O dano em ricochete e a legitimidade ativa nas ações de reparação de danos morais

Resumo: O presente artigo discorre sobre o dano moral em ricochete ou dano reflexo, gerado em consequência de uma lesão causada a uma terceira pessoa, com a qual o indiretamente ofendido mantinha vínculo pessoal. Seu objetivo é analisar o instituto da responsabilidade civil por dano em ricochete, verificar a indenizabilidade deste tipo de dano e discutir sobre a legitimidade para a propositura de ações que visem a sua reparação. Foi feita uma breve análise acerca do conceito de dano e sua distinção em relação ao conceito de prejuízo, levando em consideração os requisitos do dano indenizável. Além disso, foi apresentado o conceito de dano em ricochete, diferenciando-o do chamado dano futuro, e relatadas as possíveis vítimas do referido dano, considerando as discussões doutrinárias a respeito do reconhecimento da legitimidade ativa para a reparação. Concluiu-se que o reconhecimento da legitimidade ativa nas ações de indenização por dano moral em ricochete independe da comprovação de dependência econômica em relação à vítima ou de parentesco. Deve, pois, a verificação das pessoas afetadas pela ofensa ser analisada em cada caso concreto, segundo o critério da razoabilidade, cabendo ao julgador ponderar, com zelo, as circunstâncias e consequências apresentadas pelo requerente.

Palavras-chave: Responsabilidade civil. Dano moral. Requisitos do dano. Dano em richochete. Legitimidade ativa. Superior Tribunal de Justiça.

Sumário: 1. Introdução. 2. Dano. 3. Dano em ricochete. 4. Entendimento jurisprudencial sobre o tema. 5. Conclusão. 6. Referências bibliográficas.

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1. Introdução

Em matéria de responsabilidade civil, em regra, a legitimidade ativa, para perquirir a reparação do dano, pertence à vítima e a legitimidade passiva, para responder pela reparação, pertence ao agressor, ou seja, ao causador do dano. Ocorre que não só a vítima poderá ser lesada com a prática do ato ilícito, mas também terceiros, que, ao comprovar o nexo de causalidade entre a conduta do ofensor e o dano por ele sofrido, terão o direito a pleitear a reparação dos prejuízos. Temos que a ofensa pode ir além da esfera do próprio ofendido, sendo caracterizado um dano indireto, reflexo ou em ricochete. Embora, o dano direto almeje pessoalmente o caráter da vítima, no reflexo, não considera diretamente o ilícito perpetrado, mas a decorrência do mesmo, visto que uma lesão direta a uma pessoa pode atingir outra, de forma que se sinta ofendida tal qual a própria vítima.

Nesse sentido, o dano em ricochete é o dano que, gerado a partir de acontecimento envolvendo determinada pessoa, possui a capacidade de causar sofrimento a outras que não foram diretamente atingidas, mas que dependem da primeira. Compreende-se, dessa forma, que não apenas a vítima direta pode fazer jus à reparação cabível em caso de ato ilícito, mas também outras pessoas que, indiretamente, ou seja, por ricochete, tenham sofrido os seus efeitos. Significa constatar que um ato danoso pode repercutir de diversas maneiras na vida das pessoas, gerando uma multiplicidade de consequências que podem, muitas vezes, ir além da esfera do indivíduo diretamente atingido, havendo violação do patrimônio moral e material de terceiros. Sérgio Cavalieri Filho identifica a vítima do dano em ricochete como sendo “titular de relação jurídica que é afetada pelo dano não na sua substância, mas na sua consistência prática” [1].

A jurisprudência vem reconhecendo, dentro de determinados limites, a possibilidade de indenização do dano reflexo, conferida às pessoas que tem um vínculo pessoal com o diretamente lesado. Entretanto, devem os tribunais ter o cuidado de não ampliar demasiadamente a possibilidade de se requerer a indenização por tal dano.

Frente a tais definições, impõe-se necessidade de se discutir as pessoas que poderão ser beneficiadas pela indenização por dano em ricochete, dentro do círculo social do indivíduo diretamente lesado. Há que se ter em vista que não há qualquer imperativo que se proponha a restringir o legítimo possuidor do direito a intentar ação reparadora. Desse modo, todo aquele que se sinta prejudicado na sua esfera íntima tem esta faculdade, restando ao magistrado determinar o grau de sentimentalismo de cada caso e sua pertinência.

Portanto, cabe ao magistrado ter o cuidado de não ampliar demasiadamente a possibilidade do ajuizamento de ações de indenização baseadas no explicitado dano. E, diante disso, busca-se debater a possibilidade de demais pessoas ligadas diretamente ao ofendido de requerer uma reparação pelo dano reflexo que tenham sofrido, não somente os parentes próximos, na medida em que tal direito, por sua natureza abrangente, tem subsidiariamente refletido nos demais ao redor do lesado.

2. DANO

2.1. CONCEITO DE DANO

Para iniciar a referida discussão, é importante fazer breves considerações acerca do conceito de dano.

No atual Código Civil, a responsabilidade civil está prevista no art. 927, segundo o qual “aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.

Pelo referido dispositivo, estabelece-se que a conduta antijurídica, praticada por uma pessoa, tem como consequência a obrigação de sujeitar o ofensor a reparar o mal causado.

