Autores: Talita Custódio, Advogada, Conciliadora pela EPM.
Janeide Soares dos Santos, Advogada, Tributarista.
Resumo: A presente pesquisa analisa a função social da posse com escopo na usucapião extrajudicial e suas tendências.
A partir do conceito do tema, o artigo apresenta os fundamentos, como vem sendo trabalhado, todo procedimento, bem como as vantagens da usucapião extrajudicial.
É uma proposta para que seja observado alguns dispositivos do provimento 65 de 14/12/2017 do CNJ que sedimenta a ideia da usucapião extrajudicial trazendo novas interpretações de aspectos do artigo 216-A da Lei de Registros Públicos culminada com as atualizações da Lei 13.465/2017.
Palavras-chave: Usucapião extrajudicial. Função social da posse. Procedimentos da usucapião extrajudicial. Celeridade extrajudicial. Vantagens da usucapião extrajudicial
Abstract: The present research analyzes the social function of the possession with scope in the extrajudicial adverse possession and their tendencies.
Based on the theme concept, the article presents the fundamentals, how it is been worked, every procedures, as well as the advantages.
It is a proposal that observe some provisions of the provision 65 of 12/14/2017 of the CNJ that consolidates the idea of extrajudicial adverse possession, bringing new interpretations of aspects of article 216-A the Public Records Law, culminating with the updates of Law 13.465 / 2017.
Keywords: Extrajudicial adverse possession. Social function of ownership. Procedures for extrajudicial adverse possession. Extrajudicial speed. Advantages of extrajudicial adverse possession
Sumário
Introdução. 1. Do conceito de usucapião.1.1. Dos pressupostos. 2. Da usucapião extrajudicial. 2.1 Dos procedimentos no ordenamento jurídico. 2.2. Da legitimidade. 2.3. Dos documentos que devem instruir o pedido da usucapião extrajudicial. 2.4 Da análise e homologação. 2.5 Da impugnação 2.6 Das hipóteses de rejeição. 3.Das vantagens da usucapião extrajudicial. 4. Da função social. Conclusão. Referências.
Introdução
A Usucapião extrajudicial foi inserida no Novo Código de Processo Civil com o intuito de desjudicializar, quando possível, a aquisição da propriedade por meio do reconhecimento da usucapião, conferindo celeridade e economia processual.
A exemplo do inventário extrajudicial, da retificação extrajudicial de registro imobiliário, divórcio extrajudicial, da conciliação e mediação, a faculdade de requerer a usucapião extrajudicial é fruto de uma nova mentalidade quanto à prestação jurisdicional.
Assim, prevê a Constituição Federal de 1988 o dever de o Estado promover meios que deem celeridade aos processos.
O artigo 5°, LXXVIII Constituição Federal, dispõe: “A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.
- Do Conceito da usucapião
A usucapião é o modo originário de aquisição da propriedade de bens móveis, imóveis e outros direitos reais pelo transcurso do tempo desde que atendidos os requisitos legais.
É originária porque não tem relação entre o antigo e novo proprietário, não havendo nenhum vício ou defeito no ato da aquisição. Além da consecução da propriedade, adquire-se os direitos reais, por exemplo, se tiver ônus, como no caso da hipoteca, recairão sobre o novo proprietário.
Existem dois fundamentos jurídicos para a usucapião, primeiro a função social da posse e, segundo, a regularização ou juridicidade de situações fáticas consolidadas. Se um indivíduo possui uma propriedade por um lapso temporal e dá função social àquela propriedade, ou seja, se habita com sua família, se trabalha ou se habita e trabalha, dependendo da espécie e do tamanho do imóvel, ou seja, uma situação de fato, este cidadão poderá, por meio da usucapião, regularizar a sua posse.
Trata-se de um instituto complexo porque, para a sua configuração será necessário o preenchimento de vários requisitos, dos quais estudaremos a seguir.
1.1 Dos pressupostos
São elementos comuns a todas as espécies de usucapião:
- a) coisa hábil
- b) posse
- c) decurso do tempo
- d) justo título (pressuposto especial)
- e) boa-fé (pressuposto especial)
- Coisa hábil:
O bem deve ser passível de usucapir, existem três situações impeditivas, são elas: bens públicos, conforme os artigos 191 parágrafo único e 183 § 3º da Constituição Federal, e artigo 102 do Código Civil.
