Resumo: Trazemos à discussão aqui o tema lixo que precisa ganhar espaço na busca por soluções à sua gestão, já que na sociedade em que vivemos, baseada na produção e no consumo, o descarte torna-se algo inevitável. Assim, é que operadores do Direito, militantes da defesa de uma sociedade justa precisam estar atentos às questões socioambientais que vem constantemente e cada vez mais fazendo parte dos tramites judiciais.
Palavras-chave: Direito, lixo, resíduo sólido, problema socioambiental, sociedade de consumo.
INTRODUÇÃO
Ana Luiza Piva (2008) diz que o homem desde sua origem sempre interagiu com a natureza retirando os recursos naturais necessários para sua sobrevivência e rejeitando as matérias usadas, mas destaca que a intensidade e a velocidade dos impactos variaram no decorrer da história, de acordo com as transformações culturais. Após a Revolução Industrial, período fundamental para a consagração da economia capitalista pautada na lógica do crescimento ilimitado da produção e do consumo, a capacidade da humanidade de intervir na natureza dá um salto enorme e, até hoje, continua aumentando de tal forma que não respeita os limites ambientais globais, inclusive em relação à capacidade do Planeta de absorver os resíduos sólidos produzidos. Segundo a autora, a sociedade atualmente vive uma intensa crise ambiental e necessita reformular os padrões socioeconômicos, institucionais e culturais que possibilitem promover o desenvolvimento de uma sociedade sustentável.
O lixo é um dos grandes problemas socioambientais de nossos tempos. Dizemos socioambientais porque afetam não somente as questões ambientais como se pensava outrora, mas também sociais. Um exemplo disso são as recentes enchentes no estado de São Paulo, onde as chuvas torrenciais têm seu escoamento pelos bueiros interrompido pelo entupimento com o lixo disposto de forma inadequada, resultando na situação caótica em que se encontram os moradores que perdem seus familiares, bens móveis e imóveis. Além disso, há a questão da saúde, com o aumento das possibilidades de doenças como a dengue, a leptospirose, etc.
Então, vemos que os problemas do lixo não se restringem mais apenas a poluição visual e do ar, contaminação do solo e das águas etc., pois em todos esses casos há uma influência direta e negativa na vida humana e, portanto, social.
Pensar em soluções para o lixo implica em se discutir muito além do papel do Estado, e por isso do Direito, o que não caberia aqui nesta apresentação devido, principalmente ao tempo, já que há várias questões que podem ser levantadas. Mas, para tal proposta de analisarmos o problema do lixo sob o viés das Ciências Jurídicas na sociedade de consumo alguns pontos tornam-se imprescindíveis para nosso estudo, ou seja: Que sociedade é esta que produz tanto lixo? Qual o papel do Direito nesta solução?
O Direito se relaciona com os fatores econômicos e ambientais, portanto, é importante discutir a efetividade das práticas de regulação jurídica da atividade econômica e a necessidade de intervenção do Estado nas relações privadas a fim de promover a proteção do meio ambiente, evitando, assim, os danos provocados pela destinação inadequada dos resíduos sólidos.
1. QUAL A DIFERENÇA ENTRE LIXO E RESÍDUO SÓLIDO?
Mandarino (2000) não considera Resíduo Sólido e Lixo como sendo a mesma coisa. Para ela, o Lixo é algum objeto inútil, enquanto o Resíduo Sólido pressupõe nova utilização quer como matéria-prima para produção de outros bens de consumo quer como composto orgânico para o solo, entre outros. Já, Pinto (2004) diferentemente de Mandarino trata Resíduo Sólido e Lixo como sinônimos.
Fiorillo (1997) assim como Pinto (2004) conceitua Resíduo Sólido como sendo:
“Qualquer lixo, refugo, lodo, lamas e borras resultantes de atividades humanas de origem doméstica, profissional, agrícola, industrial, nuclear ou de serviço, que neles se depositam, com a denominação genérica de lixo, o que se agrava constantemente em decorrência do crescimento demográfico dos núcleos urbanos e especialmente das áreas metropolitanas” (1997, p. 196).
O Projeto de Lei nº 203/1991 do Poder Executivo que institui a política Nacional de Resíduos Sólidos e dá outras providencias em seu art. 7º, inciso XIII define Resíduo Sólido como sendo resíduos no estado sólido e semi-sólido que resultam de atividades de origem urbana, industrial, de serviços de saúde, rural, especial ou diferenciadas.
