O antitruste em tempos de crise e a aplicação da teoria da Failing Firm Defence

Autora: Marina Souza Leão Araujo[1]

Orientador: Edson Junio Dias de Sousa[2]

Resumo: O presente artigo pretende analisar as particularidades do antitruste em tempos de crise na sua parte de controle de estruturas, através do estudo da teoria americana da Failing Firm Defence (FFD). Tomando como marco teórico a constitucionalização do Direito Concorrencial, o trabalho busca compreender como a teoria pode ser uma ferramenta importante de reestruturação de empresas em dificuldades financeiras e como ela tem sido utilizada no Brasil pelo Conselho Administrativo de Defesa da Ordem Econômica (CADE). Para, ao final, considerar os possíveis desafios que a inédita crise econômica provocada pelo COVID-19 (coronavirus) pode apresentar à autoridade antitruste.

Palavras-chave: antitruste – crise econômica – teoria da failing firm defence – controle de estruturas – constitucionalização do Direito Concorrencial.

 

Abstract: This work intends to analyze the particularities of competition law during times of crisis in its aspect of merger control through the study of the american theory of the failing firm defence (FFD). Considering the constitutionalization of competition law as a theoretical framework, the article seeks to comprehend how the theory can be an important tool of restructuration of companies passing through financial difficulties and furthermore how it  has been applied by the Administrative Council of Economic Defense (CADE). Doing so, the present work will consider the possible challenges that the unprecedented economic crisis caused by COVID-19 (coronavirus) may present to the Antitrust Authority.

Keywords: antitrust – economic crisis – the failing firm defence theory – merger control – constitutionalization of competition law.

 

Sumário: Introdução. 1. Marco teórico: as finalidades do Direito Antitruste. 2. A teoria da failing firm defence (FFD); 2.1. Critérios de aplicação. 2.2. A Aplicação da FFD no Brasil. Conclusão. Referências.

 

Introdução

No dia 24 de outubro de 1929, na cidade de Nova York, os investidores aguardavam a abertura da bolsa de valores um tanto impacientes. Isso porque o Dow Jones Industrial Average[3] sofrera uma queda de 4,6% no dia anterior e a manchete principal do The Washington Post prenunciava a assustadora realidade que se aproximava: “Huge Selling Wave Creates Near-Panic as Stocks Collapse[4].

Esse foi considerado o primeiro dia do crash da bolsa de valores de Nova York, também conhecido como Black Thursday, marcado pelo lançamento, no mercado, de milhões de títulos que não encontraram compradores, o que acelerou a queda dos seus valores nos dias posteriores. A bolha do mercado financeiro finalmente estourara, dando o pontapé para o início da Grande Depressão, que trouxe consigo uma queda na produção, o aumento do desemprego e a aceleração da deflação (KOKKORIS; OLIVARES-CAMINAL, 2010, p. 82).

O dia, agora, é 15 de setembro de 2008 e os investidores observavam perplexos a falência de um dos bancos de investimentos mais tradicionais do Estados Unidos, o Lehman Brothers, marcando o início da maior crise financeira e da maior recessão econômica desde a Grande Depressão, o que levou a data a ficar conhecida como Black Monday.

A falência do Lehman Brothers desencadeou uma reação em cadeia que resultou no colapso do sistema financeiro, provocado pela inadimplência das hipotecas, conhecidas como subprime loan/mortgage. Mais uma vez, o mundo globalizado vivenciava uma crise econômica sem precedentes.

Atualmente, a crise econômica é prenunciada por pessoas usando máscaras hospitalares, preocupadas com a disponibilidade de leitos nos hospitais e com a distribuição de produtos essenciais durante a pandemia instaurada pelo COVID-19 (coronavirus). As manchetes dos principais jornais, tais quais a do The Washington Post em 1929, especulam sobre a chegada da próxima crise econômica, originada por um motivo inédito: o colapso do sistema de saúde pública.

