Alteração da constituição do consórcio vencedor após a adjudicação do objeto

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Resumo: A alteração da constituição e composição de consórcio de empresas, vencedor de processo licitatório, durante a execução contratual, é apresentada no presente estudo como hipótese excepcional. À luz do que prevê a Lei 8.666/93 e de modo a evitar burla aos princípios da isonomia, competitividade e da vinculação ao edital, objetiva-se demonstrar que a validade jurídica da alteração, após a vitória no certame, estará condicionada à comprovação de alguns requisitos, dentre eles, a ocorrência de fato novo, não existente ao tempo da assinatura do contrato, capaz de justificar a modificação.

Palavras-chave: Licitação. Edital. Consórcio de empresas. Alteração.

Abstract: Amendment of ownership and capital structure of consortium of companies that won the bidding process, during performance of contract, is presented in this study as an exceptional case. According to Law 8.666/93 and to avoid violation of isonomy, competitiveness and invitation to bid linking principles, the objective is to demonstrate that the legal validity of the amendment, after the victory, shall be conditioned to verification of some requirements, including the occurrence of something new, nonexistent at the time of signing the contract, to justify the modification.

Keywords: Bid. Invitation to bid. Consortium of companies. Amendment.

Sumário: Introdução; 1. Conceito de consórcio; 2. Participação dos consórcios nas licitações públicas; 3. Possibilidade de alteração da constituição do consórcio durante a execução contratual; Conclusão.

Introdução

A atuação dos consórcios de empresas no Brasil, quando contratam com a Administração Pública, submete-se a regime jurídico próprio, cuja normatividade deriva em grande parte dos princípios constitucionais que regem o Direito Administrativo-Constitucional. Embora constituídos por sociedades juridicamente autônomas, respondem perante a Administração como unidade, haja vista que assim se apresentam na fase da disputa do processo licitatório, nos casos em que sua participação é admitida. Por força de lei, o consórcio contratado deve manter ao longo da execução contratual todas as condições de habilitação exigidas no edital, submetendo-se as consorciadas à responsabilidade solidária pelos atos praticados nessa condição, tanto na fase da licitação, quanto na de execução contratual, consoante prevê o artigo 33, inciso V, da Lei 8.666/93.

Nesse contexto, a hipótese de alteração da constituição e composição do consórcio de empresas durante a execução do contrato administrativo é apresentada no presente estudo como hipótese excepcional, de modo a evitar burla aos princípios da competitividade, isonomia e da vinculação ao edital.

Objetiva-se demonstrar que os critérios de aceitabilidade de eventual alteração da constituição do consórcio após a declaração do vencedor do certame e a assinatura do contrato, se assim recomendar o interesse público envolvido no caso, deve constar do respectivo edital. Este, por sua vez, deve ser elaborado no ponto com cautela, ostentando regras compatíveis com os princípios normativo-constitucionais que regem o certame, especialmente o da igualdade, da competitividade e da proporcionalidade, de modo que não sejam admitidas alterações não estendidas aos demais interessados e com vistas a proteger não apenas a lisura do procedimento licitatório, mas também a fiel execução do objeto.

1. Conceito de consórcio

É do Direito Empresarial, especificamente da Lei 6.404/76, que se extrai o conceito de consórcio e o regramento da sua atuação no Brasil. Os artigos 278 e 279 da Lei 6.404/76 permitem a constituição de consórcio entre quaisquer sociedades, sob o mesmo controle ou não, que se reúnam para executar determinado empreendimento. Despido de personalidade jurídica, o consórcio se constitui mediante contrato, por meio do qual as consorciadas se obrigam tão somente nas condições nele previstas, respondendo cada uma por suas obrigações, sem presunção de solidariedade.

Acerca do contrato, dispõe o artigo 279 da Lei 6.404/76: “O consórcio será constituído mediante contrato aprovado pelo órgão da sociedade competente para autorizar a alienação de bens do ativo não circulante, do qual constarão: I – a designação do consórcio se houver; II – o empreendimento que constitua o objeto do consórcio; III – a duração, endereço e foro; IV – a definição das obrigações e responsabilidade de cada sociedade consorciada, e das prestações específicas; V – normas sobre recebimento de receitas e partilha de resultados; VI – normas sobre administração do consórcio, contabilização, representação das sociedades consorciadas e taxa de administração, se houver; VII – forma de deliberação sobre assuntos de interesse comum, com o número de votos que cabe a cada consorciado; VIII – contribuição de cada consorciado para as despesas comuns, se houver. Parágrafo único. O contrato de consórcio e suas alterações serão arquivados no registro do comércio do lugar da sua sede, devendo a certidão do arquivamento ser publicada.”

