Auxílio-doença e sua relação com o direito do trabalho

Resumo: Artigo intitulado “Auxílio-Doença Previdenciário e sua relação com o Direito do Trabalho”. Trata-se de análise do Auxílio-Doença que é um direito garantido aos trabalhadores celetistas que ficarem mais de 15 dias incapacitados para suas atividades laborativas. O recebimento do auxílio-doença pelo segurado do RGPS exige a carência de doze contribuições mensais à Previdência Social. Esta prerrogativa configura prejuízo aos trabalhadores que adquirirem doenças comuns e fiquem impossibilitados para o trabalho sem ter a carência exigida. Propõe-se aqui a possibilidade de inclusão de doenças comuns ao rol que garante o auxílio doença sem carência.

Palavras-chave: Trabalhador, auxílio-doença, carência.

Sumário: 1 Introdução;  2 Auxílio-doença; 3 Acidente do Trabalho; 4 Alta programada e seus reflexos; 5 Carência do Auxílio-Doença e seus reflexos prejudiciais ao trabalhador; 6 Considerações finais; Referência

1 INTRODUÇÃO

A presente dissertação tem por finalidade abordar o auxílio-doença, benefício concedido pela Previdência Social, bem como a carência a ser cumprida para o recebimento do beneficio, tendo como escopo o Regime Geral da Previdência Social que ampara os trabalhadores celetistas.

Para isso, procurou-se apresentar contornos legais da matéria, assim como o posicionamento da Jurisprudência e da Doutrina sobre aspetos controvertidos a ela relacionados.

A investigação do tema partiu da análise das noções gerais a respeito do Auxílio Doença, enfatizando-se o Regime Geral de Previdência Social.

O Auxílio Doença Previdenciário é direito garantido aos trabalhadores que ficarem mais de 15 dias incapacitados para suas atividades laborativas. Será analisada a carência de 12 meses do auxilio doença, lapso temporal que deixa o trabalhador do Regime Geral de Previdência Social sem garantia de remuneração quanto às doenças que pode adquirir durante este tempo de 12 meses.

Finalmente, discorrer-se-á sobre a carência do auxílio doença e seus reflexos prejudiciais ao trabalhador. Para ter direito ao recebimento do auxílio doença o segurado do RGPS deverá ter cumprido a carência equivalente a doze contribuições mensais, salvo se a causa for de acidente de qualquer natureza ou causa, ou de algumas das doenças especificadas na Portaria n. 2.998, de 23.8.2001, quando a carência não é exigida. Esta prerrogativa, de 12 contribuições configura prejuízo aos trabalhadores que adquirirem doenças comuns e fiquem impossibilitados para o trabalho sem ter a carência exigida.

Daí justificar-se uma análise específica sobre a matéria.

2 AUXÍLIO-DOENÇA

A Previdência Social brasileira compreende os regimes básicos e os regimes complementares. Os regimes básicos são o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e os Regimes Próprios de Previdência Social.  Os Regimes Próprios de Previdência são relativos aos servidores efetivos da União, dos Estados e de alguns Municípios que o possuem. Alguns agentes públicos podem ser contratados pelo regime de emprego público, o que os vincula, necessariamente, ao Regime Geral de Previdência Social. Caso o ente federativo não possua regime próprio de previdência, como ocorre na maioria dos pequenos municípios, serão todos os servidores, obrigatoriamente, vinculados ao Regime Geral de Previdência Social.

O RGPS é o regime básico de Previdência Social, sendo de aplicação compulsória a todos aqueles que exerçam algum tipo de atividade remunerada exceto se esta atividade já gera filiação a determinado regime próprio de previdência.

Os Regimes de Previdência complementar são facultativos e ninguém pode eximir-se de contribuir para o RGPS ou seu regimeto próprio, alegando já contribuir ao Regime complementar.

O objeto de estudo se limitará ao RGPS, administrado pelo Instituto Nacional do Seguro Social. É responsável pelo atendimento da maioria da população. Este Regime possui diversas prestações que são aposentadorias por idade, invalidez, tempo de contribuição e especial, auxílio doença, acidente e reclusão, salários-família e maternidade, reabilitação profissional, serviço social e pensão por morte.