Dado o atual nível de desenvolvimento e interdependência dos mercados globais[5] (os verdadeiros viabilizadores do sistema capitalista neoliberal), as previsões para o impacto econômico da crise de saúde instaurada pela pandemia são alarmantes e, mais uma vez, sem precedentes, remetendo ao que foi uma vez dito por Lawrence H. Summer de que “Global capital markets pose the same kinds of problems that jet planes do. They are faster, more comfortable, and they get you where you are going better. But the crashes are much more spectacular[6].

A conclusão, portanto, é a de que as crises econômicas são um fenômeno cíclico no sistema capitalista, caracterizado por um período de depressão, marcado pela estagnação dos negócios e pelo aumento do desemprego, seguido de um novo período de “prosperidade” e assim sucessivamente (AQUINO; JACQUES; DENIZE; OSCAR, 2009,  p. 392).

Dessa forma, tendo em conta o fato certo de que enquanto o sistema capitalista for o vigente, as crises econômicas ocorrerão de forma recorrente, alterando as necessidades e as dinâmicas dos mercados, é inevitável (e essencial) que o antitruste se dedique ao estudo dos temas relacionados a sua aplicação em tempos de crise, para que consiga mitigar e enfrentar as consequências desta com as ferramentas corretas.

A importância desse estudo torna-se ainda maior pelo fato de ser justamente durante os momentos de crises que a legislação concorrencial é pressionada para ser flexibilizada e, até, afastada, visto que há uma tendência maior de coordenação entre os players para, dentre outros motivos, estabilizar os preços e adequar a produção ao nível da demanda.

Essas questões assumem um protagonismo ainda maior no cenário atual, uma vez que, conforme alertado pela Professora Ana Frazão, muitas das formas de coordenação que normalmente não seriam aceitáveis passam a ser possíveis e necessárias para fazer frente às necessidades imediatas da pandemia, notadamente no que diz respeito à produção e distribuição de bens essenciais ou diretamente vinculados ao setor de saúde[7].

Nesse contexto, o presente trabalho pretende analisar as particularidades do antitruste em tempos de crise na sua parte de controle de estruturas através do estudo da teoria americana da Failing Firm Defence (FFD). Partindo da análise constitucional do Direito Concorrencial, o trabalho busca compreender como a teoria pode ser uma ferramenta importante de reestruturação de empresas em dificuldades financeiras e, dada a sua importância, como ela tem sido utilizada no Brasil pelo Conselho Administrativo de Defesa da Ordem Econômica (CADE).

 

  1. Marco Teórico: as finalidades do Direito Antitruste

Antes de mergulhar no estudo da FFD e de como ocorre a sua aplicação no Brasil, é preciso estabelecer os referenciais teóricos utilizados pelo trabalho no que diz respeito às finalidades do Direito Concorrencial, posto que é daí que emanam todos os demais questionamentos.

Para identificar tais finalidades, recorre-se ao texto constitucional, uma vez que ele é o responsável por estabelecer as premissas jurídicas para a defesa da ordem econômica através da repressão do abuso de poder econômico em seu art. 173, § 4º, nos casos em que este abuso “vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros”. A defesa da ordem econômica não se restringe, porém, à repressão do abuso de poder nos termos acima mencionados, uma vez que o art. 170 estabelece que “a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre-iniciativa, tem por fim assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social” e conforme os princípios da ordem econômica citados em seguida.

Para criar e defender o ambiente concorrencial e proteger os interesses da coletividade consubstanciados nos princípios constitucionais, a Lei nº 12.529/11 instrumentaliza as normas do Direito Antitruste no Brasil. O art. 1º do referido diploma legal, considerando os valores definidos na Constituição, prevê “a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica, orientada pelos ditames constitucionais de liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão ao abuso do poder econômico”. Adotar-se-á, portanto, o que alguns autores chamam de “constitucionalização do Direito Concorrencial”[8].

