Resumo: Investiga a presença de assédio moral no serviço público em geral, analisando as condutas caracterizadoras desse ato ilícito, os agentes de tal prática, suas causas, a natureza jurídica do instituto, as modalidades e a normatização já conferida à questão. O presente trabalho estuda o assédio moral praticado no âmbito da Administração Pública, perquirindo acerca das suas repercussões jurídicas para o agressor, a vítima e o próprio Estado-empregador e apresentando um panorama jurisprudencial, notadamente sob a ótica da necessidade de proteção ao núcleo essencial dos direitos do empregado.
Palavras-chave: assédio moral, Administração Pública, empregado público.
Abstract: Investigates the presence of moral harassment among public servants in general, analysing the behaviours which characterize this ilegal action, its agents, causes, legal nature, modalities and also the legal regulation towards the issue. This paper studies moral harassment commited in the framework of Public Administration, inquiring about legal repercussions towards the agressor, the victim and State-employee itself, and presents a broad view of the current law precedents, mostly regarding the need to protect the essential nucleus of fundamental human rights at the workplace.
Key words: moral harassment, Public Administration, public servant.
Sumário: Introdução. 1. Administração Pública. 1.1 Conceito. 1.2 Agentes Públicos. 1.3 Princípios Fundamentais da Administração Pública. 1.3.1 Princípio da Legalidade. 1.3.2 Princípio da Moralidade 1.3.3 Princípio da Impessoalidade.1.3.4 Princípio da Publicidade. 1.3.5 Princípio da Eficiência. 2. Assédio moral na administração pública. 2.1 Nomenclatura. 2.2 Definição. 2.3 Causas. 2.4 Natureza Jurídica. 2.5 Assédio Moral e Assédio Sexual: Diferenciação 2.6 Modalidades. 2.7 Normatização. 3. Repercussões jurídicas do assédio moral. 3.1 Para o agressor. 3.2 Para a vítima. 3. 3 Para a Administração Pública. 4. Precedentes jurisprudenciais. Conclusões. Referências.
Introdução
O novo constitucionalismo alçou a dignidade da pessoa humana como princípio unificador dos direitos fundamentais e, nessa toada, a Constituição Cidadã, enunciou esse princípio como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, alçando-o, portanto, à categoria de valor supremo da democracia.
Sob esses premissas é que se diz que os trabalhadores titulares dos direitos fundamentais do art. 7° da Constituição Federal não são mero objeto da atividade econômica: a eles deve ser assegurada uma existência com dignidade.
Também em face do Estado-empregador o princípio fundamental da dignidade humana, que se traduz na função de garantir o efetivo exercício dos direitos fundamentais, deve prevalecer, de sorte a inspirar a prestação de todo trabalho em favor da Administração Pública.
Nesse enfoque, o presente estudo trata de matéria que tem sido objeto de discussão na doutrina e na jurisprudência, que envolve a ofensa aos direitos fundamentais, notadamente à dignidade, dos empregados que prestam serviços em favor da máquina administrativa do próprio Estado. São situações em que o serviço público se torna palco daquilo que os estudiosos denominam assédio moral: uma pessoa ou um grupo de pessoas exercem violência de natureza psicológica e de maneira sistemática e freqüente sobre outra, com o objetivo de desestabilizar psicologicamente a vítima e marginalizá-la em seu ambiente de trabalho.
Fundamental, pois, ter em mente que o texto constitucional valorou sobremaneira a dignidade da pessoa humana, bem como enalteceu o valor social do trabalho e, nesse diapasão, consagrou o princípio da não-discriminação, com o claro escopo de coibir qualquer distinção, exclusão ou restrição que prejudique ou anule o reconhecimento, o gozo ou o exercício, em igualdade de condições, dos direitos humanos e liberdades fundamentais, inclusive no ambiente de trabalho da Administração Pública.
Resulta daí que, em semelhantes casos, é justamente a necessidade de proteção a esse núcleo essencial de direitos do empregado o fundamento para a punição do assédio moral e para a adoção de medidas tendentes a restabelecer o conteúdo dos bens e valores tutelados constitucionalmente.
2. Administração Pública
2.1 Conceito
Diversos são os sentidos da expressão “administração pública”, sendo que aqui nos interessa mais de perto a dicotomia entre os sentidos objetivo e subjetivo.
O sentido objetivo de “administração pública” compreende a própria atividade administrativa exercida pelo Estado, através de seus órgãos e agentes, para realizar seus fins, jungida à ordem constitucional e legal, cujos destinários não são outros senão os próprios indivíduos[i].
De outra sorte, em consideração ao sujeito, a expressão em exame significa o arcabouço de agentes, órgãos e pessoas jurídicas com o mister de executar as atividades administrativas e, por tal razão, é grafada com iniciais maiúsculas: Administração Pública. E é a esse Estado-sujeito que chamamos de Administração Direta e Indireta[ii].
Nessa trilha, é sabido que o Estado tanto pode prestar por si mesmo as atividades administrativas, como pode desempenhá-las através de outros sujeitos, hipótese em que acaba por transferir o exercício de atividades que lhe são pertinentes para particulares ou, ainda, por criar pessoas auxiliares suas para desempenhá-las[iii].
Trata-se, respectivamente, dos fenômenos da centralização e descentralização, sendo que o primeiro refere-se ao desempenho direto das atividades públicas pelo Estado-Administração, enquanto que o segundo tem correlação com o exercício de atividades de modo indireto, donde se extrai a noção de Administração Direta e Administração Indireta[iv].
Sob esse prisma é que se diz que a Administração Direta contem em si os órgãos que integram as pessoas políticas do Estado (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), os quais desempenham atividades administrativas de maneira centralizada, ao passo em que a Administração Indireta é o conjunto de pessoas administrativas (Autarquias, Empresas Públicas, Sociedades de Economia Mista e Fundações Públicas), vinculadas à Administração Direta, às quais foi atribuída a competência para o exercício descentralizado de atividades administrativas[v].
Vale esclarecer que, ao lado dessa estrutura organizacional administrativa, operam os entes privados que, sem integrarem a Administração Direta ou Indireta, colaboram com o Estado no mister das atividades de interesse público – organizações sociais, organizações da sociedade civil de interesse coletivo e os serviços sociais autônomos.
2.2 Agentes Públicos
O compartimento da estrutura estatal a que são cometidas funções determinadas é conceituado como órgão público, sendo este último, por sua vez, integrado por agentes que manifestam a própria vontade do Estado[vi], sendo a ele ligados por variados vínculos jurídicos.
Os agentes públicos costumam ser didaticamente separados em três grandes grupos: agentes políticos; particulares em colaboração com o poder público e servidores públicos.
Os agentes políticos são aqueles que exercem a função política no Estado, aos quais incumbem a direção, orientação e estabelecimento de diretrizes para o Poder Público, malgrado o façam sem relação profissional com a Administração, como, por exemplo: Presidente da República, Governador, Prefeito, MInistro etc[vii].
Os particulares que desempenham alguma função pública, a título oneroso ou gratuito, sem um vínculo de trabalho, são denominados particulares em colaboração com o poder público: leiloeiros, mesário eleitoral, jurado etc[viii].
