Abusividade nas taxas de juros em contratos financeiros: Possibilidade de revisão de cláusulas contratuais


 


Resumo: O presente estudo visa destacar alguns aspectos referentes
a consumidores que na expectativa de adquirir bem móvel ou imóvel e estar fazendo
um bom negócio acabam por aderir a contratos financeiros que na maioria das
vezes estabelecem a capitalização mensal de juros, correção monetária cumulada
com comissão de permanência e juros moratórios e remuneratórios acima do limite
legal, onerando excessiva e unilateralmente o contrato. Nesta seara, a revisão
contratual, portanto, não tem o objetivo de ultrapassar a vontade das partes e
gerar insegurança ao vínculo contratual, mas reequilibrar o contrato com a
finalidade de preservá-lo, com a possibilidade de satisfação dos interesses
legítimos dos envolvidos.

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Palavras-chave: Taxas
de juros. Abusividade. Contratos financeiros

Sumário: 1. Introdução, 2. Limitação de Juros: breve consideração
histórica, 3. Revisão dos Contratos
Financeiros à Luz do CDC; 4. Aplicabilidade do CDC em Contratos de Adesão; 5. A
Violação ao Princípio da Boa-Fé e o Direito de Informação; 6. Arbitrariedade Contratual;
7. Breve consideração sobre a Tabela Price,
anatocismo e o “bis in idem”; 8.
Conclusões; 9. Referências

1 INTRODUÇÃO

Um dos grandes problemas enfrentados há muito tempo
na doutrina e jurisprudência refere-se acerca da possibilidade ou não da
incidência dos juros remuneratórios em contratos financeiros limitados em 12%
ao ano principalmente no que tange aos estabelecidos pelas instituições
financeiras, cooperativas de créditos e bancos.

O art. 192, § 3º da Constituição Federal de 1988
limitava a aplicabilidade de juros no percentual de 12% ao ano, mas a edição da
Emenda Constitucional nº 40/2003 esta revogou tal limitação, e coube, a partir
de então, ao Conselho Monetário Nacional, nos termos da Lei nº 4.595/64 esta
limitação.

Entretanto, ante a aplicabilidade do disposto no
Decreto nº 22.626 de 07 de abril de 1933, conhecida como Lei da Usura e também
Código Civil Brasileiro de 1916 impôs-se a limitação dos juros remuneratórios
legais como sendo, no máximo de 12% ao ano e, neste sentido, qualquer ajuste
desprovido de especificação acerca da taxa de juros remuneratórios deveria,
necessariamente, pautar-se na disciplina da lei civil.

Ocorre que as instituições financeiras não se
submetem aos limites da Lei de Usura o que também perdeu força diante da súmula
nº 596[1]
do STF a qual aduz que não se aplicam as disposições do Decreto ora citado às
taxas de juros e a outros encargos inseridos em operações financeiras,
onerando, em muito, os contratos pactuados.

As taxas de juros nos patamares praticados na
atualidade contrariam a função social do contrato, sendo que este tem sua razão
de ser no interesse da coletividade e na produção, sendo um serviço essencial
ao desenvolvimento da sociedade fornecendo crédito para a produção da
multiplicação do dinheiro disponível no mercado financeiro, sendo que com essas
finalidades deve estar afinada a disciplina legal dos juros.

2
LIMITAÇÃO DE JUROS: BREVE CONSIDERAÇÃO HISTÓRICA

Historicamente o Direito Financeiro, no decorrer
dos tempos, passou por inúmeras tentativas de controle a fim de estabelecer taxas
máximas ou mínimas de juros. Alencar (2006, p. 5), ressalta que:

“[…] no Estado Moderno, na
sua feição social, inspirada na Constituição de Weimar,
afirmou todavia sua intervenção ampla tanto no plano econômico como no social,
só admitindo a cobrança de juros até determinado teto e combatendo todas as
formas de agiotagem e de usura, considerando-se até como figuras típicas de
direito penal.”

Sendo assim, vale dizer que o mundo civilizado
combatia e combate a usura, por reconhecer que o lucro exagerado do capital
impedia e impede o desenvolvimento dos demais setores econômicos, tanto que
Caio Mario da Silva Pereira se pronunciou neste sentido, justificando as
restrições impostas pela Lei de Usura e nos períodos de crise, sentia o
legislador ao baixar o Decreto 22.626 de 1933[2]
que os abusos eram levados aos extremos de asfixiarem toda iniciativa honesta.

Assim o intervencionismo estatal voltou a
regulamentar a prática dos juros, o art. 1º caput e o §3º da Lei de Usura
dispõe que:

Art. 1º. É vedado, e será punido nos termos desta Lei, estipular em
quaisquer contratos taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal. […]

§3º. A taxa de juros deve ser estipulada em escritura pública ou escrito
particular, e não o sendo, entender-se-á que as partes acordaram nos juros de
6% ao ano, a contar da data da propositura da respectiva ação ou do protesto
cambial
.”

Sob o comando do artigo 11 do Decreto ora
mencionado, os contratos celebrados à época que sofressem infração seria nulo
de pleno direito, e ficava assegurada ao devedor a repetição do que havia sido
pago a maior.

Com o advento da Lei nº 4.595/64, denominada “Lei
da Reforma Bancária”, em sua ementa dispunha que sobre a Política e as Instituições
monetárias, bancárias e creditícias criava o Conselho Monetário Nacional[3],
segundo o qual as diretrizes eram estabelecidas pelo Presidente da República no
sentido de limitação das taxas de juros sempre que necessárias em operações e
serviços bancários ou financeiros (art. 4º), encerrando o limite previsto Pela
lei de Usura. Neste sentido as restrições impostas pelas leis comuns às taxas
de juros não mais se aplicariam aos bancos (ABRÃO, p. 71, 1999).