O consórcio é, portanto, uma associação de sociedades, em que se mantém a autonomia jurídica de cada consorciado. Revela-se como poderoso instrumento de atuação empresarial, caracterizado pela transitoriedade, consistente na associação temporária de esforços entre duas ou mais empresas para a execução de um objeto específico. Uma vez alcançado o objetivo comum, qual seja, a execução do objeto contratado em conjunto, as sociedades se desligam, respondendo cada consorciado, em nome próprio, pelos atos a si imputáveis (MARÇAL, 2012, p. 565).

No Direito Administrativo, no entanto, a situação é diversa. Por força do regime jurídico próprio, cuja normatividade deriva em grande parte dos princípios constitucionais que regem o Direito Administrativo-Constitucional, as regras do Direito Empresarial são relativizadas, dando lugar à disciplina instituída para a contratação administrativa, em especial, a Lei de Licitações Públicas (Lei 8.666/93). O aspecto primordial da distinção refere-se à responsabilidade solidária dos consorciados pelos atos praticados em face da Administração durante a execução contratual (MARÇAL, 2012, p. 565).

2. Participação dos consórcios nas licitações públicas

O legislador pátrio deixou a critério da Administração decidir pela admissão ou não de consórcios em suas licitações. Trata-se de discricionariedade a cargo do gestor que deverá aferir, caso a caso, sempre norteado pelo interesse público perseguido com o certame, as situações em que este justifica a admissão das empresas organizadas em consórcio.

Isso porque a atuação dos consórcios pode conduzir a resultados positivos ou negativos segundo a ordem jurídica vigente. A par de permitir a ampliação da competitividade, diante da complexidade de determinado objeto ou das circunstâncias de mercado, pode também cerceá-la, na medida em que reduz o universo da disputa em razão da reunião de empresas que, ao contrário, competiriam entre si.

Nos dizeres de Marçal Justen Filho (2012, p. 565), a preocupação com possíveis resultados negativos da participação de consórcios nas licitações é evidente: No campo de licitações, a formação de consórcios poderia reduzir o universo da disputa. O consórcio poderia retratar uma composição entre eventuais interessados: em vez de estabelecerem disputa entre si, formalizariam acordo para eliminar a competição. Aliás, a composição entre os potenciais interessados para participar de licitação pode alcançar a dimensão da criminalidade.” (grifou-se)

Daí o cuidado que o legislador pátrio adotou em não incentivar abstratamente a formação de consórcios, como forma de evitar a dominação de mercados e a prática de infrações contra a ordem econômica.  

A decisão da Administração deve ser cautelosa e se pautar sob a ótica da ampliação da competitividade, para permitir a participação dos consórcios nas hipóteses em que as dimensões ou a complexidade do objeto indiquem que poucos interessados, isoladamente, teriam condições de preencher as exigências do certame, especialmente as de qualificação técnica e econômico-financeira.

Nesse sentido é o entendimento consagrado pelo Tribunal de Contas da União, cuja jurisprudência é no sentido de que “(…) a vedação ou a admissão de consórcio em licitação deve ter em vista possibilitar maior concorrência, que conforme o caso concreto pode ocorrer em uma ou outra situação”, conforme consignou o Acórdão nº 1.782/2009-Plenário, rel. Min. Raimundo Carreiro.

De fato, a solução não deve ser apriorística, mas sim definida de acordo com a realidade de cada contratação, em especial, a realidade do mercado em face da complexidade do objeto e dos riscos inerentes ao consorciamento para sua execução.

Assim é que a Administração deve partir da premissa do interesse público abrangido no caso concreto, para decidir motivadamente, em cada contratação, pela participação ou não de empresas associadas em consórcio e sempre objetivando a ampliação do universo dos participantes. Uma vez tomada a decisão que melhor atenda ao interesse público em cada caso, esta deverá nortear a elaboração dos editais por parte da Administração, mediante o estabelecimento de cláusulas que fixem não apenas os requisitos para a participação de consórcios, se for o caso, mas também definam os critérios de aceitabilidade de eventual alteração da sua constituição ou composição no curso da execução contratual, observadas as cautelas ora tratadas.