Lembramos aqui que este Projeto de Lei foi aprovado no dia 10 de março de 2010, após 19 anos de tramitação na Câmara dos Deputados. O próximo passo deste Projeto é o Senado Federal que irá analisá-lo em plenário e somente poderá aceitar ou rejeitar as mudanças oferecidas pela Câmara dos Deputados. Logo, não poderão ser colocados novos dispositivos, somente suprimir os existentes.
Entendemos que embora tenha lógica no sentido auferido na expressão Lixo e Resíduo Sólido dada por Mandarino, ambos significam a mesma coisa, conforme os demais autores consideram e o próprio Projeto de Lei.
Já Resíduo Sólido em relação a Rejeito há diferença. Resíduo como já dissemos é aquilo que não serve mais a alguém e que pode ser reciclado ou reutilizado por outrem. Já, o rejeito é aquilo cujo resultado final, depois de esgotadas todas as possibilidades de aproveitamento do produto, não apresenta outra possibilidade que não seja a disposição final ambientalmente adequada, conforme prevê o Projeto de Lei nº 203.
2. O LIXO COMO PROBLEMA SOCIOAMBIENTAL
Conforme Mota citado por Carvalho:
“Quando o lixo é despejado em depósitos a céu aberto, a poluição do solo pode resultar em: aspecto estético desagradável; maus odores, resultantes da decomposição de detritos; proliferação de insetos e roedores, transmissores de doenças; possibilidade de acesso de pessoas, podendo ocasionar doenças por contato direto; poluição da água subterrânea ou superficial, através da infiltração de líquidos e carregamento de impurezas pó escoamento superficial; possibilidade de queima dos resíduos, com incômodos à população e causando a poluição do ar; desvalorização de áreas próximas ao depósito dos resíduos sólidos” (1999, p. 23)
A deposição de resíduos sólidos a céu aberto causa não só a poluição visual, como também a poluição do solo e a poluição da água via escoamento ou infiltração promovendo a disseminação de chorume no meio ambiente. É evidente, portanto, que o destino final dado aos resíduos sólidos é de interesse socioambiental, pois quando recebem tratamento inadequado causam problemas à saúde pública, uma vez que afetam as populações que entram em contato, direto ou não, com aqueles materiais.
Percebe-se assim, que a deposição de resíduos sólidos torna-se ainda mais séria e problemática quando a deposição é feita em águas ou é carregada de alguma forma para estas, já que as águas têm um poder de disseminação ainda maior, o que possibilita que a contaminação seja proporcional.
A Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar, de 1982, determina que os países controlem e evitem a poluição marinha e se caso violarem estas obrigações tais países serão responsabilizados. Além disso, grande parte das pessoas não exerce sua cidadania e ignora a responsabilidade de manter o espaço público limpo como se este fosse um bem que não lhe pertencesse e não fizesse parte de suas vidas.
A situação dos resíduos sólidos é uma constante nas discussões ambientais e hoje, percebe-se também sua discussão como um problema social. Chaves (2007) argumenta a respeito dos problemas causados pela má disposição do lixo, citando Araújo e Costa (2003):
“Sabe-se que além da perda estética, dos prejuízos econômicos e turísticos, a disposição no ambiente costeiro-marinho dos resíduos traz sérios problemas de saúde, pois abrigam vetores de doenças como ratos, moscas e baratas e o desenvolvimento de microorganismos: fungos, bactérias e vírus que causam doenças humanas como micoses, hepatite e tétano. Além disso, afetam os pescadores tradicionais com a presença de plásticos e outros materiais nas redes e linhas de pesca” (2007, p. 30).
A crescente produção do lixo está intimamente ligada ao consumismo exacerbado que se instalou na sociedade de um modo geral, sendo um problema não só local, mas planetário. A densidade populacional, o poder aquisitivo e o modelo de vida norte-americano contribuem para que objetos sejam rapidamente substituídos por outros com melhores marcas, com mais potências, com maior velocidade ou porque estão na moda. O êxodo rural com a conseqüente concentração populacional nos centros urbanos também são fatores importantes no desenvolvimento de tal problema.