Finalmente, os servidores públicos ou agentes administrativos são todos aqueles que exercem alguma função pública de caráter permanente em decorrência de relação funcional com o Estado e as entidades da Administração Indireta. Sujeitam-se à hierarquia funcional e ao regime jurídico estabelecido pela entidade a que pertencem. Compreendem os servidores militares e civis, sendo que estes últimos dividem-se em estatutários, empregados públicos e temporários[ix].
Os servidores estatutários são os ocupantes de cargos públicos, sujeitos ao regime estatutário previamente implantado pela Administração para a qual presta serviços, cujos vínculos podem ser efetivos ou em comissão, sendo os primeiros vocacionados a serem preenchidos em caráter definitivo via concurso público e os segundos em caráter provisório e destinados apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento[x].
Por sua vez, os servidores temporários são contratados por tempo determinado, com a finalidade de atender necessidade temporária de excepcional interesse público prevista em lei, mediante regime jurídico especial a ser disciplinado em lei de cada entidade da federação.
Finalmente, o empregado público é aquele que presta serviço para Administração Pública e é regido pelo regime trabalhista previsto na legislação federal. Ou seja, seu regime básico é o mesmo que se aplica à relação de emprego no campo privado, com as exceções pertinentes à posição especial de uma das partes – o Poder Público: exigência de aprovação em concurso público, vedação de acumulação de cargos e empregos, teto remuneratório constitucional[xi].
A Administração Pública Direta, as Autarquias e as Fundações Públicas podem adotar tanto o regime de pessoal estatutário quanto o trabalhista, sendo que as empresas públicas e as sociedades de economia mista estão atreladas obrigatoriamente ao regime de pessoal trabalhista[xii], que é o foco principal deste trabalho.
2.3 Princípios Fundamentais da Administração Pública
A Administração Pública como um todo encontra-se jungida a um Regime Jurídico Administrativo, que nada mais é do que um conjunto de prerrogativas e sujeições que devem ser observadas pelo administrador no desempenho de seu mister.
Dentre as sujeições abarcadas pelo Regime Jurídico Administrativo, encontra-se indubitavelmente o respeito aos princípios trazidos pelo artigo 37 “caput” da Constituição Federal de 1988, que devem ser vistos como instrumentos que permitem um equilíbrio entre os direitos dos administrados e as prerrogativas da Administração Pública.
2.3.1 Princípio da Legalidade
O princípio da legalidade é a diretriz básica da conduta dos agentes da Administração: toda e qualquer atividade administrativa deve ser autorizada por lei.
Desta feita, inexistindo previsão legal para uma hipótese, não há possibilidade de atuação administrativa, haja vista que a vontade da Administração não passa da vontade expressa na lei, de modo que os atos eventualmente praticados em desobediência a tais parâmetros são atos inválidos[xiii].
2.3.2 Princípio da Moralidade
O princípio da moralidade torna jurídica a exigência de atuação ética dos agentes da Administração, sendo que seu conteúdo põe-se no sentido de ser a norma ou o comportamento administrativo tendente a realizar interesse público específico, objetivamente determinado[xiv].
O conceito do Estado ante os administrados tem por pressupostos a honra institucional, a boa fama, a reputação e o patrimônio moral das entidades públicas que, por sua vez, devem ser encarados como cânones pelos agentes públicos[xv].
Diante desse panorama, é importante destacar que qualquer cidadão, no exercício legal de um cargo, emprego ou função pública, encontra-se jungido ao mínimo ético que a sociedade exige para sua própria sobrevivência[xvi].
2.3.3 Princípio da Impessoalidade
Consagra-se através do princípio da impessoalidade a noção de que a Administração tem que tratar a todos os administrados sem discriminações ou favoritismos. Isto é, o princípio em tela não é senão o próprio princípio da igualdade ou isonomia aplicado à atuação administrativa[xvii].
Segundo tal princípio, a atividade administrativa deve ser neutra, portanto, balizada apenas pelo interesse público.
2.3.4 Princípio da Publicidade
Nele se traduz a ideia de que os atos da Administração devem merecera mais ampla divulgação possível entre os administrados, de sorte a possibilitar o controle da legitimidade da conduta dos agentes administrativos[xviii].
Como se vê, tal postulado decorre justamente do Estado Democrático de Direito, no qual é inadmissível ocultamento aos administrados dos assuntos a que todos interessam e, mais ainda, em relação aos sujeitos individualmente afetados por alguma medida[xix].
2.3.5 Princípio da Eficiência
Incluído recentemente em mandamento constitucional, o princípio da eficiência impõe aos agentes públicos a execução dos serviços públicos com presteza, perfeição e rendimento funcional. Destarte, a eficiência relaciona-se ao modo pelo qual se processa o desempenho das atividades administrativas, direcionando-se prioritariamente à conduta dos agentes públicos[xx].
3. ASSÉDIO MORAL NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Assentadas as premissas acerca da organização administrativa do Estado, imprescindíveis à identificação da relação empregatícia pública, passemos à análise aprofundada do tema propriamente dito deste trabalho, qual seja, o assédio moral na Administração Pública.
O problema do assédio moral no serviço público tem se revelado de crescente importância, na medida em que compreende condutas que ofendem diretamente os fundamentos do Estado Democrático de Direito Brasileiro consagrados pelo constituinte originário através da Constituição Federal de 1988.
O texto constitucional valorou sobremaneira a dignidade da pessoa humana, bem como enalteceu o valor social do trabalho e, nesse diapasão, consagrou o princípio da não-discriminação, com o claro escopo de coibir qualquer distinção, exclusão ou restrição que prejudique ou anule o reconhecimento, o gozo ou o exercício, em igualdade de condições, dos direitos humanos e liberdades fundamentais, inclusive no ambiente de trabalho da Administração Pública.
O assédio em repartições públicas tem aumentado estatisticamente, ou, pelo menos, tem aumentado seu registro, haja vista que procedimentos antes considerados naturais e inevitáveis, dada a atual ordem jurídica, são agora reconhecidos como inconvenientes e humilhantes, portanto, inaceitáveis[xxi].
Em pesquisa realizada no Brasil com um universo de 4.718 profissionais ouvidos em todo o território, 68% deles afirmaram sofrer algum tipo de humilhação várias vezes por semana, sendo que a maioria dos entrevistados (66%) disseram já ter sido intimidados por seus respectivos superiores[xxii].
3.1 Nomenclatura
O Assédio moral, inicialmente objeto de estudos da área da psicologia e sociologia, é fenômeno que não faz muito tempo passou a merecer também a atenção do mundo jurídico[xxiii], sendo chamado também de Terror Psicológico (Portugal), Harassment, Emotional abuse ou Mistreatment (Estados Unidos), Mobbing (Alemanha, Escandinávia e Itália), Harcèlement Moral (França), Bullying (Inglaterra), Ijime, Mora-hara, moral harassment ou murahachibu (Japão) e Acoso Moral (Espanha).
