Resumo: O presente artigo tem o objetivo de apresentar as principais mudanças no Tribunal do Júri, advindas da Reforma Processual Penal da Lei 11.689/08. Vem tecer comentários acerca dos principais dispositivos relativos ao Tribunal do Júri, mais precisamente sobre a nova Lei em comento, de 09 de junho de 2008. [1]*
Palavras-chave: Tribunal do Júri; Reforma Processual Penal; Lei 11.689/08.
Sumário: 1 Introdução. 2 Historicidade. 3 Princípios reitores do Tribunal do Júri. 4 Características 5. Mudanças recentes. 5.1 Judicium accusationis. 5.2 Judicium causae. 6 Conclusão
Abstract: This article aims to present the main changes in the Courtroom, resulting from the Reform of Criminal Law 11.689/08. Come comment on the main provisions concerning the grand jury, specifically about the new law under discussion, 09 June 2008.
Keywords: Jury Trial, Criminal Procedure Reform, Law 11.689/08.
“Matem-se entre vós, que saberemos julgá-los entre nós” (Correa)
1 INTRODUÇÃO
Primeiramente, há que se esclarecer que não é objetivo do presente artigo esgotar o tema. Tampouco tratar de todos os âmbitos tratados na nova lei.
O artigo busca discutir as principais mudanças trazidas pela lei em tela, bem como discutir sua reforma e inovação.
Tal inovação veio como desenvolvimento no sentido de torná-lo um procedimento mais rápido e eficaz, permitindo a aplicação da lei de uma maneira mais justa, valendo-se dos princípios da celeridade e da economia processual, diminuindo a morosidade no andamento das demandas processuais.
A natureza da vertente metodológica deste trabalho é bibliográfica.
Serão feitas considerações preliminares do Júri, com sua evolução histórica, e tal Instituto tem como pilar de sustentação a soberania do Tribunal, já que vem a garantir que a vontade dos jurados seja respeitada e, consequentemente, que prevaleça a vontade popular. Ainda serão apresentados quais princípios o regem.
2 HISTORICIDADE
O Tribunal do Júri até os dias de hoje não possui uma origem inconteste. Há muitos que acreditam que sua origem vem da antiguidade com os judeus que saíram do Egito, aconselhados por Moisés. Encontrando embasamento histórico no livro chamado Pentateuco, livro este que é composto pelos cinco iniciais livros da Bíblia Cristã, neste tempo a lei vinculava o magistrado ao sacerdote, entretanto foi a primeira lei que criou a figura do que hoje conhecemos como jurados, cidadãos comuns nos julgamentos dos tribunais.
O célebre doutrinador Guilherme de Souza Nucci (1999, p. 31), versa que o Tribunal do Júri tem origem na Palestina, advindo do Tribunal dos Vinte e Três, que acontecia nas vilas as quais a população excedesse as 120 (cento e vinte) famílias, em que os crimes julgados por este Tribunal eram punidos com a pena de morte.
Há quem diga que a origem do Tribunal do Júri se deu na época clássica de Roma e Grécia, com os “judices jurati” e “diskatas”, respectivamente, também não podemos deixar de citar os “centeni comites” chamados assim entre os germânicos. Embasavam-se em um fundamento divino para a legitimidade deste órgão. Sob este fundamento há o julgamento de Jesus Cristo, lembrando o processo do júri atual.
A maior parte da doutrina versa que o júri iniciou-se através de uma série de medidas dedicadas a lutar em desfavor dos ordálios (Juízo de Deus), que era qualquer tipo de prova ou meio pelo qual, segundo o direito germânico antigo, Deus socorreria o inocente.
“Durante o governo do rei Henrique II (1154 – 1189) em que, em 1166, instituiu o Writ (ordem, mandado, intimação) chamado novel disseisin (novo esbulho possessório) pelo qual encarregava o sheriff de reunir doze homens da vizinhança para dizerem se o detentor de uma terra desapossou, efetivamente, o queixoso, eliminando, assim, um possível duelo judiciário praticado até aí”. (RANGEL: 2009, p. 540-541)
Essa série de medidas acima referidas, que era feita por um órgão semelhante ao Ministério Público atual, começou a ser efetivada pela comunidade local quando havia crimes graves, como exemplo, homicídio, dando origem assim ao Grand Jury, composto de 23 jurados no condado, sendo então denominado de “júri de acusação”.
