Resumo: O presente estudo tem como foco a atuação da Defensoria Pública como legitimada ativa da ação civil pública decorrente de danos ambientais. Nessa toada, cumpre salientar que o meio ambiente vem sofrendo severos danos, afetando a existência humana na Terra, razão pela qual o Direito passou a intervir em tal situação. Com efeito, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 elevou o meio ambiente saudável a um direito fundamental. Embora tenha havido a previsão de tal direito expressamente na Constituição Federal, a sua consagração somente se dá por meio de mecanismos processuais, dentre os quais a ação civil pública. Esta ação, que originariamente continha apenas o Ministério Público como legitimado ativo, passou a contar com outros, a partir da Lei 11.448/2007, dentre os quais a Defensoria Pública. Esta instituição foi criada com a finalidade de auxiliar, juridicamente os hipossuficientes. Nessa toada, verifica-se qual é a contenda acerca da questão: quando ocorre a legitimação da ação civil pública para ajuizar a ação civil pública? é somente nos casos em que envolver hipossuficientes? Por isso, é necessário adentrar na dogmática ambiental, bem como se aferir a origem da Defensoria Pública. Finalmente, verifica-se que haverá uma explanação acerca dos valores constitucionais influenciadores da interpretação constitucional no que tange à legitimação para proposição da ação civil pública.
Palavras chave: defensoria pública – ação civil pública – meio ambiente – legitimidade.
Abstract: The present study focus on the Public Defender Office actuation in the condition of active legitimated of Civil Public Procedure deriving by environmental damages. In this way, it is necessary observe that environmental has been suffering severe damages, affecting the human race existence in Earth. In this compass, the 1988’s Federative Republic of Brazil Constitution elevate the health environmental to a fundamental right. Although, it have had been expressly provisioned at the Federal Constitution, the consecration only will be occurred by procedural mechanisms, like Civil Public Procedure. Originally, only the Publisch Prossecutor was legitimated to offer this cause, but with the law 11.448/2007 another legitimated institutes have been inserted, like the Public Defender Office. This institution was created in order to help the people who needs juridical orientation. In this tone, it is verified what is the contention about of this question: When Public Defender Office can offer a Civil Public Procedure? It is only when involve people who needs judicial help? Because of this, it is necessary enter in a environmental Law dogmatic and verify the Public Defender Office origin’s. Finally, it is verified that will have an explanation about the constitutional values which influence the active legitimateness of Public Civil Procedure by a constitutional interpretation.
Keywords: public defender office – civil public procedure – environment – legitimateness.
Sumário: Introdução. I. Defensoria pública. 1. A assistência jurídica. 1.1.Uma desarmonia conceitual. 1.2.Modelos de assistência judiciária. 2. Panorama constitucional da Defensoria Pública. 2.1. Assistência Jurídica no Brasil antes da Constituição da República Federativa de 1988. 2.2. Disposições acerca da Defensoria Pública na Constituição da República Federativa de 1988. 3. Funções da Defensoria Pública. II. O meio ambiente como um direito fundamental. 1.A Constituição Federal de 1988 e o direito ao meio ambiente saudável. 1.1. Definições de meio ambiente. 1.2. Estado de Direito Ambiental. 1.3. A dignidade da pessoa humana e o meio ambiente. 1.4. A teoria do risco e a proteção constitucional do meio ambiente. 2. O Meio ambiente como Direito Fundamental na visão do Supremo Tribunal Federal. 3.Tutela do Direito ao meio ambiente saudável. 3.1. Necessidade de tutela para as futuras gerações. 3.2.Esferas da tutela ambiental. III. A legitimidade em sentido amplo da defensoria pública para propor ação civil pública em defesa do meio ambiente saudável. 1. A ação civil pública. 1.1. O processo coletivo. 1.2. Direitos coletivos em sentido amplo. 1.3. A ação civil pública ambiental. 2. A interpretação conforme a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 2.1. Princípios constitucionais instrumentais pertinentes. 2.2. Princípios constitucionais materiais pertinentes. 3. A legitimidade em sentido amplo da Defensoria Pública para propor ação civil pública em defesa do meio ambienta saudável. 3.1. O embasamento constitucional para a legitimidade da Defensoria Pública. 3.3. Da legitimidade da Defensoria Pública e dos direitos difusos. 3.4.A legitimidade em sentido amplo da Defensoria Pública para propor ação civil pública em defesa do meio ambienta saudável. Conclusão. Referências.
Historicamente, verifica-se que a atuação judicial voltava-se àqueles que possuíam meios para garantir o valor de um processo. Todavia, paulatinamente, foi se introduzindo a necessidade de acesso à justiça a todos com o fito de respeitar e efetivar o princípio da isonomia, razão pela qual se demonstrará os aspectos importantes da assistência jurídica em sentido amplo.
Nessa toada, constata-se que a Defensoria Pública, cujas funções e panorama serão descritos, se mostra como ápice de uma justiça para todos, uma vez que um atendimento técnico qualificado dispensa a existência de poder aquisitivo por parte do beneficiado.
Além disso, com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, tal instituição por ser uma função essencial à justiça passou a ter a possibilidade de ajuizar demandas coletivas em favor dos necessitados.
A par da discussão acerca do conceito de necessitado, melhor apresentada no decorrer do trabalho, é necessário frisar que a Defensoria Pública sempre atuará em prol destes, sejam esses hipossuficentes econômicos, jurídicos ou organizacionais.
Paralelamente ao surgimento da Defensoria Pública, o planeta Terra passou a sofrer com catástrofes ambientais nunca antes vistas na história da humanidade, razão pela qual buscou se averiguar a causa de tais acontecimentos, chegando-se, assim, a atuação do homem perante o meio ambiente.
Com efeito, o comportamento nefasto do homem ao poluir a água, devastar matas e destruir a fauna e flora culminou em um movimento contrário em favor do meio ambiente saudável.
Nessa perspectiva, o referido movimento atingiu a Ciência Jurídica de modo que se criou o ramo do Direito Ambiental, o qual, no ordenamento jurídico brasileiro, passou a ter grande relevância com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 que inclusive acarretou na perspectiva doutrinária do denominado Estado de Direito Ambiental, elucidado no momento oportuno.
Em razão disso, em vários pontos desta Constituição passou a ventilar a possibilidade de ajuizamento de ação civil pública em favor do meio ambiente saudável.
Tal medida mostrou-se como uma forma de economia e efetividade processual ao tratar de forma coletiva o direito difuso em questão, qual seja, o meio ambiente saudável que é um direito de todos.
Dessa forma, mesmo sendo o meio ambiente saudável um direito difuso constitucionalmente assegurado, inclusive aos menos favorecidos economicamente, os quais não possuem valores pecuniários para agir contra os efeitos prejudiciais da violação daquele, é possível que a Defensoria Pública atue em uma demanda coletiva?
1. A assistência jurídica:
Mauro Cappelletti e Bryant Garth ao lecionar sobre as ondas renovatórias demonstraram que para que exista uma efetiva justiça seria necessário que os pobres passassem a ter acesso ao poder judiciário de maneira substancial de modo que se preenchesse com medidas que assegurassem a igualdade entre aqueles que tem condições de pagar para um advogado tecnicamente qualificado e aqueles que não tem, tudo isso em decorrência óbvia de uma economia de mercado a qual é adotada no Brasil.
“Os primeiros esforços importantes para incrementar o acesso à justiça nos países ocidentais concentraram-se, muito adequadamente em proporcionar serviços jurídicos para os pobres. Na maior parte das modernas sociedades, o auxílio de um advogado é essencial, senão indispensável para decifrar leis cada vez mais complexas e procedimentos misteriosos, necessários para ajuizar uma causa. Os métodos para proporcionar a assistência judiciária àqueles que não a podem custear são, por isso mesmo, vitais. Até muito recentemente, no entanto, os esquemas de assistência judiciária da maior parte dos países eram inadequados. Baseavam-se, em sua maior parte, em serviços prestados pelos advogados particulares, sem contraprestação (munus honorificum). O direito ao acesso foi, assim, reconhecido e se lhe deu algum suporte, mas o Estado não adotou qualquer atitude positiva para garanti-lo. De forma previsível, o resultado é que tais sistemas de assistência judiciária eram ineficientes. Em economias de mercado, os advogados, particularmente os mais experientes e altamente competentes, tendem mais a devotar seu tempo a trabalho remunerado que à assistência judiciária gratuita. Ademais, para evitarem incorrer em excessos de caridade, os adeptos do programa geralmente fixaram estritos limites de habilitação para quem desejasse gozar do benefício”[1].
Ocorre que para atender tal demanda a Constituição da República Federativa do Brasil cunhou a expressão ‘assistência jurídica’, a qual é muitas vezes aplicada de modo equivocado, seja na jurisprudência, seja na doutrina, seja na lei, em razão do seu confuso significado.
1.1. Uma desarmonia conceitual:
Quando se trata de Defensoria Pública, impossível não tecer comentários sobre o tema sem fazer referência ao conceito de assistência jurídica, uma vez que isso é concebido como o principal atributo desta função essencial à Justiça.