Com proficiência no assunto o professor Marçal Justen Filho[4]
relatou que, juridicamente, não compete ao Conselho Monetário Nacional
autorizar a cobrança da comissão de permanência ou dispor sobre normas
relacionadas a contratos praticados entre instituições financeiras e
particulares, podendo somente receber competência administrativa, nunca
normativa.

O Supremo Tribunal Federal se pronunciou em 1976
editando a súmula nº 596, dispondo em seu bojo que “as disposições do DL
22.626/93 não se aplicam às taxas de juros aos outros encargos cobrados nas
operações realizadas por instituições financeiras públicas ou privadas, que
integram o sistema financeiro nacional”, o tema, entretanto, nunca foi objeto
de pacífica interpretação entre os doutrinadores.

Grande celeuma se instalou no contexto jurídico da
época no sentido de que a Lei nº 4.595/64 jamais revogou a Lei de Usura, a sua
finalidade principal foi dar subsídios para as classes produtoras, o que se
tornaria impossível com juros superiores a 12% ao ano, pois num país de
dimensões continentais, necessitava de um setor produtivo forte e competitivo
(TOLENTINO, p. 5, 2007).

Nos contratos financeiros de um modo geral nota-se
que há uma inserção exagerada na taxa de juros remuneratórios – juros que
objetivam remunerar ou recompensar o mutuante pelo uso do capital e, neste
sentido, numa visão constitucionalista do direito privado, este atingiu em
cheio tais contratos, submetendo o patrimônio à pessoa do contratante, ferindo
o princípio da igualdade na sua essência. O fator de discriminação eleito
encontra abrigo no fato de terem as pessoas jurídicas o caráter de instituições
financeiras, pois se criou a possibilidade de cobrarem juros acima da taxa da
Lei de Usura (MELLO, p. 99, 1993).

Nesta seara há uma grande concentração de recursos
nas mãos de poucos contrariando um dos objetivos erigidos na Carta Magna,
artigo 3º, III, qual seja o de erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir
as desigualdades sociais e regionais, ferindo o art. 170 CF/88[5].

Tal preceito subordina a livre iniciativa à justiça
social, conferindo o aspecto finalístico da ordem
econômica e devido a esta especulação financeira das grandes corporações tem
levado em detrimento à boa fé objetiva e equidade nas relações comerciais e ou
financeiras.

Neste sentido, Luiz Edson Fachin
(2000, p. 244) afirma que:

“A Constituição Federal de
1988 operou uma inversão ao erigir fundamento da República a dignidade da
pessoa humana, impondo ao Direito Privado o abandono da postura patrimonialista
herdada do século XIX e na qual se inspirou o Código Civil pátrio. Submete-se o
patrimônio à pessoa: aquele se legitima enquanto meio de realização desta.”

As relações jurídicas devem ser perseguidas no
sentido de um maior favorecimento da pessoa humana, atualmente nestes termos a
vontade contratual deixou de ser o núcleo do contrato, abrindo espaço, entre
outros valores jurídicos fundados na Constituição Federal. Nalin
(2000, p. 79), assinala que isso é observado com grande destaque nas relações
jurídicas contratuais, em que a vontade surge como mero papel de impulso,
quando não, completamente inexistente, no âmbito das relações de contrato de
adesão.

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É pacífico o entendimento em grande parte da
doutrina a respeito das taxas de juros aplicadas aos contratos, assim também é
a opinião de Mário Soares Caymmi Gomes (2004, p. 2):

“(…) há de haver
proporcionalidade entre a necessidade do sistema de sancionar o devedor faltoso
e a necessidade de se adequar tal imperativo com as garantias de dignidade da
pessoa humana e intangibilidade patrimonial previstas nos artigos 170, caput e
5º, XXII, ambos da Constituição Federal, de maneira que a falta de pontualidade
não pode levar à espoliação completa do accipiens.”

Para tecer uma noção geral sobre juros
remuneratórios a ciência jurídica, apoiando-se nas conceituações econômicas,
qualifica os juros como sendo o preço do uso do capital, ou seja, o fruto
civil. Rodrigues (2002, p. 315) diz que ele (fruto) a um tempo remunera o
credor por ficar privado de seu capital e paga-lhe o risco em que incorre de o
não receber de volta.

Destarte, possui significado equivalente a ganhos,
usuras, interesses ou lucros. Leciona Caio Mario (1981, p. 110):

“Chamam-se juros as coisas
fungíveis que o devedor paga ao credor, pela utilização de coisas da mesma
espécie a este devidas. Pressupõe uma obrigação de capital, de que o juro
representa o respectivo rendimento, distinguindo-se com toda nitidez das cotas
de amortização. Na idéia de juro integram-se dois
elementos: um que implica a remuneração pelo uso da coisa ou quantia pelo
devedor, e outro que é a de cobertura do risco que sofre o credor.”

Juros remuneratórios, portanto, são aqueles que
representam uma compensação pelo uso que o devedor faz do capital, em razão de
cobertura dos sacrifícios de abstinência e riscos sofridos pelo credor;
enquanto os juros moratórios constituem uma indenização pelo atraso culposo do
pagamento, (ALENCAR, p. 2, 2006).

