Aspectos jurídicos da educação a distância: um estudo do ensino presencial mediado da Universidade do Estado do Amazonas

Resumo: o presente trabalho tem o objetivo de analisar a legislação sobre Educação a Distância (EAD) de forma inovadora, ou seja, englobando diferentes áreas do conhecimento, em busca de uma melhor compreensão do conceito de EAD. Para isso, discorre-se sobre seu histórico e esclarecem-se seus conceitos, suas características e espécies para, em seguida, fazer um estudo de caso do curso Normal Superior da Universidade do Estado do Amazonas, oferecidos através do Ensino Presencial Mediado. O estudo de caso possui o intuito de demonstrar a problemática conceitual existente e analisar a realidade regional através de um exemplo concreto. Com a pesquisa, conclui-se que, com base na legislação em vigor, o Ensino Presencial Mediado deve ser classificado como um tipo de EAD.


Palavras-chave: Análise Legislativa; Educação a distância; Ensino Presencial Mediado.


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Abstract: The present paper aims to analyze the legislation on Distance Learning in innovative ways, ie, covering different areas of knowledge, in search of a better understanding of the concept of distance education. For this, explains about its history and to clarify its concepts, characteristics and species to perform a case study of the undergraduate course Normal Superior of State University of Amazonas, offered through the Education Classroom Mediated. The case study has the aim of showing the conceptual issues and review the existing regional reality through a concrete example. Through research, it is concluded that, based on existing legislation, the Education Classroom Mediated should be classified as a type of distance education.


Keywords: Juridical Analysis; Distance Learning; Education Classroom Mediated.


Sumário: 1 Análise Legislativa da Educação a Distância; 2 Construindo um conceito de EAD; 3 Estudo de Caso: Projeto de Formação de Professores para o Ensino Fundamental (Proformar) da Universidade do Estado do Amazonas (UEA); 3.1 Peculiaridades da Educação no Amazonas; 3.2 Projeto de Formação de Professores para o Ensino Fundamental (PROFORMAR); 3.3 Analisando o Ensino Presencial Mediado; 3.3.1 “Presença do Professor e do aluno no mesmo local” e “Realização das atividades didáticas”; 3.3.2 “Apresentação das aulas” e “Relação de Tempo entre a realização da aula e a presença do aluno”; 3.3.3 Avaliação; 3.3.4 “Orientação dos alunos”; 3.3.5 “Interatividade”; 3.3.6 Freqüência às aulas e demais atividades; 3.4 Reclassificando o Ensino Presencial Mediado; Conclusão; Referências.


Introdução


Com a evolução tecnológica e o aumento de exigência do grau de escolaridade dos profissionais pelo mercado de trabalho, a Educação a Distância (EAD) ganha importância e seus cursos se intensificam como uma alternativa educacional para a sociedade. Conseqüentemente, surge a necessidade de uma legislação específica para regulamentar essa modalidade de ensino.


Especificamente no estado do Amazonas, as tecnologias da comunicação foram amplamente utilizadas pela Universidade do Estado do Amazonas (UEA), através do denominado “Ensino Presencial Mediado”, para o oferecimento dos cursos superiores em Normal Superior, Ciência Política, Matemática, além de cursos tecnológicos. Tal experiência mostrou-se bastante exitosa, amenizando as dificuldades geográficas locais de locomoção aos municípios do interior do Estado.


Contudo, o que vem a ser “Ensino Presencial Mediado” – terminologia essa utilizada pela própria UEA? Seria uma nova forma de ensino presencial, como assim defende a universidade, ou de EAD? Quais as implicações legislativas de tal classificação?


A literatura existente sobre EAD ainda é bastante escassa tanto no Brasil, como no exterior. Mesmo assim, a doutrina dá um enfoque meramente individual à temática, analisando-a apenas sob o prisma de uma única área do conhecimento. Buscar a exata compreensão do que seja a Educação a Distância e, mais especificamente, o Ensino Presencial Mediado não é apenas uma preocupação terminológica, mas sim, eminentemente, jurídica, uma vez que existe legislação diferenciada e própria para o Ensino Presencial e para a EAD.


Em síntese, definir um curso como Presencial ou à Distância é fundamental para se determinar a qual legislação ele deve se submeter, a que órgão governamental deve responder e na maneira como deve se dar.


1. Análise legislativa da educação a distância


A Constituição estabeleceu a educação como um dos direitos sociais protegidos, assim como o trabalho, a saúde, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desamparados (art. 6° CF/88).  No Capítulo III – Da educação (arts. 205 – 214), do Título VIII – Ordem Social, previram-se os princípios bases do ensino; a autonomia universitária; os deveres do Estado; a fixação de conteúdos mínimos; a livre iniciativa privada; a organização dos sistemas de ensino através colaboração entre os entes federativos; a aplicação da receita em Educação e a distribuição dos recursos públicos. No que tange às atribuições de cada ente federativo, as previsões encontram-se ao longo de seu texto, nos arts. 22 XXIV, 23 V, 24 IX, 30 VI e 214.


Dessa forma, tem-se que a Constituição faz apenas previsões básicas necessárias ao funcionamento e organização da educação, deixando os demais assuntos a cargo de leis específicas, no plano infraconstitucional. No caso da Educação a Distância, ela só passa a fazer parte do cenário legislativo brasileiro a partir da Nova LBD (Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996).


O projeto da nova LDB, aprovado na Câmara dos Deputados, apresentava um capítulo específico para a Educação a Distância (Capítulo XVI). Em seus três artigos, eram apresentados: o conceito de EAD (art. 84); as normas para produção, controle e avaliação de programas de Educação a Distância e a autorização para sua implantação (art. 85), além de uma previsão de tratamento diferenciado para EAD (art. 86).


“Art. 84. Considera-se educação a distância a forma de ensino que se baseia no estudo ativo, independente e possibilita ao estudante a escolha dos horários, de duração e do local de estudo, combinado a veiculação de cursos com material didático de auto-instrução e dispensando ou reduzindo a exigência da presença.”