Ocorre que existe tanto na doutrina quanto na jurisprudência uma deturpação conceitual acerca da locução substantiva “assistência jurídica”, sendo ora tratada como justiça gratuita, ora como o serviço público e ora como órgão responsável por prestar esse serviço[2].
Em razão disso, neste trabalho, adotar-se-á o termo “assistência jurídica em sentido amplo” como gênero das espécies: justiça gratuita, assistência jurídica em sentido estrito e Defensoria Pública.
1.1.1. Justiça Gratuita:
Em diversas decisões, verifica-se a frequente confusão entre os conceitos de assistência judiciária e justiça gratuita, como se fossem os mesmos significados, sendo que Angelo Maraninchi Giannakos elucida a origem de tal confusão:
“Em geral, os conceitos de assistência judiciária e de justiça gratuita são confundidos. Tal situação ocorre em virtude de sua utilização como sinônimos, sem que, na verdade, o sejam. Talvez isso acontença por causa da própria legislação brasileira referente ao assunto que normalmente utiliza as palavras como sinônimas. Assim nos mostra a Lei nº 1.060/50 que, por várias vezes, utiliza a expressão assistência judiciária para referir-se ao benefício da justiça gratuita[3].”
Portanto, ainda que haja confusão quanto a denominação, tanto na jurisprudência, quanto na doutrina, além das disposições contidas na legislação, o benefício da justiça gratuita constitui a dispensa do pagamento adiantado das despesas processuais, em favor de que não dispõe de recursos para custeá-las sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família, conforme o art. 2º, parágrafo único da Lei 1.060/1950[4]
1.1.2. Assistência jurídica em sentido estrito:
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 ampliou o espectro de proteção aos necessitados, eis que as outras constituições tratavam apenas da assistência judiciária e não da assistência jurídica, sendo essa o ato de assistir, de auxiliar, de ajudar ou proteger no campo jurídico dentro e fora do processo, enquanto que aquela se trata apenas do auxílio prestado em um determinado processo judicial.[5]
Nessa toada, a assistência jurídica se concebe como um serviço a ser prestado pelo Estado como bem elucida Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Martires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco:
“Os chamados direitos a prestações materiais recebem o rótulo de direitos a prestação em sentido estrito. Resultam da concepção social dos Estados. São tidos como os direitos sociais por excelência. Estão concebidos com o propósito de atenuar desigualdades de fato na sociedade, visando ensejar que a libertação das necessidades aproveite ao gozo da liberdade efetiva por um maior número de indivíduos. O seu objetivo consiste numa utilidade concreta (bem ou serviço)[6]”.
Dessa forma, o serviço público de assistência jurídica integral enquadra-se em tal contexto, pois deve ser uma prestação material a ser realizada pelo Estado.
1.1.3. Defensoria Pública:
O art. 134 da Constituição da República Federativa do Brasil estabelece que a Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados.
Ademais, a Lei Complementar 80/94 que trata da organização da Defensoria Pública da União e dos Territórios, bem como traça normas gerais acerca das Defensorias Públicas dos Estados dispõe que a Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, assim considerados na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal.
Nessa linha de raciocínio, constata-se que a Defensoria Pública se constitui em um órgão voltado não somente à orientação jurídica dos necessitados, mas também de proteção ao regime democrático, à promoção dos direitos humanos e promoção dos direitos individuais e coletivos.
Dessa forma, a legislação brasileira em concatenação com a Constituição da República Federativa do Brasil consagra, definitivamente, a Defensoria Pública como instituição apta à proteção da tutela coletiva, tanto que a Lei 11.448/2007 realizou tal modificação na Lei 7.347/1985.[7]
1.2. Modelos de assistência judiciária:
Como frisado, a assistência judiciária se dá apenas endoprocessualmente, razão pela qual não se confunde com a assistência jurídica.
Nessa linha de raciocínio, com base na mencionada obra de Bryan Garth e Mauro Cappelletti classificou-se os modelos de assistência judiciária em: pro bono; judicare; salaried staff model e; misto.
No que tange na assistência judiciária pro bono é aquela que implica na prestação de assistência judiciária gratuita por advogados, sem nenhuma contraprestação por parte do Estado, sendo, pois, uma atividade de cunho caritativo[8].
Por outro lado o modelo judicare é um sistema em que os advogados particulares são pagos pelo Estado como forma de atingir o máximo de pessoas enquadradas na condição de hipossuficiente financeiro[9].
De outra banda, o modelo salaried staff consiste na remuneração de agentes públicos pelo Estado para realizarem assistência judiciária gratuita, podendo ocorrer de duas formas: criando um organismo estatal destinado a prestação direta dos serviços de assistência judiciária ou o serviço ser prestado por entidades não estatais que recebem subsídios dos cofres públicos para o custeio de suas despesas[10].
Por fim, o sistema misto é aquele em que se combinam fórmulas hauridas de outros modelos, como ocorre na Suécia.[11]
Diante de tal situação, verifica-se que o modelo adotado pelo Brasil é o Salaried Staff, o qual embasa a Defensoria Pública, tanto que o o Estado de Santa Catarina utilizava o modelo judicare em seu Estado, sendo, esse, considerado inconstitucional, segundo a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.270:
“EMENTA: Art. 104 da constituição do Estado de Santa Catarina. Lei complementar estadual 155/1997. Convênio com a seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/SC) para prestação de serviço de “defensoria pública dativa”.
Inexistência, no Estado de Santa Catarina, de órgão estatal destinado à orientação jurídica e à defesa dos necessitados. Situação institucional que configura severo ataque à dignidade do ser humano. Violação do inc. LXXIV do art. 5º e do art. 134, caput, da redação originária da Constituição de 1988.
Ações diretas julgadas procedentes para declarar a inconstitucionalidade do art. 104 da constituição do Estado de Santa Catarina e da lei complementar estadual 155/1997 e admitir a continuidade dos serviços atualmente prestados pelo Estado de Santa Catarina mediante convênio com a OAB/SC pelo prazo máximo de 1 (um) em funcionamento órgão estadual de defensoria pública estruturado de acordo com a Constituição de 1988 e em estrita observância à legislação complementar nacional (LC 80/1994)”[12].
Portanto, o modelo adotado pela Constituição a República Federativa do Brasil de 1988 é o salaried staff, eis que o STF em tal decisão afastou cabalmente a possibilidade do sistema judicare que funcionava, no caso, com a Ordem dos Advogados do Brasil, recebendo verbas do Estado de Santa Catarina.
2. Panorama constitucional da Defensoria Pública:
2.1. Assistência Jurídica no Brasil antes da Constituição da República Federativa de 1988:
O primeiro regramento a trazer alguma preocupação com os necessitados se deu por meio das Ordenações Filipinas (as quais tiveram disposições em vigência até a publicação do Código Civil de 1916), que previam no robusto português da época: Em sendo o agravante tão pobre que jure não ter bens móveis, nem de rais, nem por onde pague o aggravo, e dizendo na audiência uma vez o Pater Noster pela alma Del Rey Don Diniz, ser-lhe-á havido, como se pagasse os novecentos réis, contanto que tire de tudo certidão dentro do tempo, em que havia de pagar o aggravo[13].
Não obstante, a primeira Constituição a demonstrar preocupação com os juridicamente necessitados foi a de 1934, que além de dispor acerca da assistência judiciária aos necessitados, também estabeleceu a necessidade de criação de órgãos especiais para tanto.
Em contrapartida, a Constituição de 1937, em razão do seu viés autoritário, foi omissa no que tange à qualquer benefício relacionado à assistência aos necessitados, suprimindo a evolução conseguida com a constituição anterior.
Apesar disso, o Código de Processo Civil de 1939 trouxe previsão expressa no que tange à espécie de assistência denominada justiça gratuita.
Por outro lado, a Constituição de 1946 retomou a previsão do direito de assistência judiciária aos necessitados, porém sem prever a necessidade de um órgão imbuído de tal função.
Nessa perspectiva, houve a efetiva implantação de um sistema que abrangeu tanto a assistência judiciária quanto a justiça gratuita por meio da Lei 1.060/1950, sendo os dias atuais aplicada sem ter sido revogada.
Por fim, a Constituição de 1967/69 não trouxe modificações nesta situação, bem como o Código de Processo Civil vigente que remete à Lei 1.060/1950 em sua previsão no art. 19.
2.2. Disposições acerca da Defensoria Pública na Constituição da República Federativa de 1988:
A Constituição da República Federativa de 1988, por trazer diversas disposições concernentes aos direitos sociais, turbinou consideravelmente as disposições acerca da assistência jurídica em sentido amplo, uma vez que previu expressamente tal nomenclatura no lugar de assistência judiciária, conforme a leitura do seu art. 5º, LXIV, demonstrando uma mudança de paradigma, pois o auxílio passou a ser prestado não somente dentro do processo, mas também em uma atuação extraprocessual.