O primeiro fundamento do dever de reparação reside no erro de conduta por parte do agente, ou seja, na conduta do agente contrária aos ditames normativos. Na lição de Caio Mário:

“Se o agente procede em termos contrários ao direito, desfere o primeiro impulso, no rumo do estabelecimento do dever de reparar, que poderá ser excepcionalmente ilidido, mas que em princípio constitui o primeiro momento da satisfação de perdas e interesses.”[2]

Registra-se o dano como elemento essencial da responsabilidade civil. Desse modo, existe uma obrigação de reparar o dano causado, imposta àquele que “por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral” [3] e, igualmente, ao “titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, ou pela boa-fé ou pelos bons costumes” [4].

E, como terceiro fundamento da responsabilidade civil, deve existir uma relação de causalidade entre a conduta antijurídica praticada e o dano causado. Indispensável, portanto, que o dano sofrido tenha ocorrido em função do erro de conduta do agente. É o chamado nexo de causalidade.

O dano se mostra o requisito elementar da responsabilidade civil que comporta menos discussões doutrinárias. A responsabilidade civil somente se caracteriza, obrigando o infrator à reparação, no caso de seu comportamento antijurídico gerar uma lesão a outrem.Com efeito, é pacificado o entendimento de que não pode haver responsabilidade sem a existência de um dano. Isso porque, sendo a obrigação de ressarcir, uma consequência da responsabilidade, não pode esta se concretizar se não há nada a se reparar. Então, sem que se tenha ocorrido dano a alguém, não há que se cogitar em responsabilidade civil, ou seja, não há responsabilidade onde não exista dano.

Henri de Page, citado por Caio Mário[5], conceitua o dano como um prejuízo resultante de uma lesão a um direito. Há a necessidade de uma relação entre o prejuízo e a lesão a um direito alheio, para compor-se a responsabilidade civil.

O dano é também caracterizado como a perda, o prejuízo sofrido em consequência do comportamento de outra pessoa, conforme salienta Pontes de Miranda:

“Quem danificou há de indenizar. Dano é a perda, dano é o prejuízo sofrido. A expressão “perdas e danos” torna explícito que há o dano total e os danos que não excluem o bem. Não só as coisas podem sofrer danos. Há danos ao corpo e à psique. Nas relações da vida, o ser humano há de indenizar o dano que causa. O ser humano que sofreu o dano há de ser protegido pelo direito material no sentido de ter direito, pretensão e ação contra o ofensor.”[6]

Aguiar Dias, em sua obra, afirma que dano é o resultado da lesão e, por isso, uma conceituação de dano mais acertada deve considera-lo em duas acepções. A acepção vulgar é a de dano como prejuízo que determinada pessoa sofre em sua alma, seu corpo e seus bens, sem se indagar quem seja o autor da lesão de que resulta. A acepção jurídica, por sua vez, é a de dano como prejuízo sofrido pelo sujeito de direitos em consequência da violação destes por fato alheio, sendo, portanto, determinada por sua condição de pena ou de dever de indenizar. Nessa perspectiva, a lesão que o indivíduo cause a si mesmo produz dano, em sentido vulgar. Contudo, tal dano não interessa ao direito, por não haver violação de direito alheio[7].

Existe uma grande crítica na doutrina quanto à conceituação de dano apenas como diminuição do patrimônio, sendo este patrimônio entendido como o conjunto dos direitos de valor econômico. Isso porque o citado conceito de dano não englobaria a ressarcibilidade do dano não patrimonial ou moral.

Agostinho Alvim, em sua obra, apresenta o conceito de dano em dois sentidos:

“(…) em sentido amplo, vem a ser a lesão a qualquer bem jurídico, e aí se inclui o dano moral. Mas em sentido estrito, dano é, para nós, a lesão do patrimônio; e patrimônio é o conjunto das relações jurídicas de uma pessoa, apreciáveis em dinheiro, Aprecia-se o dano tendo em vista a diminuição sofrida no patrimônio.”[8]

Para Caio Mário, no mesmo entendimento, a determinação da existência do dano, como requisito essencial da responsabilidade civil, pressupõe uma ofensa a um “bem jurídico”, sendo certo que:

“(…) nesta referência se contém toda lesão à integridade física ou moral da pessoa; as coisas corpóreas ou incorpóreas que são objeto de relações jurídicas; o direito de propriedade como os direitos de crédito; a própria vida como a honorabilidade e o bom conceito de que alguém desfruta na sociedade.”[9]

O conceito de dano como toda ofensa a um bem jurídico, não o restringe à patrimonialidade do prejuízo.Considerando que toda lesão a qualquer direito tem como consequência a obrigação de indenizar, admite-se a ressarcibilidade tanto do dano material como do dano moral.

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Nesse sentido, o dano se apresenta como toda lesão a um bem juridicamente protegido, capaz de gerar prejuízo de ordem patrimonial ou extrapatrimonial.

Com isso, torna-se possível a diferenciação entre o dano patrimonial e o dano moral, sendo admissível a reparação de ambos. O dano patrimonial pressupõe sempre ofensa ou não incremento de certos valores econômicos, lesão ao próprio patrimônio. O dano moral, por sua vez, conforme conceito dado por Minozzi, citado por Aguiar Dias [10],“não é o dinheiro nem coisa comercialmente reduzida a dinheiro, mas a dor, o espanto, a emoção, a vergonha, a injúria física ou moral, em geral uma dolorosa sensação experimentada pela pessoa, atribuída à palavra dor o mais largo significado”.

