Resumo: o Registro Civil de Pessoas Jurídicas é um dos tipos de serventias extrajudiciais mais relevantes do Sistema Cartorário Brasileiro, pois nele se registram os atos constitutivos de associações, sociedades simples, fundações, organizações religiosas e partidos políticos, além de jornais e periódicos. Essa delegação possui diversas peculiaridades procedimentais e principiológicas, que demandam especial atenção a quem tenha interesse teórico ou prático no assunto. Além disso, merece destaque, como atualização ao estado da arte, a possibilidade de alteração de competências, pela eventual publicação do Novo Código Comercial.
Palavras-chave: cartório; registro civil; pessoas jurídicas.
Abstract: the Civil Registry of Legal Persons is one of the most relevant types of extrajudicial offices in the Brazilian Registration and Notary Law system, since in it are registered the constitutive acts of associations, simple societies, foundations, religious organizations and political parties, besides newspapers and periodicals. This delegation contains several peculiariaties of principle and procedure, which require the attention of anyone with a theoretical or practical interest on the subject. Besides that, it is worthy of notice, as an update to the state of the art, the possibility of alteration of competence, by the possible approval of the new Brazilian Commercial Code.
Keywords: Registry and Notary Office; Register; Civil; Persons; Legal Persons.
Sumário: Introdução: competência e generalidades. 1. Peculiaridades de certos tipos de registro. 2. Atualidades: competência. 3. Efeitos do registro dos atos constitutivos e matrículas. 4. Princípios pertinentes. Conclusão.
Introdução: competência e generalidades
A regulamentação vigente para o RCPJ se dá sobretudo pela Lei de Registros Públicos (arts. 114 e ss) e pelo Código Civil (art. 1.150[1]). Este último, aliás, modificou profundamente a estrutura e o registro das associações, das fundações e das sociedades simples (SIQUEIRA). Nesse contexto, está superada a distinção entre sociedades comerciais e sociedades civis (que deu nome ao registro civil de pessoas jurídicas), pois hoje se trata de sociedades empresárias e não empresárias.
Assim, o RCPJ registra e averba atos relativos a pessoas jurídicas de direito privado (arroladas no art. 44 do Código Civil), exceto a maioria das sociedades empresárias e as cooperativas[2]. Competem-lhe, portanto, as associações, as sociedades simples, as fundações, as organizações religiosas e os partidos políticos.
Além disso, segundo o art. 114 da LRP e art. 8º da Lei da Imprensa (Lei 5.250/67), cabe ao RCPJ registrar matrículas de periódicos, oficinas impressoras, empresas jornalísticas e de radiodifusão, bem como empresas que tenham por objeto, de alguma forma, a produção ou agenciamento midiático.
Portanto, os Livros de registro do RCPJ são: (i) Livro A, para pessoas jurídicas em geral; (ii) Livro B, para matriculas de periódicos, oficinas impressoras, empresas jornalísticas e de radiodifusão; (iii) Livro de Protocolo.
1. Peculiaridades de certos tipos de registro
Para fins de registro, a tendência é uma interpretação numerus clausus do art. 44, do Código Civil, embora o ordenamento reconheça direitos a várias entidades despersonalizadas (como a sociedade de fato, o espólio, a massa falida, a herança jacente, os movimentos sociais, etc.).
Em regra, o RCPJ não registra sociedades empresárias. Todavia, em caráter de exceção, competem-lhe as empresas jornalísticas[3] (usa-se o termo “empresa jornalística” para designar todas as empresas relacionadas à atividade de imprensa).
Também competem ao RCPJ as entidades que integrem o chamado Terceiro Setor adotam a forma de associações ou fundações, a saber: (i) o Consórcio Público (sobre o assunto, ver Araújo); (ii) a Organização Não Governamental – ONG; (iii) a Organização Social – OS; (iv) a Organização da Sociedade Civil – OSC; e (v) a Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP (sobre estas últimas, ver conceituação didática em do “Observatório Terceiro Setor”).
Há controvérsia quanto à natureza pública ou privada dos sindicados, mas prevalece o entendimento firmado nas Cortes Superiores[4] de que são associações privadas (ver mais em Siqueira). São, portanto, registrados no RCPJ, independente de ulterior registro no Ministério Público do Trabalho. De todo modo, sem este último, a entidade não goza de todas as suas prerrogativas[5].