Na língua portuguesa pode ser referido como violência moral ou psicológica, humilhação no trabalho, assédio psicológico no trabalho, terror ou terrorismo psicológico no trabalho, psicoterror, coação moral no ambiente de trabalho, tirania nas relações de trabalho, molestamento moral e manipulação perversa[xxiv].
3.2 Definição
De maneira sintética, podemos dizer que o assédio moral é a exposição do trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras durante a jornada de trabalho e no exercício das funções profissionais que, pela repetição, vão minando sua auto-estima[xxv].
Por outro viés, entende-se que o assédio moral consubstancia um gênero da discriminação, eis que sua finalidade principal não é outra senão a exclusão da pessoa do ambiente de trabalho através de situações de desigualdade propositadas e, o que é mais importante, sem motivo legítimo[xxvi].
Para a OIT – Organização Internacional do Trabalho[xxvii], identifica-se o assédio moral quando a vítima tem razoável motivo para crer que sua recusa resultaria em desvantagem em relação ao acesso ou manutenção do emprego, com reflexos em sua progressão dentro da organização ou ainda que daí resultaria um ambiente hostil.
São formas recorrentes de assédio moral o isolamento da vítima no local do trabalho; exigência de cumprimento rigoroso do trabalho como pretexto para maltratar a vítima; ignorar a existência da vítima no ambiente de trabalho; jogo de palavras de cunho sexista; controle do tempo no banheiro; referências negativas, indiretas e continuadas à intimidade da vítima, entre outras[xxviii].
Com esses exemplos em mente, desponta relevante para a conformação do assédio moral a verificação dos seguintes elementos: natureza psicológica; conduta repetitiva, prolongada ofensiva ou humilhante; finalidade e necessidade do dano psíquico-emocional[xxix].
O assédio é um processo, um conjunto de atos de natureza psicológica que se destinam a expor a vítima a situações humilhantes e vexatórias, sendo irrelevante para a sua configuração o tipo de procedimento adotado pelo agressor. O que importa, em primeiro lugar, é a modalidade da conduta: agressiva e vexatória, capaz de constranger a vítima, provocando-lhe sentimentos de humilhação e inferiorização[xxx].
Justamente por se tratar de um fenômeno de natureza psicológica, não há de ser um ato esporádico considerado assédio moral; uma agressão verbal ou física caracteriza um conflito que, embora possa gerar um dano moral indenizável à vítima, não se confunde com o assédio moral[xxxi]. O elemento comum das modalidades de assédio estudadas pela literatura é a repetição da conduta ou ato ao longo de um arco temporal suficientemente longo para que cause um impacto real e de verdadeira perseguição pelo assediador[xxxii], embora não exista ainda na doutrina e jurisprudência um parâmetro temporal para a configuração do assédio moral.
Porém, essas condutas ofensivas guardam uma particularidade que as une. Trata-se da deliberada degradação das condições de trabalho com a finalidade principal de exclusão da vítima, seja pela pressão deliberada para exonerar-se ou demitir-se, para que se aposente precocemente ou ainda obtenha licença para tratamento de saúde, bem como pela construção de um clima de constrangimento para que o empregado/vítima, por si mesmo, julgue estar prejudicando o órgão ou o próprio ambiente de trabalho, pedindo para ausentar-se ou para sair definitivamente[xxxiii].
De acordo com a escola sueca do Professor LEYMANN[xxxiv] que, do estudo de inúmeros casos de pacientes em tratamento por problemas psicológicos oriundos das dificuldades nas relações pessoais no local de trabalho, foi pioneiro na elaboração do conceito de mobbing, é elemento imprescindível à conformação do assédio moral a necessidade de vitimação do empregado através do dano psíquico-emocional: “These words refer to a situation in which one or more people (employees) at the workplace show hostile behavior toward (1) most often, only one employee (2) very often and (3) over a very long period of time (months or years), thereby victimizing him or her.”
Em outros termos: a vítima do assédio submete-se a uma experiência subjetiva que causa prejuízos práticos e emocionais, eis que a conduta do agressor acaba por minar sua saúde física e mental enquanto corrói sua auto-estima[xxxv].
Nesse contexto, a variedade das hipóteses possíveis de serem enquadradas como assédio moral torna laboriosa a precisão de sua definição, sendo possível, contudo, concluir que o fenômeno em estudo alcança situações de ressentimento justificado que desestabilizam emocionalmente o empregado em razão da continuidade de um procedimento incômodo e injustificado causador do constrangimento e humilhação no ambiente de trabalho[xxxvi].
Cite-se, como exemplo de condutas assediadoras, atribuir erros imaginários ao trabalhador; ignorar sua presença na frente dos outros ou não cumprimentá-lo; fazer críticas em público ou brincadeiras de mau gosto; impor-lhe horários injustificados; fazer circular boatos maldosos; transferi-lo do setor para isolá-lo; pedir-lhe a execução de tarefas sem interesse ou não lhe atribuir tarefas; retirar seus instrumentos de trabalho e agredi-lo somente quando estão a sós[xxxvii].
3.3 Causas
As causas e motivações registradas pelos estudiosos para esse mal que assola o meio ambiente do trabalho são as mais diversas possíveis. O primeiro fator apontado é a nova estrutura organizacional de trabalho[xxxviii], caracterizada pelo acúmulo de atribuições, de novas tarefas, a um mesmo empregado, assim como pela competitividade e individualismo incentivados pela busca incessante de produtividade e lucratividade[xxxix].
A globalização do capital causou sérias mudanças ao mundo do trabalho, visto que as organizações procuraram se ajustar à nova realidade social privilegiando a gestão estratégica de reorganização do trabalho e buscando outras formas de administrar, as quais se voltaram mais ainda para a otimização do uso do potencial do empregado, a transferência de responsabilidade, a autonomia de decisão e o aumento de cobranças por resultados e metas[xl].
Some-se a isso a dificuldade que se tem de gerir e solucionar os conflitos presentes no ambiente de trabalho: ao negligenciar essa obrigação, ao contrário de apaziguar os ânimos, o ambiente se torna cada vez mais hostil e propício à exacerbação das diferenças[xli].
Os fatores acima delineados conduziram a alterações das relações de trabalho, as quais afetam negativamente a classe trabalhadora com o aumento das exigências no perfil do empregado, a desilusão com as instituições e, sobretudo, a insegurança no emprego.
Entretanto, não se pode simplificar e presumir que o capitalismo pós-moderno criou o assédio moral. Ora, o abusivo poder de direção do empregador sempre existiu, tanto assim é que, notadamente no Brasil, os maus-tratos sempre significaram meios de intensificação da produtividade dos trabalhadores, desde a escravidão até o momento atual. Trata-se, destarte, de uma combinação de fatores que inclui desde a conjuntura atual das organizações de trabalho até as atitudes de caráter pessoal do indivíduo que pratica o assédio moral[xlii].
Dentro do serviço público é possível, ainda, identificar outros dois fatores preponderantes: a prática contumaz da impunidade do superior hierárquico e, de outro turno, a falta da comunicação substancial desses atos por parte da vítima[xliii].