Concomitantemente às causas citadas temos uma coleta e disposição final do lixo ineficaz, já que a maior parte dos lixos coletados são depositados em aterros sanitários ou lixões sem qualquer tratamento, alguns em zonas urbanas, outros próximos a redes hidrográficas. Esse lixo causa contaminação do solo e da água, propicia a proliferação de animais indesejáveis como ratos e baratas sendo, portanto, de qualquer forma, vetor de doenças. Vê-se, assim, que a questão do lixo mais que um problema ambiental é também social e político, principalmente quando nos deparamos com famílias morando nestes locais.
3. A SOCIEDADE DE CONSUMO E A PRODUÇÃO DE LIXO
Como dissemos inicialmente, embora o homem sempre tenha consumido e, portanto, gerando material a ser descartado, após a Revolução Industrial com a proliferação da sociedade consumista, a produção de lixo também aumentou significativamente, gerando preocupações.
Desatacamos alguns pontos importantes a respeito da relação do lixo com a sociedade de consumo[1] em um artigo meu publicado na Revista Jus Vigilantibus em julho de 2009, os quais consideramos imprescindíveis serem aqui mais uma vez salientados.
Neste artigo, destacamos dentre outras coisas que convivemos diariamente com o lixo, seja jogando fora o que não nos interessa mais ou sentindo seus efeitos indesejáveis. A questão é que a partir do final do século XX, o lixo vem se tornando um sério problema socioambiental. Logo, se faz necessário identificar as causas deste problema, que para nós está no modo como vimos produzindo nossa existência na sociedade capitalista, baseada na produção e no consumo e, portanto, no descarte.
Nessa corrida pelo consumo, o indivíduo precisa cada vez mais de poder aquisitivo, que na sociedade capitalista, trata-se do dinheiro. Para conseguir tal dinheiro, o indivíduo precisa trabalhar mais, ter mais compromissos, responsabilidades, tendo menos tempo para questões importantes como família, educação, cultura, levando à alienação social. Mas, voltando ao nosso assunto, relativo ao lixo, ocorre que além dessa alienação que faz com que as pessoas percam muitas vezes a sua identificação como cidadão, tornando-se como uma máquina de produção e consumo, torna-se também uma máquina de produção de dejetos.
O surgimento e a rápida difusão da sociedade de consumo se deram a partir do fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945. Nesse período, os Estados Unidos atingiram um patamar econômico extraordinário o que impulsionou as indústrias a investirem na produção de bens de consumo, viabilizando, assim, a propagação de um novo padrão de comportamento da sociedade, não só americana como mundial, que passou a ver nos Estados Unidos o modelo de sociedade que se gostaria de fazer parte.
Assim, os Estados Unidos que sofreram com a Depressão Econômica de 1920 e passaram pela Segunda Guerra Mundial chegaram aos anos 50 representando apenas 6% da população mundial, mas consumindo 1/3 dos produtos produzidos em todo o Planeta. De tal modo é que se percebe que embora se preconize o modelo de vida americano baseado no consumismo, a realidade é conforme Porto Gonçalves preconiza em suas obras, ou seja, que isso é matematicamente impossível de ser alcançado, pois não há recursos suficientes para que todo o mundo consuma como eles.
Vemos que este modelo de sociedade é posto apenas para estimular o consumo dos países subdesenvolvidos que para chegarem ao padrão norte-americano caem na armadilha do consumismo e do descarte, vivendo para trabalhar e consumir os produtos industrializados que enriquecem cada vez mais aquele País. Apenas nos anos 60 é que começam a surgir movimentos contestatórios que passaram a alertar as pessoas acerca das contradições entre o dito progresso e dos riscos da insustentabilidade no uso indiscriminado dos recursos naturais com vistas a atender as necessidades de consumo.
É neste período que a idéia de finitude dos recursos naturais é encarada pela sociedade. Contudo, a realidade é que embora se saiba das conseqüências de uma exploração sem limites propiciada pelo consumismo moderno, quem se acostumou ao conforto e ao luxo não quer perdê-los e quem não têm almeja alcançá-los.
Entretanto, o foco deste estudo diz respeito à questão do lixo e, portanto, quando se fala aqui em consumo, preconiza-se aquilo que se refere ao descarte de produtos e o aumento do lixo, pois se acredita que uma coisa está atrelada a outra. Em outras palavras, significa dizer que os problemas socioambientais causados pelo lixo são decorrentes do consumismo. Entende-se por consumismo a compra exagerada, sem necessidade e/ou utilidade mediata e o conseqüente descarte de outro objeto que já não atende mais aos padrões de modernidade.
