A Tipicidade dos efeitos jurídicos dos atos concessivos de aposentadoria, reforma e pensão

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Resumo: O presente artigo consiste em elucidar dúvidas a respeito da tipicidade dos efeitos jurídicos dos atos de concessão de aposentadoria, reforma e pensão, pois a única condição concebível para que esses atos fossem complexos e produzissem efeitos antes dos seus aperfeiçoamentos, com a homologação dos registros pelo Tribunal de Contas, seria se fossem atípicos, uma vez que os atos complexos, essencialmente, só produzem efeitos depois de aperfeiçoados, com a conjugação de todas as vontades que participam de suas formações ou existências.

Palavras-chave: Tipicidade. Atos concessivos. Aposentadoria, reforma e pensão.

Abstract: The present paper aims at clarifying doubts on the typical characteristics of the legal effects of the concession of retirement, reform and pension, for the sole conceivable condition in order those acts were complex and produced effects before their improvements when there is the approval of the registers by the Audit Office, would be if they were atypical. Thus the complex acts only produce, essencially, effects after their improvements together with the conjugation of all the wishes which take part of their formations or existences.

Keywords: Typical Characteristics. Concessional acts. Retirement, reform and pension.

Sumário: Introdução. 1 O Tribunal de Contas e os atos concessivos de aposentadoria, reforma e pensão. 2 O Supremo Tribunal Federal e os atos concessivos de aposentadoria, reforma e pensão. 3 Da formação e efeitos do ato administrativo. 4 Da tipicidade dos efeitos jurídicos dos atos concessivos de aposentadoria, reforma e pensão e suas naturezas jurídicas. 5 Conclusão. Referências.   

Introdução

O objetivo deste artigo é demonstrar, fundamentado em doutrinas autorizadas, que, independentemente da tipicidade dos efeitos iniciais dos atos concessivos de aposentadoria, reforma ou pensão, estes configuram atos compostos, e não atos complexos.

1 O Tribunal de Contas e os atos concessivos de aposentadoria, reforma e pensão

O Tribunal de Contas, no exercício do controle externo, tem a competência constitucional (artigo 71, inciso III) de apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos administrativos de admissão ou investidura de pessoal, aposentadoria, reforma e pensão. Assim, deduz-se do texto constitucional que tais atos já existem ou foram concebidos antes do pronunciamento dessa Corte de Controle, até porque não se valida ou invalida o que não existe.[1]

Consequentemente, se já existem, não haverá que se falar da participação do Tribunal de Contas nas suas formações ou existências. A sua apreciação, verificando a legalidade ou validade dos atos administrativos de concessão dos benefícios previdenciários, como aposentadoria, reforma e pensão, praticados pela Administração Pública, tem natureza meramente declaratória, e não constitutiva desses atos. In Verbis:

“EMENTA: RECURSO ESPECIAL. ANÁLISE DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL. DESCABIMENTO. REVISÃO DO ATO DE APOSENTADORIA. DECADÊNCIA. OCORRÊNCIA.

1. Não é possível examinar violação a dispositivos da CF, ainda que para fins de prequestionamento sob pena de usurpar a competência do STF.

2. O STJ já decidiu que a decisão do Tribunal de Contas, no que toca à legalidade do ato de aposentadoria de servidores públicos, tem natureza jurídica meramente declaratória, e não constitutiva do ato referido. Precedente 

3. A nova situação jurídica surge com a própria publicação do ato de aposentadoria, do que decorre a sua imediata, e não obstante precária, execução, nos termos em que foi concedida. Consequentemente, a partir deste momento inicia o prazo decadencial previsto no art. 54 da Lei 9.784/99. 