Esta parte do projeto, contudo, sofreu modificações na casa revisora (Senado). A versão final sancionada tornou-se mais genérica. O que era um capítulo específico foi reduzido, praticamente, a um único artigo da LDB.


“Art. 80. O Poder Público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada.


§ 1º A educação a distância, organizada com abertura e regime especiais, será oferecida por instituições especificamente credenciadas pela União.


§ 2º A União regulamentará os requisitos para a realização de exames e registro de diploma relativos a cursos de educação a distância.


§ 3º As normas para produção, controle e avaliação de programas de educação a distância e a autorização para sua implementação, caberão aos respectivos sistemas de ensino, podendo haver cooperação e integração entre os diferentes sistemas.


§ 4º A educação a distância gozará de tratamento diferenciado, que incluirá:


I – custos de transmissão reduzidos em canais comerciais de radiodifusão sonora e de sons e imagens;


II – concessão de canais com finalidades exclusivamente educativas;


III – reserva de tempo mínimo, sem ônus para o Poder Público, pelos concessionários de canais comerciais.”


Dessa forma, percebem-se diversas modificações entre o Projeto da Câmara e o texto sancionado. A mais importante delas é que o legislativo absteve-se de conceituar o que seria a EAD (art. 84 do Projeto de Lei). Também foi retirada a obrigatoriedade de observância às diretrizes do Conselho Nacional de Educação no que tange às normas do § 3º art. 80 da LDB, assim como às situações específicas apresentadas nos parágrafos do art. 85 do Projeto. O § 4º art. 80 da LDB foi o que menos sofreu alterações, sendo uma transcrição do art. 86 do Projeto, apenas com a exclusão de seu inciso I. Assim, a grande preocupação focou-se em distinguir dois momentos: o do credenciamento de instituições (que ficou a cargo da União) e a autorização de programas.


Ao longo da Lei de Diretrizes e Bases, alguns outros artigos fazem menções à EAD ao versarem sobre: sua utilização no ensino fundamental obrigatório apenas como complementação da aprendizagem ou em situações emergenciais (art. 32, §4º); a não obrigatoriedade da freqüência de alunos e professores (art. 47, § 3º) e ao seu uso em programas de capacitação para todos os professores em exercício (art. 87, §3°, III).


Também se pode citar o art. 37 da LDB que é considerado uma menção indireta à EAD, uma vez que a mesma é vista como a grande possibilidade de democratização da educação.


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“Art. 37. A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria.


§ 1º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho […]”


A ausência de regulamentações mais específicas na LBD não é um problema exclusivo da temática Educação a Distância. De acordo com Rodrigues (2000), a LDB apresenta mais de cento e cinqüenta dispositivos que reclamam regulamentação específica. Conseqüentemente, tem-se uma extensa legislação educacional esparsa que compõe, praticamente, uma nova área do Direito. Quanto à EAD em especial, acabou-se por atribuir ao Executivo a maior parte da função legislativa referente à matéria.


Assim, verifica-se que a LDB teve o grande mérito de consagrar a Educação a Distância como uma modalidade de ensino, demonstrando o reconhecimento de sua importância para o processo educacional. A partir de então, a EAD não poderia mais, legalmente, ter status de um mero meio inovador de se fazer educação. Contudo, a classificação da EAD como uma modalidade de ensino é questionável, como será demonstrado posteriormente neste trabalho.


A tardia preocupação em se regulamentar a EAD se justifica, exatamente, pela falta de compreensão social de seu papel. No início, ela era vista com desconfiança, tratada como supletiva ou complementar do ensino presencial. Logo, não havia razões para fazer parte das preocupações legislativas. No entanto, com o surgimento das novas tecnologias da comunicação, há uma ampliação e difusão tecnológica que acabar por tornar imperativa a sua regulamentação, principalmente no que tange: delimitar o que deve ser regulamentado; distinguir o ensino presencial da EAD; definir os procedimentos e analisar suas práticas. Ou seja, era, e ainda é, preciso decifrar o que realmente vinha a ser a Educação a Distância.


O Dec. n° 2.494, de 10 de fevereiro de 1998, veio regulamentar o art. 80 da LDB, fazendo com que fosse efetivamente implementada a determinação legal de tornar a EAD parte do projeto pedagógico da educação no Brasil. De forma geral, o referido Decreto tratou sobre: a conceituação de educação a distância; um regime especial para EAD; o credenciamento das instituições: quais instituições podem oferecer EAD, como proceder para conseguir o credenciamento, os prazos, as exigências; a emissão de certificados e diplomas obtidos em cursos de EAD; avaliação dos alunos.


O Decreto trouxe a primeira definição legal brasileira de EAD, antes apenas prevista na parte não sancionada do projeto de lei da LDB:


“Art. 1º Educação a distância é uma forma de ensino que possibilita a auto-aprendizagem, com a mediação de recursos didáticos sistematicamente organizados, apresentados em diferentes suportes de informação, utilizados isoladamente ou combinados, e veiculados pelos diversos meios de comunicação.


Parágrafo único. Os cursos ministrados sob a forma de educação a distância serão organizados em regime especial, com flexibilidade de requisitos para admissão, horário e duração, sem prejuízo, quando for o caso, dos objetivos e das diretrizes curriculares fixadas nacionalmente.”


O Decreto possui um total de doze artigos, sendo que os arts. 11 e 12 foram alterados pelo Decreto n° 2.561, de 27 de abril de 1998, que incluiu a previsão da educação profissional de nível técnico através da EAD. O Decreto n° 5.622, de 19 de dezembro de 2005, por sua vez, revogou o Dec.2.494, trazendo inclusive uma nova definição de EAD:


“Art. 1° Para os fins deste Decreto, caracteriza-se a educação a distância como modalidade educacional na qual a mediação didático-pedagógica nos processos de ensino e aprendizagem ocorre com a utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação, com estudantes e professores desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos.