Neste sentido, importante ressaltar que nos contratos de mútuo em que a disponibilização
do capital é imediata, o montante dos juros remuneratórios praticados deve ser
consignado no respectivo instrumento.

Assim,
uma vez ausente a fixação da taxa no contrato, quando da sua revisão, o juiz
deve limitar os juros à média de mercado nas operações da espécie, divulgada
pelo Banco Central, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o cliente.
O entendimento foi pacificado pela Segunda Seção do STJ, no julgamento de dois
recursos especiais impetrados pelo Unibanco.

Ao
analisar os processos a ministra Nancy Andrighi, no
seu entender, relata que nos contratos bancários que preveem a incidência de
juros, mas não especificam seu montante, têm de ter essa cláusula anulada, já
que deixam ao arbítrio da instituição financeira definir esse índice. Há casos,
porém, em que o contrato é omisso quanto a essa questão, é preciso interpretar
o negócio considerando-se a intenção das partes ao firmá-lo.

Para
a ministra, a utilização da taxa média de mercado é adequada porque é medida
por diversas instituições financeiras, representando, portanto, o ponto de equilíbrio
nas forças do mercado, e seu uso, nos processos sob análise, é a “solução que
recomenda a boa-fé”. A jurisprudência do STJ tem utilizado a taxa média de mercado
na solução de conflitos envolvendo contratos bancários.

Paralelamente,
o Tribunal tem reiterado o entendimento de que a estipulação de juros
remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade. (REsp. nº 1112879 e
1112880 – STJ).

3 REVISÃO DOS CONTRATOS FINANCEIROS À LUZ DO CDC

Não se
pode olvidar sobre a possibilidade de revisão judicial de contratos bancários
diante do desequilíbrio na relação contratual, levando-se em consideração a idéia de cláusula abusiva no momento de formação do
contrato, a vantagem exagerada de uma das partes e a lesão subjetiva ou
o chamado dolo de aproveitamento. O novo Código Civil, no art. 157,[6]
reintroduz, no ordenamento, a lesão como modalidade de vício do negócio
jurídico. (VENOSA, 2006). É também o entendimento de Paulo Villela (2002),
quando aduz que:

“O instituto da lesão justifica-se como forma de proteção ao contratante
que se encontra em estado de inferioridade. No contrato, mesmo naqueles paritários,
ou seja, naqueles em que as partes discutem livremente suas cláusulas, em
determinadas situações, um dos contratantes, por premências várias, é colocado
em situação de inferioridade.”

O instituto da lesão justifica-se como forma de
proteção ao contratante que se encontra em estado de inferioridade,
caracterizado pelo prejuízo resultante da desproporção existente entre as prestações
de um determinado negócio jurídico, em face do abuso da inexperiência de um dos
contratantes.

No contrato, mesmo naqueles paritários, ou seja,
naqueles em que as partes discutem livremente suas cláusulas, em determinadas
situações, um dos contratantes, por premências várias, é colocado em situação
de inferioridade. (GAGLIANO & FILHO, p. 370, 2004).

Sabe-se que a teoria geral clássica do contrato tem
sua origem nos séc. XVIII e XIX época em que na filosofia vigorava o individualismo
de base Kantiana; na análise de Celso Oliveira (1998), a economia
explodia o liberalismo e na política desenvolviam-se as idéias
de abstencionismo, recomendando-se ao Estado que não se imiscuísse nas
atividades privadas e nas relações negociais entre particulares.

Um dos reflexos dessas idéias
no direito contratual foi a consagração do voluntarismo jurídico, ou seja, a
construção jurídica no direito obrigacional voltou-se completamente para a
autonomia da vontade e liberdade contratual.

Como corolário natural do princípio da liberdade
contratual foi desenvolvido o princípio da força obrigatória dos contratos (pacta sunt servanda), segundo o qual o contrato faz lei entre as
partes (conforme a conhecida fórmula do "Code Napoleon").

São características desse princípio a coercibilidade do que foi avençado e a irrevogabilidade
unilateral das cláusulas contratuais. Somente o caso fortuito ou de força maior
pode liberar a parte contratante de cumprir a avença. Ao Judiciário restaria apenas
o controle formal do contrato, sendo-lhe defesa a análise das questões relativas
à justiça contratual. (ROPPO,
Enzo. O contrato.
Coimbra: Almedina, 1988)

Nesse sistema, fundado na mais ampla liberdade de
contratar, não havia lugar para a questão da intrínseca igualdade, da justiça
substancial das operações econômicas, afigurando-se, em muitos casos, como
regra flagrantemente injusta. (GACLIANO & FILHO, p. 6, 2007).

Tal concepção jurídica (do voluntarismo contratual)
atingiu seu apogeu no século passado, por influência do Código Civil francês, e
entrou em franco declínio no século presente, diante da constatação de que a
igualdade entre as partes contratantes era apenas teórica e formal, chocando-se
com uma desigualdade material entre os indivíduos.

Sente sentido, quando as partes estão desigualadas
materialmente, e se lhes concede liberdade para estabelecerem as cláusulas
contratuais, a inexorável conseqüência é a exploração
da parte mais necessitada pela parte economicamente mais avantajada. (GOMES, p.
6, 1999).

O liberalismo contratual mostrou, assim, toda a sua
insuficiência, diante da ausência de uma efetiva vontade contratual. Havia necessidade
de uma função social do direito privado. Uma nova realidade contratual se
manifesta nos nossos dias, tornando necessária a vinculação da teoria do
contrato com a base econômica geral.