A Lei 8.666/93, em seu artigo 33, traça os requisitos a serem cumpridos pelos interessados em participar do certame por meio de consórcio, in verbis: “Art. 33. Quando permitida na licitação a participação de empresas em consórcio, observar-se-ão as seguintes normas: I – comprovação do compromisso público ou particular de constituição de consórcio, subscrito pelos consorciados; II – indicação da empresa responsável pelo consórcio que deverá atender às condições de liderança, obrigatoriamente fixadas no edital; III – apresentação dos documentos exigidos nos arts. 28 a 31 desta Lei por parte de cada consorciado, admitindo-se, para efeito de qualificação técnica, o somatório dos quantitativos de cada consorciado, e, para efeito de qualificação econômico-financeira, o somatório dos valores de cada consorciado, na proporção de sua respectiva participação, podendo a Administração estabelecer, para o consórcio, um acréscimo de até 30% (trinta por cento) dos valores exigidos para licitante individual, inexigível este acréscimo para os consórcios compostos, em sua totalidade, por micro e pequenas empresas assim definidas em lei; IV – impedimento de participação de empresa consorciada, na mesma licitação, através de mais de um consórcio ou isoladamente; V – responsabilidade solidária dos integrantes pelos atos praticados em consórcio, tanto na fase de licitação quanto na de execução do contrato. §1º No consórcio de empresas brasileiras e estrangeiras a liderança caberá, obrigatoriamente, à empresa brasileira, observado o disposto no inciso II deste artigo. §2º O licitante vencedor fica obrigado a promover, antes da celebração do contrato, a constituição e o registro do consórcio, nos termos do compromisso referido no inciso I deste artigo.” (grifou-se)

Quando contratam com a Administração Pública, portanto, os consórcios submetem-se, excepcionalmente e por força de lei, à responsabilidade solidária pelos atos praticados nessa condição, tanto na fase da licitação, quanto na de execução contratual, consoante prevê o artigo 33, inciso V, da Lei 8.666/93.

A solução adotada pela Lei de Licitações no ponto revela-se logicamente adequada, haja vista que a Administração considera, para contratar, a unidade dos consorciados. Isso porque eles se juntam para atender ao conjunto de exigências estabelecidas no edital do certame para sua habilitação e, sendo assim, a Administração considera o conjunto dos recursos por eles apresentados (tanto os de ordem técnica como os econômico-financeiros) para declarar o vencedor e com ele contratar. Justamente porque se apresentam perante a Administração como unidade, os consorciados devem responder juridicamente como unidade, a justificar a responsabilidade solidária dos envolvidos (MARÇAL, 2012, p.565).

Acerca do cumprimento dos requisitos de habilitação exigidos para a participação de empresas organizadas em consórcio, decidiu o Tribunal de Contas da União no Acórdão 478/2006-Plenário: “9.3.3. permitir a constituição de associações ou consórcios entre empresas interessadas, abstendo-se de exigir individualmente de todas as integrantes da associação ou consórcio o pleno atendimento a todos os requisitos de ordem técnica necessários, desde que, em conjunto, as empresas os atendam”.

3. Alteração da constituição do consórcio durante a execução contratual

Uma vez definido no edital, que é a lei do certame (artigo 41 da Lei 8.666/93), a possibilidade de participação na disputa de empresas organizadas em consórcio, mediante preenchimento dos requisitos de habilitação estabelecidos para tal, são estas as regras que devem prevalecer ao longo da execução contratual, sob pena de burla ao processo licitatório e também de responderem as empresas consorciadas solidariamente perante a Administração pelas obrigações assumidas (artigo 33, V, da Lei 8.666/93). Nesse sentido é o artigo 55, XIII, da Lei 8.666/93, que estabelece a obrigação do contratado de manter, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação.

Ou seja, é o edital que vai fixar as cláusulas para definir não apenas os requisitos para a participação de consórcios, se for o caso, mas também os critérios de aceitabilidade de eventual alteração da sua constituição ou composição durante a execução contratual, se assim recomendar o interesse público. Alerta-se, no entanto, que tais regras não devem se afastar da realização dos princípios normativo-constitucionais que regem o certame, especialmente o da igualdade, da competitividade e da proporcionalidade, sob pena de invalidação de cláusulas desarrazoadas. Isso porque, como todo ato decorrente da competência discricionária, as regras do edital são passíveis de controle jurisdicional para aferir a compatibilidade entre os motivos declarados para a sua prática e a realidade que o ensejou.

Nesse sentido, já determinou o Tribunal de Contas da União no Acórdão 1.453/2009-Plenário: “9.2.3.5. explicite as razões para a admissão ou a vedação à participação de consórcio de empresas, uma vez que o princípio da motivação exige que a Administração Pública indique os fundamentos de fato e de direito de suas decisões, inclusive das discricionárias (…).”