§ 1° A educação a distância organiza-se segundo metodologia, gestão e avaliação peculiares, para as quais deverá estar prevista a obrigatoriedade de momentos presenciais para:


I – avaliações de estudantes;


II – estágios obrigatórios, quando previstos na legislação pertinente;


III – defesa de trabalhos de conclusão de curso, quando previstos na legislação pertinente; e


IV – atividades relacionadas a laboratórios de ensino, quando for o caso.”


Analisando as definições de EAD apresentadas pelos Decretos n° 2.494/98 3 n° 5.622/05, podem-se perceber modificações sensíveis: a EAD deixou de ser forma de ensino para ser modalidade de ensino (I); a auto-aprendizagem deixou de ser um requisito da sua composição conceitual (II); a expressão “mediação de recursos didáticos sistematicamente organizados” foi substituída por “mediação didático-pedagógica nos processos de ensino e aprendizagem”, ou seja, a EAD deixou de ser mediação de recursos (III); “apresentados em diferentes suportes de informação, utilizados isoladamente ou combinados, e veiculados pelos diversos meios de comunicação” foi substituída por “utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação” (IV); incluiu-se a questão da separação tempo-espacial entre estudantes e professores (desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos) (V).


A LDB (art. 9° I) também trouxe a exigência de criação de um Plano Nacional de Educação (PNE), que se tornou lei apenas no dia 09 de janeiro de 2001 (Lei n° 10.172). De forma geral, o PNE define as diretrizes para a gestão e o financiamento da educação, as diretrizes e metas para cada nível e modalidade de ensino e para a formação e valorização do magistério e demais profissionais da educação, nos próximos dez anos.


No que se refere à área de interesse do presente trabalho, também estabelece os Níveis e as Modalidades de Ensino, abordando a atual situação em que se encontram (diagnóstico), as diretrizes, os objetivos e as metas de cada um de seus tipos. Os Níveis se dividem em Educação Básica, que abrange a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e o Ensino Médio, e Educação Superior. As Modalidades de Ensino, por sua vez, englobam: Educação de Jovens e Adultos; Educação a Distância e Tecnologias Educacionais; Educação Tecnológica e Formação Profissional; Educação Especial e Educação Indígena.


Os objetivos, por outro lado, versam sobre a operacionalização da EAD, com base nas diretrizes apresentadas. Já as metas demonstram a intenção de se popularizar o uso das tecnologias, principalmente o computador, além de capacitar professores e alunos para utilizá-las.


De acordo com Fragale (2003, p. 14), o PNE aponta para um modelo cooperativo de enriquecimento mútuo entre os sistemas presenciais e não presenciais, a partir da ampliação do conceito de EAD e do incentivo à multiplicação de suas iniciativas.


2. Construindo um conceito de EAD


O ensino a distância iniciou-se no período de 1830 a 1840 com os cursos por correspondência. Era uma espécie de ensino alternativo em que não se exigia constante contato entre professores e alunos, professores e instituições.


Com o tempo, tais cursos foram se multiplicando através dos estabelecimentos privados até atingirem seu estágio atual. Como demonstra Rodrigues (2000, p. 155), o uso crescente da EAD se deu em razão da expansão e do barateamento das tecnologias de comunicação e informação, pois “existem várias possibilidades de mídias, estratégias pedagógicas, tipos de cursos e instituições de EAD”.


Já na metade da década de 1980, esses programas de formação à distância funcionavam em mais de quarenta países em desenvolvimento, sendo voltados, principalmente, para a formação profissional.


Como demonstra Rumble (2003), apesar de grande parte da literatura sobre EAD enfatizar o uso dos meios de comunicação mais modernos que começaram a aparecer a partir da década de 1950, ainda há a preponderância do uso do material impresso, da tutoria por correspondência e dos audiovisuais, em razão do seu baixo custo, da facilidade de produção, distribuição, utilização e acesso aos estudantes.


A compreensão atual de EAD pode ser tida através das palavras de Rumble (2003, p. 16):


“Teoricamente, o ensino a distância é um método que separa fisicamente o estudante do professor. Ainda que os professores possam entrar em contato direto com seus alunos, por telefone, áudio e videoconferências, a separação física entre aluno e professor implica a utilização de certos meios para ensinar. Embora certos recursos permitam visualizar os estudantes (videoconferência) ou falar-lhes a distância (audioconferências, ensino por telefone), a maioria dos instrumentos de comunicação utilizados não permitem o diálogo entre professor e aluno (no caso de materiais impressos, áudio, videocassetes, ensino por computador etc.)”.


Rodrigues também destaca a questão da separação física entre professores e alunos para caracterizar a EAD.


“Uma das características mais marcantes da educação a distância é, obviamente, a separação física entre o professor e os alunos durante a maior parte do tempo. Para haver comunicação, é necessário o uso do meio de comunicação, da mídia utilizada no curso material-impresso, áudio, vídeo, teleconferência, videoconferência, internet, softwares, CD-ROM, etc., que atua como um filtro na comunicação, diferenciando-a da presencial.” (RODRIGUES, 2000, p. 160).


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A EAD pode usar, para mediação, diversos meios de comunicação, como: material impresso, correspondência, rádio, televisão, teletextos, videotextos, vídeo e audiocassetes, videodiscos, telefone, teleconferências, videoconferências, material didático, computadores, correio eletrônico e conferências. Além da hipermídia, que são sistemas de tutoria por televisão associada à rede telefônica que permite os alunos dirigirem suas perguntas diretamente aos professores. O material impresso também pode ser substituído por um transmitido pela internet ou enviado por CD.


A forma de difusão do ensino escolhida afeta, diretamente, a maneira como o aluno utiliza o curso, principalmente se for ou não destinado ao uso domiciliar. Conforme demonstra Rumble (2003), diversas experiências já comprovaram a possibilidade de se aprender com qualquer tipo de meio de difusão. De forma geral, os mesmo elementos que influenciam a aprendizagem do aluno submetido a um ensino que utiliza os recursos a distância são invariáveis. A aprendizagem


“[…] depende da precisão e clareza dos conteúdos, das capacidades individuais, da motivação para aprender, da atenção, do interesse pelo assunto, do respeito e afeição dedicados ao professor, pela ênfase conferida aos pontos principais da aprendizagem e da sua repetição, da revisão do curso pelos alunos” (SCRAMM apud Rumble, 2003, p. 32).


