Benefício assistencial da Lei 8.742/93 e a inaplicação da Súmula 111 do STJ

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Resumo: Direcionado para a prática forense, mas não menos acadêmico, trata este trabalho a respeito da aplicação da súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça em causas assistenciais da Lei 8.742/93, diante de sua redação prevendo apenas a incidência previdenciária.

Palavras-chave: Processo Previdenciário Honorários Sucumbência Assistência.

Resumen: Direccionado a la práctica forense, pero no menos académico, trata este trabajo a respecto de la aplicación del juzgamiento 111 del Superior Tribunal del Justicia en casos asistenciales de la Ley 8.742/93, delante de su redacción previendo apenas la incidencia en la previdencia.

Palabras-Clave: Proceso Previdencia Honorarios Sucumbencial Asistencia.

Sumário: Introdução; 1. Breve histórico sobre a verba honorária; 2. Da atual formatação das verbas sucumbenciais; 3. Assistência x Previdência; 4. Da súmula nas causas assistenciais; Conclusão.

Introdução

O presente artigo versa sobre nova celeuma que se postará perante os Tribunais para prestação jurisdicional de natureza acessória[1]. Trata-se da diminuição drástica das verbas alimentares dos advogados com a aplicação de limitador temporal dos honorários advocatícios, entendido ainda, como forma de salvaguardar as prerrogativas mínimas da classe. O esboço não pretende uma sucessiva e imediata modificação de julgados, eis que não é matéria tranquila, mas, ao contrário, que paulatinamente os advogados requeiram e pré-questionem a matéria em recurso nos Tribunais Regionais, com fins de modificação posterior do que atualmente é remansoso e incontroverso.

Sinteticamente a situação atine a aplicação da Súmula 111 do STJ, a qual limita a incidência temporal dos honorários advocatícios de sucumbência até a sentença a quo, ou quando esta for improcedente, a uma possível reforma nos Tribunais, para os casos previdenciários. Realizada esta apresentação cabe agora justificar a não aplicação da retro mencionada súmula, em específico para os casos de benefícios de prestação continuada da lei 8.742/93, uma vez não se qualificarem como previdenciários, mas, de outra banda, como assistenciais.

1. Breve histórico sobre a verba honorária.

Em sucinto histórico, cabe consignar a respeito da verba de sucumbência no processo civil (sendo que a espécie previdenciária se utiliza do CPC para tramitação). Não se pode esquecer que, o trâmite processual pode ser pela competência delegada Constitucional ou pelos Juízos Federais, tanto nos Juizados Especiais Federais, como nas Varas Comuns.

O código processual brasileiro expressamente aderiu ao princípio do sucumbimento, como na Exposição de Motivos declarou o Min. Alfredo Buzaid, “pelo qual o vencido responde por custas e honorários advocatícios em benefício do vencedor”.[2] Neste ínterim, disciplinou o art. 20 do CPC em termos que se avizinham ao retro escrito. Possui ainda acepção de retribuição aos serviços prestados pelo profissional.[3] Chiovenda escreveu como sendo “fato objetivo da derrota”.[4] E continua em seguida:

“[…] e a justificação deste instituto está em que a atuação da lei não deve representar uma diminuição patrimonial para a parte a cujo favor se efetiva; por ser de interesse do Estado que o emprego do processo não se resolva em prejuízo de quem te razão e por ser, de outro turno, que os direito tenham um valor tanto quanto possível nítido e constante.”[5]

Ademais, honorário provém de honra (da época das ações honorárias do direito romano); é, pois, como uma verba pela honra e boa atuação do advogado do vencedor, não em detrimento do trabalho do advogado adverso, mas por defender com precisão o direito (o interesse) da parte que o contratou. Cabe destacar que no CPC/39, em sua redação originária, não existia a previsão de ônus sucumbencial quanto aos honorários advocatícios à parte contrária. O que se vislumbrava na época, era o ressarcimento por parte do perdedor processual, das taxas e despesas judiciárias, como conclusão direta de evitar prejuízo ao Estado, monopolista da prestação jurisdicional, que era e, ainda é, de elevadas cifras.