No entanto, a despeito de qualquer regra incluída no edital acerca do tema, a Administração recebe, com freqüência, pedidos de alteração da composição ou da constituição do consórcio vencedor após a assinatura do contrato.

É importante que se atente para os riscos inerentes à ampla aceitação de pedidos dessa natureza na fase posterior à adjudicação do objeto, haja vista a abertura que se dá para a prática de fraudes contra a lisura do procedimento licitatório, especialmente porque essa possibilidade não foi estendida aos demais participantes do certame.

Com efeito, a formação do consórcio decorre de ato de vontade das empresas interessadas em participar da licitação que, livremente, assumem o compromisso de, depois da vitória, levar a registro os seus atos constitutivos para cumprir com fidelidade o contrato. Logo, a opção pela formação do consórcio decorreu do interesse das empresas envolvidas e não de exigência da Administração. E, assim sendo, a conseqüência que devem suportar, para executar o contrato, é que mantenham as condições iniciais de habilitação (artigo 55, XIII, da Lei 8.666/93). Basta concluir o objeto que, automaticamente, já não terão obrigação de permanecer atuando em conjunto.

Com a posição ora defendida, não se está aqui a negar aplicação ao comando constitucional inserido no artigo 5º, XX, da Constituição Federal, que estabelece que “ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado”. É claro que as empresas podem desfazer a associação vitoriosa no certame a qualquer momento. Não há proibição nesse sentido na lei. No entanto, deverão se submeter às conseqüências dessa decisão, segundo as regras previstas no edital e nos seus atos constitutivos, o que poderá culminar na rescisão do contrato com a Administração, ante a falta de cumprimento do objeto comprometido ou por não manterem preenchidos os requisitos de habilitação exigidos (artigo 78, incisos I e XI, da Lei 8.666/93).

De fato, não se pode perder de vista que, em muitas situações, o consórcio só se consagra vencedor em razão do somatório dos quantitativos e valores de cada consorciado, para efeito de qualificação técnica e econômico-financeira, nos moldes do artigo 33, III, da Lei 8.666/93, o que não foi possível para outros interessados que não conseguiram preenchê-los sozinhos. Ou seja, foi o elo estabelecido entre as empresas que ensejou a vitória no certame.

Caso se admita a exclusão de uma ou mais consorciadas ou a alteração do percentual de participação delas no consórcio, chegar-se-á à inevitável conclusão de que, a partir disso, o consórcio, ou o que restar dele, não mais atenderá aos requisitos de habilitação fixados no edital e, por certo, necessários para garantir segurança ao contrato celebrado.

Tal prática, por certo, pode ensejar violação aos princípios que regem o processo licitatório, decorrente da união de esforços num primeiro momento e a desistência após a adjudicação do objeto, em detrimento da possibilidade de êxito dos demais interessados.

Sobre o tema, ensina Marçal Justen Filho que a promessa de constituição do consórcio é exigida como requisito de habilitação jurídica e vincula todas as sociedades, de modo irrevogável (2012, p. 570). Acrescenta o autor que: “perante a Administração, é irrelevante se a ausência de constituição do consórcio for inviabilizada por apenas uma ou alguma das promitentes. Se a ausência de constituição do consórcio, no momento oportuno, for imputável à conduta culposa de somente alguma(s) da(s) empresa(s) compromitente(s), todas serão responsabilizáveis perante a Administração, restando o direito de regresso da(s) inocente(s) contra(s) a(s) culpada(s).” (2012, p. 570).

Por isso, entende-se que a desconstituição do consórcio é medida altamente excepcional, somente passível de admissão em situações bem delineadas e justificadas pelas empresas, de modo a afastar a possibilidade de burla ao procedimento licitatório.

Em outras palavras, a regra é não admitir tais alterações, com o objetivo de evitar violação ao procedimento licitatório, resguardar o interesse público e também para proteger o Administrador de futuros questionamentos dos órgãos de controle.