4. Agravo regimental improvido”. (BRASIL, 2010).  

Por outro lado, a manifestação inicial da Administração Pública, nas concessões desses benefícios, constituirá um ato perfeito, de eficácia condicionada à aprovação ou ratificação pelo Tribunal de Contas, sendo o pronunciamento desta Corte ato complementar de controle de legalidade, de natureza homologatória ou suspensiva, tendo como função apenas tornar a eficácia precária ou provisória do ato principal em permanente, de modo que o mesmo venha obter execução definitiva, isto é, seja exequível. Em vista do exposto, a manifestação do Tribunal de Contas configurará somente condição de eficácia ou de executoriedade (ou de exequibilidade) do ato principal.[2]

Dessa forma, o Tribunal de Contas, no âmbito de suas atribuições constitucionais de controle externo, somente aprovará ou não o ato concessivo de aposentadoria, reforma ou pensão, não o integrando para sua formação ou existência. Ao aprovar, homologando o registro, será mantido o ato, declarando-lhe, em definitivo, a sua legitimidade e executoriedade ou, num sentido mais amplo, a sua validade.[3]

2 O Supremo Tribunal Federal e os atos concessivos de aposentadoria, reforma e pensão

O ato administrativo complexo, consoante unanimidade doutrinária, só produzirá efeitos jurídicos após o seu aperfeiçoamento, com a integração das vontades que participam de sua formação ou existência. Entretanto, os atos de concessão de aposentadoria, reforma e pensão, considerados complexos pelo Supremo Tribunal Federal (STF), já produzem os efeitos que lhes são inerentes desde as suas edições e publicações pela Administração Pública, independentemente da manifestação de vontade do Tribunal de Contas.

Destarte, não haverá razão para a Corte Suprema classificar tais atos como complexos, pois não se integram as vontades da Administração Pública e do Tribunal de Contas para conceber esses benefícios, tampouco para a produção dos seus efeitos.

Nessa linha de raciocínio, o insigne jurista Maffini (2005, p. 147-148) assinala:

“A análise da doutrina brasileira sobre a classificação dos atos administrativos quanto à formação há de se iniciar pela compreensão dos ensinamentos de Hely Lopes Meirelles. Para o renomado autor, ato simples seria "o que resulta da manifestação de vontade de um único órgão, unipessoal ou colegiado". Já o ato administrativo complexo seria "o que se forma pela conjugação de vontade de mais de um órgão administrativo". Assevera Hely Lopes Meirelles, ainda em relação aos atos complexos, que tal categoria possuiria como elemento essencial "o concurso de vontades de órgãos diferentes para a formação de um ato único", razão pela qual "só se aperfeiçoa com a integração da vontade final da Administração, e a partir deste momento é que se torna atacável por via administrativa ou judicial". Por fim, o ato administrativo composto seria aquele que "resulta da vontade única de um órgão, mas depende da verificação por parte de outro, para se tornar exeqüível". Conclui, então, o autor que "o ato composto distingue-se do ato complexo porque este só se forma com a conjugação de vontade de órgãos diversos, ao passo que aquele é formado pela vontade única de um órgão, sendo apenas ratificado por outra autoridade.

[…] Ora, se ato administrativo complexo é aquele para cuja formação ou existência, apresentam-se necessárias várias vontades conjugadas, os atos administrativos dependentes de registro pelos Tribunais de Contas não podem ser considerados atos administrativos complexos. Isso porque todos os elementos de aperfeiçoamento de tais atos administrativos já são implementados quando da prática dos mesmos pela própria Administração Pública.

[…] Demais disso, ainda a contribuir para o não-enquadramento dos atos sujeitos a registro como atos complexos há de ser considerado um aspecto pertinente à sua produção de efeitos. Em efeito, tais atos sujeitos a registro (investidura, aposentadoria, pensionamento, etc.) embora tenha a sua legalidade (ou validade) apreciada ulteriormente à sua efetivação pelos Tribunais de Contas, já produzem desde sua expedição e publicação todos os efeitos que lhe são imanentes. Isso significa dizer que tais atos administrativos não dependem da apreciação e, ao final, do registro pelos Tribunais de Contas para produzirem a totalidade de seus efeitos, uma vez que os mesmos já são produzidos desde a sua perpetração pela própria Administração Pública”.

Portanto, a única hipótese admissível para que esses atos sujeitos a controle pelo Tribunal de Contas fossem complexos e gerassem efeitos antes dos seus aperfeiçoamentos, com a homologação dos registros, seria se fossem atípicos, como observou o ministro César Peluso, do STF, quando da declaração do seu voto no MS nº 25116/DF. In Verbis:

“[…] as concessões de reformas, aposentadorias e pensões seriam situações precárias, porquanto provisórias sob o aspecto formal geradas pelo implemento de ato administrativo que, embora, se complexo, seria atípico, não sendo possível negar, dada a especial natureza alimentar, a incorporação dos benefícios ao modus vivendi do pensionista ou aposentado”(BRASIL, 2011).  