Esse posicionamento permite que a análise antitruste seja balizada tanto pelos princípios constitucionais quanto por critérios de análise econômica, como a eficiência, tornando a atuação da autoridade mais dinâmica e mais adaptável às necessidades reais de cada caso. Essas características ganham importância ainda maior em períodos de crise, quando a atuação da autoridade, além de dinâmica e rápida, deve levar em conta os princípios constitucionais (a exemplo da valorização do trabalho humano e da função social da empresa) como norteadoras de suas decisões a fim de garantir a justiça social.

Tais conclusões não poderiam ser realizadas caso o presente estudo adotasse visões estritamente consequencialistas, que buscam reduzir o escopo de atuação do Direito Antitruste. Por essa razão, não será adotada a visão puramente economicista consolidada pela Escola de Chicago, que utiliza a eficiência econômica como principal critério norteador para se alcançar o “bem-estar do consumidor”. Também não se adotará a visão puramente estruturalista desenvolvida pela Escolha de Harvard, consubstanciada no modelo/paradigma Estrutura-Conduta-Desempenho (ECD) e que associa a concentração empresarial à prática de atos anticompetitivos e a baixos desempenhos de mercado[9].

Dessa forma, as finalidades do Direito Antitruste serão consideradas, aqui, para além da miopia economicista e estruturalista, procurando harmonizar os princípios constitucionais regentes da Ordem Econômica com os critérios de análise econômica. É apenas com base nessas premissas que se pode compreender os fundamentos da teoria da FFD, os quais se justificam não apenas por motivos econômicos, como também por motivos sociais, sobretudo os relacionados à função social da empresa e do papel de relevância que ela assume em tempos de crise.

 

  1. A Teoria da Failing Firm Defence (FFD)

A atuação do Direito Concorrencial, na sua parte de controle de estruturas dos mercados, busca coibir atos de concentração econômica que possam provocar a formação de estruturas empresariais que restrinjam de forma indevida a livre concorrência[i]. Nas palavras de Kokkoris e Olivares-Caminal (2010, p. 105):

 

Merger control has a significant role in today’s economies, a fact which is underlined by the ever-increasing number of mergers that are completed. The purpose of the merger legislation is to capture mergers that may have anticompetitive effects on the market structure[10].

 

Se o aumento dos atos de concentração já é um fenômeno recorrente em um cenário de estabilidade econômica, ele tende a ser ainda maior em períodos de recessão econômica, posto que é durante estes períodos que um maior número de empresas passa a enfrentar dificuldades financeiras. Consequentemente, essas empresas podem optar por realizar operações de fusão/aquisição com competidores em melhores condições com o objetivo de assegurarem a sua viabilidade e lucratividade.

Essas operações podem se mostrar como verdadeiros processos de reestruturação[11] empresarial em tempos de crise, sobretudo quando o encerramento em grande escala de empresas pode provocar consequências não só econômicas, mas também socialmente graves, conforme alerta Fábio Ulhoa Coelho (2012, p. 294):

 

A crise da empresa pode ser fatal, gerando prejuízos não só para os empreendedores e investidores que empregaram capital no seu desenvolvimento, como para os credores e, em alguns casos, num encadear de sucessivas crises, também para outros agentes econômicos. A crise fatal de uma grande empresa significa o fim de postos de trabalho, desabastecimento de produtos ou serviços, diminuição na arrecadação de impostos e, dependendo das circunstâncias, paralisação de atividades satélites e problemas sérios para a economia local, regional ou, até mesmo, nacional.

 

É diante desse cenário que surge a teoria americana da failing firm defence[12], através da qual se argumenta que, em ocasiões específicas, a aprovação de uma operação problemática do ponto de vista concorrencial (ex: criar ou aumentar a posição dominante ) não produz efeitos anticompetitivos. Explica-se.