De acordo com Rodrigues (2000), os cursos de EAD podem ser classificados nas seguintes modalidades:


a) CLASSE DISTRIBUÍDA – o uso de tecnologias da comunicação interativas permite expandir cursos baseados em sala de aula para outras localidades. Os professores e a instituição controlam o ritmo e o lugar;


b) APRENDIZADO INDEPENDENTE – Este modelo não requer que o aluno esteja em determinado lugar em horário previamente estabelecido. Recebe material para estudo individual e acompanhamento de um responsável indicado pela instituição;


c) APRENDIZADO INDEPENDENTE + SALA DE AULA – Esta alternativa utiliza material impresso e outras mídias para que o aluno possa estudar no seu próprio ritmo, consorciado com encontros presenciais ou usando mídias interativas com o professor e colegas.


A classe distributiva, como será melhor explanado no próximo capítulo, é o que a Universidade do Estado do Amazonas denomina de Ensino Presencial Mediado. O aprendizado independente seria a EAD propriamente dita, ou seja, a classificação mais comum e mais conhecida da população em geral. Já o aprendizado independente + sala de aula é o que alguns doutrinadores chamam de ensino semi-presencial, em que se mistura a auto-aprendizagem, ensino presencial e EAD, havendo a prevalência desta última. Não se pode considerar a UEA um exemplo de semi-presencial, pois o aluno não dita o seu próprio ritmo, havendo aulas em horários e locais determinados.


Tomando por base a antiga definição de EAD preceituada pelo Dec. n° 2.494/98, tinha-se, claramente, como EAD apenas o aprendizado independente e o aprendizado independente + sala de aula.


“Art. 1º Educação a distância é uma forma de ensino que possibilita a auto-aprendizagem, com a mediação de recursos didáticos sistematicamente organizados, apresentados em diferentes suportes de informação, utilizados isoladamente ou combinados, e veiculados pelos diversos meios de comunicação.”


O uso da expressão “auto-aprendizagem” gerava dúvidas sobre classificação da classe distribuída como uma forma de EAD. Contudo, a doutrina existente, como demonstrado por Rodrigues (2000), já se posicionava afirmativamente sobre o assunto.


Citando Mason, a referida autora apresenta também a classificação dos modelos de cursos segundo a possibilidade de interferência do aluno (RODRIGUES, 2000):


a) CONTEÚDO + SUPORTE – A base é a separação entre a equipe que planeja e produz o curso e as equipes que interagem com os alunos. Mesmo que os alunos possam direcionar as atividades e discussões para questões que são de seu interesse pessoal e/ou profissional. A estrutura básica do curso, normalmente produzido em larga escala, deve ser seguida pelo aluno. A possibilidade de contextualização se dá essencialmente através de interação com os professores assistentes ou tutores. Em relação ao curso como um todo, o tempo dos alunos em discussões on-line não representa mais do que 20% do total de dedicação.


b) WRAP ROUND – Esta categoria consiste em criar uma parte do curso (guia de estudo, atividades, discussões) que é construída sobre uma base de materiais já existentes (livros, CD-ROMs, tutoriais). Este modelo tende a incentivar que os alunos façam mais pesquisas, gerando mais liberdade e responsabilidade. O papel do professor ou tutor é mais intenso, porque uma parcela menor do curso é pré-determinada, de modo que ajustes são feitos a cada vez que o curso é implementado. Atividades síncronas, trabalhos em grupo e a incorporação de novas referências é possível neste modelo. O tempo dedicado a discussões, em relação ao total do curso, gira em torno de 50%.


c) INTEGRADO – Este modelo é o oposto ao primeiro. A base do curso são atividades colaborativas, pesquisa intensiva e projetos em pequenos grupos. O conteúdo é fluido e dinâmico e determinado, em grande parte, pelas atividades individuais ou do grupo. De certa forma, desaparece a distinção entre conteúdo e suporte.


Tal classificação demonstra-se confusa e incapaz de abrager todas as variações possíveis de EAD. A possibilidade de interferência do aluno irá variar em qualquer forma e modalidade de ensino, sendo apenas seu reflexo. Não é uma característica em si, mas resultado, principalmente, da metodologia e da forma de ensino adotada pela instituição.


A primeira classificação apresentada, a das modalidades de EAD, é a que realmente se demonstra necessária para melhor compreensão conceitual da Educação a Distância e, consequentemente, condiz com os objetivos deste trabalho. Por essa razão, a classificação em modelos de cursos segundo a possibilidade de interferência do aluno não será utilizada no estudo de caso da UEA.


3. Estudo de caso: projeto de formação de professores para o ensino fundamental (PROFORMAR) da universidade do estado do amazonas (UEA)


3.1. Peculiaridades da educação no Amazonas


A região amazônica possui como meio de transporte primordial os rios, sendo baixo o número de cidades acessíveis por estrada. O avião é um meio de transporte caro e escasso na região. Alguns vôos só são oferecidos uma vez por semana. Até os barcos, meio mais difundido de transporte na região, não oferecem serviços contínuos.


Na maior parte dos municípios, a população distribui-se proporcionalmente entre as áreas urbana e rural. Os poucos serviços disponíveis encontram-se nas sedes, sendo tudo infinitamente mais escasso e difícil nas áreas rurais. 


Essas peculiaridades da geografia local geram o isolamento de determinados municípios e barreiras ao desenvolvimento sócio-econômico que são proporcionais à dificuldade de acesso. Há anos, tenta-se interiorizar o ensino, principalmente o superior, mas o deslocamento dos professores da capital sempre foi um problema.