3.4 Natureza Jurídica
O assédio moral deve ser estudado como um ato discriminatório violador de um direito personalíssimo[xliv], cuja proteção remonta ao restabelecimento de uma situação de ofensa a núcleo essencial dos direitos fundamentais do trabalhador assegurados constitucionalmente e, no caso do assédio praticado no serviço público, aos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade e moralidade.
Sob esse parâmetro, a prática de assédio moral vulnera os direitos fundamentais ao trabalho digno, à saúde, à honra, à imagem e à intimidade da vítima, adentrando à seara da responsabilidade civil[xlv].
3.5 Assédio Moral e Assédio Sexual: Diferenciação
Embora sejam atos ilícitos que guardem certa correlação e que podem ocorrer no ambiente de trabalho, a diferenciação é imprescindível para a identificação de suas repercussões, notadamente considerando que o assédio sexual é crime tipificado pelo art. 216-A do Código Penal[xlvi].
O Assédio Sexual no âmbito das relações de trabalho é caracterizado pela ação dolosa e reiterada de constranger a vítima, sobre a qual se tem ascendência profissional, com o objetivo de obter vantagem sexual[xlvii].
Desta feita, a identificação do assédio sexual no ambiente de trabalho perpassa pela verificação de comportamento do empregador ou de prepostos que, abusando da autoridade inerente à função, pressiona com fins e obtenção ilícita de favores sexuais não desejados[xlviii].
Seu agente é sempre o empregador ou superior hierárquico da vítima, enquanto que no assédio moral, conforme veremos a seguir, a vítima poderá ser o próprio chefe e o agente um grupo de subalternos, por exemplo.
A intenção do agente do assédio sexual é obter um favor dessa natureza junto à vítima, ao passo que no assédio moral a intenção do agente é eliminar a vítima do mundo do trabalho através da ruína de sua auto-estima[xlix].
3.6 Modalidades
A classificação mais comum empregada pela doutrina é aquela que separa o assédio moral em três modalidades: vertical, horizontal e ascendente[l].
Reputa-se vertical o assédio moral sempre que a violência psicológica parte de um superior hierárquico da vítima. Trata-se, inclusive, da modalidade mais recorrente na seara laboral.
Horizontal é a modalidade de assédio moral em que a agressão psicológica é oriunda de colega(s) de trabalho, isto é, ocorre dentro da mesma escala hierárquica.
Finalmente, o assédio moral será ascendente quando o constrangimento psicológico for praticado pelo empregado contra o superior hierárquico, normalmente com a intenção de retirá-lo da posição ocupada[li].
Essas modalidades poderão de apresentar de maneira combinada, ensejando o que se denomina assédio moral misto[lii].
Há, ainda, outra classificação[liii] que divide o assédio moral em individual e organizacional, sendo o primeiro nada mais do que uma expressão do segundo, eis que nesse caso se os atos abusivos se dirigem a um indivíduo, visando a sua exclusão do mundo do trabalho, ao passo que o organizacional, modalidade extremamente encontradiça nos modelos de empresas atuais, é praticado de maneira difusa e fomentado pela própria organização como mais um instrumento de controle e disciplina de mão de obra, objetivando, através de atos abusivos, submeter o empregado à rigorosa política de resultado.
3.7 Normatização
Nosso país ainda não possui lei federal que discipline o assédio moral, embora existam mais de 11 (onze) projetos de lei em trâmite perante o Congresso Nacional versando sobre algum ponto relevante da matéria: alterações à Consolidação das Leis Trabalhistas para proibir o assédio moral; alteração ao Estatuto dos Servidores da União (Lei n. 8112/92) para proibir a prática do assédio moral no serviço público federal); inserção de tipo penal no Código Penal prevendo o assédio moral como crime, entre outros[liv].
É sabido que a competência para legislar sobre direito do trabalho é privativa da União, conforme inteligência do art. 22, I da Constituição Federal. Assim, nosso ordenamento jurídico atual não ostenta normas jurídicas trabalhistas, mas sim normas administrativas que visam a regulamentação de condutas havidas entre a Administração Pública e seus contratados[lv].
Com efeito, o ideal seria uma norma de âmbito federal inserida na CLT que coibisse o assédio moral, estabelecendo a nulidade da dispensa, da transferência, da demissão ou da punição disciplinar nele fundada, facultando à parte prejudicada a rescisão indireta, sem prejuízo da indenização pelos danos ocasionados[lvi].
Volvendo os olhos para o âmbito estadual, encontramos alguns diplomas normativos coibindo a prática do assédio moral entre os servidores daquela esfera da Federação, como é o caso de Goiás (Lei n. 17.161/2010), Rio Grande do Sul (Lei Complementar n. 12.561/2006), Mato Grosso (Lei Complementar n. 04/1990), Rio de Janeiro (Lei n. 3.921/2022), Distrito Federal (2.949/2002) e São Paulo (Lei n. 422/2011).
Na seara municipal também já há diversos normativos vedando o assédio moral entre os servidores municipais, dentre os quais citamos Salvador (Lei n. 6986/2006), Sete Lagoas (Lei n. 7.223/2006), Londrina (Lei n. 9.897/2005), São Paulo (Lei n. 13.288/2002), Iracemápolis (Decreto n. 1.134/2001), Americana (Lei n. 3.671/2002), Sorriso (Lei n. 1.210/2004), Amparo (Lei n. 3.234/2006), Campinas (Lei n. 11.409/2002), Bagé (Lei n. 4.027/2003).
Infelizmente, o Poder Judiciário e o próprio Legislativo ainda seguem silentes nas suas normas internas a esse respeito, sendo que os diplomas acima citados dirigem-se, notadamente, ao Poder Executivo.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT), no uso de suas atribuições de elaborar normas internacionais atinentes às questões do Direito do Trabalho, editou, em 2002, um Informe sobre algumas formas de configuração do assédio moral, elencando várias condutas que se mostraram mais típicas ou comuns[lvii].
Além do Informe acima referido, que proíbe o assédio moral, há também a Convenção 111 da OIT, que proíbe qualquer tipo de discriminação em matéria de emprego e profissão, ratificada pelo Brasil em 1968[lviii]. São, portanto, instrumentos normativos que devem ser observados como verdadeiros "sobreprincípios" dentro do ordenamento jurídico interno, devendo cada membro tomar as medidas necessárias ao efetivo respeito a esses direitos.Dentre os países que possuem legislação específica sobre o assédio moral podemos elencar a Suécia, França, Irlanda, Bélgica, Noruega, Grã-Bretanha, Finlândia e Austrália[lix].
Portanto, enquanto ausente a legislação federal, além do direito comparado, as convenções coletivas poderão ser um instrumento eficaz para coibir o assédio moral nos mais diversos ambientes de trabalho.
4. Repercussões Jurídicas Do Assédio Moral
Enquanto ato ilícito e inconstitucional, pois violador do princípio da dignidade do trabalhador, a prática do assédio moral no ambiente de trabalho da Administração Pública além de provocar efeitos nocivos à saúde da vítima, tais como perda de interesse do empregado, queda na produtividade, degradação do meio ambiente do trabalho e incidência de moléstias do trabalho[lx], apresenta várias repercussões no mundo jurídico, as quais passo a analisar detidamente.
