Primeiras ponderações à desapropriação confiscatória: a intervenção do estado na propriedade com espeque no artigo 243 da Constituição Federal

Resumo: Em consonância com as ponderações aventadas até o momento, quadra sublinhar que o direito de propriedade encontra salvaguarda no inciso XXII do artigo 5º do Texto Constitucional, sendo exigido, porém, que a propriedade atinja sua função social, nos termos do inciso XXIII do mesmo dispositivo ora mencionado. Desta feita, é possível assinalar que será lícito ao Estado intervir na propriedade toda vez em que se verificar o não cumprimento de seu papel no seio social, logo, com a intervenção, o Estado passa a desempenhar sua função primordial, a saber: atuar conforme as reivindicações de interesse público. A intervenção em comento pode ser agrupada em duas categorias distintas: de um lado, a intervenção restritiva, por meio da qual o Poder Público retira algumas das faculdades concernentes ao domínio, conquanto seja mantida a propriedade em favor do dono; doutro ângulo, a intervenção supressiva, que desencadeia a transferência da propriedade de seu dono para o Estado, acarretando, conseguintemente, a perda da propriedade. Com efeito, cuida reconhecer que o instituto da desapropriação encontra-se alcançado pela intervenção mais drástica por parte do Estado, ou seja, aquela capaz de provocar a perda da propriedade. Cuidar enunciar que a desapropriação configura procedimento de direito público por meio do qual o Poder Público transfere para si a propriedade de terceiros, por razão de utilidade pública ou de interesse social, comumente mediante pagamento de verba indenizatória.

Palavras-chaves: Intervenção do Estado. Desapropriação Confiscatória. Hipótese Constitucional.

Sumário: 1 Ponderações Introdutórias: O Aspecto de Mutabilidade da Ciência Jurídica; 2 Intervenção do Estado na Propriedade: Breve Escorço Histórico; 3 Comentários Gerais ao Instituto da Desapropriação no Ordenamento Brasileiro; 4 Primeiras Ponderações à Desapropriação Confiscatória: A Intervenção do Estado na Propriedade com espeque no artigo 243 da Constituição Federal

1 Ponderações Introdutórias: O Aspecto de Mutabilidade da Ciência Jurídica

Inicialmente, ao se dispensar um exame acerca do tema colocado em tela, patente se faz arrazoar que a Ciência Jurídica, enquanto um conjunto multifacetado de arcabouço doutrinário e técnico, assim como as robustas ramificações que a integram, reclama uma interpretação alicerçada nos plurais aspectos modificadores que passaram a influir em sua estruturação. Neste alamiré, lançando à tona os aspectos característicos de mutabilidade que passaram a orientar o Direito, tornou-se imperioso salientar, com a ênfase reclamada, que não mais subsiste uma visão arrimada em preceitos estagnados e estanques, alheios às necessidades e às diversidades sociais que passaram a contornar os Ordenamentos Jurídicos. Ora, infere-se que não mais prospera o arcabouço imutável que outrora sedimentava a aplicação das leis, sendo, em decorrência dos anseios da população, suplantados em uma nova sistemática.

Cuida hastear, com bastante pertinência, como flâmula de interpretação o “prisma de avaliação o brocardo jurídico 'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde está a sociedade, está o Direito', tornando explícita e cristalina a relação de interdependência que esse binômio mantém[1]. Destarte, com clareza solar, denota-se que há uma interação consolidada na mútua dependência, já que o primeiro tem suas balizas fincadas no constante processo de evolução da sociedade, com o fito de que seus Diplomas Legislativos e institutos não fiquem inquinados de inaptidão e arcaísmo, em total descompasso com a realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta estrutural dependência das regras consolidadas pelo Ordenamento Pátrio, cujo escopo primevo é assegurar que não haja uma vingança privada, afastando, por extensão, qualquer ranço que rememore priscas eras em que o homem valorizava a Lei de Talião (“Olho por olho, dente por dente”), bem como para evitar que se robusteça um cenário caótico no seio da coletividade.

Ademais, com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, imprescindível se fez adotá-la como maciço axioma de sustentação do Ordenamento Brasileiro, precipuamente quando se objetiva a amoldagem do texto legal, genérico e abstrato, aos complexos anseios e múltiplas necessidades que influenciam a realidade contemporânea. Ao lado disso, há que se citar o voto magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao apreciar a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF, “o direito é um organismo vivo, peculiar porém porque não envelhece, nem permanece jovem, pois é contemporâneo à realidade. O direito é um dinamismo. Essa, a sua força, o seu fascínio, a sua beleza”[2]. Como bem pontuado, o fascínio da Ciência Jurídica jaz, justamente, na constante e imprescindível mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo que reverbera na sociedade e orienta a aplicação dos Diplomas Legais e os institutos jurídicos neles consagrados.