Os jurados, que representavam a verdade advinda de Deus, eram da comunidade onde o crime ocorreu, decidindo de acordo com o que sabiam e o que se dizia, sem necessidade de motivação, tendo em vista que essa responsabilidade era de outros 12 homens de bem, escolhidos entre os vizinhos, resultando em um Petty jury (pequeno júri) que decidia se o acusado era guilty (culpado) ou innocent (inocente), independentemente de dizer a verdade.
Na Inglaterra, após o ano de 1215, com a edição da Carta Magna pelo rei João Sem Terra, alastrou-se pela Europa, respingando nos Estados Unidos, adquirindo características mais modernas. (CHOUKR: 2002, p.5).
Na Carta Magna da Inglaterra, o art. 48 versa que o julgamento deverá ser feito pelos seus pares, sendo ao contrário, ninguém poderá ser detido, preso ou despojado de seus bens, costumes e liberdades.
Nessa esteira, o Tribunal do Júri nasce com o escopo de retirar da mão do déspota o poder de decidir contrário aos interesses da sociedade da época, dando origem ao que hoje conhecemos como princípio do devido processo legal.
A Carta Magna foi um acordo entre os nobres e a monarquia, em que quem julgaria os nobres seriam outros nobres, ou seja, julgamento pelos seus pares não se sujeitando ao Rei. O povo não teve participação alguma.
Na França, com o objetivo de combater o autoritarismo dos juízes (magistrado) do antigo regime que se submetiam as invertidas da monarquia e das dinastias dos quais eram dependentes, o tribunal do júri surgiu como uma válvula de escape, posto que o mais apropriado seria que o julgamento fosse feito pela própria sociedade, sendo, consequentemente, mais justo já que não se vinculariam a monarquia nem a dinastia. (RANGEL: 2009, p. 543)
No Brasil, o tribunal do júri surgiu na Lei de 18 d junho de 1822, antes da promulgação da independência (7 de setembro de 1822) e depois da primeira Constituição brasileira (25 de março de 1824) sob o domínio português e forte influencia inglesa. O Júri só julgava crime de imprensa e os jurados eram eleitos.
A Constituição de 1824 transformou os jurados em integrantes do Poder Judiciário competente para atuar tanto no criminal como no cível decidindo os fatos e o Juiz aplicando a Lei.
Em 1832, entrou em vigor o Código de Processo Criminal que fixou procedimentos para a aplicação do Código Criminal de 1830. Este Código nasceu no período Regencial do Brasil, período em que Dom Pedro I foi para a Inglaterra proteger o seu trono, ocupado pelo seu irmão chamado Dom Miguel, deixando aqui no Brasil, para substituí-lo, seu filho Pedro II de 5 anos de idade. Ademais, como era menor, o País foi regido por figuras políticas que governaram em nome do Imperado, entre 1831 a 1840, neste período deram maiores poderes ao juiz de paz. (FAUSTO: 1999, p. 163),
Ainda no período Regencial, houve inúmeras batalhas em diversas partes do País, por exemplo, a Farroupilha no Rio Grande do Sul e a Balaiada no Maranhão, que culminaram na Lei 261, regulamentada pelo Decreto nº 120, de 1842, marcada pelo autoritarismo e centralização do Código de Processo Criminal do Império, acabando com o júri de acusação, ou grande júri. O júri sofria um grande golpe.
Na primeira Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1891, o júri foi disposto na parte referente a cidadãos brasileiros e na secção da declaração dos direitos, deixando clara a manutenção do júri.
A Constituição de 1934, já dispôs o júri no capítulo referente ao Poder Judiciário.
A Constituição de 1937 se quer trouxe o Tribunal do Júri, mas já era de se esperar, tendo em vista o contexto em que surgiu, no Estado Novo, época da ditadura instituída por Getúlio Vargas. Tendo em vista que, “ditadura e júri não são bons amigos. Não convivem no mesmo ambiente político, pelo menos enquanto o júri for visto como uma instituição democrática”. (RANGEL: 2009, p. 555)
Entretanto, em 1938, foi promulgado o Decreto n° 167, regulando o júri, trazendo uma importante inovação, o veredicto dos jurados deixava de ser soberano.