4.1 Para o agressor
Muito embora o assédio moral não esteja expressamente previsto na Consolidação das Leis Trabalhistas, é encarado pela doutrina e jurisprudência como falta grave, capaz de justificar a perda da estabilidade no emprego, sendo considerado justa causa para a rescisão do contrato de trabalho do empregado agressor, a teor do art. 482, b, da CLT.
No caso do empregado público agressor, as hipóteses de dispensa motivada encontram-se previstas no art. 482, CLT, além de outras que possam estar elencadas em lei federal, estadual ou municipal, como costuma ser o caso de acúmulo irregular de cargo, emprego ou função pública.
Entretanto, considerando que a extinção da relação jurídica do empregado público com a Administração é um ponto delicado no Direito Público, é preciso distinguir entre o empregado público detentor de estabilidade e o não estável.
O Tribunal Superior do Trabalho, através da Súmula n. 390[lxi], publicada em 2005, fruto da conversão das Orientações Jurisprudenciais n. 229 e 265 da Subseção de Dissídios Individuais-1 e da Orientação Jurisprudencial n. 22 da Subseção de Dissídios Individuais-2, decidiu que a estabilidade assegurada no art. 41 da Constituição Federal alcança alguns empregados públicos celetistas, senão vejamos: “ESTABILIDADE. ART. 41 DA CF/1988. CELETISTA. ADMINISTRAÇÃO DIRETA, AUTÁRQUICA OU FUNDACIONAL. APLICABILIDADE. EMPREGADO DE EMPRESA PÚBLICA E SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. INAPLICÁVEL – Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005
I – O servidor público celetista da administração direta, autárquica ou fundacional é beneficiário da estabilidade prevista no art. 41 da CF/1988. (ex-OJs nº s 265 da SBDI-1 – inserida em 27.09.2002 – e 22 da SBDI-2 – inserida em 20.09.00)
II – Ao empregado de empresa pública ou de sociedade de economia mista, ainda que admitido mediante aprovação em concurso público, não é garantida a estabilidade prevista no art. 41 da CF/1988. (ex-OJ nº 229 da SBDI-1 – inserida em 20.06.2001)”
Logo, discorrendo sobre a Constituição da República de 1988, em seu art. 41, o Tribunal Superior do Trabalho sustenta que apenas é assegurada estabilidade, após três anos de efetivo exercício, aos empregados públicos celetistas da Administração Direta, Autárquica ou Fundacional, admitidos por concurso público, os quais só perderão o cargo por sentença transitada em julgado; processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa; em virtude de procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa.
De outra sorte, os empregados públicos celetistas de Empresas Públicas ou Sociedades de Economia Mista não são considerados estáveis. Aliás, vale registrar a posição do Tribunal Superior do Trabalho acerca da desnecessidade de motivação da dispensa para os empregados, ainda que concursados, das empresas públicas ou sociedades de economia mista. Confira-se, a esse respeito, a redação da Orientação Jurisprudencial n. 247, da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, com a alteração empreendida pela Resolução n. 143 de 2007[lxii]:
“1. A despedida de empregados de empresa pública e de sociedade de economia mista, mesmo admitidos por concurso público, independe de ato motivado para sua validade;
2. A validade do ato de despedida do empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos ( ECT) está condicionada à motivação, por gozar a empresa do mesmo tratamento destinado à Fazenda Pública em relação à imunidade tributária e à execução por precatório, além das prerrogativas de foro, prazos e custas processuais.”
Pois bem. Efetuada a distinção acima, focando agora a análise no empregado público celetista, cumpre lembrar que a apuração de semelhante irregularidade funcional (prática de assédio moral) e a aplicação de sanção no âmbito da Administração poderão ser feitas por processo administrativo disciplinar, precedido ou não de sindicância, a depender do modelo adotado pela legislação, sendo que a finalidade principal da responsabilização disciplinar repousa na preservação da ordem e da normalidade funcional no âmbito das repartições públicas[lxiii].
Cabe à Administração Pública o dever de apurar toda e qualquer irregularidade funcional de que se venha a tomar conhecimento, através de processo administrativo atrelado aos princípios da ampla defesa, do contraditório, da economia processual, do informalismo e da publicidade dos atos.
Referido processo conterá uma fase de defesa, em que será garantido ao empregado público o acesso a todas as informações constantes do processo, assim como a apresentação de suas alegações de defesa, sendo dispensável a atuação de advogado, conforme prescreve a Súmula Vinculante n. 05 do Supremo Tribunal Federal[lxiv]:“A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição.”
A fase instrutória, norteada pelos princípios da ampla defesa e contraditório, destina-se a produzir provas que constatem as irregularidades apuradas e permitam futuramente a motivação da decisão administrativa, admitindo-se todas as provas lícitas em direito, sempre que pertinentes ao caso concreto[lxv].
Finalmente, na fase decisória a autoridade administrativa competente, diante das provas produzidas e do relatório final da autoridade ou da comissão processante, prolatará sua decisão motivada, sem o que o ato de eventual dispensa como sanção pela prática de assédio moral se tornará arbitrário, impondo-se a reintegração ao serviço público.
Por outro prisma, a perda do emprego do empregado público celetista estável também pode se dar por decisão judicial que apure o cometimento da falta grave consubstanciada no assédio moral. Trata-se do inquérito judicial para apuração de falta grave, disciplinado nos art.s 492 e 853 da CLT.
4.2 Para a vítima
Em qualquer hipótese de assédio moral caberá, nos termos do art. 483, notadamente nas alíneas a, b, e e g, da CLT, ao empregado público ofendido, o pleito de rescisão indireta de seu contrato de trabalho, com as repercussões a ela inerentes: saldo de salário, aviso prévio, férias vencidas e proporcionais, o adicional de 1/3, os depósitos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, a multa fundiária de 40% (quarenta por cento) e o 13º salário[lxvi].
Inclusive, se o assediador tiver logrado êxito no seu objetivo de excluir o empregado assediado daquele ambiente do trabalho, a doutrina se posiciona no sentido de conferir nulidade absoluta a esse ato, atribuindo ao empregado assediado o direito a reintegração no emprego, como reflexo da garantia constitucional da não discriminação[lxvii].
Todavia, o efeito mais polêmico da identificação da prática de assédio moral em face de um trabalhador é a possibilidade de reparação material e moral pelos abusos sofridos.
Conforme anteriormente assentado, a prática do assédio moral vulnera direitos humanos fundamentais da vítima, trazendo-lhe como conseqüência danos de distinta ordem: psíquica, moral e patrimonial.
A doutrina distingue o dano psíquico do dano moral. Aquele se consubstancia em uma alteração psicopatológica comprovada de que passa a sofrer a vítima dos abusos. Trata-se, em termos sintéticos, de um plus. É elemento dispensável à caracterização do assédio moral que, quando verificado, gerará um aumento da reparação por dano moral ou até mesmo uma compensação autônoma, resultando sua fixação de arbitramento do Juiz, após analisar a gravidade do ilícito, a intensidade e a repercussão da ofensa, a condição social da vítima, a sua personalidade e a do ofensor, bem como o comportamento deste último após o fato, entre outros[lxviii].
