Educação ambiental e sociedades sustentáveis: conferências, diretrizes, normas e tratados internacionais

Resumo: O presente trabalho tem o intuito de analisar o processo de normatização e consolidação da Educação Ambiental (EA) e a relação desse processo com os encontros internacionais sobre o meio ambiente realizados durante a segunda metade do século XX. Neste trabalho, pretende-se responder à seguinte questão: Como os encontros internacionais sobre o meio ambiente realizados durante a segunda metade do século XX e as declarações internacionais oriundas desses encontros contribuíram para o surgimento e consolidação da educação ambiental em nível global? Metodologicamente trata-se de uma pesquisa teórica com base em revisão de literatura em obras e em documentação oficial. A abordagem é de cunho qualitativo e seguiu ao método dedutivo. Os resultados conclusivos destes texto consolidam que as várias conferências internacionais realizadas, sobretudo a partir da segunda metade do século XX contribuíram para que esferas oficiais, governos e órgãos internacionais reconhecessem o papel central da Educação Ambiental no desenvolvimento de sociedades ecologicamente sustentáveis e socialmente menos injustas.

Palavras-chave: Educação Ambiental. Tratados Internacionais. Sociedades Sustentáveis.

Abstract: The present work aims to analyze the process of normalization and consolidation of Environmental Education (EA) and the relationship of this process to the international meetings on the environment during the second half of the twentieth century. The purpose of this paper is to answer the following question: How did the international meetings on the environment during the second half of the twentieth century and the international statements from these meetings contribute to the emergence and consolidation of environmental education at the global level? Methodologically, this is a theoretical research based on literature review in works and official documentation. The approach is qualitative and follows the deductive method. The conclusive results of this text confirm that the various international conferences, especially since the second half of the twentieth century, have contributed to official spheres, governments and international bodies recognize the central role of Environmental Education in the development of ecologically sustainable and socially less unjust societies.

Keywords: Environmental Education. International Treaties. Sustainable Societies.

Sumário: 1. Introdução. 2. Educação Ambiental e Sociedades Sustentáveis. 3. Conclusão. Referências

1 Introdução

No atual panorama global, caracterizado por uma crise socioambiental vivenciada pela maior parte da humanidade, é fundamental envolver a sociedade civil tanto na formulação quanto, e principalmente, na aplicação de políticas públicas voltadas para a defesa e conservação dos recursos naturais. Durante e após a década de 1980, o termo Educação Ambiental se consolidou no mundo todo (DIAS, 2004).

A preocupação com os problemas ambientais resultantes do processo de industrialização não é algo recente. Inúmeros fatores socioeconômicos, culturais e políticos contribuíram para a problematização da vulnerabilidade ambiental em nível global. A paulatina constatação que a finitude dos recursos naturais e o modelo produtivo vigente (capitalismo industrial) acabariam por colocar em risco a sobrevivência humana e o futuro das próximas gerações, promoveu a criação de várias instituições e legislações internacionais e, sobretudo, de uma ação transnacional voltada para a proteção e conservação dos recursos naturais.

Esta escrita tem a pretensão de contribuir para esclarecer aspectos importantes e inerentes sobre o processo de surgimento e consolidação legal da dimensão ambiental na educação, destacando o papel central que as declarações internacionais sobre o meio ambiente exercem na implementação e no desenvolvimento de ações voltadas para a promoção da a educação ambiental visando o equilíbrio ecológico e a constante busca de uma sociedade sustentável.

2 Educação Ambiental e Sociedades Sustentáveis

No ano 1987, a UNESCO, em parceria com o PNUMA, realizou, em Moscou, capital da Rússia, o Congresso Nacional sobre Educação e Formação Ambientais – UNESCO/PNUMA, evento no qual foram debatidas as conquistas e as dificuldades, em nível internacional, da área de Educação Ambiental após a Conferência Tbilisi (DIAS, 2004).

Ao final do referido Congresso, foi elaborada a estratégia internacional de ação, em matéria de Educação Ambiental para a década de 1990. Segundo Cascino (2000), esse documento destacou a necessidade da capacitação de recursos humanos tanto nas áreas formais quanto informais da Educação Ambiental, além da importância da incorporação das questões ambientais nos currículos dos diversos níveis de ensino.