Nos atos de concentração em que uma das empresas apresenta condições econômicas e financeiras tão deterioradas (“failing firm”) que, se não fossem adquiridas, sairiam do mercado, gera-se um efeito concorrencial neutro, não implicando em real aumento de poder de mercado para o adquirente (KOKKORIS; OLIVARES-CAMINAL, 2010, p. 108).

Isso se justifica porque a saída da failing firm do mercado implicaria, por si só, no aumento do poder dos agentes que já se encontravam no mercado. Nesse sentido, Calixto Salomão Filho (2013, p. 195-196) conclui que:

 

Portanto, a aquisição de uma empresa em crise não importa substancial aumento do poder de mercado, uma vez comparada essa situação com o que se verificaria se a empresa fosse à falência e sua capacidade produtiva fosse desmontada ou dirigida a outra atividade. Assim, desde que haja realmente garantia da existência de crise irremediável, a concentração não implica real aumento do poder de mercado do adquirente[13].

 

A FFD parte do princípio de que a deterioração da estrutura competitiva do mercado iria inevitavelmente ocorrer com a saída da failing firm, razão pela qual seria preferível que esta se reestruturasse mediante uma operação de concentração, possibilitando, assim, a manutenção de seus ativos produtivos no mercado e evitando os custos econômico-sociais que seriam observados com a sua saída.

É neste ponto que se observa a relevância dos princípios constitucionais para a compreensão dos fundamentos da FFD, uma vez que é considerando a função social da empresa que se opta por mantê-la no mercado mediante ato de concentração, ainda que este seja problemático sob um ponto de vista concorrencial. Em outras palavras, a manutenção da empresa como unidade econômica e social útil atende não somente aos interesses individuais do empresário, mas também de outros agentes sociais, evitando os custos que a sua saída poderia implicar.

Tendo em vista que a FFD pode ser uma valiosa ferramenta de reestruturação das empresas com dificuldades financeiras em tempos de crise, passa-se a analisar os seus critérios de aplicação para, em seguida, observar como a teoria tem sido utilizada pela autoridade concorrencial brasileira.

 

2.1. Critérios de Aplicação

Após a crise de 2008, as discussões em torno da FFD se intensificaram ao ponto do tema ter sido objeto de debate de um Roundtable realizado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em 2009, tendo como foco a análise da aplicação da teoria nas diversas jurisdições. Apesar das pequenas diferenças nas abordagens utilizadas por cada jurisdição, o estudo concluiu que há pelo menos 3 (três) requisitos cumulativos para a aceitação da FFD[14]:

 

  • Ausente o ato de concentração, a failing firm sairá do mercado num futuro próximo em razão das dificuldades financeiras;
  • Não haver alternativa viável à transação ou reorganização que seja menos anticompetitiva do que o ato de concentração proposto; e
  • Ausente o ato de concentração, os ativos da failing firm sairão inevitavelmente do mercado.

 

O primeiro requisito diz respeito ao enquadramento da empresa como failing firm, devendo restar comprovado que esta não conseguiria cumprir suas obrigações financeiras num futuro próximo, sendo forçada a sair do mercado.

A autoridade antitruste do Canadá, por exemplo, para avaliar a probabilidade de a empresa falir, considera, dentre outros fatores, (i) relatórios financeiros recentes, (ii) fluxos de caixa projetados para o futuro, (iii) dificuldade de obtenção de crédito, (iv) se fornecedores estão dificultando ou negando crédito comercial, (v) se têm havido perdas operacionais persistentes ou uma significativa redução no valor líquido dos ativos da companhia, (vi) se tais perdas foram acompanhadas por uma deterioração da posição relativa da empresa no mercado, e (vii) a probabilidade de a empresa conseguir se reorganizar financeiramente, nos termos da legislação falimentar canadense ou mediante acordos com credores.