Note-se que o pagamento de tal reparação tem a natureza jurídica de uma sanção pelo ato ilícito praticado[lxix].
O dano moral, por sua vez, resulta da lesão aos direitos da personalidade e gera consequências extrapatrimoniais, por isso mesmo é compensado com o pagamento, não de uma indenização no sentido literal, mas de uma reparação pecuniária destinada a atenuar os prejuízos decorrentes de uma lesão à esfera imaterial e personalíssima do trabalhador e que pode atingir a honra, a intimidade, a vida privada, a imagem, a saúde, a própria dignidade da pessoa humana e sua integridade física e moral.
4.3 Para a Administração Pública
Em primeiro lugar, o assédio moral no trabalho deve ser encarado como um fator de risco psicossocial capaz de provocar danos à saúde da vítima. Trata-se, destarte, de doença do trabalho, equiparada a acidente do trabalho. Sob esse prisma, afetará os custos operacionais da Administração Pública que, no mínimo, terá um empregado afastado de suas funções, em razão de sintomas psíquicos e físicos[lxx], para fruição de licença médica.
Releva assinalar que esse empregado deixará, ainda que transitoriamente, de exercer suas funções e a Administração se verá impossibilitada realizar Concurso Público para prover essa vaga, eis que a vítima, embora afastada, manterá seu liame jurídico com a Administração Pública, que deverá arcar com todos os custos do fator de risco assédio moral.
Cabe observar, ainda, que a licença médica pode não ser suficiente para a restauração da higidez psíquica e física do empregado vítima de assédio moral. Neste caso, é fácil inferir que a impossibilidade física ou psíquica do empregado público, de caráter permanente, para exercer as funções de seu cargo, conduzirá à inatividade remunerada.
De outro norte, o assédio moral ainda pode levar a baixa produtividade no serviço público, abstenteísmo, falta de motivação e de concentração[lxxi], que aumentam as falhas no desempenho das atividades e caminham na contramão do princípio da eficiência, assegurado constitucionalmente.
Por fim, repercussão também digna de nota e que atinge frontalmente a Administração Pública é a responsabilidade pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, venham a causar a terceiros[lxxii].
A Constituição Federal regula a matéria no art. 37, §6º, que tem a seguinte redação:
“As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”
A regra acima trasladada faz alusão a duas categorias de pessoas jurídicas sujeitas à responsabilidade objetiva: as pessoas jurídicas de direito público e as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos.
São, portanto, objetivamente responsáveis as pessoas componentes da federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), as autarquias e as fundações públicas. E, ainda, as pessoas privadas da Administração Indireta (empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas com personalidade de direito privado), quando se dedicarem à prestação de serviços públicos, e os concessionários e os permissionários de serviços públicos (art. 175 da Constituição Federal)[lxxiii].
Deve considerar-se que a relação entre a vontade e a ação do Estado e de seus agentes é uma relação de imputação direta dos atos dos agentes ao Estado, de maneira que o que o agente faça na qualidade funcional é o que o Estado fez[lxxiv].
Portanto, na hipótese de prática de assédio moral no âmbito da Administração Pública por qualquer empregado público, tal conduta será havida pelo Estado como pertinente a si próprio[lxxv].
De conseguinte, trazendo os balizamentos da responsabilidade objetiva para a seara do assédio moral, a configuração da aludida responsabilidade exige três pressupostos, quais sejam, a ocorrência do fato administrativo, assim entendido como qualquer forma de conduta de assédio moral praticada por empregado público; o dano experimentado pela vítima do assédio, seja ele patrimonial ou moral; e, finalmente, o nexo causal entre o fato administrativo e o dano[lxxvi].
O texto constitucional concernente à responsabilidade ostenta duas relações jurídicas diversas – uma que liga o lesado ao Estado e outra que o vincula o Estado ao seu agente, sendo a primeira objetiva e a segunda subjetiva, respectivamente. Esta última relação é que consubstancia o direito de regresso do Estado, estando prevista na parte final do §6º do art. 37 da Constituição Federal[lxxvii] e significando que a Administração Pública poderá exercer seu direito de regresso contra o agente responsável pelo assédio moral no montante com que indenizou a vítima, desde comprovada a atuação culposa daquele[lxxviii].
5. Precedentes Jurisprudenciais
O tema assédio moral já não constitui novidade para os tribunais trabalhistas pátrios que, ao longo dos últimos anos, tem reconhecido a prática desses atos ilícitos. Embora no âmbito da Administração Pública as denúncias sejam mais raras, as repercussões não são menos graves e corriqueiras.
A Constituição Federal assegura a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, assim como o direito à indenização pelo dano moral decorrente de sua violação (CF, art. 5º, X). Daí decorre que incumbe ao empregador respeitar a consciência do trabalhador, zelando pela sua saúde mental e liberdade de trabalho, sua intimidade e vida privada, sua honra e imagem, abstendo-se de práticas que importem exposição do empregado a situações humilhantes, constrangedoras e discriminatórias. O direito à indenização, por ato ilícito, supõe a comprovação do dano, o nexo de causalidade e a culpa. Evidenciado o assédio moral ao empregado, ante as condutas praticadas no âmbito do trabalho, inarredável o direito de indenizar. A empresa estatal que permite em seu ambiente de trabalho a violação a direito e dano a empregado público é obrigada a repará-lo (artigos 186, 187 e 927 do Código Civil Brasileiro): “(…) O Tribunal Regional analisou as provas constantes nos autos e, com base no princípio do livre convencimento motivado, elencado no art. 131 do CPC, concluiu que o reclamante esteve sujeito a assédio moral no seu local de trabalho por ter sido perseguido, imotivadamente, por seus superiores hierárquicos.
Ainda segundo o Tribunal Regional, a prova produzida confirmou que o assédio exercido sobre o reclamante era grande o suficiente para ensejar reparação por danos morais.