O auxílio doença é o benefício devido ao segurado da previdência social que ficar incapacitado para o seu trabalho ou para sua atividade habitual, por mais de quinze dias consecutivos. A doença, por si só, não garante o benefício, ela deve deixar o segurando incapacitado para o trabalho. Saliente-se que o auxílio-doença é disponível a todos os segurados, desde que estes cumpram, em regra, a carência de 12 contribuições mensais.

Kertzman entende que:

“O auxilio doença é o beneficio devido ao segurado que ficar incapacitado para o seu trabalho ou para atividade laboral, por mais de 15 dias consecutivos. [(…] O auxilio doença pode ser de dois tipos: a) auxilio doença acidentário – quando decorrente de acidentes do trabalho e seus equiparados, doenças profissionais e doenças do trabalho; b) auxilio doença ordinário –  em relação aos demais casos e os de origem não ocupacional”. (IVAN KERTZMAN, 2011, p. 413-414).

No mesmo sentido, IBRAHIM:

“O auxilio doença é beneficio não programado decorrente de incapacidade temporária do segurado para o seu trabalho habitual. Porém somente será devido se a capacidade for superior a 15 dias consecutivos. (….) Deve-se notar que como regra geral este beneficio possui carência de 12 contribuições mensais. (FABIO ZAMBITTE IBRAHIM, 2008, p. 567)”

A grande diferença entre este benefício e a aposentadoria por invalidez diz respeito, à natureza temporária da incapacidade protegida pelo auxílio-doença, que não existe, em regra, na aposentadoria por invalidez. A aposentadoria por invalidez pode ser reversível, mas a sua concessão exige provável inaptidão do segurado.

O segurado que estiver recebendo auxílio-doença deve ser obrigatoriamente, sob pena de suspensão do benefício, participar de processo de reabilitação previsto e custeado pela Previdência Social, mas não é obrigado a se submeter a tratamento cirúrgico e a transfusão de sangue, pois ninguém pode ser constrangido submeter-se a tratamento com risco de vida. O benefício será suspenso, caso o segurado recuse a participar do tratamento e das perícias médicas provisórias.

Quando o segurado exercer mais de uma atividade e ficar incapacitado para apenas uma delas, caberá auxílio-doença, podendo o valor chegar a ser inferior ao salário mínimo.

A carência é dispensada nos casos de acidente de qualquer natureza, doença profissional ou do trabalho e doenças que estão especificadas em uma lista que é elaborada a cada três anos pelos Ministérios da Saúde e da Previdência Social.

O artigo 151 da Lei 8.213/91 elenca o rol de doenças em que não será exigido carência, dentre elas: tuberculose ativa; hanseníase; alienação mental; neoplasia maligna; cegueira; paralisia irreversível e incapacitante; cardiopatia grave; doença de Parkinson; espondiloartrose anquilosante; nefropatia grave; estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante); síndrome da deficiência imunológica adquirida-Aids; e contaminação por radiação, com base em conclusão da medicina especializada.. Trata-se, portanto, de exceção do sistema a ausência de carência para o deferimento do benefício previdenciário.

Para alguns doutrinadores o auxílio-doença pode ser de dois tipos: Auxílio-doença acidentário, quando decorre de acidentes do trabalho e seus equiparados, doença do profissional e doença do trabalho e Auxílio-doença ordinário ou comum, que se dirige aos demais casos sem origem ocupacional. Cabe ressaltar que somente o auxílio-doença acidentário que gera estabilidade provisória ao empregado de 12 meses, conforme previsto no art. 118 da Lei n ° 8213/91:

“Art. 118. O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente.”

As lides acidentárias são sempre da Justiça dos Estados, enquanto o auxílio-doença comum compete à Justiça Federal.

Cabe ressaltar que não são doenças do trabalho:

a) a doença degenerativa;

b) a inerente a grupo etário;

c) a que não produza incapacidade laborativa;

d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.