Ainda neste substrato de exposição, pode-se evidenciar que a concepção pós-positivista que passou a permear o Direito, ofertou, por via de consequência, uma rotunda independência dos estudiosos e profissionais da Ciência Jurídica. Aliás, há que se citar o entendimento de Verdan, “esta doutrina é o ponto culminante de uma progressiva evolução acerca do valor atribuído aos princípios em face da legislação[3]. Destarte, a partir de uma análise profunda dos mencionados sustentáculos, infere-se que o ponto central da corrente pós-positivista cinge-se à valoração da robusta tábua principiológica que Direito e, por conseguinte, o arcabouço normativo passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho vinculante, flâmulas hasteadas a serem adotadas na aplicação e interpretação do conteúdo das leis, diante das situações concretas.

2 Intervenção do Estado na Propriedade: Breve Escorço Histórico

Em uma primeira plana, o tema concernente à intervenção do Estado na propriedade decore da evolução do perfil do Estado no cenário contemporâneo. Tal fato deriva da premissa que o Ente Estatal não tem suas ações limitadas tão somente à manutenção da segurança externa e da paz interna, suprindo, via de consequência, as ações individuais. “Muito mais do que isso, o Estado deve perceber e concretizar as aspirações coletivas, exercendo papel de funda conotação social[4], como obtempera José dos Santos Carvalho Filho. Nesta esteira, durante o curso evolutivo da sociedade, o Estado do século XIX não apresentava essa preocupação; ao reverso, a doutrina do laissez feire assegurava ampla liberdade aos indivíduos e considerava intocáveis os seus direitos, mas, concomitantemente, permitia que os abismos sociais se tornassem, cada vez mais, profundos, colocando em exposição os inevitáveis conflitos oriundos da desigualdade, provenientes das distintas camadas sociais.

Quadra pontuar que essa forma de Estado deu origem ao Estado de Bem-estar, o qual utiliza de seu poder supremo e coercitivo para suavizar, por meio de uma intervenção decidida, algumas das consequências consideradas mais penosas da desigualdade econômica. “O bem-estar social é o bem comum, o bem do povo em geral, expresso sob todas as formas de satisfação das necessidades comunitárias[5], compreendo, aliás, as exigências materiais e espirituais dos indivíduos coletivamente considerados. Com realce, são as necessidades consideradas vitais da comunidade, dos grupos, das classes que constituem a sociedade. Abandonando, paulatinamente, a posição de indiferente distância, o Estado contemporâneo passa a assumir a tarefar de garantir a prestação dos serviços fundamentais e ampliando seu espectro social, objetivando a materialização da proteção da sociedade vista como um todo, e não mais como uma resultante do somatório de individualidades.

Neste sentido, inclusive, o Ministro Luiz Fux, ao apreciar o Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo N° 672.579/RJ, firmou entendimento que “ainda que seja de aplicação imediata e incondicional a norma constitucional que estabeleça direitos fundamentais, não pode o Ente Estatal beneficiar-se de sua inércia em não regulamentar, em sua esfera de competência, a aplicação de direito constitucionalmente garantido[6]. Desta feita, para consubstanciar a novel feição adotada pelo Estado, restou necessário que esse passasse a se imiscuir nas relações dotadas de aspecto privado. “Para propiciar esse bem-estar social o Poder Público pode intervir na propriedade privada e nas atividades econômicas das empresas, nos limites da competência constitucional atribuída[7], por meio de normas legais e atos de essência administrativa adequados aos objetivos contidos na intervenção dos entes estatais.

Com efeito, nem sempre o Estado intervencionista ostenta aspectos positivos, todavia, é considerado melhor tolerar a hipertrofia com vistas à defesa social do que assistir à sua ineficácia e desinteresse diante dos conflitos produzidos pelos distintos grupamentos sociais. Neste jaez, justamente, é que se situa o dilema moderno na relação existente entre o Estado e o indivíduo, porquanto para que possa atender os reclamos globais da sociedade e captar as exigências inerentes ao interesse público, é carecido que o Estado atinja alguns interesses individuais. Ao lado disso, o norte que tem orientado essa relação é a da supremacia do interesse público sobre o particular, constituindo verdadeiro postulado político da intervenção do Estado na propriedade. “O princípio constitucional da supremacia do interesse público, como modernamente compreendido, impõe ao administrador ponderar, diante do caso concreto, o conflito de interesses entre o público e o privado, a fim de definir, à luz da proporcionalidade, qual direito deve prevalecer sobre os demais[8].