O dever de indenizar surge com o aperfeiçoamento dos requisitos dos arts. 186, 187 e 927, do Código Civil. A entidade a qual permite que superiores hierárquicos, legítimos representantes da empresa, persigam seus funcionários por motivos de índole pessoal, comete abuso de seu poder diretivo, ficando sujeita ao pagamento de reparação civil. (…)”[lxxix] (grifo nosso)
Em ação proposta por empregado de empresa de segurança que prestava serviços à Caixa Econômica Federal, restou reconhecida a prática de assédio moral como forma sutil e continuada de exaurir a estabilidade psicológica do trabalhador e, por tal razão, a referida empresa pública foi condenada ao pagamento de indenização por danos morais à vítima, sendo que o fato de o agente não ser seu empregado não afastou a sua responsabilidade: “(…) Como se vê da transcrição supra, a Corte Regional não analisou a controvérsia sob o enfoque recursal. Com efeito, o Tribunal manteve a condenação por entender que o ofensor era preposto da empresa beneficiária do serviço prestado pelo Autor. Incidência da Súmula n.º 297/TST. Não conheço.” [lxxx] (grifo nosso)
Com efeito, o Tribunal Superior do Trabalho[lxxxi] tem reconhecido a responsabilidade subsidiária da Caixa Econômica Federal também em casos de assédio moral praticado por prestadores de serviço por ela contratados: “(…)RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CULPA IN VIGILANDO. O Tribunal Regional decidiu a controvérsia em consonância com a Súmula nº 331, IV, desta Corte Superior, que tem por fundamento principalmente a responsabilidade subjetiva, decorrente da culpa in vigilando (arts. 186 e 927 do Código Civil). Isso porque os arts. 58, III, e 67 da Lei nº 8.666/93 impõem à administração pública o dever de fiscalizar a execução dos contratos administrativos de prestação de serviços por ela celebrados. No presente caso, o ente público tomador dos serviços não cumpriu adequadamente essa obrigação, permitindo que a empresa prestadora contratada deixasse de pagar regularmente a seus empregados as verbas trabalhistas que lhes eram devidas, bem como permitiu a ocorrência de condutas configuradoras de assédio moral. Saliente-se que tal conclusão não implica afronta ao art. 97 da CF e à Súmula Vinculante nº 10 do STF, nem desrespeito à decisão do STF na ADC nº 16, porque não parte da declaração de inconstitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93, mas da definição do alcance da norma inscrita no citado dispositivo com base na interpretação sistemática, em conjunto com as normas infraconstitucionais citadas acima. Recurso de revista não conhecido. (…)
3. LIMITES DA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. O acórdão regional encontra-se em consonância com a jurisprudência reiterada desta Corte no sentido de que a condenação subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas não adimplidas pelo devedor principal, inclusive a multa dos arts. 467 e 477 da CLT, a multa convencional, e ainda, a indenização por dano moral, uma vez que se trata de parcelas vinculadas ao contrato de trabalho. Recurso de revista não conhecido.” (grifo nosso)
No sentido da aplicação da responsabilidade à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos pela prática de assédio sexual por um de seus empregados, confira-se o seguinte trecho do Acórdão proferido pelo Tribunal Superior do Trabalho em Agravo de Instrumento em Recurso de Revista[lxxxii]: “(…)Quanto ao tema – assédio sexual – dano moral – indenização-, não há que se falar em violação do art. 216-A do Código Penal. É que o Tribunal Regional, soberano na apreciação do conjunto fático-probatório dos autos, de inviável reexame nessa esfera recursal, concluiu que restou evidenciada a -ocorrência do chamado assédio sexual- uma vez que -há na prova coligida elementos suficientes para autorizar o reconhecimento de lesão à honra, à dignidade ou ao decoro da autora-. E que os -atos ilícitos dos quais exsurgiram o dano moral aqui reconhecido foram praticados por um dos administradores da pessoa jurídica ora demandada-. Em consequência, ao reconhecer o direito à indenização por dano moral, o Tribunal Regional deu a exata subsunção da descrição dos fatos ao conceito contido nos artigos 186 e 927 do Código Civil, que disciplinam a responsabilidade aquiliana, dispondo que -Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito- e -Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. (…) “ (grifo nosso)
Sobre as repercussões experimentadas pela vítima de assédio moral, assim pontuou a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho[lxxxiii]:
“(…) Na hipótese dos autos, o Regional, analisando os elementos instrutórios dos autos, concluiu que restou configurada a prática de assédio moral (dano, nexo causal e ação culposa do Réu), razão pela qual manteve a condenação do Reclamado ao pagamento de indenização a tal título. A sujeição da Autora a tais práticas, não pode haver dúvidas, compromete a sua imagem perante seus colegas de trabalho, pois nele desenvolve, presumidamente, sentimento negativo de incapacidade profissional.
Ressalte-se, ainda, que as perseguições psicológicas ou pressões descomedidas formam grupos de trabalho desmotivados, sem condições de executar metas ou projetos em quantidade e com qualidade.
(…)” (grifo nosso)
Questão sempre objeto de muita controvérsia é a quantificação da reparação econômica devida pela empresa ao empregado nos casos de assédio moral. Neste sentido, confira-se julgado proferido em processo[lxxxiv] versando sobre empregado da Petrobrás S.A. submetido à situação vexatória: “(…) O Tribunal Regional considerou demonstrado o dano moral alegado pelo reclamante, decorrente da humilhação de ter sido mantido sem trabalho, dentro de um contêiner, durante o expediente. Assinalou que ele deixou de receber pelas despesas de hospedagem e de alimentação, que antes eram quitadas pela ré, bem como sofreu limitação do direito de retornar para o seu estado de origem, onde reside sua família. O princípio da distribuição do ônus da prova, a que se refere o artigo 818 da CLT, somente tem aplicação quando não comprovados os fatos. Provado o fato constitutivo do direito à indenização por dano moral, como se extrai do acórdão regional, impossível reconhecer violação literal desse dispositivo de lei. Quanto ao valor da condenação (50 vezes a remuneração do autor), não se verifica ofensa ao princípio da proporcionalidade, insculpido no artigo 5º, V, da Constituição Federal, pois a Corte -a quo- fundamentou sua decisão na gravidade da conduta das rés, no caráter pedagógico da indenização, no bem jurídico sob tutela (direito constitucional ao trabalho em ambiente digno) e no grau de dolo das empresas. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (…)“ (grifo nosso)
Ainda acerca dos parâmetros relevantes para a aferição do valor da indenização por dano moral, confira-se a didática ementa de julgado do Tribunal Superior do Trabalho proferido em Agravo de Instrumento interposto pela Caixa Econômica Federal em face de empregado público[lxxxv]: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA – DESCABIMENTO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. PARÂMETROS RELEVANTES PARA AFERIÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO. SISTEMA ABERTO. DOSIMETRIA DO -QUANTUM- INDENIZATÓRIO. 1. Dano moral consiste em lesão a atributos íntimos da pessoa, de modo a atingir valores juridicamente tutelados, cuja mensuração econômica envolve critérios objetivos e subjetivos. 2. A indenização por dano moral revela conteúdo de interesse público, na medida em que encontra ressonância no princípio da dignidade da pessoa humana, sob a perspectiva de uma sociedade que se pretende livre, justa e solidária (CF, arts. 1º, III, e 3º, I). 3. A dosimetria do -quantum- indenizatório guarda relação direta com a existência e a extensão do dano sofrido, o grau de culpa e a perspectiva econômica do autor e da vítima, razão pela qual a atuação dolosa do agente reclama reparação econômica mais severa, ao passo que a imprudência ou negligência clamam por reprimenda mais branda. 4. Assim, à luz do sistema aberto, cabe ao julgador, atento aos parâmetros relevantes para aferição do valor da indenização por dano moral, fixar o -quantum- indenizatório com prudência, bom senso e razoabilidade, sob pena de afronta ao princípio da restauração justa e proporcional. Agravo de instrumento conhecido e desprovido.“ (grifo nosso)
Outro ponto acerca do tema estudado e também digno de nota é a configuração do dano moral coletivo, assim entendido pelo Tribunal Superior do Trabalho em Recurso de Revista interposto pela Petróleo do Brasil S.A.[lxxxvi]: “RECURSO DE REVISTA. DANO MORAL COLETIVO. NÃO CONFIGURAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO. O dano moralcoletivo, na esfera laborativa, deve ser entendido como uma lesão injusta que extrapola a esfera trabalhista individual, atentando-se contra direitos transindividuais de natureza coletiva. A conduta ilícita a configurar o dano moral coletivo deve, portanto, repercutir não só sobre os trabalhadores diretamente envolvidos, mas também sobre a coletividade. Dentro desse contexto, verifica-se que, na hipótese dos autos, não existe dano moral coletivo a ser ressarcido. Como bem sinalizado pelo Regional, não se constata nos autos que a ilicitude praticada pela Reclamada – não quitação de créditos trabalhista – tenha extrapolado a esfera individual dos envolvidos e repercutido nos interesses extrapatrimoniais da coletividade. Ademais, se considerarmos que toda inadimplência trabalhista, seja pela não concessão de férias, de décimo terceiros ou pela retenção de salários, por exemplo, dá ensejo à reparação por dano moral coletivo, estaremos, na verdade, incentivando a famigerada -indústria do dano moral-, o que deve ser coibido pelo julgador. Recurso de Revista não conhecido.” (grifo nosso)
Matéria bastante discutida repousa na competência do Ministério Público do Trabalho para ajuizar ação civil pública objetivando coibir condutas que tipifiquem assédio moral. Consoante o disposto no art. 129, III, da CF, são funções institucionais do Ministério Público, promover a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.