Os bens fora do comércio, como por exemplo o ar atmosférico.
Os bens dos incapazes, pois são imprescritíveis, conforme vem previsto no artigo 198, inciso I do Código Civil.
Todos os outros podem ser objeto de usucapião.
- Posse:
Não é qualquer posse que garante a usucapião, tem que ser a posse com intenção de dono “animus domini”. Deve ser mansa e pacífica, contínua e ininterrupta, é aquela que não tem oposição por parte do proprietário.
“A posse deve conferir uma função socioeconômica para a propriedade, daí surge a função social da posse ou Posse “ad usucapionem” é a que contém os requisitos dos artigos 1.238 a 1.242 do Código Civil, o primeiro deles o ânimo de dono, ter como seu o imóvel”
(GONÇALVES. 2017, p.553)
- Decurso do tempo:
A posse deve ser ininterrupta, mansa e pacífica, o lapso de tempo é requisito indispensável para aquisição por usucapião, seja qual for a espécie. O tempo varia de acordo com a modalidade, vai de dois até vinte anos.
- Justo título:
Documento que comprova a propriedade, escritura de compra e venda devidamente registrada. Previsto no artigo 1.242 do Código Civil. Trata-se de pressuposto especial, pois é requisito somente na usucapião ordinária.
- Boa-fé:
“Boa-fé é a crença do possuidor de que legitimamente lhe pertence a coisa sob sua posse” (Direito das coisas, p. 201 Lafayette). Assim, se o possuidor desconhece qualquer vício na aquisição do bem, este está de boa-fé. Trata-se de pressuposto especial, pois não é requisito para todas as espécies de usucapião.
2. Da usucapião extrajudicial
Faculdade de requerer a usucapião junto ao cartório de registro de imóveis, sem necessidade de ação judicial. Não trata-se de uma nova espécie de usucapião, mas de uma nova forma procedimental.
O Novo Código de Processo Civil através do artigo 1.071 inseriu à Lei dos Registros Públicos n°6.015/73 o artigo 216-A prevendo a possibilidade de a usucapião ser requerida extrajudicialmente no cartório de registro de imóveis onde está situado o imóvel usucapiendo.
Até 16 de março de 2016 quando ainda vigorava o antigo Código de Processo Civil de 1973 quem detinha o direito precisava ingressar com ação judicial para tê-lo reconhecido.
Verifica-se no caput do artigo 216-A, da Lei de Registros Públicos, que o pedido de usucapião “será processado diretamente perante o cartório do registro de imóveis”, portanto, somente os bens imóveis podem ser objetos da usucapião extrajudicial, tendo como propósito, a celeridade.
2.1 Dos procedimentos no ordenamento jurídico
Os procedimentos da usucapião extrajudicial passam-se no ambiente do Cartório de Registro de Imóveis atribuindo ao oficial o poder de processar este pedido de acordo com o seu convencimento, não confundindo-se com o juiz de direito, pois este não tem a chamada jurisdição.
2.2 Da legitimidade
A pessoa física ou jurídica interessada que detenha posse mansa e pacífica pelo lapso de tempo que a lei determina.
Em que pese seja via extrajudicial ainda assim é necessário advogado ou defensor público para requerer a usucapião por meio de petição, conforme os moldes do artigo 319 do Código de Processo Civil.
2.3 Dos documentos que devem instruir o pedido de usucapião extrajudicial:
O artigo 216-A da lei 6.015 de 31 de dezembro de 1973 em seus incisos traz o rol taxativo de documentos a serem apresentados, em complemento, os artigos 3º e 4º da Provimento 65/2017, CNJ, quais sejam:
I – ata notarial lavrada pelo tabelião, atestando o tempo de posse do requerente e de seus antecessores, conforme o caso e suas circunstâncias:
Trata-se de um documento público, com presunção de verdade, em que um tabelião lavra em seu livro de notas, de forma escrita, declara os fatos presenciados por ele embasado nas documentações e declarações apresentadas pelo requerente.
O notário redigirá de forma imparcial e clara um instrumento público chamado de ata notarial com o objetivo de fazer a prova da posse.