Em 1946, foi promulgada a nova Constituição que trouxe o instituto do júri à sua forma digna no governo de Gal. Eurico Gaspar Dutra que prometia redemocratizar o País, sendo este um dos primeiros passos.
Em 1967, a Constituição sofreu uma grande reforma com a Emenda Constitucional nº 1/69, chamada por muitos de Nova Constituição em que mantinha o júri, com competência para julgar crimes dolosos contra a vida, mas diferente do que trazia a Constituição, antes da reforma, não fez menção à soberania do júri.
Não há que deixar de ser falado no caso emblemático conhecido como a “Lei Fleury”. Sergio Fernando Paranhos Fleury, liderava um grupo chamado “Esquadrão da Morte”. Esse grupo era formado por policiais civis, que mexiam com tráfico de drogas e matavam sumariamente quem não os interessava mais ao grupo. Tudo isso protegido pelo regime militar que governava o Brasil. (SOUZA: 2000, p.305)
Mas, por um corajoso promotor chamado Hélio Pereira Bicudo que investigou Fleury, e pela forte pressão internacional, o líder do “Esquadrão da Morte” foi preso, devido a lei da época determinar que quem fosse pronunciado deveria ter decretada a sua prisão preventiva.
Entretanto, como no Brasil tudo tem jeito, pela forte influência que Fleury exercia no regime militar, foi encomendada uma lei ao congresso que dispunha que “o réu primário e com bons antecedentes permanecesse em liberdade em caso de pronúncia, e, se preso estivesse, solto seria”, e mais, “se o condenado tivesse bons antecedentes e fosse primário, permaneceria solto”, reformando o art. 408, § 2º e 504 do CPP, respectivamente.
“Paralelamente a esse quadro, o Ato Institucional n 5, cassou a garantia doas magistrados, ou seja, no júri os magistrados presidiam a sessão desprovidos das garantias necessárias ao pleno desenvolvimento da prestação jurisdicional”. (RANGEL: 2009, p. 564)
A atual Constituição Democrática de 1988, que marcou com as Diretas Já o fim do regime militar. Assim, o júri recebeu novos moldes, instituído pelo Código de Processo Penal, apresentando como garantias assecuratórias:
“Art. 5, XXXVIII da CF/88 – é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:
a) a plenitude de defesa;
b) o sigilo das votações;
c) a soberania dos veredictos;
d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida”;
3 PRINCÍPIOS REITORES DO TRIBUNAL DO JÚRI
Princípio, é o momento em que algo se origina, é a causa primária ou o elemento predominante na constituição de um todo orgânico. (NUCCI: 2008, p. 43)
A Constituição, mais precisamente em seu art. 5º, XXXVIII, enumera os princípios que regem o tribunal popular. A competência do Tribunal do Júri abarca os crimes dolosos contra a vida, não apenas o Homicídio, como também o Induzimento ao suicídio, Aborto e Infanticídio. Ainda, abarca os crimes mencionados tanto na modalidade consumada quanto na tentada. O latrocínio é crime contra o patrimônio com resultado morte, por isso não é julgado pelo Júri.
É de enorme importância aqui, mencionarmos que qualquer animus que não seja o Animus Necandi (a vontade de matar) exclui a competência do Tribunal do Júri.
A plenitude de defesa divide em técnica e autodefesa. A técnica é obrigatória e exercida por profissional habilitado, ao passo que a segunda é facultada ao imputado, que pode exercer o direito de silêncio ou apresentar sua versão dos fatos. (ALENCAR; TÁVORA: 2009, p. 675)
O tribunal aqui tratado possui soberania dos veredictos, ou seja, suas decisões são soberanas, há a impossibilidade de uma decisão do júri ser substituída por outra sentença de órgão jurisdicional distinto, segundo preconiza o art. 593, § 3º, do Código de Processo Penal. Essa é uma garantia da ordem pública e da própria instituição.
Os jurados devem permanecer incomunicáveis entre si e deve haver o sigilo das votações. O sigilo das votações gera certo debate, qual seja, se o mesmo é garantia fundamental do réu ou do jurado. Ao que parece mais sensato, essa garantia é do conselho dos sete, tendo em vista que os mesmos poderiam se sentir coagidos ao expor seus votos, tendo em vista que os jurados fazem parte da mesma comunidade em que o(s) acusado(s) vive(m).