Percebe-se nitidamente o surgimento dos contratos
de massa, que são previamente definidos através de cláusulas contratuais gerais,
elaboradas por uma das partes contratantes e impostas à aceitação da outra
parte, que normalmente não tem alternativa senão aceitar, em bloco, tais
cláusulas.

A liberdade contratual tornou-se apenas um ideal –
inexistente na prática. Neste sentido, nos dizeres de Paulo Roberto Nalin (p. 109, 2002):

“O homem contratante acabou,
no final do século passado e início do presente, por deparar com uma situação
inusitada, qual seja, a de despersonalização das relações contratuais, em
função de uma preponderante massificação, voltada ao escoamento, em larga
escala, do que se produzia nas relações industriais.”

O que se constata é que a realidade diverge
francamente do que havia outrora quando da construção da teoria geral do
contrato. Não se pode mais aplicar, de forma automática e mecânica, os ideais
do voluntarismo jurídico e da obrigatoriedade do pacta sunt servanda.

Hodiernamente continua-se reconhecendo a
importância fundamental do contrato, mas busca-se assegurar realmente o
equilíbrio contratual. Ampliam-se as conseqüências do
princípio da boa-fé, consagrado no § 242 do BGB (Código Civil Alemão) e
acolhido pela doutrina obrigacional universalmente, o qual veio a ser
expressamente albergado como princípio básico do CDC pátrio (art. 4º, inc. III,
da Lei 8.078/90)[7].

4 APLICABILIDADE DO CDC EM CONTRATOS DE ADESÃO

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Desde que foi promulgado, as práticas das
instituições financeiras, de um modo geral conflitam diretamente com as normas
consignadas no CDC, principalmente no que tange à a) existência de vantagem
manifestamente excessiva; b) fixação de obrigações unilateral; c) ausência
prévia de pactuação dos encargos; d) usura; e) anatocismo;
f) cláusulas potestativas e abusivas; g)
enriquecimento ilícito, etc.

Por isso, todos os contratos celebrados a partir do
advento da Lei n.º 8.078/90, desde que se refiram às relações de consumo, não
podem passar ao largo de suas preceituações, ainda que celebrados sob a égide
da lei civil comum. Neste ponto, vale frisar que os serviços prestados pelas
instituições financeiras aos seus clientes, dentre eles os contratos de
concessão de crédito, deverão ser regidos pelas normas do CDC, conforme já
amplamente pacificado pela jurisprudência.

Do mesmo modo Cláudia Lima Marques (1995, p. 141),
também não diverge quanto à sujeição dos bancos às normas do CDC. Nesse
sentido, vale a pena transcrever o comentário acerca da matéria, em sua obra
Contratos do Código de Defesa do Consumidor de 1995, para quem:

“A caracterização do banco
ou instituição financeira como fornecedor está positivada no art. 3º, caput, do
CDC e especialmente no parágrafo 2º do referido artigo, o qual menciona
expressamente como serviços as atividades de natureza financeira, de crédito.”

O STJ se posicionou definitivamente através da
edição da Súmula 297 que preceitua: “O Código de Defesa do
Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.

Desta feita, pela exposição da legislação, da
jurisprudência e de autorizada doutrina, não resta dúvidas quanto à
aplicabilidade do CDC em relação a possíveis revisões em contratos financeiros.

Nem se cogita da impossibilidade de revisão
contratual, sob o argumento de que as partes teriam anuído com o seu conteúdo
ou sob alegação do “pacta sunt
servanda”
[8],
pois conforme já visto, não é aceitável, frente aos modernos postulados e à evolução
do direito, invocar-se obediência cega ao referido princípio para subjugar a
parte contratante mais fraca aos efeitos de cláusulas que contém, realmente,
onerosidade tão excessiva que chega a desequilibrar o sinalágma
do negócio jurídico, neste sentido o Art. 6º do CDC preceitua que:

Art. 6º. São direitos básicos do consumidor: […]

V – a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações
desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem
excessivamente onerosas
;”

Deve-se atentar que os contratos praticados pelas
instituições financeiras, em regra, são contratos
de adesão, vez que suas cláusulas são pré-estabelecidas unilateralmente
sem que os consumidores tenham oportunidade de discuti-las ou alterá-las.

Gagliano & Filho (2007, p. 57)
são enfáticos em dizer que:

“Hoje, não mais os coronéis
de outrora, mas grandes indústrias, empresas e instituições financeiras, muitas
delas formando cartéis, lançam no mercado produtos e serviços, alguns de
primeira necessidade, os quais são adquiridos por consumidores de todas as
idades, sem que possam discutir os termos do negócio que celebram, os juros que
são estipulados e as garantias que se lhes exigem.”

É por esta razão que o CDC ao tratar dos contratos
de adesão elucida que as cláusulas que implicarem em limitação do direito do
consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil
compreensão, in verbis:

Art. 54 – Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido
aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo
fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou
modificar substancialmente seu conteúdo. […]

§3º Os contratos
de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos
e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao corpo doze, de modo a
facilitar sua compreensão pelo consumidor.

§4º – As
cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser
redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.”

Posta assim a questão, os consumidores possuem o
direito de serem previamente informados das cláusulas contratuais e, ainda, estas
devem ter uma redação clara e compreensível, permitindo sua imediata e fácil
compreensão.

