Aspectos polêmicos da ação monitória na processualística civil brasileira

Resumo: A ação monitória foi introduzida pela Lei 9.079/95, sendo de origem italiana e disciplinada nos artigos 1.102a a 1.102c, do Código de Processo Civil, podendo ser conceituada como o procedimento especial de jurisdição contenciosa, de natureza cognitiva, que tem por finalidade a formação de um título executivo judicial a favor de quem tiver prova escrita, na qual conste obrigação de pagar soma em dinheiro, entregar coisa fungível ou determinado bem móvel, não podendo ser proposta quando se tratar de obrigação de fazer ou não fazer, sendo vários seus aspectos polêmicos: como o seu cabimento contra a Fazenda Pública; utilização de reconvenção; intervenção de terceiros; litisconsórcio; forma de citação a ser realizada ao réu; e, também no que se refere à aplicação do instituto jurídico da antecipação dos efeitos da tutela na ação supra.


Palavras-chave: ação monitória, procedimento, aspectos polêmicos.


Sumário: Introdução. Aspectos gerais da ação monitória. Aspectos polêmicos do procedimento monitório. Considerações finais. Referências bibliográficas


1 INTRODUÇÃO


A ação monitória, instituto jurídico de origem italiana, surgiu com o intuito de facilitar a função social do processo, proporcionando ao autor a opção por um procedimento de maior celeridade na prestação jurisdicional, procurando evitar, dessa forma, as delongas causadas pelo procedimento ordinário, que acarreta a chamada crise ou falência do sistema judicial e processual civil brasileiro, bem como, não retirando do réu o contraditório pleno, exercido por intermédio da interposição dos embargos do devedor.


Dessa forma, o estudo dessa espécie de ação para os Bacharéis em Direito é de suma importância, pois se trata de um procedimento cheio de particularidades e divergências doutrinárias que são cobradas tanto para os magistrados no exercício função de julgador, quanto para os advogados e procuradores que militam com o direito civil e comercial, bem como para os que pretendem lograr êxito na aprovação em concurso público, pois o tema, objeto deste singelo trabalho, é rotineiramente cobrado nas provas objetivas, subjetivas e orais pelos examinadores, que dão uma enorme valoração à ação monitória.


2 ASPECTOS GERAIS DA AÇÃO MONITÓRIA


A ação monitória foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei 9.079, de 14 de julho de 1995, sendo um instituto de origem italiana. Encontra-se atualmente disciplinada nos artigos 1.102a a 1.102c, do Código de Processo Civil Brasileiro.


Há autores como Nunes (2001) que rechaçam o termo “ação monitória”, afirmando não se tratar de ação e sim de procedimento monitório, pois a ação é o direito público de invocar a tutela jurisdicional qualquer que seja a pretensão manifestada pela parte.


Já o conceito de ação monitória encontra-se esculpido no artigo 1.102a do Código de Processo Civil. Dessa forma, podemos defini-la como o procedimento especial de jurisdição contenciosa, de natureza cognitiva, que tem por finalidade a formação de título executivo judicial a favor de quem tiver prova escrita, na qual conste obrigação de pagar soma em dinheiro, entregar coisa fungível ou determinado bem móvel.


Corroborando com o conceito, preceitua Alvim (2001 p.150):


“o procedimento monitório (ou injuncional) como tipo de ‘cognição sumária’, caracterizado pelo propósito de conseguir o mais rapidamente possível o título executivo e, com isso, o início da execução forçada. A sumariedade da cognição constitui o instrumento estrutural por meio do qual a lei busca esse desiderato, naqueles casos em que é provável a existência do direito, seja pela natureza e objeto do mesmo, seja pela particular atendibilidade da prova que serve de fundamento dele.”


O objetivo básico do procedimento monitório consiste em abreviar o caminho para a execução, deixando ao devedor a iniciativa do eventual contraditório, por intermédio do uso dos embargos previstos no artigo 1.102c, do Código de Processo Civil.


Diferentemente do que ocorre no procedimento ordinário, em que o direito pode ser tutelado com base em começo de prova por escrito ou mesmo em prova exclusivamente testemunhal, no procedimento monitório exige-se a prova escrita, conforme a dicção do artigo 1.102a, do Código de Processo Civil.


Para Santos (1996, p.41), “não é qualquer forma escrita que faz o título hábil para o pedido monitório, pois nela haverá de conter obrigação certa, líquida e exigível”.


