legais de cada ponto importante do artigo 64 da ADCT. O foco de nossa pesquisa parte das seguintes indagações: Qual a validade da norma constitucional se ela não for conhecida por todos os cidadãos brasileiros? Como os cidadãos podem cobrar os seus direitos se deles desconhecem? Como podem ter acesso e/ou participar dos órgãos públicos do Estado se não sabem como proceder? Dentre outras perguntas pertinentes. As questões levantadas levam a análise do artigo 64 da ADCT, justificando sua importância, já que o artigo garante um exemplar da Constituição a cada cidadão brasileiro. Democracia, Estado de Direito, direitos e garantias fundamentais, acesso e participação dos cidadãos brasileiros aos órgãos do Estado também serão assuntos da pesquisa. Todos estes elementos serão analisados conjuntamente com o artigo 64 da ADCT, destacado como garantidor da democratização da norma constitucional.


Sumário: Resumo; Introdução; 1.0 Art. 64 Da ADCT e a Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988; 1.1 A Democracia, o Estado de Direito, e o Art. 64 da ADCT; 2.0 A Garantia de Acessibilidade dos Indivíduos aos Poderes do Estado e o Artigo 64 Da ADCT; 3.0 Participação da Sociedade no Dia-A-Dia da Máquina Estatal e o Artigo 64 Da ADCT; Conclusão; Referências Bibliográficas


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INTRODUÇÃO


A presente pesquisa pressupõe abordar as questões de eficácia/ineficácia do artigo 64 da ADCT. Primeiramente será analisado o seu preceito legal, para tal, será necessário transcrever a presente norma, comentando posteriormente cada ponto importante regulamentado por esta.


A pesquisa torna-se bastante árdua neste ponto, já que há certo descaso da doutrina brasileira em relação aos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, em conseqüência, do artigo 64.


Contudo fazemos questão de mencionar que sobre o artigo 64 da ADCT é encontrado um breve comentário de sua importância na revista online EVOCATI, pelo prof. Carlos Augusto Alcântra Machado, em trabalho intitulado de Duas décadas da Constituição de 1988.


A pesquisa pressupõe em analisar a Democracia, o Estado de Direito conjuntamente com o artigo 64 da ADCT. Iremos dispor algumas colocações a respeito de democracia e do Estado de Direito, afirmando que ambos só se perfazem através de uma normatividade constitucional – Constituição. Neste sentido, justifica a análise conjunta com o artigo 64 da ADCT, que garante que cada cidadão brasileiro receba um exemplar da Constituição, acarretando assim, uma democratização da Constituição.


Analisaremos também, estes três elementos: Estado de Direito, democracia, art.64 da ADCT, sobre vários outros enfoques, afirmando a importância deste ultimo para aqueles, e vice-versa.


 A segunda parte de nossa pesquisa, sob a mesma linha de raciocínio irá abordar algumas normas constitucionais que garantem o acesso pelos cidadãos aos Poderes do Estado, tais como: o art.5º, XXXIII, que garante a qualquer interessado direito à informação, seja ela de interesse particular, coletivo ou geral, que deverá ser prestada por órgãos públicos dentro de um determinado prazo. Ressalvado as exceções. O art. 5º LIV que compreende o principio do devido processo legal que garante pleno acesso à justiça e o art. 5º, XXXV, que assegura o acesso às vias do Poder Judiciário afirmando que nem mesmo a lei pode excluir de sua apreciação lesão ou ameaça de direito.


O artigo 64 da ADCT será demonstrado nesta parte da pesquisa como uma norma jurídica que também garante aos cidadãos acessibilidade aos Poderes do Estado.


A terceira e ultima parte da pesquisa pretende mostrar aos leitores alguns meios previamente estabelecidos na Constituição, que garante a efetiva participação dos cidadãos do processo político do Estado, tais como: voto, exercício de cargos, funções públicas, ação popular, habeas corpus, habeas data, plebiscito, referendo, iniciativa popular e orçamento participativo.


O artigo 64 da ADCT será analisado no sentido de garantidor das informações necessárias à participação dos cidadãos no dia-dia da máquina estatal e, por conseguinte, da cidadania como fundamento do Estado Democrático de Direito.


1.0 ART. 64 DA ADCT E A CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988


Será analisada neste capítulo a norma do artigo 64 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT conjuntamente com a nossa Carta Magna de 1988, já que este artigo de forma expressa garante, gratuitamente, um exemplar da Constituição a cada cidadão brasileiro.