Corroborando o assunto,
Cláudia Lima Marques (1992. p. 12):

“[…] a
maioria dos consumidores que concluem contratos pré-redigidos o fazem sem
conhecer precisamente os termos do contrato. Normalmente o consumidor não tem
oportunidade de estudar com cuidado as cláusulas do contrato, seja porque ele
as receberá só após concluir o contrato, seja porque elas se encontram
disponíveis somente em outro local, seja porque o instrumento contratual é
longo, impresso em letras pequenas e em uma linguagem técnica, tudo desestimulando
a sua leitura e colaborando para que o consumidor se contente com as
informações gerais (e nem sempre totalmente verídicas) prestadas pelo vendedor.
Assim, confiando que o fornecedor cumprirá, pelo menos, o normalmente esperado
naquele tipo de contrato, ele aceita as condições impostas, sem plena
consciência de seu alcance e de seu conteúdo.”

As letras pequenas e as disposições truncadas, de
difícil entendimento para leigos, impedem o conhecimento pleno das cláusulas, o
que “importa num conhecimento defeituoso”, nos dizeres de Miguel Maria da Serpa
Lopes (6ª ed., p.223). Deste modo, todos os aspectos do pacto servem a um único
propósito: maximizar os lucros da Instituição Financeira e esta o faz
prescrevendo cláusulas abusivas, estabelecendo uma excessiva onerosidade para
os consumidores, carentes dessa forma de crédito.

Cláusulas abusivas inseridas nos contratos de
adesão, que nas palavras do doutrinador Nelson Nery Junior (2003, p. 947), em
sua obra Código Civil Anotado e Legislação Extravagante, são aquelas:

“Notoriamente
desfavoráveis à parte mais fraca na relação contratual de consumo. São
sinônimas de cláusulas abusivas, as expressões cláusulas opressivas, onerosas,
vexatórias ou, ainda, excessivas. Sua existência não torna nulo todo o contrato
e pode estar presente tanto nos contratos de adesão como em qualquer outro
contrato de consumo, verbal ou escrito.”

Dessarte, sendo a
relação entre fornecedor e consumidor, consistente na prestação de um serviço,
à luz do CDC (art. 6°, IV; art. 39, V; art. 51, IV, §1°, e II), não se admite,
em qualquer ajuste contratual, a subsistência de cláusulas reconhecidamente
abusivas que asseguram vantagens excessivas para uma das partes em detrimento
da outra, mesmo se estipuladas nos tratos de comum acordo, vez que os fornecedores
(instituições financeiras), abusando da hipossuficiência dos consumidores,
estabelecem as condições que se lhes apresentam sendo as mais favoráveis.

O princípio da
transparência, intrinsecamente ligado ao dever de informação do fornecedor
(art. 6º, III, CDC) se traduz na “obrigação do fornecedor de dar ao consumidor
a oportunidade de conhecer os produtos e serviços que são oferecidos e, também,
gerará no contrato a obrigação de propiciar-lhe o conhecimento prévio de seu conteúdo.”
(Nunes, 2000, p. 108).

Nestes patamares, observa-se
que a função social do contrato não é cumprida, pois com todas as taxas,
encargos e juros cobrados, e com todas as garantias ofertadas às Instituições
Financeiras, os consumidores, hipossuficientes perante as instituições
financeiras, não possuem qualquer força de negociação, sendo-lhes imposto um
contrato de adesão, no qual, como se sabe, o princípio da autonomia da vontade
se reduz à mera aceitação do conteúdo do contrato pelo aderente.

5 A VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ E O DIREITO DE
INFORMAÇÃO

Ocorre a violação ao princípio da boa-fé objetiva
realizado pelas Instituições Financeiras todas as vezes que não atendem à norma
implícita de conduta consistente em informar previamente aos consumidores sobre
as conseqüências da contratação a prazo, e a aplicação
dos juros inseridas em suas cláusulas.

O princípio da boa-fé objetiva é o fundamento
jurídico do direito à informação plena, inclusive sobre o preço que é pago pelo
produto/serviço que se adquire.

A boa-fé é norma de comportamento positivada nos
artigos 4º, inciso III, e 51, inciso IV, do CDC, que cria três deveres
principais: um de lealdade e dois de colaboração, que são, basicamente, o de
bem informar o consumidor contratante sobre o conteúdo do contrato e o de não
abusar da outra parte.

Antonio Junqueira de Azevedo (1996, p. ) ensina:

“[…] a admissão da boa-fé,
no nosso ordenamento, não se limita, pois, ao microssistema do direito do
consumidor, mas a norma deve ser aplicada pela jurisprudência, no seu papel de
agente intermediário entre a lei e o caso, a todo o direito (inclusive ao
direito público). A boa-fé objetiva é, do ponto de vista do ordenamento, o que
os franceses denominam ‘notion-quadre’, isto é, uma
cláusula geral que permite ao julgados a realização do justo concreto, sem
deixar de aplicar a lei. (Responsabilidade pré-contratual no Código Defesa do
Consumidor: estudo comparativo com a responsabilidade pré-contratual no direito
comum”, in Revista de Direito do Consumidor nº 18, abril/junho 1996.”

Vale ressaltar que, na maioria das vezes, as
instituições financeiras calam-se diante da informação aos consumidores sobre a
cobrança de juros capitalizados ou não, comportamento este que contraria a
boa-fé objetiva, que é um princípio geral de direito incorporado ao ordenamento
jurídico brasileiro por meio do art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil,
assim como pelo artigo 4º – III, da Lei nº 8.078/90.