Essa realidade é freqüentemente percebida em relação ao consumo de eletrônicos, como os computadores; vídeos-game, celulares. Quem tem condições financeiras a cada dia troca estes objetos e quem não têm passa trabalhando e ao adquiri-los já não tem mais o valor social que tinham há semanas atrás. E, assim, cada vez mais aumenta a quantidade de objetos bons e utilizáveis descartados pela sociedade de consumo.
Mas não é somente a este tipo de lixo que referimo-nos. Refere-se, pois, a tudo que a mídia nos empurra como sendo indispensáveis à nossa vida e à nossa felicidade e que, infelizmente, adere-se. É também à “era dos descartáveis” que aumentam absurdamente a quantidade de lixo, já que não são reutilizados; ao desperdício de alimento; a quantidade de embalagens desnecessárias que são todos os dias postos fora, mas principalmente a este modo de produção capitalista que cega, aliena e fere a sociedade de um modo geral.
Outro fator que pode ter influência na produção do lixo associada ao consumo é o aumento na oferta de credito que aumentou o poder de consumo, o que não significa que tenhamos menos indivíduos em situação de pobreza, mas que pessoas estão sendo inseridas no mercado por meio do credito tornando-se muitas vezes além de pobres, endividadas. Mas, o fato é que este episódio decorrente da globalização também foi um acelerador da produção de lixo.
4. O DIREITO E A GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS
Analisando a questão de proteção ambiental, sobretudo no que diz respeito à gestão dos resíduos sólidos algumas considerações acerca da legislação vigente precisam ser feitas, uma vez que a situação produzida pelo lixo faz com que necessitemos procurar nos arcabouços legais soluções a estes problemas.
Mandarino (2000) está convencida de que a legislação necessita de sistematização com vistas à superação de suas falhas que comprometem seu cumprimento, uma vez que carece de explicitação e critérios para a matéria dos resíduos sólidos domésticos em especial, embora seja pródigo em comandos genéricos.
Alessandra Fernandes Nascimento Pereira (2004) diz que a quantidade expressiva de leis ambientais que historicamente restam com pouca efetividade, assim como reafirma a necessidade de uma Política Nacional de Resíduos Sólidos, a qual se encontra hoje sob a forma de um Projeto de Lei, o PL nº 203 de 1991.
Jaciara Mota Salek (2006), na Universidade Federal do Ceará realizou o trabalho “Um Estudo da Legislação Ambiental Brasileira sobre Resíduos Sólidos Urbanos” onde coloca que a legislação ambiental brasileira, considerada moderna e abrangente, é um instrumento fundamental para a proteção do meio ambiente. Destaca que no Brasil, é latente a necessidade de políticas públicas específicas. Acrescenta também que o desconhecimento por parte da sociedade, do conteúdo e até mesmo da existência de documentos legais que contribuem para a formulação de políticas públicas e também dos responsáveis por sua aplicação, explica, em parte, a distância entre o que está previsto na lei e o que se opera na realidade.
Salek (2006) observou que o arcabouço legal federal da área de resíduos sólidos está distribuído em leis, decretos, portarias e resoluções e não consolidado em um único diploma, dificultando a aplicação das normas legais. Concluiu, portanto, que o Brasil ainda carece de uma lei federal que trate da gestão ambiental dos resíduos urbanos de forma acautelada, possibilitando maior segurança jurídica nos atos da administração pública e privada.
No que se refere especificamente às normas gerais sobre coleta, transporte e disposição de resíduos sólidos a Constituição Federal de 1988 (art. 24, XII), determina que compete concorrentemente à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar sobre a defesa e a proteção da saúde, já que os impactos ambientais como o lixo evidenciam a insustentabilidade dos modelos econômicos dominantes, que ameaçam o equilíbrio no uso e na conservação dos recursos naturais.
Paulo Afonso Leme Machado (1998) lembra que não é de se confundir, a possibilidade federal de fixar diretrizes gerais, com a execução dessa tarefa sanitária. A estrutura constitucional do município brasileiro assegura-lhe autonomia para organizar os serviços públicos de interesse local. Assim, a União não está obrigada a executar as tarefas de limpeza pública, coleta, transporte e disposição dos resíduos sólidos. Entretanto, dada a importância ambiental da matéria com reflexos diretos na saúde da população, entendemos que a União não pode se alhear da função de traçar normas amplas e adaptáveis à realidade nacional. Destaca-se que os Estados não perderão a sua oportunidade de agir nesse campo, desde que respeitem a hierarquia das normas. O Projeto de Lei nº 203 de 1991 também determina o Município como titular do serviço público de limpeza urbana, em consonância com o artigo 30 da CF 1988.