4 CARACTERÍSTICAS
O Tribunal do Júri tem como características principais: a heterogeneidade, horizontalidade, temporalidade e decisões por maioria de votos.
O órgão é heterogêneo, teve origem na Constituição de 1988, onde o Tribunal do Júri teve confirmado seu local no Poder Judiciário. Sendo composto por um Juiz que preside a sessão e por vinte e cinco jurados (nova redação do art. 433 do CPP), dentre os quais sete formarão o Conselho de Sentença. Sendo que os jurados é quem vão determinar o julgamento dos fatos e o juiz o julgamento do direito. Importante destacar que no Tribunal do Júri a soberania só recai sobre os jurados e não sobre o juiz, ou seja, os fatos depois de julgados não poderão ser alterados, já a majoração ou diminuição da pena sim. Estando classificadas as decisões do órgão jurisdicional da seguinte forma: decisão do juiz de primeiro grau – subjetivas simples; decisões das turmas recursais – subjetivamente plúrimas, e; decisão do júri – subjetivamente complexas.
O órgão é horizontal, leciona sobre a inexistência de hierarquia entre o juiz presidente.
O órgão é temporário, não será um Conselho permanente, duradouro, posto que só funcionará em determinados período do ano, mas isso não é regra, tendo em vista que o grande número de crimes contra a vida que há, não é raro que em todos os meses tenha sessão do júri. As datas de sessão são regulamentadas pela lei de organizações judiciárias de cada estado. Vale mencionar, poderá ocorrer dois julgamento do júri no mesmo dia, desde que as partes concordem, art. 453 do CPP.
E, por fim, suas decisões se caracterizam por ser por maioria de votos, aqui se entende por maioria de votos 4 votos a favor ou contra de cada quesito para decidir o julgamento, não é preciso a unanimidade. Tendo em vista ao princípio do sigilo da votação, a nova redação sobre o júri tocou num ponto sensível, em que dispôs que basta a resposta de mais de três jurados, a qualquer dos quesitos, em um determinado sentido, a fim de proteger os jurados, no caso de votos unânimes de possíveis retaliações. (art. 483, §§ 1º e 2º do CPP, Lei 11689/08)
5 MUDANÇAS RECENTES
Devido a muitas críticas acerca da morosidade inserida neste âmbito, as reformas surgiram para acelerar o procedimento bifásico. A nosso ver, as mudanças guiam-se pelos princípios da celeridade e da economia processuais.
De pronto, já explicitamos uma mudança, que é a redução da idade do jurado para 18 (dezoito) anos. Pensamos ser extremamente prejudicial, tanto para a defesa, quanto para o acusado, pior, à Instituição do Júri como um todo.
No caso, o legislador, data venia, de forma equivocada seguiu o entendimento do âmbito civil. Só que não se trata de capacidade para os atos da vida civil, muito menos de imputabilidade penal. O Conselho de Sentença é julgador, recebe qualidade de Magistrado.
O Magistrado Togado tem o dever de fundamentar suas decisões, e para presidir um júri deve ter idade mínima de 25 anos, sendo que passou por 5 anos numa faculdade de direito, e mais três anos de prática forense, para ganhar experiência e saber o peso do julgamento de um ser humano. Tendo em vista a inexperiência de uma pessoa com tão pouca idade, concordamos não ser adequado aceitar que um jurado leigo com apenas 18 anos possa julgar seu semelhante.
Ademais, o legislador prossegue mencionando que o jurado deverá ser de idônea notoriedade. No entanto, uma pessoa de apenas 18 anos de idade só será inidônea, se já tiver alguma internação em abrigo para menores infratores ou em estabelecimento educacional. Não sendo assim, não há tempo para que se observe sua idoneidade, ou não.
Contudo, há também o lado à favor dessa redução. A redução da idade mínima para os jurados, que, como mencionado, caiu de 21 para 18 anos deve aumentar o número de interessados, principalmente universitários.