Além disso, a Constituição da República Federativa de 1988 também trouxe a criação da Defensoria Pública, incluindo a como uma função essencial à justiça, conforme o art. 134.
Frederico Rodrigues Viana de Lima leciona que as Constituições anteriores a de 1988 não criaram nenhum órgão especifico para prestar tal serviço público de modo que:
“A assistência judiciária se encaixava como mais um serviço embutido no rol das competências administrativas dos entes políticos, do mesmo modo como acontecia com a saúde, a educação, a segurança pública etc. Não havia nenhuma outra referência em especial. Previa-se unicamente o serviço a ser realizado pelos Estados, deixando-lhes ao alvedrio a maneira pela qual deveriam realizá-lo. Diante da inexistência de previsão nas Constituições de quem deveria cumprir a função de prestar o serviço de assistência judiciária gratuita, os Estados se depararam com duas possibilidades: (a) a realização da assistência judiciária gratuita por um órgão estatal já existente; ou (b) a criação de um novo órgão com esta missão.[14]”.
Com base em tal premissa, o Estado do Rio de Janeiro, desde a Lei Estadual 2.188/1954 institui cargos denominados como Defensores Públicos, ligados então à Procuradoria do Estado, sendo logo em seguida (Lei Estadual 3.434/1958) transferidos ao Ministério Público, sendo somente em 1977 (Lei Complementar Estadual 06), sob a égide da Constituição Estadual de 1975, que houve a criação de um órgão estadual próprio denominado de Defensoria Pública, o qual inspirou o modelo apresentado pela Constituição da República Federativa do Brasil[15].
De outra banda, salienta-se que a Constituição da República Federativa do Brasil às seguintes características da Defensoria Pública: função essencial à jurisdição; incumbida da orientação jurídica e defesa, em todos os graus dos necessitados; há uma lei complementar que organiza a Defensoria Pública da União e que estabelece normas gerais para as Defensorias Públicas dos Estados; o ingresso na carreira se dá mediante aprovação em concurso público de provas e títulos; os Defensores tem garantia de inamovibilidade; há vedação de advocacia fora das atribuições institucionais; e há autonomia funcional e administrativa, bem como iniciativa de proposta orçamentária (somente no que tange às Defensorias Publicas dos Estados)[16].
Portanto, constata-se que a inserção do art. 134 na Constituição da República Federativa do Brasil se traduz como uma conquista significativa para a Defensoria Pública, eis que positivou em âmbito constitucional a instituição voltada para prestar o serviço público de assistência jurídica, por meio de um corpo especializado de agentes, garantindo, ainda, independência funcional para atuar em prol dos necessitados.
3. Funções da Defensoria Pública:
Como visto, os necessitados são o norte para verificar como ocorre a atuação da Defensoria Pública, motivo pelo qual há a necessidade de definir o sentido de ‘necessitado’ e de ‘insuficiência de recursos’ com a finalidade de explanar acerca das funções da Defensoria Pública.
Em uma interpretação literal, se entenderia que a função institucional da Defensoria Pública se destinaria exclusivamente aos economicamente necessitados, todavia a interpretação deve ter um enfoque jurídico-teleológico diverso uma vez que o sistema jurídico e a realidade social contemporânea apresenta outros tipos de necessidade e outros modos de insuficiência de recursos e não somente a econômica, razão pela qual se concebeu que a Defensoria Pública possui dois tipos de funções: a típica (proteção aos hiposuficientes econômicos) e a atípica (proteção às demais espécies de hipossuficiência)[17].
Nessa toada, salienta-se que a função típica, na linha de Silvio Roberto Mello Moraes seriam aquelas funções exercidas pela Defensoria Pública na defesa de direitos e interesses dos hipossuficientes, ao passo que as funções atípicas seriam aqueles outras exercidas pela Defensoria Pública, independente da situação econômica daquele ou daqueles beneficiados com a atuação da instituição[18].
A existência de funções atípicas se fundamentam em duas linhas de argumentação, sendo que a primeira delineia que a Constituição não descreve de forma exaustiva as funções da Defensoria Pública, conforme o Supremo Tribunal Federal quando do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 558/RJ:
“A Constituição Federal impõe, sim, que os Estados prestem assistência judiciária aos necessitados. Daí decorre a atribuição mínima compulsória da Defensoria Pública. Não, porém, o impedimento a que seus serviços se estendam ao patrocínio de outras iniciativas processuais em que se vislumbre interesse social que justifiquem esse subsídio estatal[19]”.
Na mesma linha aduz Ada Pellegrini Grinover:
“O art. 134 da CF não coloca limites às atribuições da Defensoria Pública. O legislador constitucional não usou o termo exclusivamente, como fez, por exemplo, quando atribuiu ao Ministério Público a função institucional de “promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei” (art. 129, inc. I). Desse modo, as atribuições da Defensoria podem ser ampliadas por lei, como, aliás, já ocorreu com o exercício da curadoria especial, mesmo em relação a pessoas não economicamente necessitadas (art. 4º, inc. VI, da Lei Complementar n. 80/94). O que o art. 134 da CF indica, portanto, é a incumbência necessária e precípua da Defensoria Pública, consistente na orientação jurídica e na defesa, em todos os graus, dos necessitados, e não sua tarefa exclusiva[20]”.
Por outro lado, a outra linha de argumentação se baseia pelo fato de que há uma interpretação ampliativa das expressões ‘insuficiência de recursos’ e ‘necessitados’, as quais podem atender ao ponto de vista jurídico e organizacional.
No que tange à hipossuficiência jurídica, verifica-se que essa decorre do fato de a parte não se encontrar representada no processo judicial por profissional da advocacia[21]. Nestes casos, a Defensoria Pública somente atuaria nos casos em que o ordenamento jurídico exige a necessidade de uma efetiva realização de contraditório e ampla defesa pela outra parte como ocorre, por exemplo, no processo penal em que a defesa é direito fundamental do réu e no processo civil quando da necessidade de curador especial, em razão da previsão do art. 9º do Código de Processo Civil.
Por fim, no tocante ao ponto de vista organizacional, a hipossuficiência se caracteriza conforme Ada Pellegrini Grinover quando da existência de todos aqueles que são socialmente vulneráveis: os consumidores,os usuários de serviços públicos, os usuários de planos de saúde, os que queiram implementar ou contestar políticas públicas, como as atinentes à saúde, à moradia, ao saneamento básico, ao meio ambiente etc[22].
Ocorre que acerca da legitimidade da Defensoria Pública da ações coletivas há uma certa contenda doutrinária e jurisprudencial de modo que será tratado de forma mais específica em capítulo posterior.
Portanto, verifica-se em um primeiro momento que a Defensoria Pública possui atribuições para atuar em relação às suas funções típicas (quais sejam, em prol dos financeiramente necessitados), bem como em relação às funções atípicas sejam de natureza jurídica, sejam de natureza organizacional, ainda que haja debates acerca desta função.
II – DO MEIO AMBIENTE COMO UM DIREITO FUNDAMENTAL
1. A Constituição Federal de 1988 e o direito ao meio ambiente saudável
1.1. Definições de meio ambiente:
De pronto, cumpre salientar que o meio ambiente passou a integrar a Carta Magna brasileira no art. 225, porém é necessário frisar que a definição do objeto de tal direito possui séria controvérsia.
O art. 3°, I, da Lei 6.938/81 estabelece o seguinte conceito:
“Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas; “
Ocorre que o previsto neste dispositivo não abrange elementos sociológicos e culturais, os quais foram incluídos no Anexo I, XII, da Resolução do CONAMA 306/2002.
Logo, entende-se que o meio ambiente em sentido amplo é gênero que abarca o meio ambiente natural, cultural e artificial[23].
O conceito de meio ambiente natural vai ao encontro do que preconiza o citado dispositivo da Lei 6.938/91, uma vez que se constituí pelo solo, pela água, pelo ar atmosférico, a flora, bem como pela interação dos seres vivos e seu meio, onde se dá a correlação recíproca entre as espécies e as relações destas com o ambiente físico que ocupam[24].
Por outro lado, o meio ambiente cultural é aquele consubstanciado pelo patrimônio histórico, artístico, arqueológico, paisagístico, turístico, que, apesar de artificial, difere deste em razão do sentido de valor especial que adquiriu ou de que se impregnou[25].
Por fim, o meio ambiente artificial é integrado pelos bens, fruto da intervenção humana, os quais não formam o patrimônio cultural, sendo a cidade um exemplo de patrimônio de ambiental artificial[26].
Dessa forma, passadas a análise de definições acerca do conceito de meio ambiente, passar-se-á a relacioná-lo com aspectos do direito constitucional.
1.2. Estado de Direito Ambiental:
As situações que permeiam o meio ambiente nos tempos atuais, tais como efeito estufa, chuva ácida, buraco na camada de ozônio dentre outros problemas ambientais oriundos de atividades insustentáveis do homem, levaram a dogmática ambiental para o centro da Ciências Jurídica brasileira, qual seja, a previsão constitucional.