Há um significativo passo para a observância de padrões sanitários mínimos em todo o País. Entretanto, pela Constituição Federal de 1988 não se prevê possa a União ou os Estados intervir nos Municípios que deixarem de agir adequadamente do ponto de vista sanitário na coleta, tratamento e destinação dos resíduos sólidos. É matéria ser cogitada no futuro, pois a negligência de um município pode acarretar graves prejuízos ecológicos.
O Município tem peculiar interesse na organização dos serviços de limpeza pública e coleta, transporte e depósito dos resíduos sólidos. Seu interesse predomina sobre os da União e dos Estados na matéria. Contudo, dada a necessidade de experiência técnica mais avançada para certos tipos de tratamento dos resíduos e o investimento de largas somas para implantar usinas de tratamento, decorre que a União e os Estados, além de estabelecerem normas, precisam intervir, auxiliando financeiramente.
Os aterros sanitários podem e devem ser feitos exclusivamente à custa dos municípios. Contudo, quando haja viabilidade para o comércio (e o volume de lixo comporte) a usina para composto merece a inversão de capital estadual e federal na sua montagem.
Em Municípios de grande porte, em havendo necessidade de usinas para incineração, da mesma forma é de se esperar a canalização de recursos Federais e Estaduais para sua instalação. Essa política de amparo financeiro da União e dos Estados para a resolução dos problemas dos resíduos sólidos é encontrada nos Estados Unidos e no Japão. Nesses Países dispõe-se que o governo nacional fará planos de desenvolvimento técnico para tratamento dos resíduos e esforçar-se-á para dar a necessária assistência técnica e financeira às municipalidades e aos governos provinciais para o adequado cumprimento de seus deveres.
O auxílio financeiro, legalmente possível, e aqui preconizado não é sob forma de financiamento ou de empréstimo, o que pressupõe pagamento posterior pelo Município, ainda que parcelado. Para que houvesse financiamento, seria necessário o aumento excessivo das taxas de remoção do lixo e de limpeza pública. Quanto à punição dos atos poluidores por lançamento e destinação inadequada dos resíduos sólidos temos as punições administrativa, penal e cível.
Quanto á punição administrativa vale dizer que apenas campanhas educativas não são suficientes, é preciso revestir tais normas de coercibilidade. As infrações previstas pelas legislações estaduais e federais não inibem as Prefeituras Municipais de também legislarem sobre a matéria, desde que não invadam as normas já estatuídas, dispondo em contrário. As posturas municipais, portanto, poderão ampliar as situações infracionais, cominando penalidades adequadas a elas.
De acordo com o sistema administrativo brasileiro, o particular (prejudicado ou não) não tem meios legais de exigir ou de reivindicar que a Administração Pública imponha a penalidade prevista, mesmo ocorrendo a infração. O direito de representação não passa de comunicação. Dada a limitação dos crimes de prevaricação e de condescendia criminosa, o primeiro exigindo a satisfação de interesse ou sentimento pessoal e o segundo ser o funcionário motivado por indulgência na sua omissão, vemos que a apenação do ilícito administrativo cai no campo discricionário da Administração Pública.
Por situações de conjuntura, a Administração Pública deixa de punir o infrator que tenha poluído o ambiente pelo lançamento de resíduo sólido. Considerando-se que o Poder Judiciário deve se conduzir de acordo com o Princípio da Legalidade na tramitação da ação penal, é que surge a inegável vantagem de, além de punição administrativa, ser prevista em lei a punição penal. Paulo Afonso Leme Machado (1998) coloca que:
“Muitos indivíduos, agindo com intolerável egoísmo, multiplicam os refugos, lançam-nos inapropriadamente, como se só à Administração pública coubesse toda e exclusiva carga da limpeza pública. Esquecem-se esses cidadãos que, subsidiariamente, a eles também compete colaborar para a sanidade do meio ambiente. Destarte, os problemas do lixo são marginalizados, pois é muito cômodo esperar a remoção periódica dos resíduos domésticos e industriais. Basta ocorrer a paralisação temporária desse serviço para, então, se mensurar o valor dessa atividade pública.”