3 Comentários Gerais ao Instituto da Desapropriação no Ordenamento Brasileiro

Em consonância com as ponderações aventadas até o momento, quadra sublinhar que o direito de propriedade encontra salvaguarda no inciso XXII do artigo 5º do Texto Constitucional[9], sendo exigido, porém, que a propriedade atinja sua função social, nos termos do inciso XXIII[10] do mesmo dispositivo ora mencionado. Desta feita, é possível assinalar que será lícito ao Estado intervir na propriedade toda vez em que se verificar o não cumprimento de seu papel no seio social, logo, com a intervenção, o Estado passa a desempenhar sua função primordial, a saber: atuar conforme as reivindicações de interesse público. Consoante o magistério de Carvalho Filho[11], a intervenção em comento pode ser agrupada em duas categorias distintas: de um lado, a intervenção restritiva, por meio da qual o Poder Público retira algumas das faculdades concernentes ao domínio, conquanto seja mantida a propriedade em favor do dono; doutro ângulo, a intervenção supressiva, que desencadeia a transferência da propriedade de seu dono para o Estado, acarretando, conseguintemente, a perda da propriedade. Com efeito, cuida reconhecer que o instituto da desapropriação encontra-se alcançado pela intervenção mais drástica por parte do Estado, ou seja, aquela capaz de provocar a perda da propriedade.

Tecidos tais comentários, cuidar enunciar que a desapropriação configura procedimento de direito público por meio do qual o Poder Público transfere para si a propriedade de terceiros, por razão de utilidade pública ou de interesse social, comumente mediante pagamento de verba indenizatória. Ademais, em se tratando de um procedimento de direito público retrata a existência de uma sequência de atos e atividades do Estado e do proprietário, desenvolvidas nas órbitas administrativa e judicial. Com efeito, sobre o procedimento em comento incidem normas de direito público, maiormente nos aspectos que demonstram a supremacia do Estado sobre o proprietário. Ao lado disso, cumpre evidenciar que o escopo da desapropriação reside na transferência do bem desapropriado para o acervo do expropriante, sendo que esse objetivo só pode ser materializado se houver os requisitos ensejadores substancializados, ou seja, a utilidade pública ou o interesse social. Como regra geral, a indenização é paga pela transferência das desapropriações, só por exceção admitindo a ausência desse pagamento indenizatório.

Neste diapasão, a natureza jurídica do instituto da desapropriação é de procedimento administrativo e, quase sempre, também judicial. Ora, considera-se procedimento como um conjunto de atos e de atividades, devidamente formalizados e produzidos com sequencia, com o escopo de se alcançar determinado objetivo. Em aludido procedimento de desapropriação, tais atos se originam não somente do Poder Público, mas também do particular proprietário. Convém, ainda, mencionar que o procedimento tem seu curso, quase sempre, em duas fases. A primeira é a administrativa, na qual o Poder Público declara seu interesse na desapropriação e começa a adotar as providências visando à transferência do bem. Por vezes, a desapropriação encontra seu esgotamento nessa fase, havendo acordo com o proprietário. Tal situação, porém, destaque-se, é considerada rara. O normal é prolongar-se pela outra fase, a judicial, substancializada por meio da ação a ser movida pelo Estado em face do proprietário.

No que concernem aos pressupostos, considera-se que a desapropriação só pode ser considera legítima se reunir a utilidade pública, compreendendo-se em tal requisito a necessidade pública, e o interesse social. Carvalho Filho[12] vai aduzir que a utilidade pública resta materializada quando a transferência do bem se apresenta conveniente para Administração, ao passo que a necessidade pública decorre de situações de emergência, cuja solução reclame a desapropriação do bem. Conquanto o Texto Constitucional se refira a ambas as expressões, o correto é a noção de necessidade pública já está inserta na de utilidade pública, porquanto esta é mais abrangente que aquela, de maneira que se pode dizer que tudo que for necessário será útil. O interesse social, por sua vez, consiste naquelas hipóteses em que mais se sublinha a função da propriedade. O Poder Público, em tais episódicas situações, tem preponderantemente o objetivo de neutralizar de alguma forma as desigualdades coletivas, encontrando nos assentamentos de colonos e na reforma agrária os exemplos mais robustos. É importante assinalar que ambos os requisitos autorizadores materializam conceitos jurídicos indeterminados, porquanto são despojados de precisa que permita a identificação. Logo, importa frisar que ambos os conceitos serão aludidos na legislação pertinente.