Nesse diapasão, Antônio Herman Benjamin elucida:
“Crise ambiental essa que ninguém mais disputa sua atualidade e gravidade. Crise que é multi facetaria e global com riscos ambientais de toda ordem e natureza: contaminação da água que bebemos, do ar que respiramos e dos alimentos que ingerimos, bem como perda crescente da biodiversidade planetária. Já não são ameaças que possam ser enfrentadas exclusivamente pelas autoridades públicas (a fórmula do nós-contra-o-Estado) ou mesmo por iniciativas isoladas, pois vítimas são e serão todos os membros da comunidade afetados indistintamente, os de hoje e os de amanhã, isto é as gerações futuras. São riscos que à insegurança política, jurídica e social acrescentam a insegurança ambiental, patologia daquilo que o legislador brasileiro com certa dose de imprecisão, chama de meio ambiente ecologicamente equilibrado e, por vezes, de qualidade ambiental”[27].
Com base nisso, constata-se que o meio ambiente saudável, no que tange à qualidade satisfatória do equilíbrio ecológico, é pertencente a todos, não abrangendo um determinado bem em si, mas sim o respectivo efeito ecológico[28].
Diante da situação mencionada, verifica-se que a instituição do Estado necessita da qualificação ambiental para atingir a sua finalidade, sendo, portanto, um Estado de Direito Ambiental.
Na linha de José Rubens Morato Leite e Patryck de Araújo Ayala, o Estado de Direito Ambiental caracteriza-se por ser democrático e social com valores ambientais como tarefas prioritárias fundados em normas constitucionais[29].
Nesse diapasão, em outra obra, José Rubens Morato Leite, leciona que para haver um Estado de Direito Ambiental é imprescindível a observância da dignidade da pessoa humana:
“O Estado de Direito Ambiental, é um conceito de cunho teórico-abstrato que abarca elementos jurídicos sociais e políticos na busca de uma situação ambiental favorável à plena satisfação da dignidade humana e harmonia dos ecossistemas. Assim, é preciso que fique claro que as normas jurídicas são apenas uma faceta do complexo de realidades que se relacionam com a ideia de Estado de Direito do Ambiente”[30].
Assim, verifica-se a necessidade de traçar contornos acerca da relação entre a dignidade da pessoa humana e o meio ambiente saudável.
1.3. A dignidade da pessoa humana e o meio ambiente:
Por outro lado, para Édis Milaré, o direito ao meio ambienta saudável se configura não somente em um mero direito fundamental, mas sim em um aspecto da dignidade da pessoa humana:
“O reconhecimento do direito a um meio ambente sadio configura-se, na verdade, como extensão do direito à vida quer sob o enfoque da própria existência física e saúde dos seres humanos, quer quanto ao aspecto da dignidade dessa existência – a qualidade de vida -, que faz com que valha a pena viver[31]”.
Cumpre lembrar que Ingo Sarlet leciona que a dignidade da pessoa humana é:
“(…) a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem à pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida”[32].
Nesse sentido, verifica-se que este fundamento da república positivado no art. 1º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 na condição de uma norma enquadrada tanto na concepção de princípio quanto na de regra.
As regras, bem como os princípios são trabalhadas no ordenamento jurídico pátrio, conforme a concepção de Robert Alexy, sendo que estes possuem um caráter prima facie, enquanto aquelas são de um caráter definitivo, no momento em que aplicáveis sem qualquer exceção. Por isso, os princípios têm como características o fato de ser mandamentos de otimização; de pertencer à lógica do ‘mais ou menos’; de serem aplicáveis na maior medida possível; e de apontar na direção da decisão a ser dada. Por outro lado, as regras são caracterizadas por serem mandamentos de definição; pertencerem à lógica do ‘tudo ou nada’; serem aplicáveis na medida exata de suas prescrições; bem como serem de aplicação imediata, impondo resultados.[33]
A concepção principiológica é patente, em razão de sua constante otimização entre os direitos conflitantes de diversas pessoas, ao passo que na concepção de regra, verifica-se em seu caráter absoluto de não poder ser violado, como, por exemplo, a vedação à tortura, regramento que absolutamente não permite a violação da dignidade da pessoa humana.
Dessa forma, é inerente à dignidade da pessoa humana, tanto na acepção de regra como de princípio, a necessidade de observar o meio ambiente saudável como direito fundamental, uma vez que sem esse não existe aquela.
1.4. A teoria do risco e a proteção constitucional do meio ambiente:
Passada a conceituação de dignidade da pessoa humana, verifica-se que para essa se consolidar é necessário a observância de um Estado Direito Ambiental, o qual possui embasamento sociológico baseado na Teoria da Sociedade de Risco.
Esta teoria foi elaborada por Ulrich Beck como uma representação que serve como substrato para a discussão sobre as realizações e as limitações da sociedade industrial e da própria modernidade, uma vez que as teorias sociais já existentes entendem são ultrapassadas, eis que entendem que a natureza é um presente para o homem e a esse deve se submeter [34].
Nessa linha de raciocínio, surgiram novos mecanismos para proteção do meio ambiente, inclusive a aplicação do direito constitucional:
“Coube à Constituição – do Brasil, mas também de muitos outros países – repreender e retificar o velho paradigma civilístico, substituindo-o, em boa hora, por outro mais sensível à saúde das pessoas (enxergadas coletivamente), às expectativas das futuras gerações, à manutenção das funções ecológicas, aos efeitos negativos a longo prazo da exploração predatória dos recursos naturais, bem como aos benefícios tangíveis e intangíveis do seu uso-limitado[35]”.
Por fim, verifica-se que o direito ao meio ambiente saudável restou constitucionalizado em razão de medida salutar a fim de garantir não só a proteção aos bens ambientais (risco de perecerem para sempre), mas também em face da própria existência humana e consequentemente da sua dignidade, de forma que se garantidos há o chamado Estado de Direito Ambiental.
2. O Meio ambiente como Direito Fundamental na visão do Supremo Tribunal Federal:
O art. 225 da Constituição da República federativa do Brasil dispõe:
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.
O referido dispositivo encontra-se fora do título inerente aos direitos e garantias fundamentais de modo que há uma celeuma acerca do meio ambiente saudável como direito fundamental.
Ocorre que em razão dos efeitos globais nefastos que decorrem da violação ao meio ambiente saudável, o Supremo Tribunal Federal, em diversas decisões já reconheceu o caráter fundamental do direito ao meio ambiente saudável, porém duas decisões merecem destaque.
No Mandado de Segurança nº 22.164/DF, o Min. Celso de Mello assentou que o direito ao meio ambiente saudável:
“Trata-se (…) de um típico direito de terceira geração que assiste de modo subjetivamente indeterminado a todo gênero humano, circunstância essa que justifica a especial obrigação de defendê-lo e preservá-lo em benefício das presentes e futuras gerações, evitando-se, desse, modo que irrompam, no sei da comunhão social, os graves conflitos intergeracionais marcados pelo desrespeito ao dever de solidariedade na proteção desse bem essencial de uso comum de todos quantos compõem o grupo social”[36].
Ademais, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que o bem ambiental ser passível de um direito fundamental deve ter como característica a repartição de responsabilidades nos exercícios; a relação estabelecida a concretização daquele e os deveres atribuídos aos Poderes Públicos e à coletividade e; a titularidade compartilhada de interesses sobre o bem que alcançam as futuras gerações[37].
Nessa toada, ainda na medida cautelar da ação direta de inconstitucionalidade 3.540, o Min. Celso de Mello também defendeu:
“A preocupação com a preservação do meio ambiente – que hoje transcende o plano das presentes gerações para também atuar em favor das futuras tem constituído , por isso mesmo, objeto de regulações normativas e proclamações jurídicas que ultrapassando a província meramente doméstica do direito nacional de cada Estado soberano, projetam-se no plano das declarações internacionais que refletem em sua expressão concreta, o compromisso das Nações com o indeclinável respeito a esse direito fundamental que assiste a toda a Humanidade”[38].
Portanto, verifica-se que a corte suprema do país entende que o meio ambiente se trata de um direito fundamental, a qual posta desta maneira deixa de ser um interesse menor ou acidental no ordenamento, contrabalançando as antiquadas prerrogativas do direito privado[39].
3. Tutela do Direito ao meio ambiente saudável:
3.1. Necessidade de tutela para as futuras gerações:
No tocante às medidas a serem adotadas para preservar o meio ambiente saudável, Canotilho leciona:
“Torna-se claro que a profunda imbricação dos efeitos combinados e das suas implicações globais e duradouras colocal em causa comportamentos ecológicos e ambientalmente relevantes das gerações actuais que, a continuarem sem a adopção de medidas restritivas, acabarão por comprometer, de forma insustentável e irreversível, os interesses das gerações futuras na manutenção e defesa da integridade dos componentes ambientais naturais. Estes interesses só podem proteger-se se partimos do pressupostoinelimável e incontornável de que as actuações sobre o ambiente adoptadas pelas gerações actuais devem tomar em consideração os interesses das gerações futuras[40]”.