Um exemplo de título que pode dar ensejo ao procedimento monitório é o contrato sem requisito de título executivo, pois, se cabe execução, torna-se dispensável a ação monitória para a satisfação do direito a ser perseguido. Citam-se, como outros exemplos, os títulos executivos prescritos, as declarações unilaterais de vontade, o contrato bancário de empréstimo eletrônico ou outros documentos que revelem obrigação líquida, certa e exigível.


A ação monitória é que dará ensejo à constituição do título executivo contra o devedor. No entanto, a constituição do título executivo não se dá com a mera interposição da ação e sim em face da inércia do devedor ao não opor os embargos monitórios ou, ainda, quando o magistrado os rejeitam.


Outro fator determinante a ser observado é que a ação monitória não poderá ser proposta quando se tratar de obrigação de fazer e não fazer, pois o artigo 1.102a se refere à soma em dinheiro, à coisa fungível ou a determinado bem móvel.


Por intermédio do procedimento monitório busca-se a rápida formação do título executivo, ou seja, apresenta-se como uma espécie de atalho para o processo de execução, naqueles casos em que, cumulativamente, há a concreta e marcante possibilidade de existência do crédito, quando o devedor não apresenta um contra-ataque ou questionamento do débito através da interposição dos embargos monitórios.


Conforme prevê a regra geral para propositura das ações, a petição inicial deverá obedecer ao disposto nos artigos 282 e 283 do Código de Processo Civil, acompanhada do documento necessário à propositura da ação, qual seja, do título sem a característica de ser auto-exeqüível, contendo obrigação certa, líquida e exigível.


Em seguida, conforme a regra do artigo 1.102b, estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá de plano a expedição do mandado de pagamento ou de entrega de coisa no prazo de quinze dias. Essa ordem do juiz também é conhecida na doutrina como mandado monitório, mandado injuntivo, ou, ainda, mandado de injunção.


Ocorrendo a citação do réu, ele poderá utilizar-se de três possibilidades lógicas e jurídicas esposadas no artigo 1.102c e seus parágrafos. A primeira seria manter-se inerte, tendo como conseqüência a conversão do mandado monitório em executivo e prosseguindo-se a execução. A segunda possibilidade seria o devedor cumprir o mandado injuntivo, satisfazendo a obrigação constante do título dentro do prazo legal, tendo por conseqüência a isenção do réu às custas e honorários advocatícios. Já a terceira hipótese seria a oposição dos embargos pelo devedor, acarretando a suspensão da eficácia do mandado impedindo a formação do título executivo com a desconstituição da dívida.


É discutível a natureza jurídica dos embargos ao mandado monitório. Para uma corrente trata-se de uma ação própria e, para a outra, seria uma espécie de contestação.


Ressalta-se que, ao contrário dos embargos à execução, a interposição dos embargos monitórios independe de segurança do juízo e são processados em autos próprios da ação, pelo procedimento ordinário.


3 ASPECTOS POLÊMICOS DO PROCEDIMENTO MONITÓRIO


O primeiro aspecto polêmico a ser evidenciado se refere à hipótese de cabimento da ação monitória contra a Fazenda Pública, pois a doutrina não encontra entendimento convergente acerca do assunto.


Pelo não cabimento da ação monitória contra a Fazenda Pública, preceitua Fidélis (1996, p. 33):


“o procedimento monitório não se aplica às pessoas jurídicas de direito público, pois elas não possuem o poder de transacionar, pelo princípio da indisponibilidade do interesse público sobre o particular, não podendo, dessa forma, figurarem no pólo passivo da relação processual da ação monitória.”


Em sentido contrário, Nunes (2001), acompanhado da maioria dos doutrinadores, não vê incompatibilidade na utilização da ação monitória contra a Fazenda Pública, posto que tanto o procedimento monitório quanto o ordinário possibilitam o exercício da cognição plena desde que a Fazenda Pública ofereça embargos, afirmando que não há razão para distinguir os entes públicos dos entes particulares, ferindo de forma manifesta o princípio da isonomia.


Outro aspecto importante a ser elucidado é quanto ao cabimento da reconvenção, bem como das exceções processuais à ação monitória, sendo entendimento unânime da doutrina pela aplicação de tais institutos ao procedimento monitório, pois, pelo oferecimento dos embargos o rito seguido é o do procedimento ordinário.


Também não há vedação quanto à possibilidade de utilização do instituto da intervenção de terceiros e do litisconsórcio no procedimento injuntivo, tendo em vista a abertura da cognição plena por intermédio da interposição dos embargos monitórios.