No entanto, mesmo atípicos, ainda assim, como será discorrido neste artigo, seriam atos administrativos compostos atípicos, e não atos administrativos complexos atípicos.

3 Da formação e efeitos do ato administrativo

Este item acarretará uma melhor compreensão da matéria objeto do item 4, com relação à tipicidade dos efeitos jurídicos dos atos administrativos concessivos de aposentadoria, reforma e pensão e suas naturezas jurídicas.

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A formação do ato administrativo diz respeito aos elementos que o compõem (perfeição, validade e eficácia). Alguns autores, em especial Hely Lopes Meirelles, adotam, além do plano de eficácia, o plano de exequibilidade para sua formação. Neste caso, o ato eficaz será o estiver apto a produzir os seus efeitos finais, e o ato exequível será o que estiver produzindo efetivamente os seus efeitos finais ou estiver disponível para sua operatividade.

Celso Antônio Bandeira de Mello e a maioria dos doutrinadores modernos não fazem essa diferenciação. Para estes, se o ato administrativo for eficaz, já estará produzindo os efeitos que lhe são típicos ou próprios. Essa diferenciação só acontecerá em relação aos atos eficazes e exequíveis. Por conseguinte, os atos ineficazes serão obviamente inexequíveis.

Elementos que compõem o ato administrativo:    

1) perfeição – significa que o ato completou todas as etapas necessárias para sua existência, ou seja,  concluiu o seu ciclo de formação. Aqui não denota que o ato não possua vícios, apenas que se encontra concluído. A imperfeição configura que o ato ainda não concluiu o seu ciclo de formação.

2) validade – diz respeito à conformidade do ato com o ordenamento jurídico. Quando o ato se encontra adequado aos requisitos estabelecidos pela ordem jurídica, em absoluta conformidade com as exigências do sistema normativo. Os inválidos possuem dissonância quanto ao sistema normativo.

3) eficácia – idoneidade que tem o ato administrativo para produzir os seus efeitos específicos. Ato eficaz – quando estiver produzindo os efeitos que lhe são típicos ou inerentes, não dependendo de condição ou evento posteriores (Celso Antônio Bandeira de Mello) ou quando estiver apto a produzir os seus efeitos finais (Hely Lopes Meirelles).

4) exequibilidade – disponibilidade que a Administração Pública tem para dar operatividade ao ato, ou a perspectiva de o mesmo ser colocado de logo em execução. Ato exequível – quando realmente produzir de imediato os seus efeitos finais ou estiver disponível para sua exequibilidade, não dependendo de condição ou evento futuros. Os inexequíveis não possuem esta disponibilidade.

O autor abordará as duas correntes doutrinárias referentes à divisão ternária dos planos lógicos do ato jurídico, sendo a primeira dos seguidores de Celso Antônio Bandeira de Mello (perfeição, validade e eficácia); e a segunda dos adeptos de Hely Lopes Meirelles (validade, eficácia e exequibilidade). Atualmente, os doutrinadores modernos preferem se reportar a esses três momentos. 

É essencial para o Direito a relação entre a perfeição, validade, eficácia e exequibilidade do ato jurídico, cujas hipóteses poderão ser:

a) perfeito, válido e eficaz – quando o ato concluiu o seu ciclo de formação ou existência, encontra-se plenamente ajustado às exigências legais e está disponível para a deflagração dos efeitos que lhe são típicos;

b) perfeito, inválido e eficaz – quando o ato concluiu todas as etapas do seu ciclo de formação ou existência, encontra-se em desconformidade com as exigências normativas e está produzindo os efeitos que lhe são inerentes;

c) perfeito, válido e ineficaz – quando o ato concluiu o seu ciclo de formação ou existência, está adequado aos requisitos de legitimidade e ainda não se encontra disponível para a eclosão dos seus efeitos típicos, por depender de uma condição suspensiva ou termo inicial, autorização, aprovação ou homologação por uma autoridade controladora;