Ademais, o Supremo Tribunal Federal entendeu no Recurso Extraordinário 134.297 que o meio ambiente constitui um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, qualificando-se como encargo que se impõe (sempre em benefício das presentes e das futuras gerações) tanto ao Poder Público como à coletividade[41].
Assim, verifica-se que a proteção ao meio ambiente saudável não se beneficia apenas a gerações atuais, mas também as futuras de modo que a tutela ambiental possui esta peculiaridade.
3.2. Esferas da tutela ambiental:
A tutela ambiental possui três esferas de atuação, quais sejam: a penal, administrativa e civil, conforme o art. 225, §3º da Constituição da República Federativa do Brasil:
As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
No tocante à esfera penal, por ser o soldado de reserva na derradeira trincheira no combate aos comportamentos humanos indesejados, há a cominação de pena, inclusive a pessoas jurídicas, por diversos crimes, que afetam as presentes e futuras gerações, como, por exemplo, o de poluição previsto no art. 54 da Lei 9.605/88.
Por outro lado, na esfera de proteção administrativa, constata-se que há uma redução da discricionariedade da Administração Pública, uma vez que impõem ao administrador o permanente dever de levar em conta o meio ambiente e a sua proteção, em razão das presentes e futuras gerações[42].
Além disso, no que tange a esfera civil de proteção do meio ambiente saudável, se dá por essa responsabilidade que não é preventiva nem repressiva, mas sim reparatória, pois vislumbra recompor o estado anterior ou, se não houver tal possibilidade, indenizar em dinheiro[43].
Nesse sentido, lembra-se a responsabilidade civil na seara ambiental foi revolucionada pela Lei 6.938/1981, pois no período posterior à promulgação daquela, o regime desta era subjetivo, ou seja, baseado na culpa e no dolo, momento em que as dificuldades da responsabilidade civil foram verificadas em face de abranger um grande número de pessoas, razão pela qual havia obstáculos para comprovar a culpa do agente poluidor,quase sempre munido de licenças e autorizações emanadas do poder público, além do fato de que o Código Beviláqua permitia excludentes tais como o caso fortuito e a força maior[44].
Por fim, verifica-se que a responsabilidade civil pode advir tanto de uma demanda ordinária individual, em que o meio ambiente seria tutelado de forma secundária, bem como nas hipóteses em que se permite ajuizar uma ação civil pública, sendo que a Lei 7.347/85 legitima a Defensoria Pública para tanto, conforme o art. 5º, II, do referido estatuto.
As ações coletivas se consubstanciam em mecanismos, os quais permitem o acesso à Justiça de forma ampla e efetiva, bem como proporciona uma importante economia processual. Esta se reflete na uniformização de julgamentos, na redução de custos materiais e econômicos e na não ocorrência de decisões contraditórias, culminando assim em uma maior segurança jurídica[45].
No tocante ao acesso à justiça, é imperioso frisar que Bryant Garth e Mauro Cappelletti preconizaram a tutela dos direitos difusos como uma segunda onda renovatória[46].
Nessa toada, os referidos autores preconizam:
“A concepção tradicional do processo civil não deixava espaço para a proteção dos direitos difusos. O processo era visto apenas como um assunto entre duas partes, que se destinava à solução de uma controvérsia entre essas mesmas partes a respeito de seus próprios interesses individuais. Direitos que pertencessem a um grupo, ao público em geral ou a um segmento do público não se enquadravam bem nesse esquema. As regras determinantes da legitimidade, as normas de procedimento e a atuação dos juízes não eram destinadas a facilitar as demandas por interesses difusos intentadas por particulares. As reformas discutidas a seguir são a prova e os resultados das rápidas mudanças que caracterizaram essa fase. (…) A visão individualista do devido processo judicial está cedendo lugar rapidamente, ou melhor, está se fundindo com uma concepção social, coletiva. Apenas tal transformação pode assegurar a realização dos “direitos públicos” relativos a interesses difusos”.
Em razão dessa perspectiva apresentada, houve a introdução do processo coletivo no ordenamento jurídico brasileiro apresentado aquele que é apresentado por um legitimado autônomo com a finalidade de obter um provimento jurisdicional que atingirá uma coletividade, um grupo ou um determinado número de pessoas, em razão da postulação de um direito coletivo[47].
Com efeito, verifica-se que o ordenamento jurídico dispôs de variados tipos de ações para alcançar o objeto da tutela coletiva, dentre os quais, cita-se a ação popular, o mandado de segurança coletivo, o mandado de injunção coletivo e a ação de improbidade administrativa.
Porém, a principal forma de proteção dos direitos e interesses coletivos encontram-se na ação civil pública, no qual há um procedimento padrão previsto na Lei 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública) e na Lei 9.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) e especificamente na seara ambiental há aplicação da Lei 6.938/1981.
1.2. Direitos coletivos em sentido amplo:
Conforme o art. 81 do Código de Defesa do Consumidor, nos incisos I, II e III do respectivo artigo, vislumbra-se a caracterização doutrinária dos direitos coletivos denominados de difusos, coletivos em sentido estrito, bem como os individuais homogêneos.
Os direitos coletivos em sentido estrito são de natureza indivisível, dos quais são titular grupo, categoria ou classe de pessoas (não determinadas, mas com possibilidade de o serem) ligadas entre si, ou com a parte contrária, por uma relação jurídica base, sendo que essa necessita ser anterior à lesão produzida.[48]
Por outro lado, há os direitos individuais homogêneos, os quais decorrem de uma violação de um direito de diversos titulares de pretensões individuais que possuam homogeneidade. Na realidade trata-se de uma ficção jurídica em que torna um direito individual em coletivo com o fito de permitir uma proteção devidamente efetiva[49].
Por fim, há os direitos difusos, os quais são entendidos como aqueles, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato, sendo um dos principais exemplo o direito ao meio ambiente saudável, como na hipótese de poluição atmosférica, em que um número incalculável de pessoas vitimadas por tal circunstância fática de modo que inviabilizaria qualquer determinação de vítimas.
Com efeito, tal categoria restou mencionada por último pelo fato de, em regra, ser o meio ambiente um direito de natureza difusa, em face do fato de que sua violação possui invariavelmente um alcance global.
1.3. A ação civil pública ambiental:
A ação civil Pública é o mais importante meio processual de defesa ambiental,[50] uma vez que possui o devido alcance tanto a tutela difusa, coletiva ou individual homogêneo como elucida René da Fonseca e Silva Neto:
“A importância de uma ação civil pública na proteção ambiental se concretiza na medida em que ela busca a reparação do dano ambiental material e dano moral difuso. Conquanto tratando-se o meio ambiente de direito difuso, res omnium, práticas destrutivas ferem sobremaneira a sociedade presente, sem perder-se de vista a proteção e inibição aos agentes que degradam a natureza, tutelando, assim, a manutenção de um meio ambiente saudável também às futuras gerações[51]”.
Nesse diapasão, é importante salientar que a ação civil pública possui como objeto imediato a condenação em dinheiro ou o cumprimento de uma obrigação de fazer ou não fazer.
Heline Servini Ferreira entende que isso é possível pelo fato da incidência do princípio da reparação integral do dano, além do fato de que os deveres de proteção, recuperação e indenização não se excluem em matéria ambiental, ainda que não haja previsão de tal cumulação pelo legislador, entendimento que foi adotado na decisão do Recurso Especial 605.323 julgado pelo Superior Tribunal de Justiça[52].
Por fim, no que tange à legitimidade ativa da ação civil pública, a Lei 7.347/85 dispõe que em favor do meio ambiente poderão ingressar com esta ação, o Ministério Público, a Defensoria Pública, a União, os Estados, os Municípios, o Distrito Federal, as Autarquias, as Empresas Públicas, as Fundações e as Sociedades de Economia Mista, em conjunto ou separadamente.
Lembra-se que a Defensoria Pública em um primeiro momento não possuía qualquer forma de legitimação para a proposição de ação civil pública, posteriormente, com o surgimento do Código de Defesa do Consumidor esta instituição passou a ser considerada legitimada por uma via transversa, já que o art. 82 deste diploma permitiu que órgãos sem personalidade jurídica poderiam ajuizar tal demanda coletiva e, finalmente, com a Lei 11.488/2007 passou a ser considerada legitimada expressamente para tutelar qualquer direito por meio da ação coletiva em comento[53].
Ocorre que a CONAMP (Associação Nacional dos Membros do Ministério Público) ajuizou a ADI nº 3943 alegando que a Lei 11.448/2007 – a qual introduziu a Defensoria Pública como legitimada ativa da ação civil pública – é inconstitucional.
Não obstante, tal celeuma se dá pelo fato de que tal legitimação afetaria a função institucional do Ministério Público, impedindo de desempenhar o papel que lhe foi constitucionalmente designado, além de ser impossível verificar a necessidade econômica dos beneficiários, bem como a finalidade da Defensoria Pública ser destinada apenas ao patrocínio de ações individuais[54].