Conterá neste instrumento a intenção do solicitante, bem como, sua qualificação, estado civil, data de eventual casamento ou divórcio, a espécie do regime de bens, o modo pelo qual adquiriu a posse, o número da matrícula do imóvel (se tiver), o valor atribuído ao imóvel, o lapso temporal da posse, inclusive dos antecessores, a relação de documentos apresentadas e qualquer referência que possa influir na decisão do oficial registrador.
A declaração do notário referente ao tempo da posse não goza de fé pública, valendo, apenas, como indício de um fato a ser provado pelo requerente.
O tabelião poderá redigir mais de uma ata notarial, desde que apareçam fatos novos ou se o requerente, depois de obtido a primeira ata, se lembrar de evento relevante.
II – planta e memorial descritivo assinado por profissional legalmente habilitado, com prova de anotação de responsabilidade técnica no respectivo conselho de fiscalização profissional, e pelos titulares de direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo ou na matrícula dos imóveis confinantes”:
Analisaremos o inciso acima, entende-se que a planta e o memorial descritivo são documentos diferentes, vez que, a planta se reproduz no papel, em escala reduzida uma representação da vista superior e da região do imóvel, diz-se planta topográfica.
No Memorial Descritivo são detalhados o estado do bem, é um relatório sem imagens, apenas com relatos acerca das medidas do imóvel, suas coordenadas geográficas.
Ambos os instrumentos devem ser assinados por profissional habilitado, isto é, registrado no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA), inclusive, estes instrumentos devem estar acompanhados da anotação de responsabilidade técnica (ART) desse profissional. A ART é um documento que possibilita a identificação da responsabilidade técnica pelo serviço prestado, assegurando que a atividade foi realizada por profissional habilitado.
Na parte final do artigo 216-A, inciso II da Lei de Registros Públicos “ e pelos titulares de direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo ou na matrícula dos imóveis confinantes”. Exige-se a anuência pelo proprietário registrado na matrícula do imóvel e de outros direitos reais, essa necessidade torna-se incompatível com o próprio instituto da usucapião, pois se o possuidor requer a propriedade justamente pela inércia do titular do direito, é controverso exigir a assinatura do proprietário para o reconhecimento da usucapião em favor do possuidor.
Perante esta incongruência o CNJ criou um provimento nº 65 de 14/12/2017 para que o registrador, no cartório, analise quanto a necessidade da assinatura do titular do imóvel, senão vejamos:
Art. 10 “Se a planta mencionada no inciso II do caput do art. 4º deste provimento não estiver assinada pelos titulares dos direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo ou na matrícula dos imóveis confinantes ou ocupantes a qualquer título e não for apresentado documento autônomo de anuência expressa, eles serão notificados pelo oficial de registro de imóveis ou por intermédio do oficial de registro de títulos e documentos para que manifestem consentimento no prazo de quinze dias, considerando-se sua inércia como concordância”.
Considerar-se-á a concordância sem necessidade de notificação do titular do imóvel, quando:
Art. 13 –Provimento nº 65 de 14/12/2017 do CNJ: “Considera-se outorgado o consentimento mencionado no caput do art. 10 deste provimento, dispensada a notificação, quando for apresentado pelo requerente justo título ou instrumento que demonstre a existência de relação jurídica com o titular registral, acompanhado de prova da quitação das obrigações e de certidão do distribuidor cível expedida até trinta dias antes do requerimento que demonstre a inexistência de ação judicial contra o requerente ou contra seus cessionários envolvendo o imóvel usucapiendo.
- 1º São exemplos de títulos ou instrumentos a que se refere o caput:
I – compromisso ou recibo de compra e venda; II – cessão de direitos e promessa de cessão;
III – pré-contrato; IV – proposta de compra; V – reserva de lote ou outro instrumento no qual conste a manifestação de vontade das partes, contendo a indicação da fração ideal, do lote ou unidade, o preço, o modo de pagamento e a promessa de contratar; VI – procuração pública com poderes de alienação para si ou para outrem, especificando o imóvel; VII – escritura de cessão de direitos hereditários, especificando o imóvel; VIII – documentos judiciais de partilha, arrematação ou adjudicação”.