d) perfeito, inválido e ineficaz – quando o ato concluiu todo o ciclo de formação ou existência, encontra-se em desconformidade com a ordem jurídica e os seus efeitos ainda não podem fluir, por se encontrarem na dependência de algum acontecimento previsto como necessário para a produção dos seus efeitos (condição suspensiva ou termo inicial, ou  aprovação ou homologação dependente de outro órgão);

e) válido, eficaz e exequível – quando o ato provém de autoridade competente para praticá-lo e contém todos os requisitos necessários à sua eficácia; possui aptidão para a produção imediata dos seus efeitos e a efetiva concretização desses efeitos;

f) válido, eficaz e inexequível – quando o ato provém de autoridade competente para praticá-lo e contém todos os requisitos necessários à sua eficácia; está apto a produzir os seus efeitos finais e ainda não é exequível, por lhe faltar a verificação de uma condição suspensiva ou a chegada de um termo, ou ainda a prática de um ato complementar (aprovação, visto, homologação, julgamento do recurso de ofício etc.) necessário ao início de sua execução ou operatividade; 

g) inválido, eficaz e inexequível – quando o ato não provém de autoridade competente para praticá-lo e contém todos os requisitos necessários à sua eficácia; tem disposição para produzir os seus efeitos finais e ainda não é exequível ou operante, por lhe faltar a verificação de uma condição suspensiva ou a chegada de um termo,  ou ainda a prática de um ato complementar (aprovação, visto, homologação, julgamento do recurso de ofício etc.) necessário para sua exequibilidade ou operatividade.

4 Da tipicidade dos efeitos jurídicos dos atos concessivos de aposentadoria, reforma e pensão e suas naturezas jurídicas

O ato administrativo será eficaz sempre que estiver apto a produzir os seus efeitos típicos ou próprios (específicos a certa classe ou categoria). Alguns atos, além dos efeitos típicos ou próprios (principais), poderão produzir efeitos atípicos ou impróprios (secundários).

Os efeitos atípicos dividem-se em preliminares ou prodrômicos e reflexos (estes atingem terceiros estranhos às suas práticas). O nosso trabalho está relacionado ao efeito atípico preliminar ou prodrômico do ato, por compreender apenas as partes envolvidas na sua prática.         

Para a doutrina, o efeito atípico preliminar ou prodrômico surgirá quando existir situação de pendência no ato administrativo, ou seja, quando um órgão se manifestar e, alheio a sua manifestação de vontade, haverá a obrigatoriedade de outro também se pronunciar.   

Assim sendo, enquanto subsistir pendência, o efeito produzido pelo ato será atípico. Após o pronunciamento complementar (aprovação, homologação, visto etc.) proveniente de outro órgão, o ato passará a produzir os seus efeitos normais ou próprios.

Nesse contexto, Bandeira de Mello (2009, p. 383) leciona:

“Os efeitos atípicos podem ser de dupla ordem: efeitos preliminares ou prodrômicos e efeitos reflexos. Os preliminares existem enquanto perdura a situação de pendência do ato, isto é, durante o período que intercorre desde a produção do ato até o desencadeamento de seus efeitos típicos. Serve de exemplo, no caso dos atos sujeitos a controle por parte de outro órgão, o dever-poder que assiste a este último de emitir o ato controlador que funciona como condição de eficácia do ato controlado”.

Desse modo, enquanto o ato sujeito a controle não for complementado por outro órgão, por meio da autorização, homologação, aprovação, ratificação, visto etc. (condição de eficácia para alguns doutrinadores ou condição de exequibilidade para outros), não estará produzindo efeitos jurídicos típicos ou próprios. 

O doutrinador Carvalho Filho (2009, p. 126), dispondo sobre o plano de eficácia, já afirmava: “embora, nos atos compostos, uma das vontades já tenha conteúdo autônomo, indicando logo o objetivo da Administração, a outra vai configurar-se, apesar de meramente instrumental, como verdadeira condição de eficácia”.

Nesse mesmo sentido, o mestre Pinheiro Madeira (2008, p. 219) também chancelava: “nos atos compostos há sempre dois órgãos realizando atos diversos. Sempre que o ato administrativo fique com sua eficácia dependente de uma condição, que vai ser atendida por outro órgão, este ato será composto”.