Ademais, o CDC enumera os seguintes direitos no seu
art. 6º:

Art. 6º São
direitos básicos do consumidor:

II – a
educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços,
asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;

III – a
informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com
especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e
preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

IV – a
proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais
coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou
impostas no fornecimento de produtos e serviços
;”

Os consumidores, hipossuficientes, não têm
conhecimento da repercussão econômica de taxas de juros divergentes, e,
portanto, a incidência de juros capitalizados ou não necessita de cláusula
expressa e em destaque, por ser limitativa de direitos do consumidor, conforme
exige o direito de informação, previsto no CDC em seu artigo 6º, inciso III.

Acerca ao referido dispositivo supra transcrito, os
ilustres doutrinadores Jônatas Milhomens e Geraldo Magela Alves (1994, p. 16 e 24/25), ensinam:

“O consumidor, sabe-se, é vulnerável, carente,
hipossuficiente, inferior na relação de consumo, porque não lhe é dado conhecer
todo o aparato técnico da produção do bem ou da prestação do serviço, além de
que os contratos de consumo normalmente contém cláusulas leoninas ou
ininteligíveis a favor do produtor e/ou fornecedor (…) A informação deve ser
compatível com a natureza do bem, espelhando claramente as suas especificações,
vantagens e desvantagens.” (Ed. Forense, 1994, p.16 e 24/25).

Portanto, no momento da contratação as informações
devem ser claras e precisas acerca do contrato, pois servem de fundamento para
que sejam conhecidas previamente todas as avenças do contrato conforme o art.
52, do CDC.

6. ARBITRARIEDADE CONTRATUAL

As instituições financeiras, devido ao grande
volume de trabalho, acabam por efetuar contratos de massa (adesão), previstos e
elaborados de forma unilateral, facilitando a inclusão de cláusulas abusivas
que asseguram vantagens excessivas para as mesmas, em detrimento do consumidor
que com elas contratam.

Considerando que tais cláusulas são abusivas e as
principais responsáveis pelo desequilíbrio entre as partes, tem-se que o contrato
deve ser revisto de forma que não seja aplicada a cobrança de juros excessivos
e valores extorsivos, em observância aos princípios da transparência, eqüidade e boa-fé
contratual.

Com relação aos princípios que norteiam a boa-fé
contratual há que se lembrar dos deveres de lealdade e confiança recíprocas, comumente
denominados deveres anexos gerais de uma relação contratual para que seja
firmado um elo de segurança jurídica calcada na confiança das partes que
pretendem contratar, com a explicitação, a mais clara possível, dos direitos e
deveres de cada um. (GAGLIANO & FILHO, p. 71, 2007)

Assim observa-se a determinação do art. 51 do CDC,
mais especificamente o inciso IV:

Art. 51 São nulas de pleno direito, entre
outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e
serviços que: […]

IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas,
abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam,
incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade
;” (grifo nosso)

O parágrafo primeiro do citado artigo ainda
classifica como exagerada as vantagens que ofenderem os princípios fundamentais
do sistema jurídico, como o equilíbrio contratual e ainda cláusulas que se
mostrem excessivamente onerosas para o consumidor.

A inadmissibilidade da cobrança arbitrária de juros
é evidenciada pelas recentes decisões dos Tribunais, conforme decisão abaixo:

“Apelação cível. Ação
revisional de contrato bancário. Alienação fiduciária. Aplicabilidade do Código
de Defesa do Consumidor. Vedada a capitalização em periodicidade inferior à
anual. Efeito restitutório e compensação. De ofício, taxa de juros remuneratórios. Ausente
qualquer justificativa por parte do fornecedor para a imposição ao consumidor
de taxa de juros excessiva como obrigação acessória em contrato de consumo
,
o restabelecimento do equilíbrio das obrigações exige a redução da taxa de
juros remuneratórios fixada em contrato de adesão. […]” (Apelação Cível Nº
70025138173, Décima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Carlos Alberto Etcheverry, Julgado em 18/09/2008).
(grifamos)

Portanto, com fulcro no referido artigo, as
cláusulas abusivas, aquelas que colocam a outra parte em posição de exagerada
desvantagem, são declaradas nulas, em especial as cláusulas contratuais que
estipulam as taxas de juros, o reajuste das parcelas, o modo de pagamento e amortização
do saldo devedor.

7. BREVE CONSIDERAÇÃO SOBRE A TABELA PRICE, ANATOCISMO E O “BIS IN
IDEM”

Neste tópico a análise versa sobre a aplicabilidade
da Tabela Price
ao sistema de amortização das prestações sob o ângulo da vedação da
capitalização de juros compostos em contratos financeiros.

O sistema de amortização pela Tabela Price parte do conceito de juros
compostos, daí decorrendo um plano de amortização em prestações periódicas e
sucessivas, considerado o termo vencido. Com isso, a aplicação de juros sobre
juros é inerente ao próprio sistema (TRF 4ª Região).

A este respeito, preceitua o art. 4º, do Decreto nº
22.626, de 7 de abril de 1933: “É
proibido contar juros dos juros”,
e sobre
o tema já se manifestou o Colendo STF, conforme consta da Súmula nº 121, “in
verbis”: “É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente
convencionada”.

Além da fixação de juros que excede aos percentuais
máximos fixados em lei, o anatocismo que nada mais é que a contagem de juros
vencidos ao capital ou sobre outros juros vencidos, nas relações pecuniárias. A
lei proíbe, portanto, o acréscimo de juros ao capital, para contabilização de
novos juros.