4 Primeiras Ponderações à Desapropriação Confiscatória: A Intervenção do Estado na Propriedade com espeque no artigo 243 da Constituição Federal

Em alinho aos comentários tecidos até o momento, cuida ponderar que a desapropriação confiscatória foi instituída pelo artigo 243 da Constituição Federal de 1988[13], cujo escopo é a expropriação, sem o pagamento de qualquer verba indenizatória, de glebas em que sejam localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas, as quais passam a ser destinadas ao assentamento de colonos para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos. A temática encontra regulamentação por meio da Lei nº 8.257, de 26 de novembro de 1991[14], que dispõe sobre a expropriação das glebas nas quais se localizem culturas ilegais de plantas psicotrópicas e dá outras providências, responsável por incluir em sua disciplina as regras processuais aplicáveis para a transferência do imóvel. Carvalho Filho[15] vai consignar que a primeira característica distintiva em relação às demais modalidades expropriatórias assenta-se na premissa que na desapropriação confiscatória, em decorrência de sua particularidade, não há ensejo para a expedição de decreto declaratório prévio. Em decorrência de tal aspecto, a fase administrativa limita-se à formalização das atividades gerais e as de polícia dos órgãos públicos com vistas à preparação da ação de desapropriação.

Mesmo não havendo expressa menção na Constituição de 1988, a competência para propor a ação expropriatória é privativa da União, sendo lícito, porém, que a atribuição seja delegada a pessoa de sua administração indireta. Ao lado disso, cuida reconhecer que há mais uma razão para a atribuição ser privativa da União. Em primeiro lugar, quadra ponderar que é competência privativa da União legislar sobre desapropriação, conforme elucida o inciso II do artigo 22 do Texto de 1988[16]. Além disso, “a lei reguladora, tal como a Constituição, em nenhum momento fez referência direta a qualquer competência para Estados, Distrito Federal e Municípios, ao contrário do que ficou expresso na lei geral de desapropriações”[17]. É possível que surjam dúvidas quanto à extensão em que se dará esse tipo de expropriação, porquanto a dúvida repousa se a cultura for localizada em parte da propriedade, a expropriação se dará apenas na área em que há o cultivo ou em toda a extensão da propriedade.

Convém mencionar que a Constituição de 1988 e a Lei nº 8.257, de 26 de novembro de 1991[18], referiram-se apenas as glebas de qualquer região do país, sem fazer qualquer alusão, contudo, a área total ou parcial. Carvalho Filho[19], em decorrência disso, firma entendimento que a desapropriação deve alcançar a propriedade integralmente, ainda que o cultivo dê-se apenas em parte dela. O argumento utilizado pelo doutrinador está ancorado no ideário que o proprietário tem o dever de vigilância sobre sua propriedade, de sorte que é de presumir que conhecia o cultivo. A hipótese só vai comportar solução diversa no caso de o proprietário comprovar que o cultivo é processado por terceiros à sua revelia, mas, em tal cenário, o ônus da prova desse fato se inverte e cabe ao proprietário. Em síntese, o entendimento plasmado pelo doutrinador em comento exterioriza que não há desapropriação parcial, ou seja, a desapropriação incide na gleba integralmente, caso presente o pressuposto constitucional, ou não será caso de expropriação, devendo-se, nessa hipótese, destruir a cultura ilegal e processar os respectivos responsáveis. Cuida mencionar, porém, que o entendimento jurisprudencial postula pelo reconhecimento da desapropriação confiscatória parcial, consoante é extraído dos entendimentos colacionados:

“Ementa: Administrativo. Desapropriação. Expropriação. Cultivo de plantas psicotrópicas. Ocorrência. Confisco. Limitação. Vários herdeiros. Sanção. Desproporcionalidade. 1. O perdimento de propriedade imobiliária destinada ao cultivo ilegal de plantas psicotrópicas tem assento na Constituição Federal de 1988, conforme o seu art. 243. 2. A desapropriação-confisco limita-se à área efetivamente plantada, que, na espécie, totaliza cerca de 36m², abrangendo parte ínfima do imóvel, que possui um total de 69,3907 ha. Não se mostra proporcional determinar a expropriação da totalidade do imóvel, se apenas uma pequena parte deste foi destinada ao plantio ilegal. 3. Desproporcional a medida do confisco quando existirem diversos co-proprietários ou muitos herdeiros e apenas um deles for o autor da prática ilícita. 4. Apelação da União e remessa oficial a que se nega provimento (Tribunal Regional Federal da 1ª Região – Terceira Turma/ AC 0005726-45.2010.4.01.3813-MG/ Relator: Desembargador Federal Ney Bello/ Publicado no e-DJF1 em 25 jul. 2014, p.1232).