2.2. Distinção entre Dano e Prejuízo

O conceito de dano, por diversas vezes, é apresentado como sinônimo de prejuízo, contudo, a distinção entre os dois termos é de grande importância para a análise do instituto jurídico da responsabilidade civil.

Dano significa, genericamente, todo o mal ou ofensa que uma pessoa tenha causado a outrem. Trata-se de elemento essencialmente fático que consiste na diminuição de valores ou na privação de uma vantagem. Já o prejuízo se apresenta como a consequência do dano. É ele analisado após a ocorrência dos danos, enquanto perda material,sofrimento moral ou diminuição da capacidade física. Em suma, prejuízos são as consequências dos fatos.

Juridicamente, a expressão dano é tomada no sentido do efeito que produz: é o prejuízo causado em virtude de ato de outrem que possa acarretar alguma perda, patrimonial ou não, ou seja, é lesão a qualquer bem jurídico.

É nesse sentido que Pontes de Miranda afirma que “tem-se de considerar o prejuízo que o ofendido sofreu, ou sofreu e ainda vai sofrer (…)”[11]. Do mesmo modo, assevera Aguiar Dias que “em matéria extracontratual, não se levanta nenhuma dúvida sobre a necessidade do prejuízo”[12]. E certifica, ainda, Agostinho Alvim que “é dano todo o prejuízo que o sujeito de direitos sofre através da violação dos seus bens jurídicos” [13].

Desse modo, o dano, para constar como elemento da responsabilidade civil, deve gerar um prejuízo, pois, caso este não se vislumbre, não há o que ser ressarcido.O prejuízo, portanto, apresenta-se como um pressuposto do dano indenizável.

2.3. Requisitos do Dano

O dano, além de decorrer de violação de um bem juridicamente tutelado, que pode ser patrimonial ou extrapatrimonial, deve apresentar outras características, enquanto elemento da responsabilidade civil, para que possa gerar o dever de indenizar.

Nem todo dano é ressarcível. Diz Atilio Anibal Alterini, citado por Caio Mário [14], que “somente o é aquele que preencher certos requisitos: certeza, atualidade e subsistência”.

É assente na doutrina que, enquanto elemento da responsabilidade civil, o dano deve ser atual e certo. Considera-se atual o dano que existe ou já existiu, no momento da interposição da ação de reparação. Certo, por sua vez, é um dano sobre um fato preciso e não sobre hipótese, é um dano não eventual.

Apesar de se ter como requisito a atualidade do dano, a reparação de um dano futuro não encontra objeção doutrinária. Admite-se a ressarcibilidade de um prejuízo ainda não concretizado, se for previsível sua realização em decorrência da certeza do desenvolvimento de um fato atual, em evolução.

O requisito da atualidade, portanto, não requer que o prejuízo esteja totalmente concretizado. O que tal requisito exige é a certeza da produção de um prejuízo, ainda que as consequências sejam futuras, ou a certeza de que tal prejuízo possa ser avaliado quando do ajuizamento de uma ação de reparação. Por essa razão, o dano futuro não pode ser descrito como necessariamente eventual.

Nesse sentido, o referido requisito não deve ser visto como absoluto, pois aceita é a indenização pelos danos futuros, até mesmo pela legislação, que resguarda, no caso das perdas e danos, não apenas os danos emergentes, como também os lucros cessantes. E, com isso, os danos reparáveis passam a ser não apenas os atuais, mas também os futuros.

No que se refere ao requisito da certeza, a certeza do dano não se confunde com o elemento quantitativo, que pode ser incerto. A certeza do dano se refere a sua existência, que deve ser evidenciada.

Afirma-se na doutrina que não existe o dever de indenizar um prejuízo meramente eventual. A apreciação do dano e consequente condenação à reparação pressupõe uma lesão concreta, conforme lição de Aguiar Dias:

“O prejuízo deve ser certo, é regra essencial da reparação. Com isto se estabelece que o dano hipotético não justifica a reparação. Em regra, os efeitos do ato danoso incidem no patrimônio atual, cuja diminuição ele acarreta.”[15]

No mesmo sentido, manifesta-se Caio Mário ao dizer que “a apuração da certeza vem ligada à atualidade. O que se exclui de reparação é o dano meramente hipotético, eventual ou conjuntural, isto é, aquele que não pode vir a concretizar-se”[16].

Neste requisito há, também, afirmações doutrinárias no sentido de que se encontra uma relativização, para que seja aceita a perda de uma chance como um dano reparável. Referida situação ocorre quando uma parte priva a outra de realizar um ganho ou evitar uma perda. Neste caso, a incerteza não impede a reparação do dano, considerando-se a probabilidade do ganho ter sido efetivado se não houvesse ocorrido a privação da concretização por parte de uma pessoa. Se o balanço das probabilidades for feito com base na oportunidade perdida no caso concreto, não se baseará em uma mera hipótese, mas sim em dados suficientes de que o dano decorria efetivamente do comportamento atribuído ao agente.

Se a ação se der com base em um dano hipotético, portanto, não será reconhecido o direito à reparação. Contudo, o ressarcimento será admitido face à ocorrência da perda de uma chance, comprovando-se a certeza de um dano.