Como no ato composto, o ato complementar consubstanciará somente condição de eficácia ou de exequibilidade do ato principal;[4] então, o ato de concessão de aposentadoria, reforma ou pensão praticado pela Administração Pública pendente, para sua eficácia ou exequibilidade, de ratificação meramente instrumental pelo Tribunal de Controle, configurará ato administrativo composto atípico.

Além do entendimento doutrinário apresentado, classificando o ato de concessão do benefício previdenciário como composto atípico, esse posicionamento também evidenciará a inviabilização desse ato como complexo atípico, uma vez que o ato pendente pressupõe um ato perfeito, isto é, ato que concluiu todas as fases necessárias para sua formação ou existência, embora dependente de condição ou termo futuros para sua exequibilidade ou operatividade (MEIRELES, 2011, p. 183). Se o ato de concessão do benefício fosse complexo, apenas após o pronunciamento do Tribunal de Contas, homologando o registro, aperfeiçoar-se-ia.

Com fundamento nessas considerações, mesmo que o ato administrativo de concessão de aposentadoria, reforma ou pensão sujeito a controle produza efeitos atípicos, por ser ato pendente de complementação provinda da Corte de Contas, ainda assim será enquadrado na categoria de ato administrativo composto, embora atípico.

Nesse caso, o efeito jurídico produzido de início não será do conteúdo próprio ou específico do ato principal, mas sim do efeito atípico preliminar ou prodrômico, e o ato de concessão; na divisão ternária dos planos lógicos de Bandeira de Mello (2009, p. 384), será perfeito, válido e ineficaz, porque já concluiu o seu ciclo de formação ou existência; está adequado aos requisitos de legitimidade e ainda não se encontra disponível para a eclosão dos seus efeitos típicos, por depender de uma condição suspensiva ou termo inicial, ou autorização, aprovação ou homologação por uma autoridade controladora. Aqui, o ato de concessão do benefício estará sujeito à condição suspensiva de eficácia, que se implementará se não houver autorização, aprovação ou homologação pelo órgão controlador.[5]

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Por sua vez, o ato de concessão, na divisão ternária dos planos lógicos de Meirelles (2011, p. 167-181), será válido, eficaz e inexequível, tendo em vista que provém de autoridade competente para praticá-lo e contém todos os requisitos necessários à sua eficácia; está apto a produzir os seus efeitos finais e ainda não é exequível ou operante, por lhe faltar a verificação de uma condição suspensiva ou a chegada de um termo, ou ainda a prática de um ato complementar (aprovação, visto, homologação, julgamento do recurso de ofício etc.) necessário ao início de  sua execução ou operatividade. O ato complementar, conforme Meirelles (2011, p.185), será “o que ratifica ou aprova o ato principal, para dar-lhe exequibilidade. O ato complementar atua como requisito de operatividade do ato principal, embora este se apresente completo em sua formação desde o nascedouro”. Neste ponto, o ato de concessão do benefício estará sujeito à condição suspensiva de exequibilidade, que se implementará se não houver aprovação, homologação ou visto por um outro órgão.[6]

Para o autor, o efeito produzido de início não será do efeito atípico preliminar ou prodrômico, mas sim do conteúdo próprio ou específico do ato principal ou ato de concessão do benefício praticado pela Administração Pública,[7] que estará sujeito à condição resolutiva (negativa) de eficácia ou de exequibilidade, que se implementará se houver a denegação do registro pela Corte de  Contas.

Por esse ângulo, a negativa do registro pela Corte de Controle ocasionará a resolução do ato de concessão de aposentadoria, reforma ou pensão, com a interrupção imediata dos seus efeitos iniciais ou provisórios e, por consequência, a sustação do pagamento dos proventos. Em contrapartida, a homologação do registro, por essa Corte, acarretará a eficácia ou execução definitiva desse ato.

De toda maneira, se considerarmos a concessão do benefício ato administrativo composto, a produção dos efeitos do ato inicial de concessão será imediata, independentemente de sua tipicidade. No ato administrativo composto, os efeitos imediatos produzidos pelo ato principal se conformam perfeitamente com a produção antecipada de efeitos causada pelo efeito atípico preliminar ou prodrômico.