Por outro lado, são raros os profissionais dispostos a residir nos municípios distantes, devido às poucas opções de lazer, estudo e trabalho. Esse é um problema enfrentado por todos os poderes do Estado. Mesmo com vantagens econômicas, são comuns vagas não preenchidas em órgãos do Judiciário, Executivo e Legislativo. Em contrapartida, a população local, normalmente, não é qualificada o suficiente para ocupar tais postos.


Nesse ínterim, o curso de Formação de Professores da UEA (Proformar) pode ser o primeiro passo para a efetiva interiorização do ensino superior, com seu oferecimento através da forma de Ensino Presencial Mediado. A ênfase deste projeto está na inovação trazida pelo Proformar, em seguida, pelo curso de Ciência Política, e nas possibilidades por eles sugeridas.


A Universidade Federal do Amazonas (UFAM), pioneira na interiorização do ensino no Estado, há anos leva seus cursos às cidades do interior. Ela faz isso através do Programa Especial de Formação de Docentes (PEFDS) ou da tradicional oferta de cursos de graduação pela interiorização. Porém, os campi ficam fechados grande parte dos semestres, funcionando apenas nas férias das aulas na capital, quando os professores se deslocam para ministrarem um curso completo em cerca de uma semana.


Essas propostas de ensino presencial contínuo, com professores da capital ou da própria cidade, são irregulares, caras e sujeitas a inúmeros empecilhos, como clima, secas, oferta de barcos, estado dos aeroportos e chuvas, por exemplo. Permanece a necessidade de se instaurar uma forma que atinja mais municípios e alunos, sem tantos custos e tanta dependência de fatores climáticos ou mercadológicos.


Dessa forma, pode-se observar que o Ensino Presencial Mediado da UEA possui dois méritos principais. O primeiro é o de ter alcançado simultaneamente todos os municípios do Estado, permitindo que diferentes cidades recebessem uma mesma aula. O segundo foi o de ter tido uma iniciativa pioneira ao usar as novas tecnologias da comunicação no ensino superior, principalmente, no interior do Estado.


A importância do Proformar já foi reconhecida até pela UNESCO e programa semelhante deverá ser implantado em paises asiáticos e africanos com características geográficas similares as do Amazonas. Assim, tem-se que o estudo do Ensino Presencial Mediado é de primordial importância, uma vez que foi uma alternativa transformadora para as práticas pedagógicas no Estado.


3.2. Projeto de formação de professores para o ensino fundamental (PROFORMAR)


A nova Lei de Diretrizes e Bases (art. 87, §3°, III e §4°) instituiu a “Década da Educação” em sintonia com a “Declaração Mundial sobre a Educação para Todos”, estabelecendo o prazo até 2007, para que a totalidade dos professores da educação infantil adquira graduação superior.


Para que as metas fixadas pela LDB pudessem ser alcançadas, o Governo Federal liberou verba, através do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e da Valorização do Magistério (FUNDEF) para a formação de professores da educação infantil da rede pública em curso superior denominado Normal Superior. A verba do FUNDEF foi repassada às Secretárias de Educação de cada Estado que, por sua vez, celebraram convênios com universidades e prefeituras locais para o desenvolvimento do programa.


No Amazonas, a Secretária de Estado da Educação e da Qualidade de Ensino (SEDUC) fez um convênio com a Universidade do Estado do Amazonas (UEA) em 2001, dando origem ao Projeto de Formação de Professores para o Ensino Fundamental (Proformar). Esse convênio visa atender a totalidade dos sessenta e dois municípios do Estado, inclusive a capital.


O Proformar é definido pela UEA como um projeto de ensino presencial mediado com aulas ao vivo e transmitidas simultaneamente para todos os municípios. Os alunos podem se comunicar com os professores no estúdio através de e-mail, fax ou do telefone (call center).


Todas as aulas são gravadas e ficam disponíveis na biblioteca montada em cada município. Caso algum aluno queira rever a aula ou tenha havido algum problema técnico na hora da exibição, é possível assisti-la novamente, em outro horário. A cada nova disciplina, os cinco livros sugeridos pelos professores titulares são disponibilizados em número condizente com a quantidade de alunos da localidade.


A universidade também distribui gratuitamente um material didático (manuais) especialmente produzido pelos próprios professores titulares para servir de suporte às aulas. O projeto da UEA é organizá-lo e editá-lo como livros, disponibilizando-o nas livrarias do Amazonas, facilitando seu acesso ao público em geral.


Como forma de avaliação, são aplicadas provas objetivas e dissertativas elaboradas pelos professores titulares com supervisão dos professores assistentes locais. As avaliações são enviadas à capital por malote e distribuídas entre os docentes da disciplina (de três a cinco professores), para correção e, posteriormente, elas são reenviadas as respectivas cidades.


Os alunos são professores do ensino fundamental da rede pública que são inscritos ex-oficio no vestibular para o curso Normal Superior. Os selecionados são matriculados e passam a freqüentar as aulas no período de férias escolares de seus alunos. Os não aprovados são inscritos novamente na seleção seguinte. É terminantemente proibida a participação de outras pessoas no curso. A cada vestibular, a SEDUC envia ao FUNDEF a relação com o nome de todos os professores e o Governo Federal “paga” por aluno em sala de aula.


Para desenvolvimento inicial do projeto, contou-se com uma equipe pedagógica de cento e dezenove professores titulares, que dão aula no estúdio, trezentos e trinta professores assistentes, que auxiliam os trabalhos nas salas de aula, e com pessoal de apoio (cento e setenta e um profissionais de diversas áreas). Também foi montado um estúdio de televisão, ilhas de edição e uma central de atendimento.


Para possibilitar a transmissão, foram inicialmente instaladas sessenta e uma antenas parabólicas e sessenta e um geradores de energia, um para cada município, com exceção da capital. Equipou-se também cada uma das cento e cinqüenta e oito salas de aula com televisores de 38”, vídeos-cassete, computadores ligados em rede e à Internet, com impressora e aparelhos de fone/fax.