Em especial, deve se verificar os art. 53 e seguintes do Dec-Lei 1.608/39, que disciplinava custas e despesas e, quem arcaria com as mesmas ao final. O art. 59 da mesma legislação adjetiva prescrevia de forma clara que apenas as despesas do processo seriam pagas pelo vencido, bem como, o art. 61 estampava a pena ao vencido, que seria atingido de modo imediato no processo, não podendo falar nos autos enquanto inadimplente com custas.

O legislador no ano de 1965 verificou que não bastava o ressarcimento de custas pelo perdedor, ao Estado, pois, o vencedor também estava obrigado, por inadimplemento do outro, a altas cifras com advogado particular. Conferiu, então, nova redação ao art. 65 do CPC de 1939, nos termos que “a sentença final na causa condenará a parte vencida ao pagamento dos honorários do advogado da parte vencedora”.

Assim, no contexto explanado por Chiovenda, estava-se reparando o patrimônio do vencedor que teve gastos ao ingressar judicialmente para receber o que lhe era devido.[6] O atual CPC, por sua vez, diante da praxe forense, corrigiu (o que antes havia sido tardiamente realizado, em 1965 – L. 4.632). Assim ver-se-á nas razões próximas.

2. Da atual formatação das verbas sucumbenciais

O Código adjetivo civil hodierno, não apenas ratificou a idéia da legislação de 1965, como ainda taxou piso e teto de valores a serem arbitrados, entre 10% e 20% sobre o valor da condenação (art. 20, § 3º). Ressalvas sucedem, por obviedades práticas (levadas à legislação no § 4º do mesmo artigo) nos casos em que não houver condenação, a causa for de pequeno valor ou ser este inestimável, assim como, se for vencida a Fazenda Pública; nestas situações previstas na legislação processual, o juiz fixará equitativamente os honorários de sucumbência (v.g. investigação de paternidade, nulidade de ato administrativo, ações previdenciárias). Veja bem que, o legislador não informou a equanimidade inferior ou superior aos limites do § 3º, deixando a norma ao alvedrio do Estado-juízo, representado pelos magistrados.

Com calco no § 4º do art. 20 do CPC, as condenações da Fazenda Pública (extensíveis ao INSS – autarquia previdenciária) começaram a sofrer drásticas diminuições, chegando-se até a edição (e pacificação) da Súmula 111 do STJ, com a redação hodierna, ora transcrita: “STJ Súmula nº 111 Honorários Advocatícios – Ações Previdenciárias – Prestações VincendasOs honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre prestações vencidas após a sentença”.[7] [8]

A situação que se passa a discutir cinge apenas ao verbete da Súmula 111, estreitados, portanto, os temas sobre honorários a tais casos. Até os anos 2000, a regra era a incidência de honorários de sucumbência de 20% sobre total da condenação contra o INSS. Começou-se então, uma leve derrubada das verbas, escorrendo este valor para 15% ou 10% (ainda dentro dos parâmetros do art. 20, § 3º) sobre o total da condenação.

A posição, que já não era tão confortável, foi talhada de vez, quando, em 2006 a malfadada Súm. 111 reduziu a incidência dos honorários até a prolação da sentença. Ocorre que, além disso, a fixação há tempos, não ultrapassava os 10%, o que, com a limitação temporal vinculada à sentença, por determinação da súmula, acaba tornando os honorários menores do que 10% da condenação. Todavia, é crível a situação, pois existe a permissão da fixação equitativa do juiz, como discrimina o alhures citado § 4º.