Portanto, é obrigatório, tão somente que, o memorial e a planta estejam assinados pelo profissional legalmente habilitado e pelo atual possuidor do imóvel. Embora, a lei disponha sobre a assinatura dos titulares anteriores do imóvel, caso estes não tenham assinado, serão notificados pessoalmente ou por correspondência com aviso de recebimento para que se manifestem quanto a concordância, se permanecerem inertes, será considerado anuência, podendo, dar seguimento aos atos da usucapião extrajudicial.
O artigo 13 do Provimento 65/2017 dispensa a assinatura dos titulares anteriores do imóvel, bem como, a tentativa de notificá-los, quando o possuidor houver justo título.
III – certidões negativas dos distribuidores da comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente:
As certidões tem por finalidade comprovar a ausência de litígio e deverão ser juntadas duas certidões, uma do distribuidor da comarca do imóvel comprovando que não existem ações judiciais relacionadas ao bem. A segunda é relativa ao domicílio do requerente, essa certidão procura saber se existe ação possessória contra o requisitante, atestando a posse violenta, tal certidão deverá ser negativa.
IV – justo título ou quaisquer outros documentos que demonstrem a origem, a continuidade, a natureza e o tempo da posse, tais como o pagamento dos impostos e das taxas que incidirem sobre o imóvel:
Entende-se por justo título o documento escrito que denota-se a intenção de obter a propriedade, por exemplo, o de compra e venda do imóvel, é requisito indispensável apenas para aquisição da propriedade pela usucapião ordinária, conforme artigo 1242 do Código Civil: “Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos”.
Para Roberto Wagner Marquesi (2017, p.93) “O justo título pode ser conceituado como a causa que, não sendo capaz de transferir o domínio, demonstra a aquisição da posse com a intenção de tornar-se dono”.
É relevante sobrelevar que, embora, seja um documento indispensável, a sua ausência não acarretará objeção ao pedido de usucapião extrajudicial, pois a ata notarial poderá conter fundamentos intrínsecos para incutir uma certeza no oficial do Cartório de Registro de Imóveis.
Não são considerados como justo título, mas podem ser juntados como indício de existência da posse, bem como, o tempo da posse, carnê de IPTU, contas de água, luz, declaração de imposto de renda que conste o bem usucapiendo, entre outros.
2.4 Da análise e homologação
Primeira fase:
O primeiro passo é entregar toda documentação vista no tópico anterior (petição ou requerimento juntamente com a ata notarial, planta, memorial descritivo, certidões negativas e justo título, quando couber) no Cartório de Registro de Imóveis onde o imóvel esteja situado, se este se estender por mais de uma cidade, poderá, o usucapiente escolher a comarca.
Segunda fase:
O oficial autuará o requerimento, significa dizer que o oficial vai fazer um caderno com a documentação recebida, enumerando e rubricando todas as páginas.
Na sequência, vai prenotar, isto é, anotar um número de protocolo que trata-se de um título com prioridade para registro, tendo o prazo de 30 dias para ser analisado, podendo ser prorrogado em casos complexos, como, por exemplo, a usucapião extrajudicial.
Depois de autuado e prenotado, iniciam-se as buscas, confirmando se há ônus que impeça a transmissão da propriedade, se as partes e cônjuges assinaram a planta e memorial descritivo, notifica-se os interessados, verifica-se a presença de exigências a serem cumpridas, caso positivo, o oficial devolverá os documentos para que se cumpram as exigências.
Depois de cumpridas, o requerente, representado por seu advogado deverá entrar novamente com o processo no cartório e refazer todo procedimento da primeira e segunda fase.
Terceira fase:
Caso não haja exigências ou se cumpridas, o oficial notificará os respectivos procuradores dos entes da federação, por meio dos correios com aviso de recebimento ou pessoalmente pelo oficial do cartório de Registro de Títulos e Documentos, para apurar se o imóvel se enquadra na relação de bens públicos, o que impossibilitaria a usucapião extrajudicial. Art. 15 – provimento 65,14/12/2017, CNJ, “Estando o requerimento regularmente instruído com todos os documentos exigidos, o oficial de registro de imóveis dará ciência à União, ao Estado, ao Distrito Federal ou ao Município pessoalmente, por intermédio do oficial de registro de títulos e documentos ou pelo correio com aviso de recebimento, para manifestação sobre o pedido no prazo de quinze dias”.