Observados esses fatores, a autoridade canadense considera falida (ou na iminência de falir) a empresa que (i) estiver insolvente (ou na iminência de se tornar insolvente), (ii) iniciou voluntariamente (ou está na iminência de iniciar voluntariamente) um processo de falência, ou (iii) foi elencada (ou está na iminência de ser elencada) em processo de falência.

A preocupação de enquadrar a empresa com failing firm se justifica com base no segundo requisito, uma vez que, a não ser que a empresa esteja em verdadeiras condições de deterioração, é provável que as dificuldades que ela enfrenta possam ser resolvidas através de outras alternativas que não a FFD. Sempre que houver outras alternativas viáveis à operação que sejam menos anticompetitivas, o ato de concentração com base na FFD não deverá ser aprovado.

É com base nessa lógica que se exige que as empresas envolvidas na operação demonstrem que se empenharam em obter ofertas alternativas razoáveis que mantivessem os ativos tangíveis e intangíveis no mercado relevante e que oferecessem menos danos à competição do que o ato de concentração.

Não sendo encontrada outra alternativa viável, as empresas deverão demonstrar que os ativos da failing firm não sairão do mercado relevante, o que pode ser observado, por exemplo, através da perda de parte da oferta desse mercado, podendo ensejar num aumento da demanda e no aumento dos custos de produção e dos preços (a não ser que a empresa seja a menos competitiva num mercado em decadência) (KOKKORIS; OLIVARES-CAMINAL, 2010, p. 197).

O atendimento dos requisitos é um forte indicativo de que a operação não importará em aumento de poder de mercado do adquirente. Acontece que, em algumas situações, a autoridade antitruste deve ter um rigor maior na análise da operação para garantir que esta não produzirá efeitos anticompetitivos no mercado relevante em que as empresas estão inseridas.

É o caso, por exemplo, da failing firm ser adquirida por um player com participação dominante no mercado. A aquisição pelo player dominante pode provocar uma consolidação excessiva do mercado na medida em que pode contribuir para o enfraquecimento da competitividade entre os pequenos players que restaram no mercado. Estes, por sua vez, podem passar a considerar a fusão com outros players para garantirem a sua viabilidade e lucratividade no mercado, concentrando-o ainda mais.

Por outro lado, a aquisição pelo player dominante pode ser uma forma deste obter ativos e know-how que lhe permitirão aumentar a produtividade e o seu nível de competitividade no mercado, o que pode ensejar na diminuição dos custos de produção e dos preços.

É crucial, portanto, que a autoridade antitruste realize uma análise de longo prazo dos efeitos que podem ser produzidos pela operação[15]. Frederic Jenny (2020), considerando as possíveis dificuldades que as autoridades irão enfrentar em razão da crise econômica provocada pelo COVID-19 (coronavirus), conclui nesse mesmo sentido ao pontuar que:

 

Competition authorities will have to take a longer and more dynamic view of the process of competition than they have had until now and to adopt their reasoning with respect to (…) mergers to circumstances of disequilibrium caused by an exogenous shock to the economic system.

 

A preocupação com o exame a longo prazo das operações de concentração, para além do atendimento dos requisitos mencionados, se justifica pelo fato delas, ao contrário das condutas unilaterais, serem menos maleáveis e mais difíceis de reverter uma vez finalizadas.

Com esses requisitos em mente, cumpre verificar como a FFD tem sido utilizada pela autoridade brasileira, ainda que não seja prevista expressamente por esta.

 

2.2. A Aplicação da FFD no Brasil

Conforme mencionado anteriormente, a FFD não encontra previsão normativa expressa, sendo rapidamente pontuada pelo Guia de Concentração Horizontal do CADE de 2016 no sentido de que a jurisprudência da Autarquia costuma adotar extrema cautela na utilização da teoria. Em razão da falta de legislação específica, o Guia prevê os mesmos critérios de aplicação que os utilizados pelo padrão internacional consolidado pela OCDE.