A estabilidade de que trata o art. 118 da Lei n°8.213/91 alcançará todas as espécies de acidente de trabalho, incluindo aqueles ocorridos no trajeto do trabalho. Mas há controvérsias quanto a referida estabilidade nos contratos por prazo determinado. Maurício Godinho Delgado admite a excepcional hipótese, e na jurisprudência não já consenso. Vejamos a seguir:

“CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. A fruição de auxílio-doença acidentário suspende a eficácia do contrato de experiência enquanto perdurar o benefício previdenciário, devendo o empregado, após a cessação, cumprir o restante, até o limite legal de noventa dias, não havendo falar em conversão tácita em contrato por prazo indeterminado. O contrato de experiência não comporta também a estabilidade prevista no art. 118 da Lei 8213/91. Nega-se provimento. (…)TRT4, AC 0088900-84.2009.5.04.0202 (RO), Red. João Ghisleni Filho, j. em 04.08.2010

ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ACIDENTE DE TRABALHO. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. A estabilidade prevista no art. 118 da Lei nº. 8.213/91 é compatível com o contrato de trabalho a prazo determinado, devendo este ser prorrogado por força do acidente do trabalho. Desta forma, protege-se o empregado para que tenha recuperação plena após o acidente, privilegiando-se o direito fundamental a dignidade da pessoa humana – art. 1º, inciso III, da Constituição Federal. TRT4, AC 0092200-92.5.04.0351 (RO), Red. André Reverbel Fernandes, j. em 27.10.2010.

“É incompatível com a garantia de emprego a que alude o art. 118 da Lei nº 8.213/91 com o contrato a prazo, notadamente o contrato de experiência, porque a garantia de emprego pressupõe a proteção da continuidade do vínculo de emprego, nos contratos por prazo indeterminado”. TST, E-ED-RR 93566/2003-900-04-00, Rel. Min. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DJ 8.2.2008.”

O auxílio-doença será devido ao segurado empregado, a contar do 16° dia do afastamento da atividade ou a partir da entrada do requerimento, se ultrapassar 30 dias da data do afastamento. Aos demais segurados (empregado doméstico, contribuinte individual, trabalhador avulso, especial e facultativo) o benefício será concedido a contar da data do início da incapacidade ou da data da entrada do requerimento, se entre essas datas decorrerem mais de 30 dias, nos termos do artigo 60 da Lei 8.213/91:

“Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do afastamento da atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz.

§ 1º Quando requerido por segurado afastado da atividade por mais de 30 (trinta) dias, o auxílio-doença será devido a contar da data da entrada do requerimento.”

Para que o benefício seja concedido, o segurado deve passar pela perícia médica do INSS para confirmar a sua doença, eis que para concessão de auxílio-doença é necessária a comprovação da incapacidade, e esta função é de competência privativa do cargo de Perito Médico da Previdência Social e aos cargos de Supervisor Médico Pericial.

O segurado que recebe auxílio-doença é obrigado a submeter-se a exame médico pericial sob pena de suspensão do benefício, bem como participar de processo de reabilitação profissional pela Previdência Social, custeado e prescrito por ela. O segurado está obrigado a participar de tais medidas, mas não é obrigado a se submeter a tratamento cirúrgico e a transfusão de sangue.

Decorre daí, que a lei não prevê um prazo máximo de duração do auxílio-doença, podendo este perdurar quando se tem possibilidade de recuperação ou readaptação mediante reabilitação profissional. Muitos segurados desejam que o benefício auxílio-doença seja convertido em Aposentadoria por Invalidez, mas a conversão implica que se tenha uma inaptidão para o trabalho.

A renda mensal do auxílio-doença é de 91% do salário-de-benefício, calculado a partir da média dos 80% maiores salários-de contribuição, sem a utilização do fator previdenciário.

O empregado que estiver em gozo do auxílio-doença é considerado licenciado e seu contrato de trabalho fica suspenso. Caso a empresa pague a diferença do auxílio-doença e da remuneração que antes era percebida pelo segurado a todos os empregados da empresa, o valor da diferença não será considerado salário-contribuição.

Por fim, o auxílio-doença cessa quando há a recuperação do segurado e sua capacidade laborativa, ou com a transformação em aposentadoria por invalidez ou auxílio-acidente (quando há sequela que implique redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia).

3 ACIDENTE DO TRABALHO

Para Ivan Kertzman acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados especiais, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho. As doenças ocupacionais também se equiparam a acidente do trabalho.