     Nesse sentido, entendeu o Tribunal de Contas da União no Acórdão n.º 1854/2012-Plenário: “Ex-presidente e ex-diretor de engenharia da Desenvolvimento Rodoviário S.A. (Dersa) interpuseram pedidos de reexame contra o Acórdão nº 2.342/2011-, por meio do qual, o Tribunal os apenara com multas do art. 58, inciso II, da Lei nº 8.443/1992, no valor de R$ 10.000,00, em decorrência de irregularidades no contrato das obras do trecho sul do Rodoanel de São Paulo. Tais sanções foram impostas em razão de haverem eles permitido a sub-rogação da execução do Contrato nº 3.587/2006 (lote 5 do Rodoanel), inicialmente celebrado com o consórcio formado pelas empresas OAS e Mendes Júnior. Verificou-se que a contratada teve sua estrutura societária modificada para sociedade de propósito específico, tendo ainda sido incluída uma terceira cotista, a Carioca Christiani-Nielsen Engenharia S.A. O relator, ao apreciar as razões dos recorrentes, anotou que, "a citada modificação contratual, subscrita pelos ex-gestores apenados, implicou ofensa às regras da licitação – não havia previsão editalícia para a formação da SPE e o número de componentes dos consórcios participantes estava limitado a dois – e ao art. 20 da Lei nº 8.987/1995, que, ao prever a hipótese de o poder concedente determinar que o consórcio vencedor se constitua em empresa, estabelece que isso deva ocorrer ‘antes da celebração do contrato’…". Acrescentou que tal vício merece ser considerado grave e configurou burla à licitação, pois permitiu a inclusão, na nova sociedade, de terceira sócia que não participara da licitação. Tal empresa, acrescentou, "foi trazida intempestivamente à relação contratual sem que fossem obedecidos os ritos e as exigências legais, por simples ato de alteração societária". Ao endossar observação da unidade técnica, ressaltou que, "caso já houvesse no edital, desde o início, a permissão para a associação de três empresas, o panorama do certame seria substancialmente diverso, permitindo que empresas menores se unissem para participar da disputa". O Tribunal, ao acolher proposta do relator, decidiu conhecer os recursos interpostos pelos responsáveis e, no mérito, negar provimento a eles. Precedente mencionado: Acórdão nº 2.342/2011-Plenário.”  

Assim sendo, visando a proteger a lisura do procedimento licitatório, defende-se que a Administração deve ser cautelosa quando da elaboração dos seus editais, para fixar cláusulas que definam, de forma razoável e proporcional às circunstâncias de cada contratação, os requisitos para a participação dos consórcios, além de regras que proíbam a alteração da constituição ou composição do consórcio vencedor durante a execução contratual ou inibam a utilização desse subterfúgio para violar o procedimento.

No entanto, caso não haja vedação no edital, para resguardar situações excepcionais em que o interesse público recomendar a alteração, mesmo após a adjudicação do objeto, defende-se que a validade jurídica do ato estará condicionada à comprovação cumulativa dos seguintes requisitos: i) que haja comprovação por parte do consórcio de fatos novos, ocorridos após a assinatura do contrato, para justificar a alteração; ii) que o consórcio permaneça cumprindo todos os requisitos exigidos à época da habilitação na licitação, nos termos do edital correlato; iii) que os novos percentuais de participação das empresas na composição do consórcio não prejudiquem a execução do objeto contratado, nem constitua burla ao procedimento licitatório; iv) a existência de decisão motivada da Administração que esclareça e acate as razões da alteração e reconheça quais são os fatos novos, não existentes à época de licitação, que ensejam o deferimento do pedido de alteração após a adjudicação do objeto; v) a existência de manifestação no sentido de que a nova composição do consórcio teria, à época da licitação, condições de se sagrar, sozinha, vencedora do certame.

De todo modo, como forma de se evitar soluções divergentes, casuísticas ou até subjetivas nos casos concretos, o que se defende é que a Administração estabeleça regras objetivas em seus editais para disciplinar a participação dos consórcios nos certames, assim como o comportamento deles esperado durante a execução contratual, de modo a proteger a lisura do procedimento.

Conclusão

Ante as conseqüências negativas para o interesse público enfatizadas no presente estudo, conclui-se que alterações na base dos consórcios contratados, após a adjudicação do objeto, devem ser excepcionais e não rotineiramente admitidas pela Administração Pública durante a condução dos seus processos.

Especialmente por considerar que o elo estabelecido entre as empresas foi o que ensejou a vitória na disputa e à luz do que prevê a Lei 8.666/93, defende-se que somente será juridicamente válida a desconstituição do consórcio em situações bem delineadas e justificadas pelas consorciadas, nos moldes ora expostos, de modo a afastar a possibilidade de burla ao procedimento licitatório.

 

Referências bibliográficas
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BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo nº TC-011.818/2010-7. Acórdão nº 2.342/2011-Plenário, julgado em 31/8/2011.
JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Vade-Mécum de licitações e contratos. Legislação: organização e seleção, jurisprudências, notas e índices de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes. 5ª edição. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2011.
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 15ª edição. São Paulo: Dialética, 2012.

Informações Sobre o Autor

Thirzzia Guimarães de Carvalho

Procuradora Federal, Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Goiás, Especialista em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás


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