5.1 Judicium accusationis
A primeira fase do procedimento, judicium accusationis sofreu alterações relevantes. A exemplo disso os artigos 406 e seguintes do CPP, que, antes da Lei 11.689 /08, tratavam da decisão de pronúncia, impronúncia e absolvição sumária, são analisadas em novos procedimentos e dispositivos. Com a nova redação dos artigos 406 a 412, do Código de Processo Penal, todos os atos processuais foram reunidos em uma única audiência, demonstrando um grande avanço para a satisfação da comunidade, em atendimento ao princípio da razoável duração do processo.
Essa fase será iniciada com a denúncia ou queixa subsidiária, podendo ser rejeitada ou não. O órgão da acusação poderá arrolar até 8 testemunhas. O prazo é contado a partir da realização da diligência, não da juntada aos autos do mandado (art. 406, § 1º, CP, Lei 11.689/08).
O interrogatório é o ato derradeiro da instrução, após a produção de prova testemunhal, pericial e demais diligências, ou seja, antes dos debates orais finais. Na resposta, ao acusado será facultado arguir preliminarmente e declarar tudo o que for cabível para a sua defesa.
Após o término da instrução probatória, passar-se-á à fase dos debates orais. Encerrados os debates orais, cabe ao juiz pronunciar-se imediatamente ou em 10 dias, sobre a admissibilidade da denúncia ou queixa. As quais podem ser de pronunciar, impronunciar, absolver sumariamente o acusado ou desclassificar a infração penal.
De acordo com a nova redação, na fase preliminar contraditória, que vem antes do recebimento da denúncia, o juiz, no prazo de 90 dias, fará a oitiva de testemunhas, irá interrogar o acusado, determinará diligências e, por fim, decidirá se a peça será admissível ou não. Mais uma vez, frise-se a celeridade como ponto visado pela reforma. (AVENA: 2009, p. 678)
A doutrina denomina de juízo de admissibilidade da acusação caracterizado pelo contraditório. Note-se que o descumprimento injustificável desse prazo pela Justiça, caracteriza constrangimento ilegal, o que abre espaço para os remédios cabíveis.
A Pronúncia, destacada no art. 413 da lei ora em comento, é a decisão do juízo singular que submete o processo à competência do Tribunal do Júri. Essa decisão é baseada em indícios de autoria ou participação e prova da materialidade, destaque-se, “existência do fato”.
Ademais, a pronúncia visa à admissibilidade da pretensão acusatória, como bem explana o professor José Frederico Marques:
“A pronúncia é uma decisão processual de cunho declaratório em que o Juiz proclama admissível a acusação e tornando imprescindível o julgamento do pronunciado pelo Tribunal do Júri.” (MARQUES: 1963, p. 71)
Em decorrência do art. 472, parágrafo único da Lei 11.689/2008, em que “o jurado receberá cópias da pronúncia ou, se for o caso, das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação e do relatório do processo”, o magistrado deve ter muito cuidado ao motivar a pronúncia, ao passo que pode induzir o Conselho de Sentença de que os indícios que o levaram a tal são mais do que apenas indícios a serem comprovados.
Portanto, o juiz deve declarar apenas o dispositivo legal em que julgar incorrer o acusado e mencionar as possíveis circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena. Determinando o fim da chamada eloquência acusatória.
Ademais, durante os debates, as partes não podem fazer menção à decisão de pronúncia, ou seja, a decisão que julgou admissível a acusação. Contra esta sentença de pronúncia, continua a utilização do recurso em sentido estrito.
Para efeitos de intimação da decisão de pronúncia, constava antigamente no CPP que o ato intimatório fosse sempre pessoal, sob pena de suspensão do processo (antiga redação dos art. 414 c/c 413, CPP). Atualmente essa intimação deverá ser feita de forma pessoal ao acusado, ao defensor nomeado e ao Ministério Público; e ao defensor constituído, ao querelante e ao assistente do Ministério Público, segundo o art. 370, § 1º, CPP (art. 420 e incisos). Em se tratando de réu solto, passa a ser admitida a intimação por edital, com o normal prosseguimento do feito, colocando fim à chamada crise de instância. (NASSIF: 2009, p. 62)
5.2 Judicium causae
Esta fase é vinculada à decisão de pronúncia de acusado em crime doloso contra a vida, em outras palavras, somente se tiver sido precluído para o Ministério Público e para a defesa, sem ter sido interposto recurso em sentido estrito, ou, se apresentado recurso, após seu julgamento.