Se os entes federativos permanecerem inertes, o procedimento seguirá regularmente, podendo, o Poder Público se manifestar a qualquer momento.
Decorrido o prazo para se manifestarem, o oficial publicará no edital para que, possíveis terceiros interessados tomem ciência.
Artigo 216-A, §4º, da Lei de Registros Públicos, “O oficial de registro de imóveis promoverá a publicação de edital em jornal de grande circulação, onde houver, para a ciência de terceiros eventualmente interessados, que poderão se manifestar em 15 (quinze) dias”.
Ao final das diligências, se a documentação estiverem em ordem e não houver impugnações, o oficial fundamentadamente deferirá o pedido e promoverá o registro do novo titular na matrícula do imóvel (somente nos casos em que o imóvel tiver um número de matrícula e compreender a usucapião em sua totalidade), caso o imóvel tenha apenas a inscrição e não tiver matrícula ou, nos casos em que o reconhecimento da usucapião seja feita em frações do imóvel, será permitida a abertura de uma nova matrícula.
Artigo 216-A Lei 6.015/1973, “§ 6º Transcorrido o prazo de que trata o § 4o deste artigo, sem pendência de diligências na forma do § 5o deste artigo e achando-se em ordem a documentação, o oficial de registro de imóveis registrará a aquisição do imóvel com as descrições apresentadas, sendo permitida a abertura de matrícula, se for o caso”.
Provimento 65/2017 – Art. 20. “O registro do reconhecimento extrajudicial da usucapião de imóvel implica abertura de nova matrícula.
- 1º Na hipótese de o imóvel usucapiendo encontrar-se matriculado e o pedido referir-se à totalidade do bem, o registro do reconhecimento extrajudicial de usucapião será averbado na própria matrícula existente.
- 2º Caso o reconhecimento extrajudicial da usucapião atinja fração de imóvel matriculado ou imóveis referentes, total ou parcialmente, a duas ou mais matrículas, será aberta nova matrícula para o imóvel usucapiendo, devendo as matrículas atingidas, conforme o caso, ser encerradas ou receber as averbações dos respectivos desfalques ou destaques, dispensada, para esse fim, a apuração da área remanescente”.
2.5 Da Impugnação
A impugnação também deve ser apresentada por meio escrito, fundamentada e representada por advogado.
Existem algumas pessoas legitimadas a impugnar:
- O Poder público, a qualquer momento do procedimento e, se acontecer, o oficial encerrará o andamento e enviará ao rito judicial, conforme dispõe o entendimento do CNJ.
Artigo 15 do provimento nº 65, CNJ § 3º: “Apresentada qualquer ressalva, óbice ou oposição dos entes públicos mencionados, o procedimento extrajudicial deverá ser encerrado e enviado ao juízo competente para o rito judicial da usucapião”.
- O terceiro interessado, poderá impugnar após a publicação do edital, no prazo de 15 dias. É aquele que, por exemplo, adquiriu o bem mediante compromisso de compra e venda e não levou a registro e descobre que este bem está prestes a ser usucapido.
- Os interessados diretamente, também podem impugnar, o próprio titular do imóvel, o herdeiro e o cônjuge.
O Conselho Nacional de Justiça (art. 18 – Provimento nº65/2017) entende que se houver impugnação, o oficial poderá, antes de indeferir, arquivar ou remeter os autos ao judiciário, transacionar uma conciliação para que o procedimento figure no âmbito cartorário.
Art. 18, Provimento nº65/2017:
“Em caso de impugnação do pedido de reconhecimento extrajudicial da usucapião apresentada por qualquer dos titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo ou na matrícula dos imóveis confinantes, por ente público ou por terceiro interessado, o oficial de registro de imóveis tentará promover a conciliação ou a mediação entre as partes interessadas.
- 1º Sendo infrutífera a conciliação ou a mediação mencionada no caput deste artigo, persistindo a impugnação, o oficial de registro de imóveis lavrará relatório circunstanciado de todo o processamento da usucapião.
- 2º O oficial de registro de imóveis entregará os autos do pedido da usucapião ao requerente, acompanhados do relatório circunstanciado, mediante recibo.