Ora, tal posição doutrinária se mostra contrária ao direito posto na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 nas palavras de Fredie Didier Junior e Hermes Zaneti Junior:
“A legitimação para tutela coletiva é conferida para a proteção dos interesses da coletividade, e não para dar mais prestígio a essa ou aquela instituição. A ampliação dos legitimados à tutela coletiva é uma tendência do direito brasileiro, que se iniciou em 1985, com a permissão de que associações pudessem promover ações coletivas (…). Por outro lado, a tese clássica de Mauro Cappelletti é no sentido da legitimação plúrima como forma mais coerente de fortalecer a efetividade dos novos direitos pela jurisprudência. Esta tese foi aprovada e referendada pelo constituinte no §1º do art. 129, que trata das funções institucionais do Ministério Público, dispondo expressamente: ‘a legitimação do Ministério Público para ações civis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo o disposto nesta Constituição e na lei’. Incide, no caso, o princípio da proibição de retrocesso toda vez que a lei legitime mais de um representante adequado para o ajuizamento da ação coletiva[55]”.
Nessa linha de pensamento, verifica-se que impossível falar em inconstitucionalidade para a legitimidade da Defensoria Pública, ainda que tenha ocorrido a propositura de ação direta de inconstitucionalidade, todavia a doutrina e a jurisprudência cindem-se em duas correntes de entendimento: uma que entende que a legitimidade da Defensoria Pública para a tutela coletiva surge quando estiver presente a hipossuficiência organizacional, ainda que os beneficiados pelo resultado da demanda não sejam hipossuficientes econômicos; outra a qual salienta a imprescindibilidade dos potenciais favorecidos serem hipossuficientes econômicos. O segundo entendimento vem prevalecendo conforme decisões do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (AC 200738000144365/MG) [56] e o da 5ª Região (AC 478110/CE) transcritas a seguir:
“Ementa: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CADERNETA DE POUPANÇA. CORREÇÃO MONETÁRIA. DEFESA COLETIVA DOS CONSUMIDORES. HIPOSSUFICIÊNCIA. NÃO CAURACTERIZAÇÃO. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. EXTINÇÃO DO FEITO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
I – A defesa dos interesses e direitos protegidos pelo Código de Defesa do Consumidor, vale dizer, interesses ou direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos (Lei nº 8.078/90, art. 81, parágrafo único, incisos I, II e III), como na espécie em comento, em que se busca a proteção de direitos coletivos de que é titular o universo dos titulares de contas de caderneta de poupança, que se sentiram lesados, no tocante à correção monetária dos saldos ali existentes, poderá ser exercida, individual ou coletivamente, afigurando-se a Defensoria Pública da União legitimada a propor competente ação civil pública, com essa finalidade, nos termos do art. 82, III, do referido Código Consumerista.
II – Essa legitimação, contudo, restringe-se ao universo de poupadores economicamente hipossuficientes, nos termos do art. 134 da Constituição Federal, hipótese não comprovada, na espécie em comento, resultando daí a ilegitimidade ativa da Defensoria Pública da União, no caso concreto, e, por conseguinte, a extinção do processo, nos termos do art. 267, VI, do CPC, sem resolução do mérito.
III – Apelação desprovida. Sentença confirmada”[57].
“EMENTA: CONSTITUCIONAL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO DE CARGOS DE ASSISTENTE TÉCNICO-ADMINISTRATIVO DO MINISTÉRIO DA FAZENDA. INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. DPU. LEGITIMIDADE ATIVA PARA A CAUSA. APELAÇÃO PROVIDA.
1. A Lei n.º 11.448/07 alterou a Lei n.º 7.347/85 (art. 5.º, inciso II, da Lei n.º 7.347/85), conferindo à Defensoria Pública legitimidade para propor ação civil pública na defesa dos interesses ali previstos, estando a atual jurisprudência do STJ, em face dessa alteração legislativa, posicionada favoravelmente a essa legitimidade (STJ, 1.ª Turma, REsp n.º 912.849/RS, Relator Ministro José Delgado, DJe 28.04.2008).
2. Essa legitimidade abrange tanto interesses difusos, como coletivos e individuais homogêneos, não tendo a norma legal feito diferenciação entre eles, e, para fins de pertinência temática quanto à função institucional da Defensoria Pública (defesa dos interesses dos hipossuficientes), é suficiente que parte dos interessados na lide sejam enquadráveis como hipossuficientes, pois a interpretação contrária, de exigência de exclusividade da titularidade destes em relação aos interesses objeto da discussão judicial, representaria a negativa de ampla e efetiva tutela judicial quanto à defesa destes.
3. No caso presente, resta evidente que parte dos potenciais interessados no afastamento de exigência constante de cláusula do Edital ESAF nº 15/2009, de Concurso Público para provimento de cargos de Assistente Técnico-Administrativo do Ministério da Fazenda, é hipossuficiente, estando caracterizada, assim, a hipótese fática de legitimação da DPU para a causa.
4. Impõe-se, pois, a reforma da sentença apelada que indeferiu a petição inicial desta ação civil pública, com o normal prosseguimento do feito.
5. Provimento da apelação da DPU, para reformar a sentença apelada, determinando o prosseguimento da ação civil pública em seus ulteriores trâmites[58]”.
Não obstante, no que tange à seara ambiental tal entendimento não pode prosperar, em razão do caráter norteador do direito ao meio ambiente saudável, qual seja a dignidade da pessoa humana.
Portanto, a Defensoria Pública é legitimada para ajuizar ação civil pública no âmbito do meio ambiente, ainda que não haja explicitamente hipossuficientes econômicos como favorecidos, conforme será elucidado a seguir.
2. A interpretação conforme a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:
Os métodos tradicionais de interpretação, quais sejam, gramatical, teleológico, histórico, sistemático são aqueles voltados para as normas de cunho comum que passam a dar clareza e sentido a um determinado texto normativo, porém quando se trata de interpretação do texto constitucional, ainda que seja necessário utilizar-se de tais métodos (pois a Constituição não deixa de ser uma lei em sentido amplo), constata-se que não apenas estes devem ser observados, mas também pela valorização dos princípios e do valor supremo da dignidade da pessoa humana[59].
Nessa linha de raciocínio, se manifesta Eros Roberto Grau:
“Os princípios atuam como mecanismo de controle da produção de normas pelo intérprete, ainda que o próprio intérprete produza as normas-princípio. Aqui não há, contudo, contradição, na medida que os princípios atuam como a medida do controle externo da produção de normas. Além disso, a escolha do princípio há de ser feita, pelo intérprete, sempre diante de um caso concreto, a partir da ponderação do conteúdo do próprio princípio; (…)[60]”
Por isso se faz necessário uma análise dos princípios constitucionais pertinentes a presente questão, tanto os instrumentais quanto os materiais com a finalidade de se aferir se a legitimidade da Defensoria Pública seria plena no tocante ao âmbito ambiental do Direito.
2.1. Princípios constitucionais instrumentais pertinentes:
A supremacia da Constituição impõe a observância, na interpretação das normas infraconstitucionais, tanto de princípios constitucionais materiais, com vistas à realização dos valores e fins constitucionalmente pretendidos quando de princípios instrumentais, sendo que estes demonstram o sentido do vetor de aplicação daqueles[61].
2.1.1. Princípio da unidade:
Pedro Lenza leciona o princípio da unidade significa que a Constituição deve ser interpretada de forma global, afastando-se as aparentes antinomias[62].
Por outro lado, Marcelo Novelino ressalta que tal princípio “impõe ao intérprete o dever de harmonização das tensões e contradições existentes, in abstrato, entre as normas de uma Constituição[63]”.
Assim, constata-se que as normas constantes na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 não podem se contradizer, eis que possuem a mesma força normativa.
2.1.2. Princípio do efeito integrador:
Marcelo Novelino elucida com clareza o que vem a ser o princípio do efeito integrador:
“A Constituição enquanto elemento do processo de integração comunitária tem como escopo a produção e conservação da unidade política. Por essa razão, nas resoluções de problemas jurídico-constitucionais deve ser dada primazia aos critérios que favoreçam a integração política e social produzindo um efeito criador e conservador desta unidade[64]”.
Portanto, constata-se que o princípio do efeito integrador busca da conflituosidade constitucional soluções que emanem pluralidade e sejam integradoras.
2.1.3. Princípio da proporcionalidade:
O princípio da proporcionalidade é concebido por boa parte não com um princípio mas sim como uma máxima, eis que como os princípios são mandados de otimização não como ponderar a proporcionalidade com outro princípio[65].
Nessa linha de raciocínio Marcelo Novelino elucida que tal máxima é concebida por parte da doutrina como máxima informadora da aplicação dos princípios, o postulado da proporcionalidade atua como critério de aferição da legitimidade material dos atos praticados pelos poderes públicos[66].
Por fim, salienta-se que para que uma medida seja consonante com a proporcionalidade é necessário que se atenda as seguintes máximas: necessidade, a qual é a adoção de uma medida restritiva de direitos, que só se legitima se indispensável para o caso concreto e não puder ser substituída por outra; adequação, a qual significa que o meio escolhido deve atingir o objetivo perquerido e, finalmente; proporcionalidade em sentido estrito, que significa a medida adotada deve ter um custo benefício no tocante à máxima efetividade e mínima restrição[67].