São os acidentes do trabalho por equiparação tratados no art. 21 da Lei 8.213/91:

I – o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação;

II – o acidente sofrido pelo segurado no local e no horário do trabalho, em consequência de:

a) ato de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho;

b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao trabalho;

c) ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro de trabalho;

d) ato de pessoa privada do uso da razão;

e) desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior;

III – a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no exercício de sua atividade;

IV – o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horário de trabalho:

a) na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa;

b) na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito;

c) em viagem a serviço da empresa, inclusive para estudo quando financiada por esta dentro de seus planos para melhor capacitação da mão-de-obra, independentemente do meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade do segurado;

d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado.

§ 1º Nos períodos destinados a refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este, o empregado é considerado no exercício do trabalho.

§ 2º Não é considerada agravação ou complicação de acidente do trabalho a lesão que, resultante de acidente de outra origem, se associe ou se superponha às consequências do anterior.

A empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador, sendo crime se a empresa deixar de cumprir as normas de segurança e higiene do trabalho.

Não são consideradas doenças do trabalho:

a) doença degenerativa;

b) a inerente a grupo etário;

c) a que não produza incapacidade para o trabalho;

d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.

Várias consequências decorrem do acidente do trabalho, uma delas e a estabilidade provisória introduzida pelo art. 118 da Lei 8.213/91. A Justiça do Trabalho vem reconhecendo o direito aos segurados empregados que tenham sido demitidos nesse período:

“ACIDENTE DO TRABALHO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ART. 118 DA LEI 8.213/91. Caso em que, após a emissão da Comunicação de Acidente do Trabalho pelo sindicato da categoria profissional do reclamante, este gozou regularmente do benefício de auxílio-doença acidentário, inexistindo nos autos qualquer elemento de prova que contrarie a ocorrência do infortúnio. Mantida a sentença que reconheceu o direito do reclamante ao recebimento de indenização relativa ao período da garantia de emprego prevista no artigo 118 da Lei 8.213/91.  TRT4, AC 0096100-42.2009.504.0203 (RO), Red. Wilson Carvalho Dias, j. em 18.11.2010.”

Além da estabilidade vista acima, há outras consequências oriundas da incapacidade do empregado. Como a que vemos prevista no art. 4º, parágrafo único da CLT, que diz que todo o período de afastamento por motivo de acidente do trabalho é considerado na contagem do tempo de serviço, sendo devidos os respectivos depósitos do FGTS (art. 15, §5º, da Lei 8.036/1990). O trabalhador não terá direito a férias o empregado que, no curso do período aquisitivo, tiver percebido da Previdência Social prestações de acidente do trabalho por mais de seis meses, ainda que descontínuos (art. 133, inc. IV, da CLT).

Portanto, nos benefícios relacionados a acidentes do trabalho e doenças ocupacionais, o tempo de serviço é computado para todos os efeitos. Assim é que a tendência da doutrina majoritária considera que, “no acidente do trabalho, até o 15º dia de afastamento, tem-se a hipótese de interrupção do contrato de trabalho; a partir do 16º dia, observa-se uma suspensão sui generis do pacto laboral”. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Ob. cit., p. 68.

Constata-se que não há coordenação entre os órgãos públicos responsáveis pela fiscalização do ambiente do trabalho e os que concedem os benefícios acidentários, pois a Previdência Social concede os benefícios, enquanto o Ministério do Trabalho e Emprego fiscaliza as empresas em desconformidade com normas relativas ao meio ambiente do trabalho. Decorre daí a tentativa de coordenar essas áreas através do NTEP – Nexo técnico epidemiológico previdenciário, previsto no art. 21-A da lei 8.213/91:

“Art. 21-A. A perícia médica do INSS considerará caracterizada a natureza acidentária da incapacidade quando constatar ocorrência de nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade elencada na Classificação Internacional de Doenças – CID, em conformidade com o que dispuser o regulamento.

§ 1o A perícia médica do INSS deixará de aplicar o disposto neste artigo quando demonstrada a inexistência do nexo de que trata o caput deste artigo.

§ 2o A empresa poderá requerer a não aplicação do nexo técnico epidemiológico, de cuja decisão caberá recurso com efeito suspensivo, da empresa ou do segurado, ao Conselho de Recursos da Previdência Social.”

O Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário realiza uma relação entre a atividade econômica da empresa e a doença ocupacional manifestada pelo segurado. Esta medida mostra-se favorável ao trabalhador, pois correlaciona a atividade da empresa e a atividade que motivou a incapacidade. O empregado não pode ser prejudicado diante da inércia da empresa e é responsável pelos riscos de sua atividade econômica. Nesse sentido, foi aprovado o Enunciado 43, na 1a Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho em 23 de Novembro de 2007:

“Acidente de trabalho. Nexo técnico epidemiológico. Presume-se a ocorrência de acidente de trabalho, mesmo sem a emissão da CAT – Comunicação de Acidente de Trabalho, quando houver nexo técnico epidemiológico conforme art. 21-A da Lei 8.213/1991”.

É ainda dever do empregador comunicar à Previdência Social o acidente de trabalho ocorrido com o segurado empregado, exceto o doméstico, e o trabalhador avulso, até o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência, e, em caso de morte, de imediato, à autoridade competente, sob pena de multa. É a CAT – Comunicação de Acidente de Trabalho.

O NTEP permite abandonar o CAT como único instrumento de informação no caso dos acidentes de trabalho. Com isso, verificada a existência do referido nexo técnico epidemiológico, não cabe mais ao empregado provar ou demonstrar que a doença foi produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade, ou que a doença foi adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente.

Presente o nexo técnico epidemiológico, a presunção é de se tratar de doença do trabalho ou profissional.

4 ALTA PROGRAMADA E SEUS REFLEXOS

A perícia médica do INSS é responsável pela verificação da incapacidade laborativa dos segurados da Previdência Social.  O Decreto 3.048/99 nos artigo 78§§ 1° e 2° acrescido pelo Decreto 5. 844, de 13/07/06 estabeleceu a alta programada, que consiste em estabelecer um prazo razoável e suficiente para a recuperação da capacidade para o trabalho do segurando, dispensando assim nova pericia.

Art. 78. O auxílio-doença cessa pela recuperação da capacidade para o trabalho, pela transformação em aposentadoria por invalidez ou auxílio-acidente de qualquer natureza, neste caso se resultar seqüela que implique redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.

§ 1o O INSS poderá estabelecer, mediante avaliação médico-pericial, o prazo que entender suficiente para a recuperação da capacidade para o trabalho do segurado, dispensada nessa hipótese a realização de nova perícia.

§ 2o Caso o prazo concedido para a recuperação se revele insuficiente, o segurado poderá solicitar a realização de nova perícia médica, na forma estabelecida pelo Ministério da Previdência Social”

O objetivo de tal medida é reduzir o número de perícias médicas, já estabelecendo na perícia médica inicial um tempo estipulado em que seria possível a recuperação do segurado.

Para os casos de menor gravidade e para situações que realmente a medicina, aponta com certeza a duração da incapacidade, a medida até pode ser conveniente.

A alta médica programada só pode ser dada por perito médico oficial do INSS, conforme consta em julgado do STJ:

“STJ. Auxílio-doença. Gozo. Perícia médica. Ausência do segurado. Cassação do benefício. Processo administrativo prévio. Obrigatoriedade. Em decisão unânime, a 5ª Turma do STJ entendeu que, para a suspensão do benefício de auxílio-doença, é necessária a instauração de regular procedimento administrativo a fim de evitar atuação arbitrária da Administração. Segundo o relator, Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, o segurado em gozo de auxílio-doença deverá se submeter à inspeção de saúde, que poderá apresentar as seguintes conclusões: continuação das condições geradoras de benefício, permanecendo o seu tratamento e o pagamento; incapacidade de se recuperar para qualquer atividade, com concessão de aposentadoria por invalidez; e habilitação para desempenho da mesma atividade, ou de outra, sem redução da capacidade laborativa, cessando o pagamento do auxílio-doença. “O auxílio-doença somente poderá ser cancelado pelo INSS nessas situações legalmente determinadas. Não estando a hipótese dos autos (ausência do segurado na perícia médica) incluída nesse rol, a decisão de suspensão do benefício deverá ser precedida de regular procedimento administrativo”, afirmou. (Rec. Esp. 1.034.611 – decisão de julho de 2008)”

A solicitação de prorrogação do auxílio doença pode ser solicitada pela internet ou por ligação telefônica. Caso o médico negue a prorrogação, o segurado ainda tem a opção de entrar com o Pedido de Reconsideração. Se esta nova perícia confirmar a capacidade para o trabalho, o segurado ainda tem a opção de dar entrada em recurso que será encaminhado para a Junta de Recursos do Conselho de Recursos da Previdência Social, que dará a decisão final sobre o assunto.