Novamente invoca-se a pena de LACERDA DE ALMEIDA:

“Anatocismo
é a acumulação dos juros vencidos ao capital para por sua vez vencerem juros,
ou melhor, é a contagem de juros compostos. Proibidos no cível, são-no
igualmente proibidos no comercial, onde o art. 253 do Código expressamente os
condena, admitindo apenas a acumulação de juros no encerramento anual das contas
correntes. O anatocismo é absolutamente proibido, estipulado ou não . A
taxa dos juros e o modo de contá-los depende de convenção das partes ou de determinação
legal. Isto, porém não obsta a que a obrigação de pagar juros esteja sujeita a
certas restrições destinadas a coibir freqüentes
abusos […]. A rescisão por lesão enorme e o freio que coíbe os possíveis
abusos, é o corretivo que restabelece a igualdade nos contratos comutativos, e
a ancora, o ponderador da justiça nesta ordem de relações” (“Obrigações”, Rio,
Revista dos Tribunais, 2 edição, 1916, p. 176, 179, 180, 394 e 395). (grifamos)

A matéria ainda gera muitas discussões, pois o a
utilização da Tabela Price engloba juros compostos por natureza e,
portanto pode ser considerada ilegal e ter afastada a sua aplicação dependendo
da análise de cada caso concreto.

A capitalização composta é comprovada ao se
analisar o sistema de cálculo das parcelas a serem pagas. Este sistema de
amortização caracteriza-se pelas seguintes premissas: pagamentos em prestações
iguais e sucessivas, cada qual composta por um componente decrescente de juros
e um componente crescente de amortização (SCAVONE, p. 2, 1999).

Para que seja reconhecida ilegalidade na
contratação da taxa de juros remuneratórios há necessidade de prova da
existência de discrepância com a taxa média praticada pelo mercado, com a conseqüente comprovação do desequilíbrio contratual ou de
lucros excessivos. Deve ser demonstrada a incidência de juros capitalizados sobre
o quantum debeatur por simples cálculo
aritmético, qual seja, multiplicação da taxa de juros mensal pactuada por doze
(número de meses), cujo resultado deve ser aquele previsto para a taxa anual de
juros. Em sendo a taxa anual de juros avençada superior a este resultado, resta
caracterizada a capitalização." (TJPR, AC 472.108-8, Rel. Renato Naves
Barcelos, 16ª Ccv. DJ:16/12/2008)

Este sistema de amortizações promove a
capitalização mensal de juros e seu conceito compreende a realização ou
pagamento dos mesmos. Neste sentido, fica claro que, parcela a parcela, o valor
dos juros é incorporado ao saldo devedor dos financiamentos, para serem
realizados exponencialmente e onerar o saldo devedor dos consumidores. (MELLO,
p. 72).

Fica assim, então, caracterizada a ocorrência do anatocismo na aplicação desta fórmula
de cálculo, o que não pode se permitir já que tal prática (composição de juros)
é repudiada pela Legislação e pelos Tribunais.

Em contrapartida, no entendimento de Jorge Antonio Maurique,
Relator do Tribunal Regional  Federal da
4ª Região, para que ocorra a amortização da dívida, o valor de cada prestação
constitui-se de duas parcelas: uma delas é denominada amortização (devolução do
principal ou de parte dele); a outra traduz os juros que representam o custo do
empréstimo. Cada prestação é composta por uma quota de amortização e por outra
de juros. Sendo fixo o valor da prestação, a utilização da tabela price implica realizar pequenas amortizações iniciais do
saldo devedor, sendo a maior parte da prestação, representada pelo pagamento de
juros.

O STJ
tem-se inclinado pela legalidade da adoção do Sistema Francês de Amortização
nos contratos de mútuo para aquisição de imóvel pelo SFH. Todavia, exige-se que
o valor da prestação seja suficiente para cobrir a parcela de juros, impedindo
a cumulação de resíduo no saldo devedor.

Nesse
sentido, tal providência não ofende o ordenamento jurídico brasileiro, uma vez
que a atualização do capital financiado antes da amortização dos juros não
afronta a regra do art. 6º, "c", da Lei 4.380/1964, pois as
instâncias ordinárias estipularam que a parcela do encargo mensal não abatida
deverá ser lançada em conta separada, submetida apenas à atualização monetária,
como meio de evitar a incidência de juros sobre juros nos financiamentos do
Sistema Financeiro de Habitação, conforme disposto na Súmula 121/STF. (AgRg no REsp 933.928/RS, Rel.
Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em
23/02/2010, DJe 04/03/2010).

Portanto,
não há óbice à aplicabilidade da tabela price como sistema
de amortização, se tal foi pactuado, vedando-se, contudo, o cômputo de juros de
forma capitalizada, consoante assegurado no voto majoritário, não merecendo
acolhida a tese da parte embargante. (TRF 4ª Região)

Entretanto, dependendo de cada caso concreto, o
CDC, em seu Art. 6º, inciso V, declara o direito básico do consumidor à
modificação de cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais,
no que se enquadram as taxas de juros praticadas no mercado financeiro.