Ementa: Administrativo. Desapropriação. Cultivo de plantas psicotrópicas. Proprietário do imóvel. Legitimidade passiva. Expropriação da área efetivamente plantada. 1. O proprietário do imóvel no qual ocorreu o cultivo ilegal de planta psicotrópica é parte legítima para figurar no polo passivo da ação expropriatória. 2. A Constituição Federal de 1988 prevê, em seu art. 243, o perdimento do imóvel destinado ao cultivo ilegal de plantas psicotrópicas. 3. A desapropriação-confisco limita-se à área efetivamente plantada, ou ao módulo-rural para a região, caso a área plantada seja inferior ao mínimo. 4. Apelação parcialmente provida, para reduzir a expropriação do imóvel à área efetivamente plantada (2,00 ha), ou à área referente ao módulo rural para a região, caso este seja maior que 2 hectares”. (Tribunal Regional Federal da 1ª Região – Terceira Turma/ AC 0044123-67.2000.4.01.3800-MG/ Relator: Desembargador Federal Tourinho Neto/ Publicado no DJe em 01 jun. 2007, p. 14).

“Ementa: Constitucional. Desapropriação confisco. Plantio de plantas psicotrópicas. Proprietários não envolvidos no fato delituoso. Parcela da terra de difícil acesso. Área proporcionalmente pequena. Impossibilidade do desprezo do aspecto subjetivo. Punição que não se aplica sem análise criteriosa. Direito de propriedade. Proteção Constitucional. 1. A desapropriação não constitui direito absoluto do Estado, autorizando-o a atingir o direito de propriedade, constitucionalmente assegurado, que, só por exceção, pode ser retirada do seu titular, após procedimento expropriatório submetido ao devido processo legal e à ampla defesa, ou seja, ao controle judicial. 2. Os proprietários da fazenda não foram envolvidos no fato delituoso. 3. Como o confisco é uma penalidade, não pode ser aplicada sem que se levem em conta os aspectos subjetivos. 4. Documentos provam que a fazenda objeto da presente ação é produtiva. A área onde foi encontrada a plantação da droga é, em comparação com o tamanho do imóvel, pequena e de difícil acesso. Não se pode dizer que os proprietários foram omissos quanto ao dever de emprestar à propriedade sua função social. 5. Apelos e remessa, tida por interposta, improvidos” (Tribunal Regional Federal da 1ª Região – Terceira Turma/ AC 0015864-10.2000.4.01.3300-BA/ Relator: Desembargador Federal Hilton Queiroz/ Publicado no DJ em 18 out. 2004, p.83).

O procedimento judicial preconizado na Lei nº 8.257, de 26 de novembro de 1991[20], tem caráter sumário. A petição inicial, sem regra especial na lei, atenderá aos requisitos afixados no Código de Processo Civil, não havendo oferta de preço nem juntada de exempla do diário oficial, ao contrário do que é exigido para as demais modalidades de desapropriação. Assim, o juiz, ao ordenar a citação, já nomeia o perito, tendo este o prazo de oito dias para promover a entrega do laudo. O prazo para contestação e indicação de assistentes técnicos é de dez dias, a contar da juntada do mandado, cabendo ao magistrado designar audiência de instrução e julgamento dentro do período de quinze dias contados da data da peça de bloqueio. Caso o juiz conceda ao expropriante a imissão liminar na posse do imóvel, deverá proceder a realização a audiência de justificação, na qual haverá o exercício do contraditório. Encerrada a instrução processual, a sentença deve ser prolatada em cinco dias, desafiando o recurso de apelação. Transitando em julgamento o pronunciamento judicial, o bem expropriado será incorporado ao acervo patrimonial da União Federal. Parte significativa da doutrina tem firmado entendimento que a intervenção do Ministério Público, em sede de ações de desapropriação confiscatória, é imprescindível, porquanto tem fundamento constitucional e se reveste de indiscutível interesse público, embora a legislação específica seja lacunosa em tal questão.