Em cognição acurada da súmula do STJ, vê-se, entretanto, que sua aplicabilidade reserva-se aos feitos previdenciários. Neste ponto jaz a dogmática-exegética asseverada no artigo. Decorre que os benefícios da Lei Orgânica da Assistência Social são de estereótipo assistencial, não se confundindo com o sistema previdenciário. Ambos apenas se confundem quanto à entidade governamental que efetua os procedimentos para a concessão do benefício, no caso o INSS.

3. Assistência x Previdência

O sistema Constitucional da Seguridade Social, como sabido, engloba os ‘sub-sistemas’ da saúde, assistência e previdência. Neste patamar, cada um é exercido com plataforma própria (ou deveria ser); porém, a assistência social executa uma gama mínima de serviços (se comparado com os demais) e, por isso, veio a ser anexada ao sistema burocrático da previdência (INSS). No entanto, é necessário ter em mente que nada mais é do que uma forma de economia administrativa das receitas públicas.[9]

Wladimir N. Martinez impõe que “são duas técnicas distintas e inconfundíveis, cujos traços marcantes carecem ser permanentemente avultados”.[10]

Em epítome, diz-se que a autarquia previdenciária abarca a administração do sub-sistema assistencial, mas nada além disso, pois, as verbas para manutenção dos beneplácitos por esta última concedidos, advém do cofre único da seguridade (saúde, assistência e previdência) e não das contribuições especiais ao seguro social. Com esta breve digressão do assunto principal, fica demonstrada a separação dos tipos de benefício. Subjaz entendimento nítido, que se ratifica: a súmula 111 do STJ apenas incide sobre os processos previdenciários e, numa averiguação técnica, não pode confundir-se com as ações nas quais se requer benefícios assistenciais.

Não obstante, para certificar a flagrante infungibilidade das espécies, Martinez destaca que “como instituições historicamente diferenciadas, podem ser definidas igualmente como técnicas protetivas, a primeira alcançando os segurados, contribuintes obrigatórios ou facultativos e a segunda, os assistidos, pessoa carentes de recursos mínimos para sua subsistência”.[11]

4. Da súmula nas causas assistenciais

Não se confundindo no tópico retro, idêntica análise provém quanto a aplicação do verbete sumular do STJ, podendo, por expressa menção da própria 3ª Seção do Tribunal da Cidadania, incidir apenas nos processos previdenciários; jamais, portanto, até modificação ou novo sumulado, sobre as verbas honorários sucumbenciais dos processos de benefício assistencial, nos quais o INSS figura apenas como agente incumbido da administração da esfera (e por isso legitimo ad causam) tanto previdenciária como assistenciária.

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Além da desvinculação das matérias, do aviltamento dos honorários, outra situação que se faz presente no interior das questões de benefícios assistenciais continuados, é a situação de miserabilidade do requerente.[12] Logo, os prejuízos para a parte são muito mais gravosos do que para uma pessoa que está buscando, por exemplo, sua aposentadoria por idade, ainda operária. O requerente de LOAS possui fragilidade social exacerbada, e neste entender, o pagamento de 20% de honorários contratuais para o advogado, por vezes, pode-lhe causar ainda mais prejuízos.

Com a aplicação da Súm. 111 do STJ nestes casos (da LOAS), o advogado já sabe que, no fim, seus ‘honorários processuais’ serão impreterivelmente diminuídos, e, diante de tal realidade, aumenta os honorários contratuais para compensar. O prejuízo pelos atos lesivos da administração autárquica respinga, inexoravelmente, na parte requerente da benesse assistencial, com a conivência, ademais, da inapropriada aplicação da malograda súmula 111 nos casos extra-previdenciárias. Observando-se que não se pode imputar qualquer forma de má-fé ao advogado, eis que ele, como trabalhador, igualmente necessita das verbas honorárias para sobreviver, tanto que são consideradas alimentares.

Conclusão

Resta conclusivamente, deixar perpetuado, que a aplicação da súmula 111 do STJ deve ser afastada dos processos judiciais que possuam por escopo a concessão (ou restabelecimento) dos benefícios assistenciais de prestação continuada da lei 8.742/93, a conhecida Lei Orgânica da Assistência Social.