Para a compreensão do leitor é indispensável que seja feita a transcrição do referido artigo:


“Art.64 – A imprensa Nacional e demais gráficas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta ou indireta, inclusive o poder público, promoverão edição popular do texto integral da Constituição que será posta à disposição das escolas e dos cartórios, dos sindicatos, dos quartéis, das igrejas e de outras instituições representativas da comunidade, gratuitamente, de modo que cada cidadão brasileiro possa receber do Estado um Exemplar da Constituição do Brasil” (Ar.64, ADCT – Atos das Disposições Constitucionais Transitórias)


Portanto, vê-se com clareza que é de competência da Imprensa Nacional, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta ou indireta e do poder publico, fazer cumprir as disposições do presente artigo. Importa lembrar que órgão não realiza nenhuma tarefa senão pelos seus agentes responsáveis pela boa administração, e por óbvio, pela boa aplicação da norma jurídica acima citada.


A obrigação dos agentes responsáveis pela aplicação do disposto do artigo 64 da ADCT deverá ser prestada de forma gratuita, já que podemos pressupor o emprego do dinheiro público por vias de recolhimento de impostos. Não podendo, portanto, os agentes cobrar pelos exemplares.


A promoção de edição do exemplar constitucional deverá conter o texto integral da Constituição, não sendo, portanto, passível de ser editada de forma fragmentada. Caso o cidadão receba desta forma poderá recusá-la e tomar as cabíveis providencias.


Cabe aos responsáveis pela edição do exemplar da constituição fazer com que estes sejam dispostos nos locais descritos pela norma jurídica, que são basicamente: escolas, Igrejas, quartéis, sindicatos, cartórios.


Importa lembrar que tais locais não são taxativos, ou seja, os agentes públicos não se podem limitar somente a eles, mesmo porque, o legislador de forma abrangente inseriu no artigo um elemento normativo que amplia os locais que deverão ser deixados à disposição os exemplares, a seguir transcrito: “(…) e de outras instituições representativas da comunidade (…)” (Art. 64 ADCT)


A forma de entrega dos exemplares, pouco importa, podendo ser via correio, por um agente competente, etc. desde que a cópia da Constituição chegue ao local designado pela norma.


Outra parte importante da norma jurídica é que o legislador de forma explicita afirma uma de suas finalidades, conforme se verá em momento oportuno as outras finalidades estão implícitas. Portanto, a explicita é: fazer com que cada cidadão brasileiro receba um exemplar da Constituição.


Logo, estrangeiros não farão jus a este direito, já que a norma é expressa, e além do mais não é cabível que um estrangeiro que não contribua com impostos receber um exemplar que um brasileiro teve um gasto por isto. Portanto, somente cidadãos brasileiros receberão devidamente os exemplares, podendo estes ser naturalizados ou brasileiros natos.


Conforme havíamos ditos os locais descritos pela norma do art. 64 da ADCT são exemplificativos e dado a intenção do legislador de que cada cidadão receba um exemplar, não é vedado, portanto, que os agentes do Estado promovam a entrega na própria residência e domicilio do cidadão que requerer seu direito.


Devemos fazer uma pequena reflexão, a doutrina brasileira, não fala do presente artigo, já que este, para a elite da sociedade, se vê completamente desnecessário, já que possuem fácil acesso a norma jurídica constitucional. Entretanto, ressalvamos apenas uma doutrina publicada pela revista EVOCATI, pelo prof. Carlos Augusto Alcântra Machado que levanta algumas importantes indagações, senão vejamos:


“A obra prima nacional, entretanto, precisava ser conhecida por todos os brasileiros. De que valem as leis – e particularmente a Lei Maior – se forem desconhecidas? Como centenas de milhares de brasileiros, que viviam à margem da sociedade[3], poderiam exigir um sem número de direitos, com dignidade constitucional, se nem sequer imaginavam que eram seus destinatários? Para tanto, o art. 64 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) determinou – louve-se – que fossem disponibilizados, gratuitamente, exemplares do texto integral da Constituição nas escolas, cartórios, sindicatos, quartéis, igrejas e outras instituições representativas da comunidade, de modo que cada cidadão brasileiro pudesse ter acesso ao seu conteúdo. (MACHADO, Evocati revista, nº36,dez/2008)


São pertinentes as indagações formuladas pelo referido autor, neste sentido procuraremos trabalhar nossa pesquisa e ampliar o nosso leque de perguntas, que será voltado também para o art.64 da ADCT.