Na visão do autor, após a expedição e publicação, a concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão será um ato perfeito, válido e eficaz,[8] não dependendo de aprovação ou ratificação para produzir os efeitos que lhe são típicos ou próprios, visto que os mesmos já são produzidos, quando de sua formação ou existência a partir da prática do ato principal pela Administração Pública.[9]

Não é outra a concepção do conceituado administrativista e procurador de Justiça/RJ aposentado Carvalho Filho (2009, p. 122), quando leciona que, “se o ato completou seu ciclo de formação, podemos considerá-lo eficaz, e isso ainda que dependa de termo ou condição futuros para ser executado. O termo e a condição podem constituir óbices à operatividade do ato, mas nem por isso descaracterizam sua eficácia”. (grifo nosso).   

Inegavelmente, a inatividade do servidor público, o percebimento dos proventos, a declaração de vacância do cargo e até o seu provimento por outra pessoa concursada são efeitos típicos do ato inicial de concessão do benefício, após a sua edição e publicação, e não meros efeitos atípicos preliminares ou prodrômicos desse ato que implicam na obrigação de outro órgão se pronunciar.

Na verdade, o ato de concessão de aposentadoria, reforma ou pensão é um autêntico exemplo de ato administrativo composto,[10] no qual o ato acessório ou complementar de controle apenas ratifica ou aprova o ato de concessão inicial ou principal, tornando-o exequível. 

Na concessão desses benefícios, o primeiro ato praticado pela Administração Pública será o principal, sendo o segundo, a homologação do registro pela Corte de Contas, realizado a posteriori, mera manifestação instrumental de regularidade do ato principal, não se constituindo em elemento essencial para a perfeição deste.

Conclusão

O ato administrativo composto é formado pela vontade de um órgão que pratica o ato principal. É uma vontade única condicionada à ratificação ou aprovação, cuja eficácia prevalecerá precariamente, mas dependerá de um ato acessório de verificação para que esteja apta a produzir os seus efeitos finais (condição de eficácia ou de exequibilidade). No entanto, o ato acessório em nada altera o conteúdo do ato principal, que carrega em si a vontade própria da Administração.

No ato administrativo composto todos os elementos de seu aperfeiçoamento já se realizam, quando da sua formação ou existência a partir da prática do ato principal (é unânime, entre os doutrinadores, o entendimento de que a perfeição do ato coincide com sua existência). O ato acessório, por não ter autonomia, ou conteúdo próprio, nada acrescenta, somente ratifica ou não. No ato administrativo composto, os atos que o compõem têm relação de dependência.

Já o ato administrativo complexo é aquele para cuja formação ou existência serão necessárias várias manifestações de vontade conjugadas ou integradas de órgãos ou sujeitos distintos da Administração Pública para a produção de um único ato.

No ato administrativo complexo são duas ou mais vontades independentes entre si, com identidade de conteúdo e unidade de fins, que se integram ou se unem para sua formação ou existência, não havendo prevalência de vontades. A sua essencialidade ocorrerá com o aperfeiçoamento da última vontade de todas que se integrarão para sua formação e somente a partir deste momento, como um todo, passará a existir na ordem jurídica e estará disponível para a produção dos seus efeitos. No ato administrativo complexo, as vontades que o compõem têm relação de unidade.     

Os atos concessivos de aposentadoria, reforma e pensão, tidos como complexos pelo STF, como já exposto, produzem os efeitos que lhes são pertinentes desde as suas práticas pela Administração Pública, independentemente da manifestação de vontade da Corte de Contas.

A produção de efeitos desses benefícios possibilita constatar-se que não há integração ou união de vontades para a formação ou existência de um ato único, mas sim dois atos (um principal, o ato de concessão de inatividade praticado pela Administração, e o outro complementar ou secundário, o registro do referido ato pelo Tribunal de Contas), que não se unem ou se convergem em um ato único resultante, por possuírem efeitos, conteúdos e fins autônomos.

Demais disso, o Tribunal de Contas, no exercício do controle externo, tem a competência constitucional (artigo 71, inciso III) de apreciar, para fins de registro, a legalidade do ato concessivo do benefício praticado pela Administração Pública, o que imputa essa manifestação como ato de controle a posteriori, e não manifestação volitiva conjugada à manifestação da Administração para a formação de um ato único complexo.