No início da década de 1990, mais especificamente no mês de junho de 1992, foi realizada a Segunda Conferência das Nações Unidas (ONU) sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO-92) no estado do Rio de Janeiro. Nessa mesma data e local, também foi realizado o Fórum Global das Organizações Não-Governamentais, evento realizado paralelamente à ECO-92, onde foi elaborado o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global; documento fundamental para a elaboração de estratégias globais voltadas para a consolidação da Educação Ambiental no mundo.

No referido tratado, a educação é entendida como um processo ativo em constante construção, o que propicia a reflexão, o debate e sua permanente modificação. Toda a humanidade, entendida como seus subscritores, deve reconhecer a centralidade da educação na formação de valores e na ação social, comprometer-se com a proteção da Terra e envolver-se no processo educativo transformador por meio da participação das nossas comunidades e nações na criação de sociedades sustentáveis e equitativas (TRATADO DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA SOCIEDADES SUSTENTÁVEIS E RESPONSABILIDADE GLOBAL, 1992).

Considerando a Educação Ambiental como um permanente processo de aprendizagem essencial para a transformação humana e social, para a preservação ecológica, bem como para a formação de sociedades que prezem a justiça social e o equilíbrio ecológico, o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global (1992) aborda os seguintes tópicos: Princípios da Educação para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global, Plano de Ação, Sistemas de Coordenação Monitoramento e Avaliação, Grupos a serem envolvidos e Recursos para o desenvolvimento de programas educativos voltados para a melhora do ambiente de vida.

Neste sentido, a ECO-92 é reconhecida como um dos encontros internacionais mais significativos da história humana, pois contribuiu para o desenvolvimento de estratégias globais voltadas para a preservação e melhoria do meio ambiente por meio de uma ideia de desenvolvimento sustentável, ou seja, contribuiu para a busca por sociedades justas socialmente e ecologicamente equilibradas (PELICIONI, 2011).

Cascino (2000) também ressalta que o amplo diálogo e a participação de representantes de inúmeros setores sociais na Jornada Internacional de Educação Ambiental, evento realizado paralelamente à ECO-92, contribuíram para a ampliação do debate ambientalista com o crescimento e, posteriormente, consolidação das ONGs (Organizações Não Governamentais) enquanto nova força de pressão em prol da conservação do meio ambiente e de uma forma de desenvolvimento sustentável.

Cascino (2000) ainda ressalta que, ao longo da segunda metade do século XX, mais especificamente a partir dos grandes encontros internacionais de 1968, de 1972, de 1977, de 1987 e de 1992, a Educação Ambiental assumiu um papel central na consolidação de uma nova visão de mundo caracterizada por novos ideais, novos referenciais culturais e pela implementação de formas sustentáveis de convivência com o meio ambiente.

Em dezembro de 1997, na cidade de Tessalônica, na Grécia, foi realizada a “Conferência Internacional sobre Meio Ambiente e Sociedade: Educação e Consciência Pública para a Sustentabilidade” que contou com a participação de representantes de mais de 83 países. Na referida Conferência, foi elaborado um documento, a Declaração de Tessalônica, destacando que, durante os cinco anos posteriores à ECO-92, ocorreu um insuficiente progresso na preservação ambiental e na busca pela sustentabilidade (DIAS, 2004).

Dessa forma, é ressaltado que a busca pela sustentabilidade requer tanto a participação de um grande número de setores das sociedades quanto uma mudança radical nos estilos de vida e nos padrões de consumo vigentes. Também é destacado que a reorientação da educação em direção à sustentabilidade deve ser realizada em todos os níveis de educação formal, informal ou não formal e em todas as áreas do conhecimento, principalmente nas ciências humanas e sociais, devendo discutir as questões relacionadas ao meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável de maneira interdisciplinar e holística. Nesse sentido, é destacado que a Educação Ambiental, desde a Conferência de Tbilisi, foi tratada como educação para o meio ambiente e para a sustentabilidade.

A Declaração de Tessalônica recomenda que: os compromissos assumidos durante as Conferências das Nações Unidas sejam honrados; que sejam elaborados planos de ação concretos; que os Conselhos nacionais para o Desenvolvimento Sustentável atribuam à educação, à conscientização pública e ao treinamento a importância merecida nos programas ambientais; que sejam estabelecidos fundos especiais para a educação e o desenvolvimento sustentável; que parte da economia investida no processo de esverdeamento seja reinvestida em programas de Educação Ambiental, conscientização e capacitação; que a comunidade científica disponibilize informações atualizadas para os programas de educação voltados para a sustentabilidade; que a mídia difunda as mensagens referentes à complexidade das questões ambientais; e que as escolas sejam estimuladas a reformularem seus currículos de acordo com a perspectiva da busca por um futuro sustentável.