Já os partidos políticos embora previstos no rol do art. 44, são também pessoas jurídicas de direito eleitoral, tendo natureza mista; logo, regem-se por lei específica, o que se depreende do próprio art. 44, §º CC.
Por fim, ressalte-se que, conquanto as organizações religiosas sejam classificadas como instituições privadas (art. 44, CC), a Igreja Católica[6] é considerada pessoa jurídica de direito público externo, incidindo a seu respeito regras específicas.
2. Atualidades: competência
A competência do RCPJ pode ser alterada, caso seja aprovado o PL 1.572/11, do Novo Código Comercial. O projeto não distingue a sociedade simples da sociedade empresária, de modo que o empresário poderia optar pelo registro na junta ou no RCPJ.
Segundo seus idealizadores, essa competência concorrente seria benéfica dada a competitividade que ensejaria (Cerezoli, p. 60), e vai ao encontro da política nacional concretizada na “Rede Nacional para Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (REDESIM), que busca integrar o processo de registro e legalização de empresas, englobando num mesmo sistema, o registro empresarial, os cadastros da Receita Municipal, órgãos de licenciamento urbano municipais, órgãos de vigilância sanitária federal, estadual e municipal, órgãos de licenciamento ambiental federal, estadual e municipal, Bombeiros, entre outros” (Cerezoli, p. 60).
Contudo, segundo José Cerezoli (2017, p. 60), cria-se o risco de tornar o sistema mais complexo e caótico. Isso porque, embora a integração tenha vantagens indiscutíveis (sobretudo a maior acessibilidade aos RCPJs localizados no interior dos estados), não seria aconselhável reputar o registro empresarial a serventias extrajudiciais, tendo em vista a falta de especialização dos registradores a respeito da matéria comercial.
Na realidade, contudo, esse entendimento é refutável, pois os registradores têm mais condições de realizar atos especializados, tendo em vista sua maior qualificação jurídica. Afinal, as pessoas que atuam nas Juntas Comerciais não são concursadas, nem sequer precisam ser bacharéis em Direito, enquanto que os registradores precisam ter dez anos de prática jurídica, bem como são aprovados no mais complexo concurso público jurídico do país.
3. Efeitos do registro dos atos constitutivos e matrículas
Em sua natureza, registro de pessoas jurídicas tem eficácia constitutiva, pois confere personalidade jurídica à entidade, a qual passa a ser sujeito de direito. Nesse sentido, reza a o art. 119 da LRP que “a existência legal das pessoas jurídicas só começa com o registro de seus atos constitutivos”.
Diversas são as espécies de atos constitutivos, a depender da pessoa jurídica, a saber: “o ato constitutivo, em se tratando de sociedade, é o contrato social, exceto no caso da sociedade anônima, cujo ato constitutivo é o estatuto social; em se tratando de associação, incluindo-se aí as organizações religiosas, partidos políticos e sindicatos, é a ata de constituição, mais o estatuto social; e, em se tratando de fundação, o ato constitutivo é o testamento e a escritura pública”. (SIQUEIRA, grifou-se).
Assim, os efeitos variam conforme natureza da entidade, mas é possível arrolar alguns genéricos: (i) personalidade jurídica própria, com vontade autônoma; (ii) patrimônio distinto (independente de limitação da responsabilidade); (iii) capacidade processual própria.
Ademais, há eficácia negativa na matrícula de periódicos: não serem taxados de clandestinos. Isso porque, na forma do art. 125 da LRP, “considera-se clandestino o jornal, ou outra publicação periódica, não matriculado nos termos do artigo 122 ou de cuja matrícula não constem os nomes e as qualificações do diretor ou redator e do proprietário”.
4. Princípios pertinentes
Os princípios são os mesmos da atividade registral em geral, mais bem desenvolvidos legal e teoricamente em relação ao registro de imóveis. Assim, no estudo do RCPJ é interessante apenas recordar alguns conceitos principais e abordar as adaptações que esses princípios sofre para este tipo de serventia.
Segundo o art. 1.154 do Código Civil[7], o RCPJ tem duas finalidades específicas em relação ao princípio da publicidade: (i) conferir ciência a terceiros da prática do ato; (ii) conferir oponibilidade a terceiros, que não podem alegar ignorância, caso o ato preencha as formalidades legais.