São vedadas, ainda, ao fornecedor de serviços
bancários e creditícios, práticas consideradas abusivas, tais como exigir
vantagem manifestamente excessiva, art. 39. Além disso, são consideradas nulas
as cláusulas contratuais que estabeleçam obrigações consideradas abusivas, art.
51. sendo que a capitalização de juros (juros sobre juros), denominada
anatocismo, dependendo da análise de cada caso, é condenada pelos tribunais
brasileiros. (CASADO, 2000, p. 125)

Tais práticas abusivas são rebatidas pelo Tribunal
de Justiça do Paraná, conforme se depreende da Apelação Cível 0523966, de
25/11/2008:

“Processual
Civil – Apelação Cível – Ação de Revisão Contratual. Caracterizada incidência cumulativa de correção monetária e juros
remuneratórios – ilegalidade constatada
– encargos que exercem a
mesma finalidade na relação contratual – evidência de bis in idem
– honorários advocatícios adequados ao caso concreto – art.20, §3º do CPC. 1.
Contrato particular de compra e venda de imóvel. Cláusula contratual prevendo a
correção monetária do preço ajustado e incidência de juros de 1% (um por cento)
ao mês. Ilegalidade da cobrança dos
juros por falta de fundamentação fático-jurídica, não estando configurado se
tem caráter moratório, compensatório ou de capitalização.
2. A abusividade da cumulação de encargos somente existe quando
tais encargos exerçam a mesma finalidade na relação contratual, representando
verdadeira dupla cobrança ou bis in idem. RECURSO DE
APELAÇÃO CÍVEL PROCEDENTE.” (grifamos)

Assim, com relação à
correção monetária para a atualização da moeda, esta só poderá ser corretamente
calculada mediante aplicação de índices oficiais que efetivamente reflitam a
inflação, sendo esta norma de ordem pública que não pode ser violada pela
eleição de outros indexadores a arbítrio das instituições financeiras, através
de cláusula contratual.

Reitera-se a vantagem
excessiva em face da hipossuficiência dos consumidores. O acúmulo de juros
incidentes sobre o contrato fere o Art. 39, incisos IV e V, do Código de Defesa
do Consumidor.

Amparada pelos princípios
constitucionais da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana, aliado
ao Código supramencionado, revela-se a ilegalidade dos índices aplicados por
algumas instituições financeiras nos contratos de adesão.

8 CONCLUSÕES

Como se viu num primeiro momento deste trabalho o combate
a usura sempre foi reconhecer que o lucro exagerado do capital impedia e impede
o desenvolvimento dos setores econômicos. Assim o intervencionismo estatal pode
regulamentar a prática de juros sob a égide da Lei de Usura.

A Lei da Reforma Bancária limitava as taxas de
juros sempre que necessárias em operações e serviços bancários ou financeiros,
encerrando o limite previsto pela Lei de Usura.

O TSF editou a súmula 596 e sepultou as disposições
contidas na referida Lei, o que gerou, entretanto, uma celeuma jurídica entre
os doutrinadores. Diante do desequilíbrio nas relações contratuais e à luz do
Código de Defesa do Consumidor, houve, então, a possibilidade de revisão e sua
aplicabilidade nos contratos sob a idéia de cláusulas
abusivas no momento de sua formação.

Mesmo assim, em muitos casos, as instituições
financeiras acabam por violar o princípio da boa-fé objetiva que é o fundamento
jurídico do direito à informação plena, inclusive sobre o preço que é pago pelo
produto ou serviço que se adquire.

As cláusulas abusivas são as principais
responsáveis pelo desequilíbrio entre as partes e tem-se que o contrato deve
ser revisto de forma que não seja aplicada a cobrança de juros excessivos e
valores extorsivos, em observância aos princípios da transparência, equidade e
boa-fé contratual.

Há de se ressaltar que, embora não há mais
limitação de juros em 12% contido
no artigo 192, § 3º da CF, a jurisprudência pátria vem considerando a
utilização da taxa média de mercado, emitida pelo Bacen,
como ponto de equilíbrio nas relações contratuais.

Num outro momento questiona-se a aplicabilidade da
Tabela Price em contratos financeiros, tema este que
também tem gerado muitas discussões uma vez que o sistema francês de
amortização engloba juros compostos por natureza e, portanto pode ser
considerada ilegal em determinados casos e ter afastada sua aplicabilidade.

 

Referências

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Notas:


[1]
As disposições do Decreto nº 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos
outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou
privadas que integram o sistema financeiro nacional.

[2] Decreto nº 22.626/1933, também
conhecida como Lei da Usura, foi editada pelo Governo Provisório de Getúlio
Vargas.

[3] A regra da Lei nº 4595/1964 pode ser
questionada também perante a Constituição Federal, com base nas considerações
traçadas quando se abordou o poder normativo do Conselho Monetário Nacional.

[4] Simpósio sobre as Condições Gerais
dos Contratos Bancários e a Ordem Pública e Econômica. Curitiba 1998 –
Competência Normativa do Conselho Monetário Nacional.

[5] Art. 170 – A ordem econômica, fundada
na valorização do trabalho e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos
existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os
seguintes princípios: (…) IV – livre concorrência; V – defesa do consumidor.

[6] Art. 157 – Ocorre a lesão quando uma
pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação
manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta. Parágrafo 1º –
Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo
em que foi celebrado o negócio jurídico. Parágrafo 2º – Não se decretará a
anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte
favorecida concordar com a redução do proveito.

[7]  Art.
4º, inc. III. harmonização dos interesses dos participantes das relações de
consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de
desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos
quais se funda a ordem econômica (art. 170 da CF/88), sempre com base na boa-fé
e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores.

[8] “O princípio da força obrigatória,
denominado classicamente pacta sunt servanda, consubstancia-se na regra de que o contrato é
lei entre as partes. Celebrado que seja, com a observância de todos os
pressupostos e requisitos necessários à sua validade, deve ser executado pelas
partes como se suas cláusulas fossem preceitos legais imperativos” (Orlando
Gomes 2002, p.36)


Informações Sobre o Autor

Edilson Panicki

Advogado inscrito na OAB/PR sob o nº 49.692. Especialista em Processo Civil pelo Instituto de Direito Constitucional e Cidadania


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