Esclarece Judith Martins-Costa que a indenização:

“(…) não pode abranger senão as perdas efetivas e os lucros que o credor deixou de realizar como consequência direta e imediata da inexecução. Resta, assim, afastada da indenização o damnum remotum bem como o dano meramente hipotético ou incerto.”[17]

Junto aos elementos da certeza e atualidade, encontra-se, ainda, o requisito da subsistência do dano. Isso significa que o dano não será ressarcido novamente se este já foi reparado pelo ofensor. Com efeito, o dano deve subsistir no momento da exigibilidade em juízo e, se já foi reparado, perde-se o interesse da responsabilidade civil.

3. DANO EM RICOCHETE

3.1.Conceito de Dano em Ricochete

Em regra, o dano que deve ser indenizado é o dano imediatamente sofrido,e não o dano que, indiretamente, atingiu a terceiros. Nessa perspectiva, a indenização deve ser revertida em favor dequem experimentou imediata e pessoalmente as consequências do evento danoso.

Entretanto, conforme explicitado nas linhas introdutórias, em alguns casos, merece atenção o fato de que não somente o ofendido diretamente sofre uma lesão, mas outras pessoas a este ligadas são igualmente atingidas, tornando-se, portanto, vítimas indiretas do ato lesivo. Diante de tal fato, há que se destacar a existência do dano reflexo ou em ricochete.

Tem-se, portanto, que a ofensa pode ir além da esfera da pessoa lesada. O evento danoso é único, porém o dano que ele causa repercute na esfera de vida de uma gama de pessoas eventualmente envolvidas ou ligadas àquela vítima. Assim, embora o dano direto almeje pessoalmente o caráter da vítima, no dano em ricochete, não se considera diretamente o ilícito perpetrado, mas a decorrência do mesmo, visto que uma lesão direta a uma pessoa pode atingir outra, de modo que se sinta ofendida tal qual a própria vítima. Uma pessoa sofre o reflexo de um dano causado à outra pessoa. O dano em ricochete, portanto, mostra-se como a consequência de um prejuízo direto que lesa uma primeira pessoa, mas atinge, igualmente, uma segunda pessoa, que da primeira depende.

Na lição de Philippe Malaurie e Laurent Aynès, citada por Caio Mário:

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“(…) no dano em ricochete há duas vítimas e duas ações, posto que fundadas em um só fato danoso. Não será estranhável que, independentemente da natureza material deste, possa o dano reflexo ser um dano moral ou um dano pecuniário, uma vez que o prejuízo da vítima reflexa pode ser de uma e de outra espécie.”[18]

Com efeito, cabe ao indiretamente lesado requerer, por meio de ação própria, a reparação do dano em ricochete por ele sofrido. Nesse sentido, assegura Aguiar Dias que “a indenização, ainda quando por morte de outrem, é reclamada jure próprio. Constitui reparação do prejuízo irrogado ao titular” [19].

Pode-se afirmar que aqueles que dependem da vítima diretamente lesada sofrem um “duplo dano: extrapatrimonial e direto, pelo ‘prejuízo de afeição’ e patrimonial, este indireto, pois não poderão mais contar com quem os sustentava”[20]. Isso porque o dano é sofrido pelo próprio parente ou pessoa relacionada com a vítima direta da ofensa,em razão do dano por esta sofrido.

Assim, em caso de morte do diretamente ofendido, tem o herdeiro direito a duas ações contra o responsável pelo dano. “Uma como sucessor do ofendido, para haver do responsável todos os créditos que o defunto tinha ou dispunha por ocasião da sua morte e que, com a morte, foram transmitidos aos seus herdeiros. Outra, para o ressarcimento de todo o prejuízo que pessoalmente sofreu com a morte, quer material ou simplesmente moral”. [21]

Pondera Caio Mário que:

“Em linhas gerais, pode-se concluir que é reparável o dano reflexo ou em ricochete, dês que seja certa a repercussão do dano principal, por atingir a pessoa que lhe sofra a repercussão, e esta seja devidamente comprovada.” [22]

Desse modo, tendo a pessoa sofrido dano reflexo, em consequência de lesão direta causada a outra pessoa, existindo a certeza do prejuízo, há que se falar em reparação de dano em ricochete, pois presente está o requisito do dano como elementar da responsabilidade civil.

3.2. Diferença entre Dano em Ricochete e Dano Futuro

Para uma melhor compreensão do tema, necessária se faz a distinção entre os conceitos de dano em ricochete e dano futuro.

Para alguns doutrinadores, o dano futuro é um dano ainda não apurado, mas cuja probabilidade de aparecer é previsível. O desenvolvimento do conceito de certeza, dessa forma, torna-se mais elástico, tendo em vista que o exame de cada caso permite determinar que a certeza do prejuízo não pode deixar de atentar a um critério de probabilidade, analisando-se quando o dano vai se efetivar e qual o nível do prejuízo.