1.1 A DEMOCRACIA, O ESTADO DE DIREITO E O ART. 64 DA ADCT.


No decorrer da história das civilizações, inclusive do Brasil, os homens muitas das vezes se depararam com regimes ditatoriais, com políticas severas que atacam direitos pessoais e coletivos, ou seja, de toda uma sociedade.


O Poder do Estado e de seus regentes políticos já foram muitas vezes legitimados por um poder diferente ao homem – Poder Divino. Muitas vezes, os governantes já se utilizaram do medo dos governados para obter controle supremo de tudo e de todos. Ambos ainda são visíveis no mundo, mas uma coisa é certa nestes sistemas políticos não há “liberdades” e respeito aos diretos indispensáveis à dignidade humana.


A democracia, presente em alguns momentos da história, tal como na idade antiga, visível através da polis, é hoje praticada e vista de forma diferente. Sem sombra de dúvida a democracia nos últimos tempos representa “o melhor modelo de organização política que a humanidade já excogitou” (BOFF, disponível em http//www.leonardoboff.com.br, 2008 Acesso: 2009).


Neste sentido demonstra Paulo Bonavides que a democracia ganha forças nos tempos atuais, afirma o referido autor que:


“nos dias correntes a democracia domina com tal força a linguagem política deste século, que raro o governo, a sociedade ou o Estado que não se proclamem democráticos” (BONAVIDES, 267, 2003)


Apesar de vários paises do mundo adaptar a democracia como forma política, devemos tomar certo cuidado, pois muitos governantes usam nominalmente e até mesmos os mecanismos da democracia para a pratica de atos contrário ao sistema democrático.


Podemos analisar o conceito epistemológico do termo democracia na Cartilha produzida pelo Escritório de Programas Internacionais de Informação do Departamento de Estado dos EUA, onde:


“Democracia vem da palavra grega “demos” que significa povo. Nas democracias, é o povo quem detém o poder soberano sobre o poder” (Escritório de Programas Internacionais – EUA, disponível em http://www.embaixada–mericana.org.br/democracia/democracy.pdf Acesso em 2008)


Portanto, compreendemos a democracia através das liberdades, porém não é “uma liberdade sem conteúdo, e nem regime do desregramento e da ausência da lei” (FERREIRA, p.11, 1986). Na democracia há regras a serem seguidas e direitos a serem respeitados por todos, sendo inquestionável que “hoje, em quase todo os lugares do mundo, verifica-se uma grande sede por liberdade e direitos humanos” (KÜNG, p.58,1993), que só poderão ser desfrutados através do sistema político organizacional democrático e inclusive de uma ordem Constitucional.


Portanto, é inquestionável que o um Estado democrático tem o dever de “promover a liberdade de consciência e de religião. Também deve considerar a liberdade de imprensa e de reunião e tudo mais que faz parte dos direitos humanos modernos” (KÜNG, p.58,1993).


Em suma, o Estado possui deveres com seus cidadãos e inclusive deve resguardar direitos daqueles que estão sob seu território ou proteção. – Isto só é possível através de regras e princípios éticos, em outras palavras por uma ordem constitucional. Daí é correto dizer que a existência de um Estado de Direito se realiza por vias democráticas.


Neste sentido o professor da PUC Minas, Rodolfo Viana Pereira, afirma que a democracia


“enquanto único método de gestão do poder admitido no quadro da teoria contemporânea do Estado de Direito, realiza-se através da ordem constitucional de acordo com duas funções interpenetrantes: a função de legitimação e função de controle” (PEREIRA, p.34/35, 2008)


Resumidamente, Robert A. Dahl citado por Kildare esclarece alguns princípios e diretrizes para que seja alcançada a democracia:


“a) a liberdade para constituir e integrar-se em organizações; b) liberdade de expressão; c) direito de voto; d) acesso a cargos públicos; e) possibilidade de os líderes políticos competirem por meio da votação; f) fontes alternativas de informações g) eleições livres e isentas” (DAHL, citado por CARVALHO, p. 199, 2008)


Neste sentido destaca a cartilha do Escritório de Programas internacionais dos da Embaixada Americana, alguns dos princípios e fundamentos básicos da democracia, a saber:


“proteger direitos humanos fundamentais como a liberdade de expressão e de religião; o direito à proteção legal igual; e a oportunidade de organizar e participar plenamente na vida política, econômica e cultural da sociedade (…)”. (Escritório de Programas Internacionais – EUA, disponível em http://www.embaixada–mericana.org.br/democracia/democracy.pdf Acesso em 2009)


Além dos princípios e diretrizes da democracia acima descritos, outros são destacados pelo prof. Kildare Gonçalves Carvalho, que segundo ele, a democracia exige:


“a) um Estado Democrático de Direito responsável por sustentar as normas legais que correspondem à existência e permanência do regime democrático; b) a validade do sistema legal, é dizer, a possibilidade de que ele ordene, de fato, as relações sociais, tendo, por isso reconhecida a sua utilidade e todos os que são afetados por ela” (CARVALHO, p. 200, 2008)


Portanto, podemos reforçar aquilo que já havíamos dito, a democracia será sustentada e sustentará o Estado de Direito que garantirá sua validade e legitimação através das normas constitucionais previamente estabelecidas segundo a vontade dos seus próprios cidadãos.


Portanto, é de extrema importância o artigo 64 da ADCT. Apesar de, em regra, todos saberem que há uma norma constitucional que garanta seus direitos, estes muitas vezes se encontram em situações (econômicas, etc) que não podem adquirir uma constituição. Cabe, portanto, o Estado promover a edição de exemplares constitucionais, dispondo nas escolas, Igrejas, cartórios, e demais locais que representem à comunidade, fazendo com que cada cidadão possa receber o seu exemplar.


Sendo assim, podemos dizer que aqueles que receberem um exemplar poderão não só tomar conhecimento das normas que regulem os seus direitos, mas também, de outros dispositivos da Constituição.


A democracia para Oliveira citado por Antoniazzi, é compreendida como uma “forma de organizar a vida que radica no direito fundamental do ser humano, fonte de todos os outros direitos”. (OLIVEIRA, citado por ANTONIAZZI, p.63, 1997), prossegue o referido autor, afirmando que a democracia é simplesmente uma forma de viver “sob uma normatividade ética, que faz emergir o homem na dignidade de sua liberdade” (OLIVEIRA, citado por ANTONIAZZI, p.63, 1997).


Este sistema político consiste também na limitação do poder, garantindo assim aos indivíduos direitos e garantias frente ao Estado, e inclusive frente aos desrespeitos dos próprios integrantes da sociedade. Seguindo os princípios de um Estado de Direito estes direitos e garantias deverão ser previstos genericamente em um texto constitucional, sendo passível de normatividade infraconstitucional específica, desde que estas não desobedeçam a Carta Magna.


Torna-se claro que a democracia é o governo de muitos – Dos Cidadãos, respeita a vontade de todos, muito embora não se exclua a minoria, pois em um sistema democrático protege-se “escrupulosamente os direitos fundamentais dos indivíduos e das minorias” (Escritório de Programas Internacionais – EUA, disponível http://www.embaixada–mericana.org.br/democracia/democracy.pdf Acesso:2009)


Neste sentido, em 1986 no Brasil, antes da entrada da vigência da Constituição de 1988, Ferreira em magistral colocação afirma que a democracia é “o Governo da maioria, obrigada por lei, a respeitar os direitos da minoria, mesmo que o exercício desses direitos venha transformar a minoria em maioria” (FERREIRA, p.11, 1986).


Atualmente, a doutrina constitucional moderna, dispõe com mais precisão quando se trata das minorias e maiorias. Kildare por exemplo, afirma que a “democracia pressupõe que a vontade popular se manifeste nas suas diversas opiniões, de modo que possa predominar a vontade da maioria, preservando-se, contudo, a manifestação das minorias” (CARVALHO, p. 214, 2008)


A previsão do artigo 64 da ADCT demonstra com precisão o respeito à minoria quando garante que cada cidadão brasileiro tenha um exemplar da constituição. Na verdade trata o artigo 64 de forma bem ampla, incluindo a maioria e a minoria nesta amplitude.


Por obvio que numa sociedade marcada pela tradição, pelo autoritarismo, populismo, pela moral religiosa, pela discriminação social, econômica, política, pela miserabilidade, dentre tantos outros distúrbios sociais, obviamente a elite se sobressairá e terá fácil acesso as normas constitucionais, sendo viável a esta, que a segunda classe não tenha o mesmo acesso, por conseqüência disso que não saibam de seus direitos.