Seja pela exegese da súmula, pelo fim precípuo da mesma, bem como, do esboço histórico-social no corpo deste artigo apresentado, não se pode admitir a manutenção da incidência remansosa do verbete em casos de benefícios assistenciários; mas, tão-somente, nas causas previdenciárias.

Referências:
AMARAL, Moacyr Santos. Primeiras linhas de direito processual civil. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 1998, v. 3.
BRASIL. Constituição Federal, código civil, código de processo civil / organizador Yussef Said Cahali. Obra coletiva da autoria da Editora Revista dos Tribunais, com coordenação de Giselle de Melo Braga Tapai. 5. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.
MARTINEZ, Wladimir Novaes. Princípios de direito previdenciário. 4. ed. São Paulo: LTr, 2001.
MICHAELIS. Dicionário prático da língua portuguesa. 2011. Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=honorário. Acesso em 22 dez. 2011.
STJ. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 111. Órgão Julgador: 3. seção. Publicação 04 out. 2006. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/sumulas/doc.jsp?livre=111&&b=SUMU&p=true&t=&l=10&i=1. Acesso em 23 dez. 2011.

Notas:
[1] AMARAL, Moacyr Santos. Primeiras linhas de direito processual civil. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 34. Explica o autor que “Aos efeitos declaratório, condenatório ou constitutivo, chamados efeitos principais das sentenças, seguem-se outros, que lhes são acessórios” e, ainda que “surgem tais efeitos, automaticamente, por força de lei, como decorrência do efeito principal”.
[2] BRASIL. Exposição de motivos do Código de Processo Civil. Obra coletiva da Ed. Revista dos Tribunais. 5. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003, p. 774.
[3] MICHAELIS. Dicionário on-line. Pesquisa no site http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=honorário. Acesso em 22 dez. 2011.
[4] BRASIL, op. cit., p. 774.
[5] Id.
[6] Vide texto da exposição de motivos da atual legislação processual civil brasileira, consoante nota acima.
[7] STJ. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 111. Órgão Julgador: 3. seção. Publicação 04 out. 2006. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/sumulas/doc.jsp?livre=111&&b=SUMU&p=true&t=&l=10&i=1. Acesso em 23 dez. 2011, texto digital.
[8] Id., texto digital. A redação anterior da Súm 111 do STJ, de 13 de outubro de 1994, com formatação um pouco diversa, já iniciava, de modo singelo, a aviltar os honorários de sucumbência, com supedâneo ainda, na vigência da lei 8.952/94. Após, com a modificação de 2006, na atual redação, torna os honorários sucumbenciais em ações previdenciárias, por inúmeras vezes, verbas irrisórias.
[9] [n.a] Não compensaria constituir uma autarquia federal tão somente para a manutenção do sistema assistencial, uma vez que procede basicamente a concessão de benefício de prestação continuada para o idoso e para o deficiente, sendo que, as várias outras prestações (como bolsa família, bolsa escola etc.) são descentralizados para competências municipais, quanto a administração, fiscalização. Uma hipotética autarquia assistencial geraria os mesmos custos logísticos que a autarquia previdenciária, mas com desiderato muito mais estreito.
[10] MARTINEZ, Wladimir Novaes. Princípios de direito previdenciário. 4. ed. São Paulo: LTr, 2001, p. 390-391.
[11] Id.
[12] [n.a] É imposição da lei e entendimento jurisprudencial, que para fazer jus a qualquer benefício previsto na LOAS (Lei 8.742/93) a parte deve estar em situação objetiva de carência (renda menor que ¼) ou ainda, provar a fragilidade social subjetiva, caso a caso, sem a medida objetiva que presume a miséria.


Informações Sobre o Autor

Daniel Angelo Passaia

Advogado. Especializando em Direito Previdenciário e, ainda, em Direito Processual Civil Moderno


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