 

Referências
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: < www.planalto.org.br >. Acesso em 10 jul. 2016.
___________. Lei nº 8.257, de 26 de novembro de 1991. Dispõe sobre a expropriação das glebas nas quais se localizem culturas ilegais de plantas psicotrópicas e dá outras providências. Disponível em: <www.planalto.org.br>. Acesso em 10 jul. 2016.
___________. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: <www.stj.jus.br>. Acesso em 10 jul. 2016.
___________. Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 10 jul. 2016.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24 ed, rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 38 ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2012.
VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun. 2009. Disponível em: <http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em 10 jul. 2016
 
Notas:
[1] VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun. 2009. Disponível em: <http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em 10 jul. 2016.

[2] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão em Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF. Empresa Pública de Correios e Telégrafos. Privilégio de Entrega de Correspondências. Serviço Postal. Controvérsia referente à Lei Federal 6.538, de 22 de Junho de 1978. Ato Normativo que regula direitos e obrigações concernentes ao Serviço Postal. Previsão de Sanções nas Hipóteses de Violação do Privilégio Postal. Compatibilidade com o Sistema Constitucional Vigente. Alegação de afronta ao disposto nos artigos 1º, inciso IV; 5º, inciso XIII, 170, caput, inciso IV e parágrafo único, e 173 da Constituição do Brasil. Violação dos Princípios da Livre Concorrência e Livre Iniciativa. Não Caracterização. Arguição Julgada Improcedente. Interpretação conforme à Constituição conferida ao artigo 42 da Lei N. 6.538, que estabelece sanção, se configurada a violação do privilégio postal da União. Aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º, da lei. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marcos Aurélio. Julgado em 05 ago. 2009. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 10 jul. 2016.

[3] VERDAN, 2009, s.p.

[4] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24 ed, rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011, p. 711.

[5] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 38 ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2012, p. 661.

[6] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo N° 672.579/RJ. Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Direito administrativo. Servidor público. Adicional noturno. Regime de plantão semanal. Necessário reexame da legislação infraconstitucional. Análise do contexto fático-probatório. Impossibilidade. Incidência da súmula 279 do STF. Agravo regimental desprovido. Órgão Julgador: Primeira Turma. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgado em 29 mai. 2012. Publicado em 19 jun. 2012. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 10 jul. 2016.

[7] MEIRELLES, 2012, p. 662.

[8] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão proferido em Recurso em Mandado de Segurança N° 27.428/GO. Administrativo. Servidor público. Determinação de abertura de conta corrente em instituição financeira pré-determinada. Recebimento de proventos. Possibilidade. Recurso ordinário improvido. Órgão Julgador: Quinta Turma. Relator: Ministro Jorge Mussi. Julgado em 03 mar. 2011. Publicado em 14 mar. 2011. Disponível em: <www.stj.jus.br>. Acesso em 10 jul. 2016.

[9] Idem. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: < www.planalto.org.br >. Acesso em 10 jul. 2016. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [omissis] XXII – é garantido o direito de propriedade.

[10] Ibid. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [omissis] XXIII – a propriedade atenderá a sua função social.

[11] CARVALHO FILHO, 2011.

[12] CARVALHO FILHO, 2011.

[13] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: <www.planalto.org.br>. Acesso em 10 jul. 2016. Art. 243. As propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º.

[14] Idem. Lei nº 8.257, de 26 de novembro de 1991. Dispõe sobre a expropriação das glebas nas quais se localizem culturas ilegais de plantas psicotrópicas e dá outras providências. Disponível em: <www.planalto.org.br>. Acesso em 10 jul. 2016.

[15] CARVALHO FILHO, 2011.

[16] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: <www.planalto.org.br>. Acesso em 10 jul. 2016. Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: [omissis] II – desapropriação.

[17] CARVALHO FILHO, 2011, p. 826.

[18] BRASIL. Lei nº 8.257, de 26 de novembro de 1991. Dispõe sobre a expropriação das glebas nas quais se localizem culturas ilegais de plantas psicotrópicas e dá outras providências. Disponível em: <www.planalto.org.br>. Acesso em 10 jul. 2016.

[19] CARVALHO FILHO, 2011.

[20] BRASIL. Lei nº 8.257, de 26 de novembro de 1991. Dispõe sobre a expropriação das glebas nas quais se localizem culturas ilegais de plantas psicotrópicas e dá outras providências. Disponível em: <www.planalto.org.br>. Acesso em 10 jul. 2016.


Informações Sobre o Autor

Tauã Lima Verdan Rangel

Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense. Especializando em Práticas Processuais – Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo-ES


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