- 3º A parte requerente poderá emendar a petição inicial, adequando-a ao procedimento judicial e apresentá-la ao juízo competente da comarca de localização do imóvel usucapiendo”.
Caso não haja conciliação ou não seja feita, o requerente, na pessoa do seu advogado, poderá emendar a petição inicial para que se adeque, proporcionando o andamento do pedido no juízo da comarca do imóvel.
Dispõe o parágrafo 10 do art. 216-A, da Lei de Registros Públicos, “Em caso de impugnação do pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião, apresentada por qualquer um dos titulares de direito reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes, por algum dos entes públicos ou por algum terceiro interessado, o oficial de registro de imóveis remeterá os autos ao juízo competente da comarca da situação do imóvel, cabendo ao requerente emendar a petição inicial para adequá-la ao procedimento comum.”
2.6 Das hipóteses de rejeição
- 1ª Hipótese: Indeferido e arquivado.
Pode ser indeferido o pedido extrajudicial de usucapião se o possuidor do imóvel não conseguir fazer prova de sua posse pelo tempo e de forma pacífica como dispõe a lei.
O interessado deve apresentar provas de que tem a posse do imóvel há 15 anos ou 10 anos se constituiu sua moradia habitual ou nele tenha realizado obras ou serviços de caráter produtivo.
Essa prova pode ser feita através de testemunhas, como vizinhos, que possam declarar conhecimento da posse pelo tempo exigido, devem ser apresentados como prova comprovantes de pagamentos de impostos, contas de água, luz, telefone etc.
Em caso de indeferimento, o procedimento será arquivado no cartório, o interessado poderá propor ação judicial, senão vejamos os parágrafos do artigo 216-A, da Lei de Registros Públicos, “§ 8o Ao final das diligências, se as documentações não estiverem em ordem, o oficial de registro de imóveis rejeitará o pedido; § 9° A rejeição do pedido extrajudicial não impede o ajuizamento de ação de usucapião”.
- 2ª Hipótese: Indeferido e remetido ao juízo competente
Se houver dissenso entre as partes ou impugnação, o oficial vai dar um prazo para o advogado do requerente emendar a petição, tornando-a uma petição inicial com os requisitos do artigo 319, do Código de Processo Civil tornando aquele caderno um processo de fato e remeterá os autos ao juízo da comarca do imóvel.
Se a comarca tiver tramitação por meio eletrônico, o oficial digitalizará e enviará eletronicamente.
3. Das vantagens da usucapião extrajudicial
Pode ser considerado como vantagens, os seguintes aspectos em relação a usucapião extrajudicial:
Consenso:
Quando as partes reconhecem a usucapião, por exemplo, no contrato de compra e venda que não foi realizada a escritura, haverá muito mais facilidade de produzir efeito na via extrajudicial, auxiliando na convicção do oficial do cartório.
Tem como princípio o consentimento das partes, exigindo as assinaturas tanto dos confinantes do imóvel quanto do proprietário registrado na matrícula do imóvel.
Porém, há entendimento favorável no provimento nº 65 de 14/12/2017 do CNJ.
Desjudiscialização e celeridade:
É sabido que o Novo Código de Processo Civil se preocupou muito com a celeridade processual, tendo por objetivo dar celeridade a legitimação de situações fáticas. O cerne foi desafogar o judiciário deixando para o juiz as questões mais complexas, possibilitando ao oficial do Cartório de Registro de Imóveis decidir sobre este tema, sabendo que possui fé pública.
Um processo judicial de usucapião demora em torno de 4 a 8 anos, podendo ultrapassar uma década, enquanto que a usucapião extrajudicial tem previsão de 120 dias para ser declarada, podendo ultrapassar alguns meses caso a documentação fique pendente por motivo alheio a vontade do oficial do Cartório de Registro de Imóveis.
Possibilidade da via judicial:
O fato do usucapiente escolher a via extrajudicial não exclui a faculdade de optar pela via judicial, tendo por base o artigo 5º, XXXV da Constituição Federal “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
Portanto, caso o sujeito que pleiteia a usucapião extrajudicial tenha o seu pedido rejeitado pelo oficial do cartório de registro de imóveis, poderá requerer em juízo competente.