A primeira versão do Proformar durou de 2002 até 2004, com a formação da primeira turma. Nessa oportunidade, de acordo com a referida universidade, foram graduados 7.300 professores da rede Municipal e Estadual de Educação, os quais eram responsáveis por atender cerca de 400 mil alunos. A segunda versão teve seu inicio em junho de 2005. O único município a não renovar o convênio foi Lábrea, pois todos seus professores já haviam sido alcançados pelo projeto anterior.


Como já mencionado, o Proformar foi reconhecido pelas Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) em novembro de 2004. Na oportunidade, foram apresentados seu formato e modelo, que deverão ser implantados em paises asiáticos e africanos com características de distância geográfica similares às do Amazonas. Em 2005, foi assinado um convênio entre a UEA e a UNESCO, concretizando a parceria.


Assim, tem-se que o Proformar conseguiu alcançar simultaneamente todos os municípios existentes no 1,5 milhão de km² ocupados pelo Estado do Amazonas, superando um dos principais problemas da região: a dificuldade de acesso a determinadas áreas.


3.3. Analisando o ensino presencial mediado


A Universidade justifica a classificação do Ensino Presencial Mediado como uma nova espécie de Ensino Presencial através da seguinte argumentação:


“[…] Há, no entanto, uma grande diferença entre o modelo de educação a distância e o modelo desenvolvido pela UEA: Sistema  Presencial Mediado pela Tecnologia. Nesse sistema, os alunos, em salas de aula multimídias, localizadas no interior, recebem a mesma informação, em tempo real, com a potencialização e integração dos diferentes meios e linguagens tais como o computador, a TV, o vídeo, o material impresso e o telefone. Os recursos tecnológicos, o pessoal envolvido e os procedimentos utilizados no sistema contribuem para a formação de um ambiente que recria as características da aula presencial, favoráveis ao desenvolvimento dos processos de aprendizagem”.  (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS, 2006, p. 9).


Dessa forma, podem-se resumir os argumentos da Universidade nos seguintes tópicos: os alunos se encontram em horários determinados para assistirem as aulas em conjunto, ou seja, não é um estudo independente (I); a aula é transmitida em tempo real – ao vivo (II); recriam-se as características de uma aula presencial – a mediação torna-se um simples detalhe (III); a televisão (tecnologia da comunicação utilizada) é vista como um recurso e não como um meio em si (IV).


A Universidade (UEA, 2006) criou até um quadro explicativo para melhor apresentar tais diferenças:


 


 8115A(1)


 


Frente a tais argumentos, analisar-se-á um a um.


3.3.1 “Presença do Professor e do aluno no mesmo local” e “Realização das atividades didáticas”


O argumento aqui utilizado é a questão espacial. Primeiramente, o professor pode estar ou não presente em sala de aula, não existe a classificação legislativa de presença virtual. A presença pressupõe uma presença física. Como determina o art. 1° do Dec, n° 5.622/05, a EAD se caracteriza “[…] com estudantes e professores desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos”.


No caso do Ensino Presencial Mediado, tem-se o desenvolvimento de atividades em lugares diversos. O professor que ministra a aula é o professor titular que se encontra em um estúdio de televisão e unicamente lá. Não se pode dizer que professor e alunos estão virtualmente presentes em um mesmo lugar.


Também não se pode contar com a presença do professor assistente, pois ele não é o responsável pela aula, não possuindo sequer, na grande parte das vezes, a mesma formação da disciplina oferecida. Se o professor assistente fosse o verdadeiro responsável pela aula, não haveria necessidade de um titular. Na verdade, ele funciona como uma espécie de tutor, apenas auxiliando os alunos no desenvolvimento de suas atividades, assim como ocorre na EAD.


Logo, a separação espacial é inquestionável, não podendo ser convertida em um mero detalhe, como assim o quer a Universidade. Para visualizar tal situação de maneira mais concreta, basta supor que o estúdio onde são gravadas as aulas não se localize na cidade de Manaus, mas sim num país estrangeiro.


3.3.2 “Apresentação das aulas” e “Relação de Tempo entre a realização da aula e a presença do aluno”


Novamente, a Universidade apresenta um mesmo argumento em dois tópicos: o fato de as aulas serem transmitidas ao vivo. Primeiramente, há um grave equivoco por parte da Universidade ao estabelecer que a EAD só pode ser feita “através de gravação em meio eletrônico ou de material impresso”.


O fato de as aulas da UEA serem transmitidas ao vivo não descaracteriza o curso como uma forma de EAD, uma vez que o próprio art. 1° do Dec. n° 5.622/05 fala da necessidade de se desenvolver atividades educativas entre professores e alunos em tempo ou lugares diversos. Não se fala em tempo e lugares diversos. Logo, a questão da sincronia é irrelevante.


3.3.3 Avaliação


Na EAD, a avaliação não se dá de forma livre, como equivocadamente é argumentado pela UEA. O próprio Decreto que regulamente a EAD (Dec. n° 5.622/05) prevê a realização de avaliações presenciais:


“Art. 1°  […]


§ 1o  A educação a distância organiza-se segundo metodologia, gestão e avaliação peculiares, para as quais deverá estar prevista a obrigatoriedade de momentos presenciais para:


I – avaliações de estudantes; (destaque da autora)


Art. 4°  A avaliação do desempenho do estudante para fins de promoção, conclusão de estudos e obtenção de diplomas ou certificados dar-se-á no processo, mediante: […]


II – realização de exames presenciais.


§ 1o  Os exames citados no inciso II serão elaborados pela própria instituição de ensino credenciada, segundo procedimentos e critérios definidos no projeto pedagógico do curso ou programa.


§ 2o  Os resultados dos exames citados no inciso II deverão prevalecer sobre os demais resultados obtidos em quaisquer outras formas de avaliação a distância.” (destaque da autora)


Logo, a questão dá avaliação não pode ser utilizada como um elemento diferenciador entre o Ensino Presencial Mediado e a EAD.