A segunda classe, portanto, se vê desprovida da Constituição, ou, muito raro, mas possa vir acontecer, de haver pessoas que não saibam da existência de uma Constituição no país. Portanto, os direitos, as opiniões e garantias, das minorias, embora muitas vezes discriminalizadas e marginalizadas pela sociedade será respeitada pelo art. 64 da ADCT, que garantirá ao menos, a estes cidadãos um exemplar, gratuito e integral da norma constitucional.


O artigo 64 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias é muito importante para efetivo funcionamento do sistema político democrático e inclusive para a segurança do Estado de Direito, já que a lei de maior significância jurídica social e política será conhecida, em regra, por todos da sociedade. Ocorrendo assim uma democratização da Constituição.


Conforme vimos dispõe o referido artigo que cada cidadão brasileiro possa receber um exemplar da Constituição. Isto representa uma aproximação muito grande dos cidadãos com os órgãos públicos do Estado, já que os cidadãos terão em mãos um texto que prevê: a forma e o sistema de governo do Estado, bem como outros princípios fundamentais, a organização do Estado, a organização dos poderes (legislativo, executivo, judiciário), as funções essenciais à justiça, o sistema tributário nacional, as políticas das atividades econômicas do país, a seguridade e previdência social etc.


Este direito a um exemplar da Constituição sendo efetivamente garantindo, importará em aumento significativo de cidadãos que conhecerão os seus direitos, e, por conseguinte, poderá estes exigir respeito a eles.


Importar lembrar também, que o art. 64 da ADCT só se justifica porque vivemos num Estado Democrático de Direito, pois se não fosse por estas vias, por exemplo, do que valeria os “indivíduos” (se é que pode se dizer assim) conhecerem dos direitos, já que estes não existiriam, e se existissem nem todos regozijariam. Um outro exemplo seria a afirmação de que estes “sujeitos” não necessitariam conhecer da organização política, administrativa e financeira do Estado, já que ficaria a cabo do livre arbitro do governante.


2.0 A GARANTIA DE ACESSIBILIDADE DOS INDIVÍDUOS AOS PODERES DO ESTADO E O ARTIGO 64 DA ADCT


A Constituição no título II, Dos Direitos e Garantias Fundamentas, Capítulo I Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, no art.5º estabelece em seus incisos as cláusulas pétreas, ou seja, aquelas que não poderão ser suprimidas do texto constitucional. Importa lembra que há na Constituição, vários outros artigos tidos como cláusulas pétreas que deverão ser atentamente observados.


Já é sabido por todos que o Estado Democrático de Direito, deve não só garantir na norma constitucional proteção aos direitos de seus cidadãos, mas também promover meios para que estes busquem os Poderes do Estado quando tais direitos forem violados ou quando ameaçados. Além do mais, como se verá em capítulo próprio, deve haver meios para que os cidadãos possam participar no dia-dia da máquina Estatal tomando decisões de forma direta.


Neste sentido, o inciso XXXIII, art. 5º da Constituição nos chama atenção, a saber:


“Art.5º XXXIII Todos têm direito a receber dos órgãos públicos, informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível a segurança da sociedade e do Estado” (Art. 5, XXXIII, CF)


Pode-se verificar que o referido inciso do art. 5º, garante à qualquer interessado o direito à informação, ressalvado os casos que seja imprescindível o sigilo, dado a preservação da segurança do Estado. Podemos perceber, portanto, que esta regra garante a acessibilidade a qualquer pessoa aos órgãos públicos. Sendo negado qualquer tipo de informação permitida, ou não sendo esta prestada pelo prazo em que a lei estabelecer, os agentes do Estado serão responsabilizados.


Neste sentido o principio do devido processo legal, colorário do principio da isonomia e do contraditório garante a acessibilidade pelos jurisdicionados ao Poder Judiciário do Estado. O principio do devido processo legal segundo Alexandre de Freitas Câmara, “deve ser entendido como a garantia de pleno acesso à justiça” (CÂMARA, p.35, 2008)


O devido processo legal está previsto na norma do art. 5º LIV da Constituição, que dispõe que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal” (Art. 5º LIV, CF), portanto, este direito que garante acesso pleno à justiça deve ser entendido sobre duas esferas do Direito: Direito Processual e do Direito Material.