Caio Mário, nessa linha de entendimento, apresenta o chamado “dano atômico” como um exemplo de dano futuro, afirmando que:

“Ocorre atentar para o dano provindo de intoxicação devida a isótomos radioativos, cuja ação somente é detectada com o correr do tempo. Vem, aí, correlata a preocupação com o dano futuro (…). Sabe-se que a irradiação, qualquer que seja a causa, pode provocar danos diretos, como gerar moléstias graves, cuja ação não será imediata.”[23]

Para outros doutrinadores, o dano futuro se apresenta como sinônimo de lucro cessante. Nesse sentido, o dano patrimonial dividir-se-ia em dano emergente e lucro cessante, sendo o primeiro um dano atual e o segundo um dano futuro. Assim, dano futuro é a perda do ganho esperável, ou seja, a frustração da expectativa de lucro. Corrobora deste entendimento Sergio Cavalieri Filho ao definir que o lucro cessante consiste no “reflexo futuro do ato ilícito sobre o patrimônio da vítima” [24]. Afirma, também, nesta perspectiva, Judith Martins-Costaque a certeza do dano significa dizer que não pode ser uma mera hipótese, mas que, porém, pode haver um prejuízo futuro que seja certo, e não meramente hipótese[25].

Apesar da diferenciação, em ambos os entendimentos, é suscetível de ressarcimento o dano futuro desde que se possa demonstrar, no momento da decisão, que ele tem existência real.

Durante algum tempo, com base na súmula 491 do STF [26], entendeu-se que a indenização decorrente da morte de filho menor tinha o caráter de ressarcimento de dano patrimonial. Dessa maneira:

“Identificava-se, no caso, uma forma de lucros cessantes, de dano potencial, futuro e eventual, na consideração de que, nas famílias mais pobres, o filho menor representa um potencial econômico expressivo na medida em que, logo cedo, é convocado em razão das necessidades domésticas para o desempenho da atividade laborativa e contribuição para as despesas do lar, divisando-se essa possibilidade ainda que o filho menor fosse de tenra idade; e excluindo-se até mesmo a aplicação da referida Súmula naquelas hipóteses excepcionais em que, tratando-se de morte de filho pertencente a família abastada, não seria de presumir-se que o mesmo viesse a contribuir, com a prestação de serviços, para o sustento da casa.” [27]

O dano em ricochete, portanto, era considerado um dano futuro. Contudo, tal entendimento não prevalece mais, pois o dano em ricochete possui uma caracterização própria, conforme exposto nas linhas acima. Daí, pode-se perceber a diferenciação entre essas duas modalidades de dano. O dano em ricochete pode ser vislumbrado tanto no âmbito dos danos patrimoniais, quanto no âmbito dos danos morais, enquanto o dano futuro ocorre somente em relação aos danos patrimoniais.

3.3. Possíveis Vítimas do Dano em Ricochete

Diversas discussões são travadas a respeito de quem pode ser considerado vítima de dano em ricochete. Nesse sentido, discute-se a respeito do possível titular do direito à reparação, em caso de ocorrência do dano reflexo.

Primeiramente, são considerados vítimas do dano em ricochete os parentes mais próximos da pessoa diretamente lesada, ou seja, os herdeiros, ascendentes, descendentes e o cônjuge. No que tange à família, é presumido o prejuízo pelo fato puro e simples da morte do parente, não havendo necessidade de demonstração do dano. Nenhuma dificuldade ocorre, portanto, quanto a esta hipótese.

Nesse sentido, manifesta-se Mário Moacyr Porto, citado por Yussef Said Cahali, afirmando que “dúvida alguma existe quanto à possibilidade da ação quando o herdeiro pleiteia em seu próprio nome, isto é, pleiteia o ressarcimento do dano de natureza afetiva que pessoalmente sofreu com a morte” [28].

A presunção em relação à família prevalece inclusive quando não há dependência econômica comprovada, já que a perda de um parente gera dor, angústia e sofrimento, ou seja, dano moral que independe da dependência econômica. Por esse motivo, assegura Aguiar Dias que “a vida humana representa em si mesma um bem, cuja consideração não pode estar sujeita ao fato de possibilitar, ou não, alimentos àquele que sofreu por vê-la desaparecer” [29].

Não fazendo parte do círculo familiar, contudo, não é presumido o dano sofrido, cabendo à suposta vítima provar que este realmente se verificou, conforme inteligência de Sergio Cavalieri Filho:

“Só em favor do cônjuge, companheira, filhos, pais e irmãos menores há uma presunção juris tantum de dano moral por lesões sofridas pela vítima ou em razão de sua morte. Além dessas pessoas, todas as outras, parentes ou não, terão que provar o dano moral sofrido em virtude de fatos ocorridos com terceiros.”[30]

Dessa forma, é acertado o entendimento de Mazeaud et Mazeaud, citado por Aguiar Dias:

“Tem direito de pedir reparação toda pessoa que demonstre um prejuízo e a sua injustiça. O quadro dos sujeitos ativos da reparação deve atender a esse princípio, de ampla significação. Assim sendo, quer se trate de dano moral ou de dano material, não se pode cogitar de restringir a ação de indenização a privilégio do parentesco”.[31]

O pedido de reparação, portanto, pode ser formulado por parentes ou pessoas que mantenham fortes vínculos afetivos com a vítima. Assim, pelo entendimento doutrinário, podem figurar como titulares da indenização tanto os pais, mesmo que o filho morto não exercesse atividades laborativas, como os irmãos, quando demonstrado o dano, em decorrência de anterior vida em comum, e até mesmo, em determinados casos, amigos fortemente ligados à vítima direta, que comprovem a dor e o sofrimento oriundos do dano.