Na absolvição sumária o artigo 415 e incisos da lei, ora em tela, amplia as suas hipóteses, determinando que “o juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando I) provada a inexistência do fato; II) provado não ser ele o autor; III) o fato não constituir crime; IV) demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime”.
Contudo, o parágrafo único deste dispositivo fez uma ressalva. A chamada absolvição sumária imprópria. Que diz que não ocorrerá absolvição sumária com base no inciso IV (causa de isenção de pena ou de exclusão do crime), quando for hipótese de inimputabilidade do artigo 26, caput do CP, a não ser que seja a única defesa.
A absolvição sumária traz benefícios para ambas as partes; à defesa porque encerra as acusações contra seu cliente, sem submetê-lo ao Plenário, e, para a acusação, pois não demandará esforço para que ao final nem consiga um resultado satisfatório. (SILVA: 2008, p. 98)
Dessa forma, com a inovação processual trazida ao tribunal do júri, o acusado poderá alegar qualquer das excludentes elencadas no art. 396-A, e, se bem fundamentada, apresenta-se ao juiz a alternativa de findar o processo absolvendo o acusado sumariamente, isto é, antes da fase probatória na audiência de instrução e julgamento (art. 400 do CPP).
Vale destacar que antes dessa reforma, como não havia um rol vasto como o do art. 415 do CPP (Lei 11.689/08), os operadores do direito utilizavam-se do remédio constitucional Habeas Corpus, pedindo o trancamento da ação penal por falta de justa causa para o seu prosseguimento.
Ainda, a absolvição sumária do crime contra a vida julga o mérito da ação penal em momento antecipado. A denúncia é julgada improcedente e, por força da coisa julgada material formada, não pode ser iniciada demanda penal pelos mesmos fatos narrados na peça acusatória. (ALENCAR; TÁVORA: 2009, p. 688)
Quanto ao recurso da absolvição sumária, tem-se que, com o advento da Lei 11.689/08, este deixou de ser o Recurso em Sentido Estrito, passando a ser o recurso de Apelação. A decisão de impronúncia, assim com a pronúncia, tem natureza formal, assumindo, porém, característica de sentença, já que avança na apreciação do mérito e equivale à discordância ao recurso de Apelação. “É decisão com força de definitiva”. (NASSIF: 2009, p. 67)
O grande impacto trazido por esta mudança reside no fato de que sai a possibilidade do juízo de retratação para a pronúncia e impronúncia. Desta feita, não há que se falar em decidir contrariamente à primeira decisão, restando-lhe somente, realizar o primeiro juízo de admissibilidade recursal da apelação para averiguar se os pressupostos processuais foram cumpridos.
Entretanto, acreditamos que para a absolvição sumária, por ser decisão definitiva, é compatível com o recurso de Apelação. Todavia, por não ter caráter de condenar nem de absolver, muito menos definitivo, entendemos que a sua vinculação ao recurso de Apelação foi equivocada.
Outra importante modificação é acerca do desaforamento. O artigo 428 cria uma nova hipótese de aplicação do instituto, a não realização do julgamento em Plenário, nos 6 meses seguintes ao trânsito em julgado da decisão de pronúncia.
O desaforamento também poderá ser determinado em razão do comprovado excesso de serviço, ocorrendo risco concreto de grave perturbação da ordem pública, dúvida séria sobre a imparcialidade do júri ou sobre à segurança pessoal do réu, se o julgamento não puder ser realizado no prazo de 6 meses contados do trânsito em julgado da decisão de pronúncia. Ocorrendo tal situação, o desaforamento será para a Comarca vizinha que esteja desobstruída.
“Essas situações, quando efetivamente comprovadas, demonstram a necessidade de alteração do local de realização do julgamento, optando-se pelas localidades mais próximas onde não subsistam os mesmo motivos. Nesses pontos, a nova lei determina a preferência por comarca da mesma região. Mais importante do que a proximidade, no entanto, há de ser o critério da contaminação, já que, em alguns casos, a repercussão do fato irradia-se por toda a região, sendo caso de se desaforar para local onde não haja o reflexo da situação”. (MARQUES: 2009, p. 92)
O libelo-crime acusatório tem muita importância historicamente para o direito processual penal brasileiro. Entretanto, com o advento das modificações inseridas pela Lei 11.689/08, este instituto foi extinto. Era uma espécie de petição inicial da segunda fase do júri, retratava a pronúncia. Por isso que foi extinto, considerado por muitos doutrinadores como um instituto dispensável, devido ser um espelho da pronúncia, em que era reproduzi-la por inteiro.