Quanto ao princípio da territorialidade para o RCPJ, tem-se que: (i) o registro das entidades civis em geral será aquele do domicílio de sua sede principal (as filiais devem ser registradas em seus respectivos domicílios); (ii) o registro de partidos políticos é exclusiva dos RCPJ de Brasília[8] (vez que partidos passíveis de registro são apenas os de caráter nacional). Logo, a sistemática é pela distribuição de competências.
Também vige o princípio da inscrição (obrigatoriedade do registro): para reconhecimento jurídico, as entidades de competência do RCPJ devem ser devidamente registradas (e o mesmo se diga em relação aos demais atos passíveis de registro ou averbação). No que diz respeito a periódicos, reforça-se o princípio da inscrição pela questão da clandestinidade (v. tópico anterior).
Para estes últimos, aliás, incide o princípio unitariedade da matrícula, segundo o qual a todo periódico deve corresponder uma única matrícula (e a cada matrícula deve corresponder um único periódico). Ressalte-se que a matrícula, nesse caso, diz respeito a informações sobre a existência e a titularidade do veículo midiático.
De acordo com o princípio da continuidade, não se admitem lacunas ou incoerências em relação a uma determinada cadeia registral. Para o RCPJ, isso se relaciona a alterações: (i) nas matrículas de jornais e periódicos (que são instrumentos onde se assentam, por definição, todos os atos relevantes do objeto matriculado); (ii) no ato constitutivo das pessoas jurídicas, sobretudo na razão social ou do tipo de sociedade (art. 45 do Código Civil[9]). Nesse último caso, a continuidade é também importa aos mandatos do corpo diretivo, pois a responsabilidade se inicia e finaliza com o registro da ata de eleição/nomeação.
Por fim, há diversas peculiaridades em relação ao princípio da qualificação. Como é cediço, a qualificação é o poder-dever do cartorário analisar os documentos apresentados, a fim de verificar o preenchimento dos requisitos para o registro. Em geral, pode o registrador: (i) estabelecer exigências ao interessando; (ii) declarar, fundamentadamente, a impossibilidade do registro; (iii) suscitar dúvida ao juízo competente. Nesse sentido, observar o disposto nos artigos 115[10] e 119, parágrafo único[11], da LRP.
Logo, existem alguns critérios específicos ao registro de pessoas jurídicas (bem público, moral, bons costumes e “aprovação por autoridade”, quando for o caso). No mais, contudo, “é vedado ao oficial registrador interferir na vontade associativa, cumprindo-lhe tão somente verificar a inexistência de nulidade, sobretudo de modo a assegurar que as normas de constituição e funcionamento da administração assegurarem o direito das minorias” (Rodrigues, p. 110).
Conclusão
O registro civil de pessoas jurídicas é um dos tipos de serventias extrajudiciais mais relevantes do sistema cartorário brasileiro, pois nele se registram os atos constitutivos de associações, sociedades simples, fundações, organizações religiosas e partidos políticos, bem como as matrículas de jornais e periódicos.
Quanto à eficácia, pode-se dizer que os registros em RCPJ possuem natureza constitutiva quando registrados os contratos sociais e estatutos das pessoas jurídicas. Além disso, conferem aos jornais e periódicos a possibilidade de não serem clandestinos.
Essa delegação possui diversas peculiaridades procedimentais e principiológicas, que demandam especial atenção a quem tenha interesse teórico ou prático no assunto. Destacam-se, nesse sentido, os princípios da publicidade, da territorialidade, da inscrição, da unitariedade da matrícula, da continuidade e da qualificação – que, apesar de incidirem sobre toda a atividade cartorária, assumem feições próprias no RCPJ.
Por fim, merece destaque, como atualização ao estado da arte, a possibilidade de alteração de competências, pela eventual publicação do Novo Código Comercial. Embora os idealizadores do projeto entendam vantajosa a competência concorrente dos RCPJ com as Juntas Comerciais, isso pode significar um decréscimo na qualidade dos serviços, tendo em vista a maior qualificação jurídica dos registradores em comparação aos membros das juntas comerciais.
bacharel pela UFPR pós-graduando em Direito Tributário pelo IBET e advogado OAB/PR 76.031 da banca Macedo Guedes Advocacia nas áreas cível e tributária com ênfase em direito registral e notarial
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