Neste sentido, dispõe de forma brilhante a doutrina, a saber:


“A garantia do devido processo legal surgiu como sendo de índole exclusivamente processual, mas, depois, passou a ter também um aspecto de direito material (…) Assim é que o devido processo legal substancial (ou material) deve ser entendido como uma garantia do trinômio “vida-liberdade-propriedade” (CÂMARA, p. 35, 2008)


Portanto, o devido processo legal, garante a acessibilidade ao jurisdicionado de forma justa, ao Poder Judiciário.


O artigo 5º, XXXV, assegura ainda, que nem mesmo a lei “excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito” (Art. 5º XXXV, CF).


Por inferência, aos artigos mencionados, o artigo 64 da ADCT, garante também acessibilidade aos Poderes do Estado, já que pretendeu o legislador aproximar seus cidadãos à norma constitucional.


3.0 PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE NO DIA-A-DIA DA MÁQUINA ESTATAL E O ARTIGO 64 DA ADCT


O artigo 64 da ADCT, conforme vimos, poderá garantir aos cidadãos que ao conhecerem a norma constitucional, tenham maior facilidade de acessibilidade aos Poderes do Estado. Neste sentido se cumprido as disposições do referido artigo os cidadãos tomarão também conhecimento dos meios de participação da máquina Estatal.


Várias são as formas de se participar da máquina estatal, ou seja, dos Poderes dos Estados, todos os meios estarão previstos por norma constitucional.


No processo político, por exemplo, podem os cidadãos participar de várias formas. Dispõe resumidamente Kildare Gonçalves de Carvalho, as seguintes formas::


I- artigo.5º, LXXVII, que diz serem gratuita as ações de habeas corpus e habeas data, e, na forma da lei os atos necessários ao exercício da cidadania


II – artigo 14, que afirma que a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, como valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante plebiscito, referendo e iniciativa popular;


III – artigo 14, II, alínea C, que institui o alistamento e o voto facultativo para os maiores de dezesseis e maiores de 18 anos (…)


IV – artigo 37, I, que assegura o acesso a cargos, empregos, e funções públicas


V – artigo 5º. LXXIII, que prevê legitimidade ao cidadão para propositura de ação popular que vise anular ato lesivo ao patrimônio publico ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural” (CARVALHO, p. 652/653, 2008)


Portanto, podem os cidadãos votarem, exercerem determinadas profissões públicas desde que preenchidos os requisitos (aprovação em concurso, elegibilidade, etc.). Podem propor ação popular quando tiverem capacidade jurídica para tal ato. Se valerem do habeas corpus e habeas data, respeitando a forma prevista em lei. Por fim, poderão os cidadãos participar da vida política do Estado através do plebiscito, referendo, iniciativa popular e orçamento participativo.


Estas participações far-se-ão sob a forma da democracia direta ou participativa “que implica o exercício direto e pessoal da cidadania nos atos de governo” (CARVALHO, p.209, 2008). O mesmo autor afirma a importância da cidadania, dispondo que esta “constitui (…) fundamento do Estado Democrático de Direito (art.1º,II)” (CARVALHO, p.652, 2008).


Por fim, a cidadania é compreendida como “a habilitação do nacional para o exercício dos direitos políticos” (CRETELLA, citado por CARVALHO, p.652, 2008).


Podemos dizer, portanto, que levar a conhecimento a norma constitucional, é levar aos cidadãos informações necessárias dos meios para se exercer a cidadania. Novamente se justifica a importância do artigo 64 da ADCT.


CONCLUSÃO


Vimos com a presente pesquisa que o artigo 64 da ADCT regula que será de competência da Imprensa Nacional, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta ou indireta e do poder publico, fazer a edição dos exemplares da Constituição do Brasil.


Além da edição, vimos que fica sob a responsabilidade dos agentes aplicadores da norma jurídica disponibilizá-las nas escolas, cartórios, Igrejas, dentre outras instituições que representativas da comunidade.


O presente artigo analisado prescreve uma forma, quanto a edição e disponibilidade do texto constitucional, que deverá ser observada: edição integral e disponibilidade gratuita do exemplar.


O objetivo explicito do legislador é fazer com que cada cidadão brasileiro receba um exemplar da Constituição, em outras palavras, é democratizar a Constituição.


 Concluímos com a pesquisa que este artigo é de suma importância, já que leva o conhecimento da nossa Carta Magna aos cidadãos que não podem adquirir o texto senão por este meio. Sendo assim, podemos pressupor que estes saberão sobre seus direitos e poderão cobrá-los de forma mais eficaz.