Em decorrência da Recomendação 27, da Declaração de Tessalônica, a qual sugeria que, após dez anos, fosse realizada uma nova conferência internacional com o intuito de examinar a implementação e o progresso do processo educacional sugerido na Conferência Tessalônica, foi realizada, em 2007, na cidade indiana de Ahmedabad, a Conferência Educação para um Futuro Sustentável. Fruto da referida Conferência, a Declaração de Ahmedabad ressaltou o potencial da educação para a consolidação de estilos de vida e políticas sustentáveis socialmente justos.

Segundo Cascino (2000), Dias (2004) e Gadotti (2010), outro documento fundamental para a consolidação da Educação Ambiental foi a Carta da Terra, que propunha, por meio da utilização de diversas fontes, valores e princípios necessários para um futuro sustentável.

Nas palavras de Gadotti (2001), a Carta da Terra é:

“Baseada em princípios e valores fundamentais, que nortearão pessoas e Estados no que se refere ao desenvolvimento sustentável, a Carta da Terra servirá como um código ético planetário. Uma vez aprovada pelas Nações Unidas por volta de 2002, a Carta da Terra será o equivalente à Declaração Universal dos Direitos Humanos no que concerne à sustentabilidade, à eqüidade e à justiça […]. O projeto da Carta da Terra inspira-se em uma variedade de fontes, incluindo a ecologia e outras ciências contemporâneas, as tradições religiosas e as filosóficas do mundo, a literatura sobre ética global, o meio ambiente e o desenvolvimento, a experiência prática dos povos que vivem de maneira sustentada, além das declarações e dos tratados intergovernamentais e não-governamentais relevantes.” (GADOTTI, 2001, p. 100).

Gadotti (2001) ainda ressalta que, consensualmente, a Carta da Terra deve ser entendida como um código de valores universais e uma chamada de ação para pessoas, instituições e Estados, ou seja, uma articulação entre princípios norteadores da prática.

3 Conclusão

Ao analisar o histórico desde o surgimento à “consolidação” da Educação Ambiental, foi possível concluir que os encontros internacionais expostos anteriormente propiciaram o aumento do debate internacional a respeito da dimensão ambiental e da Educação Ambiental como ferramenta fundamental para a conscientização dos impactos negativos da ação humana predatória sobre o meio ambiente e, por consequência, sobre a qualidade de vida das atuais e futuras gerações.

Destarte, é importante destacar que as várias conferências internacionais realizadas durante a segunda metade do século XX contribuíram para que esferas oficiais, governos e órgãos internacionais reconhecessem o papel central da Educação Ambiental no desenvolvimento de sociedades ecologicamente sustentáveis e socialmente menos injustas.

 

Referências
CASCINO, Fábio. Educação Ambiental: princípios, história, formação de professores. 2. ed. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2000.
DECLARAÇÃO DE TESSALÔNICA, 1997. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/fundo-nacional-do-meio-ambiente/item/8070-declara%C3%A7%C3%A3o-de-thessaloniki>. Acesso em: 10 de ago. 2015
DIAS, Genebaldo Freire. Educação Ambiental: princípios e práticas. 5ª ed. São Paulo: Editora Global, 2004.
GADOTTI, Moacir. Pedagogia da Terra. 5ª ed. São Paulo: Editora Fundação Petrópolis, 2001.
PELICIONE, Andréa Focesi. Movimento Ambientalista e Educação Ambiental. In: PHILIPPI, Arlindo (Org.). Educação Ambiental e Sustentabilidade. São Paulo: Editora Manole Ltda, 2011.
TRATADO DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA SOCIEDADES SUSTENTÁVEIS E RESPONSABILIDADE GLOBAL, 1992. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/secad/arquivos/pdf/educacaoambiental/tratado.pdf>. Acesso em: 13 de ago. 2015.

Informações Sobre os Autores

Pedro Bruno Silva Lemos

Assistente em Administração (UNILAB); Especialista em Gestão Pública Municipal pela Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB); Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Estadual do Ceará (UECE)

Canuto Diógenes Saldanha Neto

Antônio Roberto Xavier

Doutor UFC e Pós-doutor UFPB em Educação. Professor do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas e do Mestrado em Sociobiodiversidade e Tecnologias Sustentáveis MASTS ambos da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira UNILAB. Líder do Grupo de Pesquisa Gestão de Políticas Sociais GPS-UNILAB/CNPq


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