A ação de reparação caberiaa todos os lesados, ou seja, todas as pessoas comprovadamente prejudicadas pelo ato danoso.Não há qualquer determinação, que restrinja o legítimo possuidor de intentar a ação de reparação. Todo aquele que se sinta ofendido na sua esfera íntima tem esta faculdade, restando ao magistrado o dever de determinar o grau de sentimentalismo de cada caso e sua pertinência, conforme destacado nas linhas introdutórias.

Entretanto, tal fato não pode ser usado como fundamento para que qualquer pessoa se apresente como prejudicada.A dificuldade está em colocar um limite para o dano reflexo.

O ofensor tem o dever de reparar os danos que causou, verificados pelo nexo de causalidade. Desse modo, somente o dano reflexo certo e que tenha sido consequência do ato ilícito praticado pode ser reparado, excluindo-se o dano que se mostra como consequência remota. É nesse sentido a lição de Sérgio Cavalieri Filho:

“Entendo que a solução deva ser buscada, uma vez mais, no nexo de causalidade. O ofensor deve reparar todo o dano que causou, segundo a relação de causalidade. O que importa é saber se o dano decorreu efetivamente da conduta do agente, já que, como vimos, em sede de responsabilidade civil predomina a teoria da causa adequada, ou da causa direta e imediata, consoante art. 403 do Código Civil.” [32]

Existe, portanto, um limite a essa pretensão, que é verificado, nos casos concretos, pelas reais consequências provenientes do ato ilícito causador do dano, capazes de influenciar uma terceira pessoa.Assim, a legitimidade indireta se dá independentemente de qualquer vínculo de parentesco, podendo ser pleiteada por pessoas que, pelo exame da situação fática, seja crível a existência de real sofrimento e dor, em face do dano direto causado.

4. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL SOBRE O TEMA

Tem entendido a jurisprudência, inclusive o Superior Tribunal de Justiça, que o sofrimento, a dor e o trauma provocados pela morte de um ente querido podem gerar o dever de indenizar, quando o pedido é formulado por parentes ou pessoas que mantenham fortes vínculos afetivos com a vítima. Recentes decisões do STJ têm contribuído para firmar jurisprudência a respeito do tema.

Inicialmente, entendia-se que a indenização por dano em ricochete, só era devida se o indiretamente ofendido dependesse economicamente da vítima direta da lesão. Não se admitia a compensação econômica pela dor que a morte causou aos familiares, considerada uma noção subjetiva que impedia a perquirição da real existência do dano, o que tornava impossível a avaliação, em pecúnia, da sua extensão. Nessa linha de pensamento, afirmava Pontes de Miranda que “a regra jurídica que se há de redigir, no sistema jurídico brasileiro é a seguinte: todo dano, que o terceiro sofra porque houve ofensa física ou psíquica a B, há de ser ressarcido pelo ofensor se o ofendido já lhe devia alimentos e não pode solver porque sofreu a ofensa”[33].

Entretanto, passou-se a entende que é possível a reparação moral por morte de parente próximo independentemente de prova de dependência econômica. A indenização por dano moral tem natureza extrapatrimonial e origem, em caso de morte, na dor, no sofrimento e no trauma dos familiares próximos das vítimas. Dispensável, assim, a verificação de que os autores do pedido de reparação dependessem economicamente da vítima.

Adotando esse entendimento, já havia se manifestado Aguiar Dias:

“Achamos que a referência a alimentos não tem, em nosso sistema de reparações, a influência fundamental que sempre se lhe tem atribuído. Deve ser tida como simples indicação subsidiária, para apontar os benefícios da indenização ou para coibir abuso na liquidação, o que, como já dissemos, não implica em negar a possibilidade da reparação do dano moral. Nesse ponto, é de notar que o Decreto Legislativo nº. 2.681, de 1912, no art. 22, contempla como beneficiário da indenização aqueles a quem a vítima prestava alimentos, auxílio ou educação. Por aí se vê que não há critério rigorosamente alimentar na obrigação de indenizar por ato ilícito. “[34]

Ao julgar o REsp 160.125 em 1999, o ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira foi pioneiro no STJ a enfrentar a questão de danos morais reflexos e afastar a necessidade de dependência econômica entre a vítima e aquele que postula compensação pelo prejuízo experimentado. Em seu voto, destacou o ministro que:

“Irrelevante, portanto, se havia ou não, ou se haveria ou não futuramente, dependência econômica entre os irmãos. O que interessa, para a indenização por dano moral, é verificar se os postulantes da pretensão sofreram intimamente o acontecimento, dano que se presume quando se trata de familiar próximo (…). Assim não fosse, os pais também não poderiam pleitear a indenização por dano moral decorrente da morte de filho que não exercesse atividade remunerada, nem pessoa rica teria legitimidade; e assim por diante” (STJ, REsp 160.125/DF, Rel. Min. Salvio de Figueiredo Teixeira, 4ª T., ac. 23.03.1999, DJ 24.05.1999, p. 172).

Decisões diversas continuaram a ser prolatadas no mesmo sentido. No Resp 331.333/MG[35], julgado em fevereiro 2006, mãe e filhos ajuizaram ação de indenização por danos morais e materiais em face da morte da filha e mãe dos autores. No respectivo recurso, foi concedida a reparação por dano moral e material tanto aos filhos, quanto à mãe da vítima. Dispôs o ministro relator Humberto Gomes de Barros que “Nossa jurisprudência entende que é possível reparação moral por morte de parente próximo (ascendente, descendente e colateral em segundo grau) independentemente de prova de dependência econômica”.