2.2. Princípios constitucionais materiais pertinentes:
2.2.1. Princípio da reparação integral:
O primeiro princípio pertinente trata-se do princípio da reparação integral do dano, o qual deriva do princípio da isonomia, uma vez que produzido o dano há um desnivelamento de uma relação jurídica, sendo que a reparação se configura como uma medida apta a produzir a igualdade material.
É possível aferir a aplicação deste princípio, em razão de que mesmo que não haja expressamente o pedido de reparação de dano, esse deve ser objetivado em uma ação coletiva[68].
2.2.2. Princípio da primazia do conhecimento do mérito do processo coletivo:
Este princípio parte de duas premissas: a de que o processo não é um fim em sim mesmo, pois está voltado para a justiça material e para a pacificação social e; a de que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 possui feição pluralista. Tais premissas, asseguram que questões meramente formais não impeçam a finalidade do processo, permitindo ao órgão jurisdicional que seja mais flexível em relação ao preenchimento dos requisitos de admissibilidade processual[69].
Nota-se que dessa forma impedir que a Defensoria Pública tenha legitimidade para ajuizar uma demanda coletiva acaba por acarretar na violação deste princípio.
2.2.3 Princípio do ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental da pessoa humana:
É concebido que o direito ao meio ambiente saudável ao ser expressamente previsto na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em especial, no art. 225, caput, passou a denotar um direito fundamental.
Édis Milaré aborda essa questão:
“De fato, nosso legislador constituinte, a par dos direitos e deveres individuais e coletivos elencados no art. 5º, acrescentou, no caput do art. 225, um novo direito fundamental da pessoa humana, que diz com o desfrute de adequadas condições de vida em um ambiente saudável, ou, na dicção da lei, “ecologicamente equilibrado”. Direito fundamental que, enfatize-se, nada perde em conteúdo, por situar-se topograficamente fora do Título II (Dos Direitos e Garantias Fundamentais), Capítulo I (Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos) da Lei Maior, já que esta admite, como é da tradição do constitucionalismo brasileiro, a existência de outros direitos ‘decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte’”.
Dessa forma, impossível não tratar o direito ao meio ambiente saudável como um direito fundamental, uma vez que sem a sua observância não há dignidade da pessoa humana, não há sequer vida.
2.2.4. Princípio da solidariedade intergeracional:
O art. 225, caput, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 estabelece cabalmente o direito das futuras gerações decorrendo daí tal princípio.
Nesse diapasão, Édis Milaré leciona que tal princípio busca assegurar a solidariedade da presente geração em relação às futuras, para que essas possam usufruir de forma sustentável dos recursos ambientais, salientando ainda que tal solidariedade se classifica de duas maneiras: sincrônica, a qual se dá entre as gerações contemporâneas e; diacrônica, que se dá entre gerações que virão posteriormente na sucessão do tempo[70].
Logo, é patente que o meio ambiente saudável é um direito fundamental constitucionalmente assegurado às presentes e futuras gerações.
2.2.5. Princípio da natureza pública da proteção ambiental:
O art. 225, caput, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 traz em seu bojo a necessidade de o Poder Público e da coletividade proteger o meio ambiente saudável.
Nessa toada, Édis Milaré explica que o princípio em questão tem uma profunda vinculação com os princípios da primazia e da indisponibilidade do interesse público, pois:
“(…) o interesse na proteção do ambiente, por ser de natureza pública, deve prevalecer sobre os direitos individuais privados, de sorte que, sempre que houver dúvida sobre a norma a ser aplicada a um caso concreto, deve prevalecer aquela que privilegie os interesses da sociedade a dizer, in dúbio pro ambiente[71]”.
Por isso, verifica-se que a proteção do meio ambiente deve se dar pelo Poder Público da melhor forma possível, o que inclui, portanto, a inclusão de instituições legitimadas a proteger os direitos fundamentais, tal como a Defensoria Pública.
3.1. O embasamento constitucional para a legitimidade da Defensoria Pública:
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 intitulou o acesso à justiça como um de seus direitos fundamentais, conforme preconiza o art. 5º, XXXV, motivo pelo qual se deve interpretar as normas infraconstitucionais com base neste postulado e, consequentemente, entender que não apenas os necessitados econômicos possuem direitos a ser tutelados pela Defensoria Pública, mas também os já mencionados hipossuficientes organizacionais.
Nessa linha de pensamento, manifesta-se Alexandre Freitas Câmara:
“Há, porém, um outro público alvo para a Defensoria Pública: as coletividades. É que estas nem sempre estão organizadas (em associações de classe ou sindicatos, por exemplo) e, com isso, tornam-se hipossuficientes na busca da tutela jurisdicional referente a interesses ou direitos transidividuais. Era preciso então reconhecer a legitimidade ativa da Defensoria Pública para a defesa de tais interesses.
Negar tal legitimidade implicaria contraria a ideia de que incumbe ao Estado (a Defensoria Pública é, evidentemente, órgão do Estado) assegurar ampla e efetiva tutela jurisdicional a todos. Decorre, pois, essa legitimidade diretamente do disposto do art. 5º, XXV, da Constituição da República”[72].
Ademais, ressalta-se que o art. 134 da Constituição da República Federativa do Brasil estabelece que a defesa dos necessitados é incumbência da Defensoria Pública, nunca sendo demasiado mencionar que tal necessidade não se restringe somente às finanças, mas também à necessidade organizacional e jurídica, de forma que, aplicando os princípios instrumentais constitucionais, verifica-se que o legislador constituinte vislumbrou dar a maior efetividade aos processos coletivos , razão pela qual o vocábulo em questão deve ter uma interpretação extensiva.
De outra banda, o referido art. 134 da Constituição da República Federativa do Brasil em nenhum momento restringiu a atuação da Defensoria Pública somente aos necessitados econômicos, razão pela qual é plenamente admissível que tal instituição seja legitimada a ajuizar ação civil pública, seja em razão da Lei 7.347/1985 ou da Lei Complementar 80/1994.
Outrossim, cabe ainda salientar que a tese de sobreposição da função institucional do Ministério Público aventada na Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.943 parece ignorar o texto constitucional, pois o art. 129, §1º da Constituição da República Federativa do Brasil é de clareza solar ao dispor que a legitimação daquela instituição para as ação civil pública não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo o disposto na Constituição e na lei.
Nesse sentido, é possível ainda salientar que Bryant Garth e Mauro Cappelletti já pendiam para a hipótese de que a legitimação no processo coletivo tende a ser mista com o fito de permitir uma maior tutela dos direitos em questão:
“É preciso que haja uma solução mista ou plurarística para o problema de representação dos interesses difusos. Tal solução, naturalmente, não precisa ser incorporada numa única proposta de reforma. O importante é reconhecer e enfrentar o problema básico nessa área: resumindo, esses interesses exigem uma eficiente ação de grupos particulares, sempre que possível; mas grupos particulares nem sempre estão disponíveis e costumam ser difíceis de organizar. A combinação de recursos, tais como as ações coletivas, as sociedades de advogados do interesse público, a assessoria pública e o advogado público podem auxiliar a superar este problema e conduzir à reivindicação eficiente dos interesses difusos[73]”.
Por fim, verifica-se que considerar a Defensoria Pública como não legitimada para proposição de ação civil pública acaba por violar o princípio do não retrocesso social, uma vez que ao atribuir àquela tal poder demonstra-se que a sociedade se porta de uma maneira mais plural, possibilitando uma maior tutela dos direitos coletivos, motivo pelo qual há aí o denominado efeito cliquet[74].
3.2. Da legitimidade da Defensoria Pública e dos direitos difusos:
Como salientado acima, a jurisprudência e a doutrina parecem, em sua maioria, entenderem que a Defensoria Pública somente pode se valer da tutela coletiva quando houver hipossuficientes financeiros como favorecidos.
Em razão disso, Frederico Rodrigues Viana de Lima (se posicionando de forma contrária) demonstra que se passou a debater qual espécie de direitos podem ser objeto de tutela pela Defensoria Pública, afirmando-se que somente os direitos individuais homogêneos e os coletivos em sentido estrito poderiam ser tutelados por esta instituição, uma vez que apenas nestes direitos poderia ser possível a identificação dos favorecidos, verificando se são ou não hipossuficientes financeiros[75].
Todavia, para José Augusto Garcia de Sousa:
“(…) os direitos difusos podem – e devem – ser objeto de ações coletivas da Defensoria Pública, sob pena de não se admitir a participação dos necessitados nesses direitos indivisíveis, o que seria verdadeiramente cruel. E mais. Além de não serem perfeitamente nítidas as linhas que separam as três categorias, atentaria contra o princípio da instrumentalidade e da economia processual circunscrever a atuação da Defensoria a um tipo específico de interesse. Restam assim liberadas atuações as mais profícuas, inclusive no campo dos direitos difusos, antípodas em relação aos direitos subjetivos clássicos[76]”.