Desembaraço dos atos e ausência do Ministério Público:
Os atos procedimentais são simples e ágeis, a comunicação é feita por correio ou pessoalmente, não há aquelas solenidades que existem no processo judicial como a citação, as intimações, recursos e prazos longos para as partes, nem tão pouco a necessidade de intervenção do Ministério Público.
Dispensa de homologação judicial:
A decisão será declarada pelo oficial do Cartório de Registro de Imóveis, não havendo necessidade da homologação do juiz, a partir da decisão do oficial será feito o registro ou abertura da matrícula, dependendo do caso.
Participação do advogado:
Aparentemente, quando se fala em desjudicialização entende-se que estão retirando o lugar do advogado, afinal, é neste ambiente em que ele trabalha, porém, o legislador garantiu a assistência do advogado no âmbito da usucapião extrajudicial, tendo em vista que, os documentos a serem apresentados serão melhor preparados pelo advogado, por exemplo, o requerimento que nada mais é do que uma petição inicial em favor do usucapiente fundamentada nos artigos da lei, cujo interessado não tem os conhecimentos técnicos.
Economia processual:
O valor a ser cobrado pelo advogado dependerá dentre outros fatores, do valor do imóvel. Com a usucapião extrajudicial o requerente vai obter uma economia média de 40%. Não incluindo despesas extras, custas e possíveis recursos.
4. Da função social
Trata-se de um dos fundamentos da usucapião, a proteção da função social da propriedade.
O artigo 5º, XXIII da Constituição Federal elucida que “a propriedade atenderá a sua função social”. O Estado protege a propriedade como garantia fundamental quando se confere ao bem um destino social útil, sendo que o desinteresse prolongado no tempo a esta determinação acarretará a perda do direito da propriedade quando outro possuidor conceder ao bem o destino econômico e social esperado, desde que atenda outros requisitos impostos pela lei.
O direito a propriedade não está condicionado somente ao seu titular, mas, também, em prol da sociedade retirando aquela visão monarca em que as terras poderiam ficar sem utilização alguma que nada acontecia com o proprietário comodista. A Constituição Federal retirou estes interesses egoísticos ao inserir que a propriedade deve atender a sua função social, portanto, deve-se harmonizar os interesses da coletividade e do proprietário.
Dentro da usucapião nota-se a preocupação do legislador com a função social da propriedade quando diminui o prazo para usucapir o imóvel desde que o possuidor dê função social ou econômica, habitando com sua família, trabalhando na propriedade ou ambos.
“Tem-se com o fundamento racional para a prescrição aquisitiva a função social que a propriedade deve ter, função social esta que se declara pela conduta omissiva do proprietário no exercício de um não-uso que, por ser improdutivo e antissocial, é nocivo, e pela conduta comissiva do prescribente que, usando a coisa, exercendo a sua utilidade, lhe dá uma função de conteúdo social. Estes elementos, em conjunto justificam a usucapião, dando-lhe um caráter ético mesmo que, objetivamente, seja despojado da propriedade alheia”(NASCIMENTO, 1992, p. 15).
Conclusão
A usucapião extrajudicial apresenta-se como uma forma mais célere de obter a aquisição originária de uma propriedade. Este procedimento não alterou a sua natureza jurídica.
A usucapião extrajudicial foi inserida em 2015 no Código de Processo Civil, no entanto, com os aspectos analisados percebe-se que apesar de algumas incongruências, por isso, veio a Lei 13465/17 que introduziu o artigo 216-A e o Provimento 65/2017 do CNJ para dar efetividade à este procedimento.
Em que pese, ser apenas para bens imóveis, passíveis de serem usucapidos, a usucapião extrajudicial veio para desafogar o judiciário garantindo o direito a titularidade da propriedade aos sujeitos que vivem em situações fáticas.
Referências
BODNAR, Zenildo, Curso objetivo de propriedade: 4ª edição. Curitiba – PR: Editora Juruá, 2009.
NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro do. Usucapião. 6ª edição. Rio de Janeiro: Aide Editora. 1992.
MARQUESI, Roberto Wagner. Usucapião Extrajudicial. Curitiba: Juruá, 2017.
GONÇALVES, Carlos. Direito civil, 2 – Esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2017.
http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3394 – Acesso em 13 mar.2018.
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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm Acesso em 14 mar. 2018.