Não se pode confundir EAD com auto-aprendizagem. O fato de os alunos se encontrarem em sala de aula, com horário e lugar predeterminado não exclui a possibilidade de EAD. A legislação, conforme já explicitado em capítulo anterior, não faz nenhuma menção à necessidade de os alunos estarem em lugares diversos entre si. Só a uma única exigência – a separação espacial ou temporal entre professores e alunos. Dessa forma, tal característica não se constitui em um argumento pró-ensino presencial.


3.3.4 “Orientação dos alunos”


Como a própria Universidade admite a orientação se dá a distância pelo professores titulares e presencialmente através dos tutores (professores assistentes), ou seja, dá mesma maneira que ocorre na EAD. Contudo, a Universidade enfrenta um grande problema com seus cursos presenciais mediados, uma vez que os professores assistentes não possuem a mesma formação que seus alunos. Assim, um professor licenciado em Física, por exemplo, pode ser o tutor de uma turma de Ciência Política.


3.3.5 “Interatividade”


Como demonstra Marco Silva (2007), interatividade é um adjetivo que qualifica “[…] qualquer coisa qualquer coisa ou sistema cujo funcionamento permite ao seu usuário algum nível de participação ou de suposta participação”. No caso da UEA, os alunos interagem com os professores titulares através da mediatização tecnológica, como através de call center, e-mail ou fax, mecanismos esses também utilizados pelos cursos de EAD.


A classificação da interatividade da EAD como restrita a poucos momentos não possui fundamento algum, pois desde as suas origens, com os cursos por correspondência, a interatividade é existente. Com o avanço das tecnologias da comunicação, ela ganhou força e velocidade, havendo cursos pela internet com atendimento on-line disponível o dia inteiro.


3.3.6 Freqüência às aulas e demais atividades


A exigência de freqüência às aulas é sim uma característica do Ensino Presencial inexistente na EAD, conforme estabelece a lei maior do ensino no Brasil – Lei de diretrizes e Bases da Educação (LDB), através do §3º do art. 47: “É obrigatória a freqüência de alunos e professores, salvo nos programas de educação a distância.”


Em consonância com o argumento defendido no presente trabalho de que o Ensino Presencial Mediado é uma espécie de EAD, tem-se que a exigência de presença dos alunos às aulas, pela Universidade, é uma distorção da EAD. Ou seja, não serve como característica para diferenciar o Ensino Presencial Mediado da EAD.


Apesar de transmitidas ao vivo, todas as aulas são gravadas e ficam disponíveis em cada biblioteca da UEA em que se dão os cursos, para empréstimo exclusivo aos alunos do curso presencial mediado, não sendo possível nem seu acesso pelos alunos do ensino regular da UEA. Ou seja, o aluno pode assisti-las em qualquer outro horário. Logo, não há razão para a cobrança de freqüência às aulas.


Vale ainda destacar que é no momento da transmissão das aulas que os professores titulares estão disponíveis para interagirem com os alunos através dos mecanismos já apresentados. Mas na impede um posterior contato via e-mail, por exemplo. É no horário da transmissão que a Universidade disponibiliza os professores, da mesma maneira como toda instituição de EAD estabelece uma forma e horário de tal contato se realizar.


Assim, tem-se que a UEA montou toda uma estrutura capaz de garantir o acesso do aluno às aulas, mesmo que ele não possa assisti-la em tempo real, juntamente com seus demais colegas. Isso é uma clara característica da EAD!


3.4 reclassificando o ensino presencial mediado


A mediação através do uso de tecnologias da comunicação é uma característica fundamental do denominado Ensino Presencial Mediado. Se a tecnologia utilizada para mediatizar fosse o rádio no lugar da televisão, mantendo-se as demais características do curso, não se cogitaria a classificação em Ensino Presencial. A mediação requer linguagem, metodologia e recursos próprios. Dizer que o Ensino Presencial Mediado é uma espécie de Ensino Presencial significa transformar o elemento mediatizador (a televisão) em um mero recurso áudio-visual.


Observando de forma sistêmica a atual legislação sobre EAD, analisando seus termos conceituais apresentados ao longo deste trabalho e com base na argumentação feita no tópico anterior, tem-se que o Ensino Presencial Mediado é uma forma de Educação a Distância, estando na categoria de classe distribuída. Ou seja, contrariando o entendimento da própria UEA, o denominado Ensino Presencial Mediado não é uma nova espécie de Ensino Presencial, mas sim de EAD. 


Assim, tem-se que a terminologia Ensino Presencial Mediado nada mais indica do que a Educação a Distância sob sua forma de classe distribuída, em que o traço marcante do curso é o controle pela instituição e pelos professores, afastando-se do modelo clássico de EAD, em que o contato com outros alunos e a instituição é mínimo.


Vale destacar que os cursos Proformar surgiu em 2001, ainda sob a vigência do Dec. n° 2.494/98, ou seja, quando a EAD era definida como:


“Art. 1º Educação a distância é uma forma de ensino que possibilita a auto-aprendizagem, com a mediação de recursos didáticos sistematicamente organizados, apresentados em diferentes suportes de informação, utilizados isoladamente ou combinados, e veiculados pelos diversos meios de comunicação.”


Tal definição pode ter corroborado para a compreensão de que o Ensino Presencial Mediado seria uma nova forma de Ensino Presencial. Contudo, com a revogação do referido texto pelo Dec. 5.622/05, houve um esclarecimento conceitual do que seja a EAD, deixando explícito o fato de que o Ensino Presencial Mediado é uma espécie de EAD.


Tal mudança de nomenclatura não é meramente ornamental, implicando em importantes conseqüências jurídicas. A inclusão dos cursos da UEA como formas de EAD, faz com que os mesmos deixem de se submeter a legislação do Ensino Presencial, para entrar na seara da EAD.


O Dec. n° 5.622/05, regulador da EAD, possui um capítulo exclusivo sobre o credenciamento de instituições para a oferta de cursos e programas a distância, uma vez que as instituições devem ser, especificamente, credenciadas para oferecer cursos por EAD. O Ministério da Educação possui, inclusive, um setor próprio para cuidar do assunto – Secretaria de Educação a Distância.