Caso o prazo estabelecido pela perícia for insuficiente o segurado poderá solicitar que seja realizada nova perícia médica. Dessa forma, o benefício é cessado após o prazo estabelecido, sem que realmente o trabalhador tenha recuperado sua capacidade laborativa, medida que prejudica diretamente o trabalhador portador de doenças ocupacionais, o que consequentemente provoca um aumento de demandas judiciais contra o INSS.

5 A CARÊNCIA DO AUXÍLIO DOENÇA E SEUS REFLEXOS PREJUDICIAIS AO TRABALHADOR

Período de carência é o número de contribuições mensais mínimas que o segurado deve fazer para ter direito aos benefícios concedidos pela previdência social. Nem todos os benefícios têm carência. A carência funciona como um pré-requisito à concessão de benefício.

Balera (2003 p. 64) ao tratar de carência defende a extinção deste instituto e que deve ser repensado à luz dos ideais da Constituição de 1988, que visa alcançar o bem-estar e justiça sociais.

Segundo Daniel Machado da Rocha a carência pode ser (THIESEN, 1999, p. 64):

“Neste comando legal jaz uma norma protetiva do sistema impondo um período mínimo durante o qual o obreiro, cuja qualidade de segurado foi adquirida, não poderá usufruir de determinados benefícios, a fim de se preservar o sistema de previdência social, essencialmente contributivo, daqueles que só acorrem a ele quando atingidos pelo risco social.”

A carência exigida para o recebimento do auxílio-doença é de 12 meses, conforme exposto anteriormente. Interessante lacuna se forma, à situação do trabalhador que é acometido de doença que deixa incapaz o trabalhador, que não cumpriu a carência exigida em lei. Situação esta bem comum e que não possuem em nosso ordenamento jurídico solução satisfatória.

Como satisfazer a garantia constitucional prevista do artigo 201 da CF( de cobrir evento de doenças) rente ao previsto no artigo 59 da Lei 8.213/91?

O lapso temporal de carência não se justifica para esta espécie de benefício, que incapacita o trabalhador temporariamente, porém, muitas vezes por longos períodos, causando-lhe sérios problemas financeiros e até mesmo de subsistência indo totalmente contra o princípio da universalidade da cobertura previsto no art. 194, parágrafo único, inciso I, da Constituição:

“Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:

I – universalidade da cobertura e do atendimento;”

Para Castro e Lazzari (2009, p.635) o auxílio doença não é:

“Um benefício programado, como são as aposentadorias voluntárias – podem acontecer a qualquer tempo na vida do trabalhador. Se cabe à Previdência Social, e somente a ela, a cobertura dos eventos elencados no art. 201 da Constituição, dentre os quais a incapacidade decorrente de doença, não é razoável que se faça qualquer discriminação por conta do número de contribuições vertidas, ainda mais se considerado o argumento que normalmente é lançado para justificar tal prazo carencial –  a existência de fraudes. Ora, cabe ao Estado coibir as fraudes, e não desproteger os cidadãos de bens.”

Para evitar fraudes, o artigo 59, parágrafo único, da Lei 8.213/91 determina que não é devido auxílio doença para quem já se filiar ao RGPS sendo portador de doença incapacitante para o trabalho, exceto se a incapacidade for decorrente de progressão ou agravamento da doença ou lesão.

Ressalte-se que o artigo 476 da CLT é expresso no sentido de que no curso do auxílio doença o empregado é considerado em licença não remunerada, ou seja, o contrato está suspenso.

Enquanto perdurar a suspensão do contrato de trabalho o empregado estará em um limbo jurídico, eis que a lei não obriga nem o empregador, tampouco o Estado, a lhe pagar qualquer verba pecuniária.