Em face dessas ponderações, os atos de concessão de aposentadoria, reforma e pensão consubstanciam atos administrativos compostos, e não atos administrativos complexos, pois se encontram perfeitos e acabados (ou completos) desde o pronunciamento inicial da Administração Pública; as vontades dos órgãos partícipes não possuem a mesma identidade de conteúdo e unidade de fins e o Tribunal de Contas não participa de suas formações ou existências, apenas declara as suas legitimidades, registrando-os para efeito executório. Nessa ordem de pensamento, a doutrina moderna, praticamente de modo uniforme, tem-se manifestado.  

Para o autor, editado e publicado o ato de concessão do benefício, seguirá a sua execução, embora precária, por ser condicionada à aprovação pelo Tribunal de Contas, mas com plena produção dos efeitos que lhe são inerentes.

Por fim, cumpre consignar que, independentemente da tipicidade dos efeitos jurídicos dos atos concessivos de aposentadoria, reforma e pensão, estes serão compostos, e não complexos.

Referências
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Notas:
[1] Pontes de Miranda (1970, p. 7), já advertia: “Não tem sentido falar-se de validade ou invalidade a respeito do que não existe. A questão da existência é questão prévia. Somente depois de se afirmar que existe é possível pensar-se em validade ou invalidade”.

[2] Campos (1956, p. 140), enfocando esse assunto pelo mesmo aspecto, profere: “o registro pressupõe acabado, integrado e perfeito o ato administrativo, já dotado de uma executoriedade provisória, correspondendo a uma função de controle, que não colabora na formação do ato, sendo apenas condição de executoriedade definitiva”. Tácito (1958, p. 216-223), também conjuga esse entendimento, quando afirma: “desde que se limite o conceito de aprovação aos atos típicos de controle, especialmente de entes personalizados, não há identidade de fins e de conteúdo entre as duas manifestações de vontade, que, embora concorrentes, atendem a interesses distintos. O pronunciamento inicial constitui, assim de per si,  um ato perfeito, de eficácia condicionada à aprovação. Nesta, a autoridade administrativa exprime um juízo sobre a legitimidade e a oportunidade de um ato jurídico já praticado por outra autoridade. Quando o controle sucessivo à formação do ato limita-se ao exame de legalidade não há aprovação, mas apenas visto, com o qual menos ainda se conforma a concepção unitária do ato complexo” (grifo nosso).

[3] O professor Maffini (2005, p. 146) destaca o papel da Corte de Contas no desempenho de suas atribuições constitucionais com relação à apreciação da legalidade dos atos administrativos de pessoal sujeitos a controle: “Tal apreciação, para fins de registro, cumpre salientar, consiste na verificação, sem caráter jurisdicional, da legalidade ou, num sentido mais amplo, da validade dos atos administrativos benéficos aos indivíduos investidos em funções públicas, inativados ou pensionados”.

[4] Para a doutrina autorizada, se o ato de concessão de aposentadoria for complexo, o registro pelo Tribunal de Contas será condição de existência ou perfeição do ato de concessão de aposentadoria; se for composto, o registro será condição de eficácia ou de exequibilidade do ato inicial de concessão de aposentadoria ou ato principal.

[5]  A contribuir ainda mais para que a condição de eficácia seja característica peculiar dos atos compostos, Martins Junior (2015, p. 14), promotor de justiça/SP, doutor e mestre em Direito Administrativo, manifestando-se sobre as vontades convergentes que participam da formação do ato complexo e sua consequente eficácia, pontua: “A manifestação de vontade do último órgão a ser ouvido não condiciona a eficácia da vontade inicial, porque esta ainda que reputada como ato necessita do concurso das demais, razão pela qual  a falta de convergência de vontades para a edição do ato único retira-lhe um elemento essencial. Será isto ineficácia do ato? Parece que de ineficácia não há que se cogitar, pois se atribuiria ao ato complexo a característica própria do ato composto: isto é, a eficácia do ato principal ficaria na dependência de um ato acessório, subordinada à condição suspensiva (no caso, homologação ou aprovação)”.

[6]  O professor Pinheiro Madeira (2008, p. 219), discorrendo sobre o ato composto, explica: “Em síntese, o ato composto (conjunto) é uma vontade que, para ser exequível, tem como condição a ratificação ou verificação, prévia ou posterior, por uma vontade de um outro órgão […], observa-se que o ato composto tem uma condição suspensiva de exequibilidade, que é um 'algo a mais', isto é, só será exequível se houver homologação”.