Como se vê, a figura legal contém uma norma penal em branco. Só a pena está previamente estatuída. O comportamento do infrator dependerá da adequação de sua conduta às prescrições legais ou regulamentares federais, estaduais e municipais. A figura delituosa proposta ocorrerá tão só com o lançamento ou o depósito dos resíduos sólidos em desacordo com as normas legais ou de que a ação seja nociva a alguém ou que ofenda, suje ou moleste a determinada pessoas, como prevê o art. 37 da Lei de Contravenções Penais.
Trata-se de um crime de mera conduta. Nos delitos em que a descrição da conduta, por não existir explicitamente qualquer referência ao resultado da ação ou da omissão, o dano ou lesão ao interesse que a norma tutela é a própria conduta do agente como realidade espacial e temporal em que seu querer interno se exterioriza. Os múltiplos resultados que daí advém, na esfera do mundo natural, deixam de ser apreciados e verificados no campo da tipicidade porque a norma penal não os prevê.
Conscientizadas do problema e das necessidades de novas medidas legais, as estruturas administrativas e judiciais hão de trabalhar sintonizadas. Os Tribunais têm sido constantemente solicitados em rever as ações administrativas que dizem respeito aos interesses fundamentais da pessoa humana, quanto à vida, à saúde e à liberdade. Esses em confronto com os interesses econômicos em risco. Uma resposta eficaz ao desafio da poluição não dependerá somente de um quadro jurídico fixo, mas do entendimento franco e contínuo entre administradores e juristas com o fim de realizarem conjuntamente os programas de interesse comum de preservação e melhoria da qualidade de vida.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O acelerado processo de urbanização no Brasil nas últimas décadas, seguido da falta de planejamento na ocupação dos espaços urbanos e no uso inadequado dos recursos naturais, contribui para que as cidades brasileiras apresentem os mais diversos problemas, inclusive no que se refere à coleta de resíduos sólidos, já que o lixo é um dos grandes responsáveis por tais problemas. Frente a este fato tão debatido, mas tão pouco solucionado, não somente pelo Poder Público como pela sociedade de um modo geral e pela relevância deste tema é que este trabalho objetivou trazê-lo mais uma vez à discussão com o intuito de refletirmos a respeito de uma forma de a partir da legislação vigente, encontrarmos soluções viáveis aos problemas relativos à gestão dos resíduos sólidos.
As questões ambientais dizem respeito às diferentes maneiras pelas quais a sociedade, através dos tempos, se relaciona com o meio físico-natural. Através da interação com a natureza e com outros homens ela produz valores, atitudes, bens materiais, modos de perceber o mundo e com isto constrói seu patrimônio cultural.
O homem e o meio ambiente estão inevitavelmente interligados, sendo uma das preocupações centrais a qualidade do meio ambiente, que se reflete na sua qualidade de vida. A tentativa de atender a demanda do consumo faz com que o homem transforme cada vez mais a matéria-prima em produtos acabados gerando maiores quantidades de resíduos e contaminando cada vez mais seus recursos.
A partir do processo de urbanização, houve um aumento na utilização dos recursos naturais porque a sociedade se apropriou da natureza para produzir objetos que atendessem as demandas econômicas e sociais. Como bem salientam Pereira e Sampaio (2006): A cidade é consumidora de grande quantidade de produtos, contribuindo para o movimento de produção, distribuição, troca e consumo sendo, portanto, necessário ser estudada a relação entre este ambiente e o desenvolvimento a ele induzido. Nesse contexto, a questão ambiental deve ser entendida como um produto da intervenção da sociedade sobre a natureza.
A situação de degradação desperta a procura de dispositivos legais que prevejam o fato e tutelem os direitos que o mesmo ameaça, de uma maneira particular ao que se refere ao meio ambiente. Os dispositivos legais, desde a Constituição Federal até códigos municipais e portarias parecem ser adequados à situação de preservação ambiental, entretanto, as ações públicas e o aparelho fiscalizador não encontram pelo que se observa o devido cumprimento das diversas disposições previstas nas normas.
A questão do lixo propicia discussões acerca da crise ambiental em seus múltiplos aspectos como os padrões de produção e consumo, saúde pública, poluição ambiental, etc.
Nota:
Informações Sobre o Autor
Danieli Veleda Moura
Bacharel em Direito (FURG) Mestranda em Educação Ambiental (FURG)