Algumas propostas parecem satisfatórias com o objetivo de diminuir os prejuízos causados ao trabalhador durante esse lapso temporal de 12 meses iniciais de sua contribuição, onde o trabalhador não se encontra amparado pela legislação.

Uma opção seria responsabilizar o empregador durante o período de carência (12 meses) a pagar o salário de seu empregado, caso fosse acometido de alguma doença que o deixar incapaz para o trabalho. Tal medida não encontra amparo legal, pois a partir do 16° dia de trabalho o contrato de trabalho é suspenso.

A melhor saída seria a alteração do artigo 25, inciso I, da Lei 8.213 de 1991, diminuindo o tempo de carência ou excluir esta exigência assim como funciona em caso de acidentes do trabalho e de doenças elencadas na lei.

Alguns projetos de lei já existem nesse sentido, como o Projeto de Lei n° 2606/00 proposto pela Deputada Federal Rita de Cássia Camata do PSDB/ES que trata da alteração dos períodos de carência de contribuição previdenciária para aposentadoria por invalidez, auxílio-doença e salário maternidade, propondo que a carência seja de 6 contribuições. Infelizmente, tal projeto foi arquivado.

A alteração da Lei 8.213/91 seria a solução mais adequada, visto que já houvera diversos projetos visando-lhe a alteração. Para que a Lei de Benefícios possa atender às expectativas de cobertura das diversas formas hoje socialmente adotadas para composição de grupo familiar, trazendo à realidade a concessão da cobertura social a interpretação da lei de benefícios deve ser real, humana e socialmente útil, com base nos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade, da proteção e da solidariedade social.

O princípio da legalidade está configurado numa interação com os demais princípios do Direito e com os direitos fundamentais. Por isso, na aplicação das normas relativas ao Seguro Social, devem-se buscar os fins sociais aos quais elas se dirigem diante da proteção ao indivíduo, com vistas à concretização dos seus direitos sociais fundamentais.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Lei nº 8.213/91 desconsidera totalmente o aspecto constitucional de universalidade da cobertura do atendimento ao exigir a carência de 12 meses para a concessão de auxílio-doença.

Por tamanha omissão da Lei de Benefícios, entende-se, assim como também advogam Castro e Lazzari (2009), que este lapso de carência não se justifica para esta espécie de benefício pois causa muitos prejuízos ao trabalhador.

O que se busca não é somente a alteração da Lei Previdenciária diminuindo o tempo de carência. O que se pretende zelar é a universidade de cobertura aos que necessitam da previdência social, quando estão incapacitados para o trabalho.

Desse modo, deve ser emprestada interpretação de acordo com a Constituição Federal, levando-se em consideração os princípios e direitos fundamentais constantes na Lei Maior, valores nucleares de todo ordenamento jurídico, como forma de valorização profissional, pois é dever do Estado promover o desenvolvimento pessoal dos cidadãos e a sua qualificação profissional, buscando a igualdade e a justiça social.

A alteração do art. 25, inciso I da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, seria a solução mais adequada, visto que já houvera diversos projetos visando-lhe a alteração.

Como solução imediata, é necessário que o lapso temporal da carência sejam revistos e atualizados, para que a Lei de Benefícios possa atender às expectativas de cobertura das diversas formas hoje socialmente adotadas, trazendo à realidade a concessão da cobertura social. A interpretação da lei de benefícios deve ser real, humana e socialmente útil, com base nos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade, da proteção e da solidariedade social.

 

Referências:
BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1988.
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 7. ed. São Paulo: LTr, 2006, p. 98
______. Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999. Aprova o Regulamento da Previdência Social, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 12 maio, 1999. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto/D3048.htm >Acesso em: 12 Out. 2011.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 15 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2010
KERTZMAN, Ivan. Curso Prático de Direito Previdênciário. 8 ed. Bahia: Podivm, 2011.
______. Lei 8213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de
Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. São Paulo, 2006.
THIESEN, 1999, p. 64 Ana Maria Wickert; Vladimir Passos de Freitas. Direito previdenciário: aspectos materiais, processuais e penais. 2. Ed., Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999, p. 64

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Aline Késsia Gonçalves da Cruz

 

Bacharel em Direito, pela Universidade Federal do Maranhão, Advogada pela Seccional-OAB/MA

 


 

logo Âmbito Jurídico