Em decisões mais recentes, da mesma forma, manifestou-se o Superior Tribunal de Justiça, no AgRg no Ag 1.413.481/RJ, julgado em março de 2012, em face da alegação de ilegitimidade dos irmãos da vítima. Restou ementado que:

“Os irmãos possuem legitimidade ativa para pleitear indenização pela morte do outro irmão, de forma independente dos pais e demais familiares, pois quando se verifica que o terceiro sofre efetivamente com a lesão causada à vítima, nasce para ele um dano moral reflexo, 'par ricochet', que é específico e autônomo. Isto significa que todos aqueles que sofrem com a morte da vítima terão direito, separadamente, à indenização pelo dano moral a eles reflexamente causado” (STJ, AgRg no Ag 1413481/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª T., ac. 13.03.2012, DJe 19.03.2012).

Estando assente o entendimento de que a legitimidade, para a reparação de dano moral reflexo sofrido, independe de dependência econômica em relação ao diretamente ofendido, resta avaliar a amplitude do reconhecimento dessa legitimidade.Importante, pois, haver um cuidado dos tribunais em não ampliar demasiadamente a indenizabilidade deste tipo de dano.

A verificação das pessoas afetadas pela ofensa deve ser analisada em cada caso concreto, segundo o critério da razoabilidade. Cabe ao magistrado, portanto, sopesar em cada caso as circunstâncias apresentadas de modo a reconhecer ou não a legitimidade para a reparação de dano reflexo. No julgamento do REsp 1.210.778[36], foi reconhecida a legitimidade dos avós da vítima para a ação de reparação de danos, ocasião em que certificou o Ministro Castro Meira que “o sofrimento pela morte é disseminado pelo núcleo familiar, como em força centrífuga, atingindo cada membro particularmente, em gradações diversas, o que deve ser levado em conta pelo magistrado, para fins de reparação do dano moral”.

Com efeito, a legitimidade pode ser reconhecida a qualquer membro da família, desde que demonstradas as circunstâncias fáticas que confirmem a relação estreita de convivência. Foi o que ocorreu no julgamento do REsp 865.363, no qual foi admitida a legitimidade da sogra da vítima, juntamente com os filhos, para o ajuizamento da ação de reparação de danos. Isso porque, restou demonstrada no caso a relação de constância e proximidade existente entre a vítima e a autora, já que sogra e vítima viviam sob o mesmo teto e era ela quem cuidava dos netos.

Do mesmo modo, existem julgados também reconhecendo a legitimidade de sobrinhos para as ações de reparação de dano reflexo. Tal fato foi vislumbrado no REsp 239.009/RJ, tendo argumentado o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira que:

“O que se impõe, para o recebimento da indenização, é a demonstração de a parte veio a sofrer intimamente com o acontecimento, sendo certo, de outro lado, que se poderá provar que o convívio familiar entre os parentes não era de muita proximidade, cabendo ainda ao julgador sopesar todos os elementos dos autos para fins da quantificação indenizatória”. (STJ, REsp 239.009/RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª T., ac.13.06.2000, DJ 04.09.2000, p. 161)

5. CONCLUSÃO

É fato que, sendo certo, atual e subsistente, o dano é indenizável.  Vislumbra-se que, em alguns casos, não somente o ofendido diretamente sofre uma lesão, mas outras pessoas a este ligadas são igualmente atingidas. Com isso, a ofensa pode ir além da esfera da pessoa lesada, dando origem ao chamado dano em ricochete ou dano reflexo.

Percebe-se, com base em julgados recentes, que é reconhecida a reparação de tal dano, quando da propositura de ações. E mais, entende-se que a referida reparação independe de dependência econômica entre a vítima direta da ofensa e o requerente indiretamente lesado. Isso porque, a indenização por dano moral tem natureza extrapatrimonial e origem, em caso de morte, na dor, no sofrimento e no trauma dos familiares próximos das vítimas. Fato que dispensa a verificação de que os autores do pedido de reparação dependessem economicamente da vítima.

O reconhecimento da legitimidade para a propositura das referidas ações irá depender das situações fáticas apresentadas em cada caso. Em relação aos parentes mais próximos, como pais e filhos, o dano em consequência da morte se presume, não havendo necessidade de demonstração. Quanto aos parentes com vínculo não tão próximo, assim como às pessoas relacionadas à vítima, como avós, sobrinhos e até sogra, pode ser reconhecida a legitimidade, desde que comprovadas a real proximidade da vítima, bem como a dor e o sofrimento decorrentes da lesão gerada ao parente vitimado.

Com base nisso, a legitimidade pode ser conferida até mesmo a um amigo, que mantinha uma relação muito próxima e vínculo muito estreito com a vítima. Para isso, devem ser verificados, no caso concreto, fatos que levam à conclusão de que o dano causado ao amigo realmente se efetivou, em função da estreita convivência ora mantida entre o requerente e a vítima.

As decisões prolatadas, com o passar dos anos, passaram a reconhecer cada vez mais legitimados para as ações de reparação de danos em ricochete. Inicialmente, não se admitia a compensação de tal dano. Passou-se, em momento posterior, a se admitir a reparação, quando comprovada a dependência econômica do requerente em relação à vítima. Superado o requisito da dependência econômica, foram considerados legitimados pessoas com parentescos não tão próximos da vítima, como sobrinhos e até mesmo sogra.