[7]  O ato administrativo composto, por possuir uma única vontade de conteúdo próprio, que se identifica pelo conteúdo do ato principal, origina-se juridicamente com a realização deste ato, porquanto a sua eficácia, consectário da sua existência, iniciar-se-á a partir da prática do ato principal. A eficácia do ato principal, em caráter definitivo, irá depender da confirmação de outra autoridade.

[8]  Nesse mesmo diapasão, Moreira Neto (2009, p. 167) afirma: “Assim, no caso de ato composto, embora ele seja editado por um único órgão, que lhe infunde existência, validade e eficácia, tal como se dá com o ato administrativo simples, deste difere, apenas, porque a sua execução fica pendente de uma manifestação complementar provinda de outro órgão”. (grifo nosso).

[9] Fátima Maria Amaral Tavares Paes, então procuradora-geral do TCE/RJ, comunga desse posicionamento, quando declara: “[…] Com efeito, o artigo 71 da Constituição Federal firma a competência do Tribunal de Contas no sentido de apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal…, bem como a das concessões de aposentadorias. Logo, a redação da norma sugere que a aposentadoria já tenha sido concedida antes de encaminhada ao Tribunal para registro, até porque os efeitos típicos do ato já se verificam desde a manifestação inicial da Administração a qual estaria o servidor vinculado, devendo, porém, sofrer um controle posterior que poderá, inclusive, importar na sua desconstituição…, o ato inicial afigura-se perfeito, desde logo apto a produzir efeitos, pendendo, apenas, de um controle de legalidade posterior” (CAETANO, 2010). Luísa Cristina Pinto e Netto (2006, p. 133), procuradora do Estado de Minas Gerais e professora de Direito Administrativo da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, dispondo acerca do ato de aposentadoria, também assegura que “os efeitos típicos do ato se produzem desde já com a expressão da vontade de um único órgão, aquele que concede a aposentadoria. Não há efeito típico do ato de aposentadoria que dependa do registro do ato pelo Tribunal de Contas…, o que ocorre é que o ato, perfeito, praticado pela Administração está submetido ao controle de legalidade a ser exercido pelo Tribunal de Contas; um ato já existente será examinado, quanto à sua legalidade, para fins de registro junto ao órgão de controle”. (grifo nosso).

[10] O renomado doutrinador Osvaldo Aranha Bandeira de Mello, discorrendo sobre os atos praticados pela Administração e pelo órgão de controle, perfilha essa opinião: “Há, aqui, um ato composto, em que a manifestação de vontade expressa por um determinado ato administrativo acha-se unida por vínculo funcional a outro, numa relação de caráter meramente instrumental, e não unitário, porque ausente a homogeneidade das respectivas vontades. Funcionam como pressupostos do ato principal (como a solicitação do interessado ou a proposta de um órgão para outro praticar o ato principal) ou como complementares a ele (como aprovação ou homologação). Esses atos instrumentais funcionam como elemento propulsor ou como elemento de eficácia” (BANDEIRA DE MELLO, 1969, p. 475 apud STEIN, 1975, p. 28). Carvalho Filho (2009, p. 660) também expressa que o ato de concessão de aposentadoria não configura ato complexo: “Lavra funda divergência a respeito da natureza jurídica do ato de aposentadoria. Para alguns, trata-se de ato complexo formado pela manifestação volitiva do órgão administrativo somada à do Tribunal de Contas. Não nos parece correto semelhante pensamento. Cuida-se, com efeito, de atos administrativos diversos, com conteúdos próprios e oriundos de órgãos administrativos desvinculados entre si. No primeiro, a Administração, verificando o cumprimento dos pressupostos normativos, reconhece ao servidor o direito ao benefício da inatividade remunerada; no segundo, a Corte de Contas procede à apreciação da legalidade do ato para fins de registro (art. 71, III, CF), o que o caracteriza como ato de controle a posterior”. (grifo do autor)


Informações Sobre o Autor

André Gonzalez Cruz

Assessor de Procurador de Justiça. Membro da Academia Maranhense de Letras Jurídicas. Mestre em Políticas Públicas e Doutorando em Direito


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