Em assim sendo, por meio de ação civil pública, a pretensão do parquet se refere à defesa do patrimônio público, porquanto, além de pretender tutelar a saúde psicológica dos trabalhadores, em face da prática do assédio moral promovida por entidade da Administração Pública a empregados públicos, o ambiente de trabalho, como um todo, poderá ser afetado, deixando de ser um local de trabalho adequado e equilibrado.
Dessa forma, tendo em vista a preservação dos direitos difusos da coletividade, ao Ministério Público cabe a defesa da ordem jurídica e dos interesses sociais e individuais homogêneos, sendo legítimo, portanto, para ajuizar semelhante ação civil pública. Não foi outra a manifestação do Tribunal Superior do Trabalho em Recurso de Revista interposto pela PETROBRAS S.A.[lxxxvii]: “RECURSOS DE REVISTA INTERPOSTOS PELA PETROBRAS – PETRÓLEO BRASILEIRO S.A. E PELA MARÍTIMA PETRÓLEO E ENGENHARIA LTDA. TEMA COMUM (ANÁLISE CONJUNTA). ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. A defesa dos direitos individuais homogêneos, que são aqueles que decorrem de origem comum, pode ser feita a título coletivo, devendo ser registrado que o STF, no RE 163.231-SP, considerou que os direitos individuais homogêneos são uma espécie de direito coletivo, porque -são relativos a grupos, categorias ou classes de pessoas, que conquanto digam respeito às pessoas isoladamente, não se classificam como direitos individuais para o fim de ser vedada a sua defesa em ação civil pública, porque sua concepção finalística destina-se á proteção desses grupos, categorias ou classe de pessoas-. Recursos de revista de que não se conhece. RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA MARÍTIMA PETRÓLEO E ENGENHARIA. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. INDENIZAÇÃO POR DANO GENÉRICO À SOCIEDADE. A matéria já se encontra pacificada na Corte, com a edição da Súmula nº 392. A indenização pleiteada pelo Ministério Público pelo dano causado aos trabalhadores decorre da relação de emprego. Assim, ainda que o Ministério Público entenda que esse dano atingiu, também, o interesse de todos os trabalhadores da sociedade, esse entendimento não é suficiente para afastar a competência da Justiça do Trabalho, pois a origem do dano foi a relação de trabalho existente entre os empregados listados na ação civil pública e a empregadora. Recurso de revista de que não se conhece. (…) Por último, o rol do artigo 1º da Lei nº 7.347/85 não é numerus clausus, afirmação corroborada pelo disposto nos artigos 21 da Lei nº 7.347/85, c/c o art. 6º, VII, a e d, da Lei Complementar nº 75/93, que diz que compete ao Ministério Público ajuizar ação civil pública para proteção dos direitos constitucionais e de outros interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos. Nesse contexto, a situação dos autos encontra respaldo na Lei nºs 7.345/85 e na Lei Complementar nº 75/93. Ante o exposto, não conheço do recurso de revista da reclamada Marítima Petróleo e Engenharia Ltda. Recurso de que não se conhece. RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA PETROBRAS – PETRÓLEO BRASILEIRO S.A. PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO DO TRT POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. Não procedem as alegações da recorrente, pois o Tribunal Regional expôs os motivos que determinaram a manutenção da sentença quanto à responsabilidade subsidiária, até mesmo sobre a aplicação da Súmula nº 3331, IV, do TST. Incólumes os artigos 832 da CLT, e 93, IX, da Constituição. Recurso de revista que não se conhece. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. TOMADORA DOS SERVIÇOS. A decisão recorrida, de que a tomadora de serviços deve responder subsidiariamente pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas, está em consonância com a atual redação da Súmula nº 331, IV, do TST. Recurso de revista de que não se conhece.” (grifo nosso)
Conclusões
Restou assentado que assédio moral é toda e qualquer conduta abusiva que, intencional e frequentemente, fira a dignidade e a integridade física ou psíquica de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o ambiente de trabalho.
Trata-se, com efeito, de um conjunto de condutas, em última análise, diretamente lesivas ao princípio da dignidade humana, tão caro ao Estado Democrático de Direito, eis que já consagrado como seu fundamento pela Constituição de 1988.
Procurou-se, por meio deste singelo trabalho demonstrar que as resultantes de condutas caracterizadoras do assédio moral também são encontradiças no ambiente de trabalho do serviço público, figurando o empregado público, destarte, ora como agente, ora como vítima.
Os sindicatos, a comunidade médica e os psicólogos tem desenvolvido pesquisas que constatam os desdobramentos físicos e psicológicos danosos à saúde do empregado. Cabe ao Estado empregador, em razão de sua responsabilidade constitucional, tratar a questão com a seriedade que merece, identificando os agressores, ouvindo testemunhas e, sobretudo, apurando as responsabilidades, sem menosprezar a importância da adoção de medidas atinentes à organização do ambiente de trabalho e destinadas à prevenção do assédio moral, pois, sem dúvida, será menos oneroso antecipar-se ao dano e corrigir um servidor infrator que indenizar, tratar e aposentar precocemente o outro servidor-vítima.
Urge, portanto, que a legislação pátria, acompanhando a evolução das relações de trabalho, regulamente a proibição do assédio moral em face de todo e qualquer empregado, conferindo concretude ao núcleo essencial dos direitos fundamentais do trabalhador assegurados pela Constituição Cidadã.
Informações Sobre o Autor
Emilia Munhoz Gaiva
Procuradora do Estado de Goiás