Desse modo, percebe-se que a jurisprudência evolui no sentido de garantir cada vez mais a reparação dos danos sofridos intimamente pelas pessoas, em razão de lesão causada a ente com o qual mantinha uma relação de afeto. Isso porque, impossível ignorar que a morte ou lesão grave gere dor, sofrimento, angústia e trauma a um grupo grande de pessoas distinta e diretamente ligadas ao lesado. A indenização se apresenta, portanto, como forma de compensar a perda, diante da comprovação, no caso, do vínculo existente e das consequências sofridas.

Por fim, compartilho o entendimento acertadamente exposto pelo Ministro Ruy Rosado de Aguiar, no julgamento do REsp 239.009:

“(…) não vejo na dependência econômica, nem no parentesco, pressuposto para a indenização do dano moral estrito senso. Esse pressuposto está na existência da dor. Demonstrado tal fato, é suficiente para que se tenha pelo menos o ponto inicial para a responsabilização do causador do dano. Evidentemente que tudo há de ser visto dentro dos limites do razoável. Embora possam existir dores que comovam o mundo ou a nação, não se há de reconhecer legitimidade ativa para todos os sofredores. É razoável dizer também que o parentesco poderá, à falta de outros dados, indicar a maior proximidade entre as pessoas e daí a presunção de dor. Nos autos, isso se confirmará ou não. O parentesco, portanto, poderá ser um indicativo para a existência de sofrimento, na falta de outros elementos. Daí por que é possível imaginar-se que o pai sofra mais que o sobrinho ou o primo.”[37]

 

Referências
ALVIM, Agostinho. Da Inexecução das Obrigações e suas Consequências. São Paulo: Ed. Saraiva, 1972.
CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1998.
COSTA, Judith Martins. Comentários ao Novo Código Civil – Do Inadimplemento das Obrigações.Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2003.
DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1983.
FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 8ª ed. São Paulo: Ed. Atlas, 2008.
MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Volume 22. Rio de Janeiro: Ed. Borsoi, 1959.
MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Volume 26. Rio de Janeiro: Ed. Borsoi, 1959.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed: Forense, 1997.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume II. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2009.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume III. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2009
SILVA, Wilson Melo da. O Dano Moral e sua Reparação. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1969.
 
Notas
[1]FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 8ª ed. São Paulo: Ed. Atlas, 2007, p. 98.

[2] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume II, Teoria Geral das Obrigações. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2009, p. 319.

[3] Art. 186 do Código Civil de 2002.

[4] Art. 187 do Código Civil de 2002.

[5] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed: Forense, 1997, p. 38.

[6] MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Volume XXVI. Rio de Janeiro: Ed. Borsoi, 1959, p. 23.

[7] DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1983, p. 794.

[8] ALVIM, Agostinho. Da Inexecução das Obrigações e suas Consequências. São Paulo: Ed. Saraiva, 1972, p. 172.

[9] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed: Forense, 1997, p. 53.

[10] DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1983, p. 812.

[11] MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Volume XXII. Rio de Janeiro: Ed. Borsoi, 1971, p. 206.

[12] DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1983, p. 797.

[13] ALVIM, Agostinho. Da Inexecução das Obrigações e suas Consequências. São Paulo: Ed. Saraiva, 1972, p. 171.

[14] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed: Forense, 1997, p. 39.

[15] DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1983, p. 799.

[16] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed: Forense, 1997, p. 40.

[17]COSTA, Judith Martins. Comentários ao Novo Código Civil – Do Inadimplemento das Obrigações. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2003, p. 337.

[18] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed: Forense, 1997, p. 43.

[19] DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1983, p. 883.

[20]COSTA, Judith Martins. Comentários ao Novo Código Civil – Do Inadimplemento das Obrigações. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2003, p. 354.

[21] CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, p. 696.

[22] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed: Forense, 1997, p. 44.

[23] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed: Forense, 1997, p. 49.

[24] FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Ed. Atlas, 2007, p. 72.

[25]COSTA, Judith Martins. Comentários ao Novo Código Civil – Do Inadimplemento das Obrigações. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2003, p. 358.

[26] Súmula 491 do STJ: É indenizável o acidente que cause a morte de filho menor, ainda que não exerça trabalho remunerado.

[27] CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, p. 115.

[28] CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, p. 696.

[29] DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1983, p. 883.

[30] FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Ed. Atlas, 2007, p. 84.

[31] DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1983, p. 887.

[32] FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Ed. Atlas, 2007, p. 98.

[33] MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Volume XXVI. Rio de Janeiro: Ed. Borsoi, 1959, p. 39.

[34] DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1983, p. 849.

[35] STJ, REsp 331.333/MG, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 3ª T., ac. 14.02.2006, DJ 13.03.2006, p. 315

[36] STJ, REsp 1210778/SC, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 1ª T., ac.06.09.2011, DJe 15.09.2011.

[37] STJ, REsp 239.009/RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª T., ac.13.06.2000, DJ 04.09.2000, p. 161.


Informações Sobre o Autor

Marina do Nascimento Ferreira

Advogada. Assistente Jurídico no escritório Humberto Theodoro Júnior Sociedade de Advogados. Especialista em Direito Constitucional


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