 Outra problemática do tema tratado se refere à forma de citação realizada no procedimento monitório ao réu. A tese minoritária firma o entendimento de que não cabe citação ficta no procedimento injuntivo, pois a revelia acarreta a transladação do procedimento monitório em execução, devendo dessa forma, ser realizada sempre por oficial de justiça, tendo, no entanto, a tese majoritária primado pela utilização da citação por edital, pois o Código não trouxe a expressa exigência de citação pessoal ao réu. Logo, as formas de citação utilizadas no procedimento ordinário seriam aplicadas à ação em tela.


Há também divergências doutrinárias quanto à antecipação dos efeitos da tutela no procedimento monitório. Parte da doutrina entende não ser cabível a referida antecipação, uma vez que, se não houver embargos, o autor ficará satisfeito com a própria decisão interlocutória inicial, tendo em vista que o mandado monitório se transformará em executivo.


Freitas (2005), acompanhado da maioria da doutrina, firma entendimento em contrário, no sentido de que, concedido o mandado, existirá juízo de verossimilhança favorável ao autor que, muito provavelmente será suficiente para que se considere cumprido um dos requisitos da antecipação dos efeitos da tutela, previstos no artigo 273 do Código de Processo Civil.


4 CONSIDERAÇÕES FINAIS


Por intermédio deste artigo foi apresentado todo o conteúdo, de forma sucinta, pertinente ao tema proposto, quais sejam os aspectos gerais e polêmicos da ação monitória no ordenamento jurídico brasileiro.


Conforme exposto no corpo do trabalho, percebeu-se que o tema, igualmente como quase todos os institutos jurídicos adotados no Brasil, goza de várias divergências doutrinárias, tendo a maioria da doutrina defendido o cabimento do procedimento monitório contra a Fazenda Pública, bem como a possibilidade de citação ficta e, também, no que se refere à possibilidade de antecipação dos efeitos da tutela na ação monitória.


Contrariamente, ficou caracterizado que há vozes na doutrina processualística civil que primam pelo não cabimento da ação monitória contra o Poder Público, pela impossibilidade de citação ficta, bem como pela não possibilidade do cabimento do instituto da antecipação dos efeitos da tutela pretendida previsto no artigo 273, do Código de Processo Civil.


Pelos posicionamentos esposados nos dois parágrafos acima, percebe-se que as teses majoritárias partem do princípio de que “o que não está vedado pela lei é permitido”, sendo que a limitação ao uso do procedimento monitório encontra-se somente na lei, estando em consonância com o princípio da legalidade esculpido na Magna Carta de 1988. Já as correntes minoritárias utilizam argumentos que não se coadunam com o direito constitucional.


É bem certo que o direito processual civil goza de autonomia. No entanto, ela é relativa e hierarquicamente inferior à Constituição Federal. Logo, o princípio da hierarquia das normas deve ser observado, não podendo utilizar interpretações contrárias aos princípios constitucionais, o que justifica, repita-se, o amplo cabimento da ação monitória.


Sendo assim, ficaram caracterizados os principais aspectos polêmicos de cabimento do instituto da ação monitória no ordenamento jurídico brasileiro neste singelo trabalho.


 


Referências bibliográficas

ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, 345p.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. Informação e documentação – Referência – Elaboração: NBR 6023. São Paulo: ABNT, 2002, 24p.

_____. Informação e documentação – Citação em documentos – Apresentação: NBR 10520. São Paulo: ABNT, 2002, 7p.

_____. Informação e documentação – Trabalhos acadêmicos – Apresentação: NBR 14724. São Paulo: ABNT, 2002, 6p.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Organização do texto: Juarez de Oliveira. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990. 168p. (Série Legislação Brasileira).

BRASIL. Código de Processo Civil: Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Organização do texto: Yussef  Said Cahali. 5. ed. São Paulo: RT, 2003, 1725p.

FESURV – UNIVERSIDADE DE RIO VERDE. Normas e Padrões para Elaboração de Trabalhos Acadêmicos. Rio Verde: Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa, 2006. 64p.

FREITAS, Reinaldo Alves. Direito processual civil. Goiânia: Axioma Jurídico, 2006, 277p. Apostila.

NUNES, Elpídio Donizetti. Curso didático de direito processual civil. 2. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, 519p.

SANTOS, Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil: processo de conhecimento. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, 458p.

Informações Sobre o Autor

André Luiz Maranhão

Advogado Especialista em Direito Processual e Professor Universitário da Faculdade Unida de Campinas – FacUnicamps


Equipe Âmbito Jurídico

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