O libelo também delimitava a dimensão da acusação, não podia se excedido seus limites. Sendo que apenas podia ser feito o libelo sob a “forma de articulado, vale dizer, os fatos deviam ser relatados parte por parte, a começar do fato principal, passando pelas qualificadoras, causas de aumento, e, se houvesse, circunstanciais agravantes”. (ALENCAR; TÁVORA: 2009, p. 695)
O libelo-crime acusatório era o divisor de águas das duas fases do júri e quando preclusa o ponto de partida da segunda fase. Neste instituto, a apresentação da contrariedade ao libelo era facultativo, porém a intimação para o ato era obrigatório. Com a chegada da reforma a contrariedade foi substituída pelo requerimento de oitiva de testemunhas através da defesa, poderiam pleitear diligências e acostar documentos.
Outra importante mudança trazida pela lei, diz respeito a alterações relativas às recusas, por parte da defesa e da acusação no que se refere à escolha dos jurados para compor o Conselho de Sentença, mais especificamente no que se refere à dupla recusa.
Assim, com a busca incessante de celeridade, foram criadas novas formas de restringir a cisão de julgamentos, que acontecerá “se forem 2 (dois) ou mais os acusados, as recusas poderão ser feitas por um só defensor”, como dispõe o novo art. 469 do CPP. Em sendo dois os réus, abrem-se espaço para que os advogados combinem entre si as recusas, conduzindo à cisão do julgamento.
Também será feita a cisão quando não houver mais jurados suficientes para compor o Conselho de Sentença, “a separação dos julgamentos somente correrá se, em razão das recusas, não for obtido o número mínimo de 7 (sete) jurados para compor o Conselho de Sentença”. Para evitar a cisão do julgamento, foi aumentado o número de jurados de 21 (vinte e um) para 25 (vinte e cinco), no termos do art. 433 do CPP. (art. 469, § 1º do CPP)
O §2º determinada que “a separação dos julgamentos, será julgado em primeiro lugar o acusado a quem foi atribuída a autoria do fato ou, em caso de co-autoria, aplicar-se-á o critério de preferência disposto no art. 429 deste Código” (art. 469, §2º do CPP) Em detrimento desse dispositivo há divergência doutrinária a respeito de quem será julgado primeiro em caso de cisão do julgamento.
Para Alencar e Távora (2009, p. 706) acreditam que primeiro será o acusado que estiver preso, com mais tempo nessa situação e, por último quem teve em seu processo a decisão e pronúncia já decretada. Por outro lado, Marques (2009, p. 121) primeiro será aquele que for imputado da prática de crime doloso contra vida em relação a um dos acusados. E, em crimes conexos, será dado prioritariamente ao julgamento do acusado de crime doloso contra a vida, tendo que autor é aquele que define a competência do Júri.
Ademais, outra alteração que merece destaque é a consagração do sistema da cross examination, que trata da possibilidade de “reperguntas” diretamente às testemunhas, por parte da defesa e da acusação, sem a necessidade de aludir antes ao juiz. As perguntas são feitas diretamente pelas partes às testemunhas. Ensina o art. 473 da Lei, ipsis litteris:
“Art. 473. Prestado o compromisso pelos jurados, será iniciada a instrução plenária quando o juiz presidente, o Ministério Público, o assistente, o querelante e o defensor do acusado tomarão, sucessiva e diretamente, as declarações do ofendido, se possível, e inquirirão as testemunhas arroladas pela acusação.
§ 1º Para a inquirição das testemunhas arroladas pela defesa, o defensor do acusado formulará as perguntas antes do Ministério Público e do assistente, mantidos no mais a ordem e os critérios estabelecidos neste artigo.
§ 2º Os jurados poderão formular perguntas ao ofendido e às testemunhas, por intermédio do juiz presidente.”