No mesmo sentido, Fredie Didier Junior e Hermes Zaneti Junior elucidam tal questão, demonstrando que aqueles, que entendem pela impossibilidade de tutela dos direitos difusos pela Defensoria Pública, encontram-se em equívoco.
“Não se pode confundir o critério para a aferição da capacidade de conduzir o processo coletivo com a eficácia subjetiva da coisa julgada. A tutela coletiva é sempre indivisível: tutela-se o direito da coletividade, beneficiando-se, por consequência, todos os seus membros. Não se pode confundir a legitimação extraordinária para a tutela de direitos coletivos (pertencentes sempre a uma coletividade) com a legitimação extraordinária para tutela de direitos individuais[77]”.
Por fim, qualquer posicionamento contrário a legitimidade da Defensoria Pública em tutelar, por meio de ação civil pública, direitos difusos são contrários ao texto legal da Lei complementar 80/94 que em seu art. 4º, VII, assim estipula:
São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras: promover ação civil pública e todas as espécies de ações capazes de propiciar a adequada tutela dos direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos quando o resultado da demanda puder beneficiar grupo de pessoas hipossuficientes;
Da mesma forma, o art. 4º, VIII:
São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras: VIII – exercer a defesa dos direitos e interesses individuais, difusos, coletivos e individuais homogêneos e dos direitos do consumidor, na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal;
Além do art. 15-A:
A organização da Defensoria Pública da União deve primar pela descentralização, e sua atuação deve incluir atendimento interdisciplinar, bem como a tutela dos interesses individuais, difusos, coletivos e individuais homogêneos.
E, por fim, o art. 106-A:
A organização da Defensoria Pública do Estado deve primar pela descentralização, e sua atuação deve incluir atendimento interdisciplinar, bem como a tutela dos interesses individuais, difusos, coletivos e individuais homogêneos.
Superada a contenda de que a Defensoria Pública possui legitimidade para ajuizar ação civil pública, inclusive no que tange à direitos difusos, constata-se a necessidade de demonstrar, finalmente, o porquê desta instituição sempre poder ajuizar a referida ação coletiva em favor do meio ambiente.
Primeiramente, verifica-se que dentre as atribuições preconizadas pela Lei Complementar 80/1994 está a de promoção dos direitos humanos e a defesa dos direitos coletivos.
O meio ambiente saudável, como já frisado, está na condição de um direito fundamental, em razão disso está também dentro da classificação de direitos humanos, eis que não há vida digna sem a promoção daquele direito.
Cumpre salientar que o meio ambiente saudável é reconhecido em importantes diplomas internacionais como um direito da pessoa humana a exemplo do Pacto Internacional dos Direitos Sociais, Econômicos e Culturais, bem como no âmbito do sistema interamericano no Protocolo de São Salvador.
Ademais, a Defensoria Pública também tem como atribuição a proteção dos direitos coletivos em sentido amplo, sendo o meio ambiente um exemplo por excelência, motivo pelo qual não há como defender que esta instituição não seja legitimada a proteger o meio ambiente saudável.
Nesse sentido, ainda que se entenda que a Defensoria Pública na seara do processo coletivo somente pode atuar para proteger os hipossuficientes financeiros, qualquer dano ao meio ambiente saudável acaba por prejudicar os economicamente vulneráveis, seja por uma via direta ou por uma indireta.
Nessa linha de raciocínio, exemplifica Aluísio Ruggeri Ré:
“Outrossim, não podemos negar que a parcela da sociedade que carece de maiores recursos financeiros está mais vulnerável e exposta às conseqüências oriundas da degradação ambiental, qualquer que seja a espécie do meio ambiente destruído (natural, cultural, histórico ou artificial).
Imagine o desmatamento em uma encosta que causa, na época das águas, o deslizamento de várias casas, cujos proprietários variam entres pessoas pobres e ricas, no sentido legal dos termos. Os ricos poderão transferir seus domicílios para outros imóveis que eventualmente possuam. Os pobres ficarão desabrigados. É um exemplo simples, mas que reflete a realidade brasileira de extrema desigualdade social. Esse mesmo raciocínio pode ser aplicado em outros casos trágicos, como nas enchentes decorrentes dos lixos lançados e acumulados nos rios, que atingem as populações ribeirinhas e acabam deixando os moradores desabrigados e despidos de seus pertences pessoais atingidos pelas águas[78]”.
Outrossim, ao se utilizar os princípios constitucionais instrumentais, constata-se que para se obedecer a unidade da Constituição é imperioso que se entenda que haja legitimidade para a Defensoria Pública sempre poder ajuizar ação civil pública em razão de violação do direito ao meio ambiente saudável, de modo que se entender de forma contrária existiria um mandamento constitucional destinado a tal instituição proteger os necessitados, salvo nas hipóteses em que se ofendesse direitos difusos.
Nessa perspectiva, a partir do efeito integrador que deve ser utilizado na interpretação das normas constitucionais, constata-se que se a Defensoria Pública não for considerada legitimada para ajuizar uma ação civil pública em favor do meio ambiente saudável, essa proteção restaria prejudicada de modo que a interpretação do art. 134 contrariaria a leitura do art. 225 que expressamente determina que o Poder Público deve de todas as formas proteger o direito fundamental em questão.
Ainda, com escopo dos princípios instrumentais, não entender pela legitimidade, para propositura de ação civil pública, da Defensoria Pública na proteção do meio ambiente saudável fere de morte o princípio da proporcionalidade, pois se tal instituição foi criada para zelar pelos direitos humanos e pelo regime democrático, obviamente, há adequação na referida legitimação, bem como se o direito fundamental do art. 225 é constantemente violado há necessidade desta instituição ser uma possível legitimada e, por fim, o custo benefício da atuação da instituição em comento é produtivo, eis que a Constituição da República Federativa do Brasil prima pela máxima proteção do meio ambiente saudável.
De outra banda, a dignidade da pessoa humana possui valor preponderante na celeuma em voga, visto que, como fundamento da república, tal valor supremo da Constituição da República Federativa do Brasil se trata, também, de um vetor interpretativo que no caso em questão prima pela máxima proteção ao meio ambiente e, por consequência, à população economicamente desamparada.
Portanto, ao se realiar uma interpretação constitucionalmente adequada dos princípios materiais que norteiam as questões do meio ambiente e do processo coletivo, verifica-se que a Defensoria Pública sempre poderá e deverá ajuizar ação civil pública em prol do meio ambiente saudável na condição de um direito difuso que se violado prejudica em sua imensa maioria as populações economicamente necessitadas.
Em posterior momento à 2ª Guerra Mundial, os direitos humanos passaram a ser o cerne das constituições existentes, motivo pelo qual a dignidade da pessoa humana passou a ter valor supremo e imprescindível na interpretação de qualquer norma.
Da mesma forma, mecanismos de interpretação das normas constitucionais foram criados, em face da considerável diferença entre essas e as normas infraconstitucionais, dentre os quais cita-se os princípios instrumentais da unidade, do efeito integrador e da proporcionalidade, os quais procuram, em suma, dar um sentido adequado as normas constitucionais materiais.
Nesse diapasão, verifica-se que a própria Constituição da República Federativa de 1988, considerada a “Constituição Verde”, possui um viés ambientalista muito forte, tanto que o direito ao meio ambiente saudável passou a ser considerado um direito fundamental.
Ressalta-se ainda que o meio ambiente deve ser protegido sobremaneira, uma vez que rege a vida na Terra, inclusive a humana, de modo que inexistindo meio ambiente saudável não existe vida humana, muito menos digna.
Com efeito, constata-se que o Poder Público deve atuar da melhor forma possível em favor do meio ambiente saudável, o que abrange, pois, a interpretação de normas infraconstitucionais.
Por isso, a atuação da Defensoria Pública na seara da ação civil pública ambiental é sempre permitida, eis que a efetividade da tutela ambiental deve ser buscada de modo que não existe razão adequada para excluir tal atribuição, simplesmente, por ser o meio ambiente saudável um direito difuso.
Pelo contrário, o fato de ser o meio ambiente um direito difuso é causa para a atuação da Defensoria Pública no âmbito da tutela coletiva, eis que em qualquer dano ambiental, sempre, ainda que por uma via indireta, atingir-se-á o menos favorecidos economicamente.
E, os menos favorecidos economicamente são sempre aqueles que mais sofrem quando da violação de um direito difuso, especialmente, o destinado à tutela do meio ambiente, uma vez que irão sofrer as consequências da devastação ambiental.
Dessa forma, afastar a atuação da Defensoria Pública no âmbito da tutela coletiva, especificamente na seara ambiental, mostra-se não somente um retrocesso social, mas também o sobrestamento de uma função assegurada constitucionalmente, qual seja, a proteção dos hipossuficientes.
Informações Sobre o Autor
Thiago Burlani Neves
Defensor Público de Santa Catarina além de possuir especialização em Direito Ambiental e Direito Constitucional