 O artigo analisado traz várias outras vantagens aos cidadãos, tais como: obtenção de conhecimento da forma e do sistema de governo do Estado, indiretamente contribuíra para acessibilidade aos Poderes do Estado, bem como do processo político do Estado, através da obtenção de conhecimento dos meios de participação de forma direta no sistema democrático, compreendidos pela: votação, preenchimento de cargos ou funções ou profissão pública, ação popular, habeas corpus e habeas data, plebiscito, referendo, iniciativa popular e orçamento participativo.


Portanto, é de grande valia levar a conhecimento de todos cidadãos (em especial, os hipossuficientes) do texto constitucional, como forma de garantir a estes pleno acesso à justiça e a todos órgãos públicos do Estado.


Somente sabendo o mínimo da carta política do Estado, é que podemos cobrar efetivamente nossos direitos, lutar contra qualquer lesão ou ameaça a estes, bem como, exercer de forma séria e eficaz a nossa cidadania.


Contudo, devemos agir rapidamente, pois o presente artigo está em desuso, não por culpa da sociedade, mas por culpa do Estado, já que, não se tem divulgação da presente norma.


No plano real podemos perceber que os agentes não estão preparados para atender a exigência legal do art. 64 da ADCT, além do mais, exercem sua função abusando dos cofres públicos. Utilizando da prerrogativa a eles atribuída empregam nos exemplares, suas fotos, nome e qualificações profissionais para conseguirem algum tipo de beneficio, o que pela ordem constitucional é expressamente vedado.


Aparentemente não há uma punição aos agentes aplicadores da norma jurídica, seja para aqueles que dispõe exemplar inadequado (com fotos dos políticos) seja para aqueles que não atendem o requerimento da população. Isto, infelizmente implicará ainda mais no aumento da ineficácia do art. 64 da ADCT, e, por conseguinte, do próprio texto constitucional, já que dele a população mais carente estará desprovida.


Notamos também que não há divulgação da norma jurídica, o que impede que a população conheça dela, e por conseqüência, cobre dos agentes públicos o seu direito a um exemplar.


 


Referências bibliográficas

ANTONIAZZI, Alberto, Ética religião e política, Horizonte, Belo Horizonte, v. 1, n. 1, p. 59-70, 1º sem. 1997.

BOFF, Leonardo, artigo “A democracia entrou na fábrica”, disponível em http://www.leonardoboff.com.br, seção artigos Set/2008, acesso 2009.

BONAVIDES, Paulo, Ciência Política, 10 edição, 12º tiragem, São Paulo; Malheiros Editores: 2003.

CÂMARA, Alexandre Freitas, Lições de Direito Processual Civil, 18º edição, revista, vol I, Rio de Janeiro, Lumen Júris: 2008.

CARVALHO, Kildare Golçalves, Direito Constitucional, Teoria do Estado e da Constituição, Direito Constitucional Positivo. 14 edição, revista, atualizada e ampliada. Belo Horizonte, Del Rey: 2008.

DAHL, Robert A., citado por CARVALHO, Kildare Golçalves, Direito Constitucional, Teoria do Estado e da Constituição, Direito Constitucional Positivo. 14 edição, revista, atualizada e ampliada. Belo Horizonte, Del Rey: 2008.

Escritório de Programas Internacionais de Informação, Departamento de Estado dos EUA, Princípios da Democracia, disponível em http://www.embaixada–mericana.org.br/democracia/democracy.pdf Acesso em 2008

FERREIRA, José de Castro, Democracia em Trânsito, Juiz de Fora, 1986.

KÜNG, Hans, Tradução Haroldo Reimer Projeto da ética mundial: uma moral ecumênica em vista da sobrevivência humana, São Paulo, Paulinas:1993.

MACHADO, Carlos Augusto, Duas Décadas da Constituição de 1988, Evocati revista, nº 36, Evocati Revista, dezembro:2008, disponível em http://www.evocati.com.br/evocati/interna.wsp?tmp_page=interna&tmp_codigo=294&tmp_secao=10&tmp_topico=direitoconst Acesso em 17/05/2009

PEREIRA, Rodolfo Viana, Direito Constitucional Democrático, Controle e participação como Elementos Fundantes Garantidores da Constitucionalidade, Rio de Janeiro, Lumem Júris: 2008.

Informações Sobre o Autor

Davi Souza de Paula Pinto

Acadêmico de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – Betim


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Equipe Âmbito Jurídico

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