Contudo, o § 2º da norma em comento traz uma exceção: os jurados, por sua vez, não podem formular perguntas diretamente às testemunhas.
Podemos concluir que com o advento da Lei 11.689/08 o nosso ordenamento adotou um sistema misto de inquirição de testemunhas, uma vez pela cross examination, quando se tratar de “reperguntas” do Ministério Público, outra pela da defesa (presidencialista) nas perguntas feitas pelos jurados.
Outra questão que sofreu alteração foi a leitura de peças em Plenário. Não havia limitações, as partes podiam solicitar a leitura de quantas peças considerassem necessárias. A Lei 11.689/08 alterou isso; haverá a leitura apenas do que for considerado indispensável. A exemplo disso, as provas cautelares.
Ainda, importante mudança trazida pela lei, diz respeito à extinção do Protesto por Novo Júri, que “tratava-se de recurso exclusivo da defesa, cujo objetivo era propiciar a realização de um novo julgamento quando a pena imposta, decorrente da condenação pelo Júri, fosse igual ou superior a 20 anos”, a realização um novo julgamento se dava porque a pena era considerada excessiva. (CUNHA; PINTO: 2008, p. 236)
O art. 4º, da Lei em tela ficou destinado a revogar o capítulo do Código Processual Penal que dispunha sobre o protesto por novo júri.
Era previsto nos artigos 607 e seguintes, do CPP, e era um recurso específico da defesa. Independentemente de uma fundamentação maior, o réu que tivesse sido submetido a júri popular, alcançando a condenação de, pelo menos, vinte anos de reclusão, só podia empregá-lo uma única vez. Pena essa que deve ser atribuída a apenas um crime.
Se acaso o protesto fosse deferido, haveria um novo julgamento, e, mesmo que se obtivesse condenação igual ou superior a vinte anos, o réu não poderia interpor o Protesto por novo Júri novamente. Porém, quanto a essa segunda decisão, cabe Apelação.
O principal fundamento para a extinção desse instituto é a morosidade processual. Contudo, sua extinção, apesar de ser defendida por diversos doutrinadores, inclusive Guilherme de Souza Nucci, foi massacrada por outros.
Para esses, foi uma retroação abolir, pois o país estava no auge da democracia, e as duas partes tinham seus direitos. Já que o réu era a parte mais fraca, era garantido a ele protestar por um novo júri quando lhe fosse auferida pena gravosa pelo júri.
A nosso ver, a extinção do Protesto por Novo Júri chegou em um momento muito oportuno. O Protesto por novo Júri não apenas representava uma ofensa aos princípios do contraditório, da economia processual, da igualdade entre as partes, e, sobretudo, da soberania dos veredictos dos jurados, como ultrapassava o direito que o réu tem de plena defesa.
O Protesto por Novo Júri apenas satisfazia o acusado, que teria uma nova ocasião de ter sua causa analisada por um Conselho de Sentença.
Como bem observado, não é esse o objetivo da Instituição do Júri. Ela pretende proporcionar seguridade a todos que necessitam de uma justiça eficaz, a sociedade como um todo.
6 CONCLUSÃO
Por derradeiro, concluímos que o Tribunal do Júri, mesmo sendo a instituição julgadora mais democrática atualmente, além de atualizada e imprescindível para a sociedade, sempre necessitará de mudanças como essas, para que possa dar respostas as mais céleres possíveis a quem carece de Justiça.
Ademais, a reforma vem trazendo diversos debates entre os mais diversos doutrinadores. Como mencionado, tratamos da discussão sobre a extinção do protesto por novo júri. Há quem acredite que acaba por cercear o direito de defesa do acusado, assim como há quem se posicione de modo contrário, logo, que sua extinção foi mais do que acertada, inclusive o nosso posicionamento.
A reforma ocorrida no instituto aqui tratado trouxe maior celeridade, mas não nos parece ser vantajosos por acreditarmos que causará lesões ao contraditório e a plena defesa, tendo em vista que em casos de alta complexidade e ainda o julgamento de co-autores na mesma sessão. Celeridade não quer dizer eficácia. Essa reforma tem por objetivo fazer valer os princípios da celeridade e da economia processual, diminuindo a morosidade no andamento das demandas processuais.
Acadêmico de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco.
Acadêmico de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB
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