O referido Decreto também estabelece os níveis e as modalidades que poderão ser ofertadas através da EAD:


“Art. 2o  A educação a distância poderá ser ofertada nos seguintes níveis e modalidades educacionais:


I – educação básica, nos termos do art. 30 deste Decreto;


II – educação de jovens e adultos, nos termos do art. 37 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996;


III – educação especial, respeitadas as especificidades legais pertinentes;


IV – educação profissional, abrangendo os seguintes cursos e programas:


a) técnicos, de nível médio; e


b) tecnológicos, de nível superior;


V – educação superior, abrangendo os seguintes cursos e programas:


a) seqüenciais;


b) de graduação;


c) de especialização;


d) de mestrado; e


e) de doutorado.”


No caso específico da UEA, a grande implicação se dará na exigência de assiduidade dos alunos. Os artigos da Resolução n° 012/2006 – CONSUNIV, que dispõe sobre a verificação do rendimento escolar em cursos desenvolvidos através de programas especiais pela UEA, que exigem um índice de assiduidade dos alunos de setenta e cinco por cento (75%) para sua aprovação e para poder, inclusive, fazer a prova final são ilegais, pois contrariam o art. 80 da LDB – norma esta que lhe é hierarquicamente superior. Em suma, a UEA não pode exigir assiduidade de seus alunos do Ensino Presencial Mediado, por ser tal exigência um ato ilegal.


No entanto, a Universidade pode reservar-se o direito de disponibilizar os professores titulares para interação mediada em tempo real com os alunos apenas durante os horários de transmissão (ao vivo) das aulas. Assim, como a disponibilização dos tutores pode continuar restrita a determinados horários e formas.


A exigência da presença dos alunos na realização das avaliações e de qualquer outra atividade, por outro lado, é respaldada pela legislação federal, devendo essas serem previamente marcadas pela Universidade.


Conclusão


A importância da Educação a Distância e o seu crescimento nos últimos anos são fatores inquestionáveis. Também inegável é o trabalho desenvolvido pela Universidade do Estado do Amazonas que, com pioneirismo, conseguiu alcançar simultaneamente todos os municípios do Estado do Amazonas, ultrapassando barreiras geográficas antes supostas insuperáveis.


Infelizmente, o estudo dessa forma de ensino ainda se demonstra escasso na literatura nacional e, até mesmo na internacional. A EAD precisa ser vista de forma sistêmica e multidisciplinar e muitos de seus aspectos devem ser estudados e regulamentados.


A divergência quanto à classificação dos cursos da UEA e a criação de um novo termo para denominar algo já existente é apenas o reflexo de um conceito pouco esclarecedor e incapaz de explicar o que realmente fosse a EAD. Conceito este preceituado pelo revogado Dec. n° 2.494/98, ainda em vigor a época da criação do curso Proformar.


Contudo, com o Dec. n° 5.622/05, que revogou o Dec. n° 2.494/98, e a conseqüente reformulação conceitual da EAD, ficou evidente que o Ensino Presencial Mediado da UEA nada mais é do que a EAD na sua forma de classe distribuída.


Apesar de sua finalidade inovadora, a metodologia utilizada pela UEA não é exclusiva a ela. A Universidade utiliza as tecnologias da comunicação, em especial a televisão, da mesma forma que inúmeras outras instituições. Na atualidade, principalmente, no mundo jurídico, existem diversos cursos que utilizam a mesma sistemática da UEA, cursos esses que também poderiam receber a nomenclatura de Ensino Presencial Mediado.


Tal mudança de classificação implica em diversas conseqüências de ordem prática, como foi demonstrado no último capítulo do presente trabalho. A principal modificação diz respeito à cobrança da assiduidade dos alunos feita pela UEA. Mesmo estando respaldada em Resolução do Conselho Universitário da UEA, é uma exigência ilegal frente ao preceituado pela Lei de Diretrizes e Bases.


Assim, tem-se que o presente trabalho procurou analisar o tema de forma inovadora, englobando diferentes áreas do conhecimento em busca de uma melhor compreensão da legislação sobre EAD. O estudo de caso teve o intuito de demonstrar a problemática conceitual existente e analisar a realidade regional através de um exemplo concreto, concluindo-se que o Ensino Presencial Mediado seria uma espécie de sinônimo para a classe distribuída da EAD, ao menos enquanto permanecer a legislação vigente.


 


Referências bibliográficas:

AMAZONAS. Resolução n° 012/2006 – CONUNIV, de 13 de fevereiro de 2007. Dispõe sobre a verificação do rendimento escolar em cursos desenvolvidos através de programas especiais.

RODRIGUES, Rosângela Schwarz. Modelos de educação a distância. In: PRETI, Oreste (org.). Educação a distância: construindo significados. Cuiabá: NEAD/IE – UFMT; Brasília: Plano, 2000.

RUMBLE, Greville. A gestão dos sistemas de ensino a distância. Brasília: Editora Universidade de Brasília: Unesco, 2003.

SILVA, Marco. O que é interatividade. Disponível em: http://www.senac.br/informativo/BTS/242/boltec242d.htm. Acessado em 24 de junho de 2007.

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS. Apresentação oficial do curso Ciência Política. Manaus: UEA, 2006.

______. Quadro comparativo entre as atividades desenvolvidas nas modalidades de ensino: presencial – a distância – presencial mediado. Manaus: UEA, 2006.

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS/Proformar. Didática II. Manaus: 2006.


Informações Sobre os Autores

Serguei Aily Franco de Camargo

Assessor Jurídico do Ministério Público de Roraima. Professor Titular da Coordenação da Direito da Faculdade Estácio Atual de Roraima. Professor do Curso de Direito da Faculdade Cathedral de Boa Vista. Mestre e Doutor em Ciências Ambientais (cursos estrito senso interdisciplinares) pela Universidade Estadual Paulista (UNESP) e Pós-Doutor em Ecologia Aplicada pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e em Direito Ambiental pela UNESP

Thaisa Rodrigues Lustosa de Camargo

Advogada e doutoranda em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia da Universidade Federal do Amazonas


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