Assédio moral é crime?


Como já é de todos conhecido, o assédio moral no trabalho não é um fato isolado qualquer, resumidamente, ele se baseia na repetição ao longo do tempo, de práticas vexatórias e constrangedoras, explicitando a degradação deliberada das condições de trabalho num inegável contexto de desemprego e aumento da pobreza urbana.


Inúmeros são os exemplos de casos de assédio moral no trabalho, tais como: ameaça constante de demissão, preconceito contra trabalhadores doentes ou acidentados, constrangimento e humilhação públicas, autoritarismo e intolerância de gerências e chefias, imposição de jornadas extras de trabalho, espionagem e vigilância de trabalhadores, desmoralização e menosprezo de trabalhadores, assédio sexual, isolamento e segregação de trabalhadores por parte de gerências e chefias, desvio de função, insultos e grosserias de superiores, demissões por telefone, telegrama e e-mail, perseguição através da não promoção, calúnias e inverdades dissimuladas no ambiente de trabalho por chefias, negação por parte da empresa de laudos médicos ou comunicações de acidente, estímulo por parte da empresa à competitividade e ao individualismo, omissão de informações sobre direitos do trabalhador e riscos de sua atividade, discriminação salarial segundo sexo e etnia, ameaça a sindicalizados, punição aos que recorrem à Justiça, dificultar a entrega de documentos ao trabalhador.


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Para quem acha que o problema só acontece no Brasil e se restringe aos trabalhadores menos qualificados, basta ver pesquisa realizada pela revista francesa Rebondir, especializada em questões de emprego. Dos 471 entrevistados para a pesquisa, divulgada em junho do ano passado, 33% disseram já ter sofrido assédio. E o problema atingiu indiscriminadamente todos os escalões: executivos (35%), supervisores (27%) e operários (32%).


Temos que o basta à humilhação, que em muitas das vezes pode ser caracterizado como crime, depende também da informação, organização e, consideravelmente, da mobilização dos trabalhadores, vez que um ambiente de trabalho saudável é uma conquista diária possível na medida em que haja vigilância constante, sempre objetivando condições de trabalho dignas, estas, baseadas no respeito ’ao outro como legítimo outro’, no incentivo à criatividade, na cooperação.


Cremos mais, a batalha para recuperar a dignidade, a identidade, o respeito no trabalho e a auto-estima, deve passar ainda pela organização de forma coletiva por meio dos representantes dos trabalhadores do seu sindicato, das CIPAS, das organizações por local de trabalho, Comissões de Saúde dos Trabalhadores, Comissão de Direitos Humanos e dos Núcleos de Promoção de Igualdade e Oportunidades e de Combate à Discriminação em matéria de Emprego e Profissão que existem nas Delegacias Regionais do Trabalho de todos os Estados.


A questão crucial deste texto é saber: assédio moral é crime? Respeitando entendimentos contrários, cremos que não e explicaremos. Pois bem, para tais atos acima descritos, aplica-se o texto constitucional estampado nos artigos 5º e 7º, inciso XXX, da Constituição Federal, que estabelece a proteção ao direito à intimidade, dignidade, igualdade, honra e vida privada, além do artigo 483 da CLT.


Em que pese admitirmos que tal norma tenha já alcançado o Direito Civil, quando a Súmula 341, editada pelo Supremo Tribunal Federal prega que “é presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto”, ainda não temos tal avanço no segmento penal, ou seja, não resta, ainda, regulamentado o assédio moral como crime.


Entretanto, de relevância salientar, que já tramita na Câmara dos Deputados projeto de lei de autoria do então deputado Marcos de Jesus (PL-PE), a proposição 4.742 de 2001, que tipifica o chamado assédio moral como crime enquadrando-o no Código Penal brasileiro no artigo 146 – A. Pelo dispositivo, a pena para quem assediar trabalhador em posição hierárquica inferior, poderá ir do pagamento de multa à detenção, de três meses a um ano. Este projeto ainda aguarda julgamento desde o dia 2/8/07.


Agora, é bom que se diga que, nos dias de hoje, quem humilha ou xinga empregado, não fica impune, pois será enquadrado na prática de crime de calúnia e difamação, estes, estampados nos artigos 138 e 139 do Código Penal, além de correr o risco de indenizar o trabalhador prejudicado por dano material, moral e à imagem.


Cremos que já há muito chegou a hora de regulamentar essa matéria, vez que a Justiça não pode ficar engessada no trato de questões de tamanha importância, como é a do caso do assédio moral, também conhecido por o terrorismo psicológico. Tolerar infratores em potencial que acabam se vendo livres de uma punição mais adequada por falta de norma aplicável à espécie, não é aceitável em pleno século XXI.


Enfim, concluímos que o embate de forma eficaz ao assédio moral no trabalho, crime ainda não tipificado por nosso ordenamento pátrio, exige a formação de um coletivo multidisciplinar, envolvendo diferentes atores sociais: sindicatos, advogados, médicos do trabalho e outros profissionais de saúde, sociólogos, antropólogos e grupos de reflexão sobre o assédio moral, estes sim, são os passos iniciais para conquistarmos um ambiente de trabalho saneado de riscos e violências e que seja sinônimo de cidadania.



Informações Sobre o Autor

Marcelo Di Rezende Bernardes

Advogado
Sócio da Rezende & Almeida Advogados Associados S/S.
Sócio Fundador e Delegado Federal da Associação Goiana de Advogados (AGA).
Especializado em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Academia de Polícia Civil do Estado de Goiás (ACADEPOL-GO).
Especializado em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Especializando em Direito Ambiental pela Universidade Católica de Goiás (UCG).
Membro da Associação Brasileira dos Advogados Ambientalistas (ABAA).
Sócio Efetivo do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).
Membro do Instituto de Direito Empresarial, Internacional e Ambiental (IDEA).
Membro do Instituto Brasileiro de Ciências e Direito do Turismo (IBcDTur).
Membro do Instituto Nacional de Direito Público (INDIP).
Membro da Sociedade de Estudos Jurídicos (SOCEJUR).
Membro do Instituto Comportamento, Evolução e Direito (ICED).
Representante no Estado de Goiás do Movimento em Defesa da Advocacia (MDA).
Membro e Representante no Estado de Goiás da Associação Brasileira dos Advogados (ABA).
Apresentador do Programa Dominical em âmbito local (Estado de Goiás) denominado “Foco Jurídico” na Rede Bandeirantes de Televisão.
Member of American Chamber of Commerce DF/GO (AMCHAM).


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