 

Além disso, a teoria da failing firm defence tem sido pouco abordada, na prática, pelo CADE, o que dificulta a construção de um entendimento sistematizado a respeito da FFD tanto na doutrina quanto na jurisprudência. Nesse sentido, vale destacar que a FFD apenas foi expressamente aplicada no julgamento de poucos atos de concentração e a sua aplicação sempre ocorreu de forma associada com outros critérios de análise econômica favoráveis à aprovação do ato.

Isso ocorreu, por exemplo, no julgamento do Ato de Concentração de nº 08012.014340/2007-7551[16], de relatoria do Conselheiro Luís Fernando Rigato Vasconcellos, julgado em 07 de janeiro de 2008, em que a Votorantim Metais Zinco S/A visava a aquisição dos direitos minerários da Massa Falida de Mineração Areiense S/A.

A aprovação do Ato se deu com respaldo nos critérios de análise econômica e argumentos levantados pela FFD, uma vez que foram observados poucos efeitos nocivos à concorrência e foi constatado que a empresa falida havia efetivamente buscado uma alternativa menos anticompetitiva mediante a realização de leilão judicial. No caso, o CADE concluiu que a aprovação da operação representava baixa barreira à entrada e aumento da rivalidade no setor.

A aplicação ainda precoce da FFD e a falta de entendimento sistematizado em relação aos casos em que a teoria efetivamente é acatada pela Autarquia no Brasil[17], gera preocupação diante da provável crise econômica que seguirá a pandemia causada pelo COVID-19 (coronavirus). Essa preocupação se justifica na medida em que a presente crise se difere de todas as que lhe precederam por ter origem no colapso do sistema de saúde público[18], tornando necessária a adoção de medidas extremas como o isolamento social em massa e o fechamento do comércio.

Nesse contexto, o impacto da permanência dos ativos de uma empresa em deterioração não ocorrerá apenas no nível de seu mercado relevante, mas, provavelmente, essa manutenção poderá garantir a perpetuação de toda uma cadeia de mercado de bens essenciais, como é o caso das cadeias de alimentação[19].

A autoridade concorrencial precisará estar preparada para lidar com os novos cenários decorrentes da crise, o que lhe exigirá uma atuação dinâmica e de longo prazo, voltada para a necessidade específica de cada caso, a qual pode ser viabilizada através da utilização dos princípios constitucionais da ordem econômica como norteadores das decisões. Como os princípios estão previstos no ordenamento constitucional pátrio, os critérios internacionais de aplicação da FFD devem ser adaptados à realidade brasileira, para que a aplicação da teoria ocorra em consonância com os princípios constitucionais.

Além disso, a adaptação é ferramenta necessária para evitar que a FFD seja levantada com base em argumentos de flexibilização do enforcement[20], uma vez que, conforme se demonstrará a seguir, a teoria encontra assentamento nas normas concorrenciais pátrias. Não se trata, assim, de flexibilização da legislação antitruste como instrumento de assistência a firmas em dificuldades financeiras, mas sim da sua aplicação com base nos princípios que fundamentam a própria legislação.

Nesse sentido, a Lei nº 12.529/11, em seu art. 88, estabelece o controle de atos de concentração principalmente através dos dispositivos abaixo transcritos:

 

Art. 88. Serão submetidos ao Cade pelas partes envolvidas na operação os atos de concentração econômica em que, cumulativamente:

I – pelo menos um dos grupos envolvidos na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 400.000.000,00 (quatrocentos milhões de reais); e

II – pelo menos um outro grupo envolvido na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais). […]

  • 5º Serão proibidos os atos de concentração que impliquem eliminação da concorrência em parte substancial de mercado relevante, que possam criar ou reforçar uma posição dominante ou que possam resultar na dominação de mercado relevante de bens ou serviços, ressalvado o disposto no § 6º deste artigo.
  • Os atos a que se refere o § 5º deste artigo poderão ser autorizados, desde que sejam observados os limites estritamente necessários para atingir os seguintes objetivos:

I – cumulada ou alternativamente:

  1. a) aumentar a produtividade ou a competitividade;
  2. b) melhorar a qualidade de bens ou serviços; ou
  3. c) propiciar a eficiência e o desenvolvimento tecnológico ou econômico; e

II – sejam repassados aos consumidores parte relevante dos benefícios decorrentes. (grifos nossos)

 

O § 6º do dispositivo em comento permite que, em alguns casos específicos, um ato de concentração seja aprovado ainda que problemático em termos concorrenciais, desde que atenda cumulada ou alternativamente os requisitos do inciso I e que parte relevante dos benefícios decorrentes do ato sejam repassados aos consumidores. Tal exceção encontra fundamento nos princípios da proporcionalidade[21] e no princípio retributivo (SALOMÃO FILHO, 2013, p.241) e busca balancear os efeitos positivos e negativos que costumam decorrer de um ato de concentração.

Dessa forma, não bastará que o ato produza a redução de custos, aumento de lucros ou outros benefícios que sejam incorporados unicamente pelas empresas fusionadas, deverá ser constatado que parte relevante de tais benefícios serão repassados aos consumidores. Ademais, essa disposição está diretamente relacionada com os princípios constitucionais da ordem econômica, a exemplo da função social da empresa, já que exige que os agentes de mercado exerçam a livre-iniciativa sem causar danos desnecessários ou desproporcionais aos envolvidos, notadamente aos outros concorrentes e aos consumidores (FRAZÃO, 2017, p. 132).

É possível inferir que o objetivo do dispositivo é de assegurar a existência de efetivos benefícios que, uma vez distribuídos entre os consumidores, possam assegurar a neutralização dos efeitos concorrenciais do ato. Haveria, portanto, um resultado concorrencial neutro, tal qual o observado na aprovação de um ato baseado na FFD.

Como a aplicação dos critérios internacionais da FFD presam pela não geração de danos à livre concorrência, mediante o resultado de neutralidade da operação, a teoria encontra assentamento na exceção, prevista no § 6º do art. 88 da Lei nº 12.529/11. Logo, a FFD pode e deve ser aplicada com base no referido dispositivo, a fim de que a aprovação guarde consonância com o Sistema Brasileiro de Direito Concorrencial, o que servirá de baliza no caso de eventuais questionamentos que surjam durante a aplicação da teoria diante do cenário de crise inédito provocado pela pandemia.

 

Conclusão

Com base nos pontos acima suscitados, conclui-se que a possibilidade de aplicação da FFD pelo CADE é um ponto superado, seja porque a teoria foi mencionada em seu Guia de Atos de Concentração Horizontal de 2016, seja porque já houve julgados em que a FFD foi utilizada como parâmetro para aprovação ou não do ato.

A questão que urge ser tratada é a adaptação dos critérios internacionais utilizados pela Autarquia às normas concorrenciais brasileiras, para que a análise da teoria ocorra em consonância com a ordem econômica constitucional, responsável por fundamentar as diretrizes do Direito da Concorrência nacional.

Essa reaproximação entre os princípios constitucionais e a atuação da autoridade antitruste permite que esta não seja um mero instrumento de defesa dos mercados ou da eficiência econômica, mas que ela também se preocupe com os impactos da sua atuação causam na efetivação da justiça social. É o caso, por exemplo, de analisar os custos sociais que a saída de uma failing firm pode acarretar, sobretudo quando essa saída, no atual contexto, pode provocar o desmantelamento de toda uma cadeia de mercado de produtos essenciais, como as cadeias de distribuição de alimentos e de produtos de saúde.

O que se propõe, dessa forma, é que, com base nos princípios constitucionais, a autoridade concorrencial saia da posição de conforto, por  não tratar de assuntos que envolvam aspectos que vão além da defesa dos mercados ou da eficiência econômica, para que ela possa efetivamente atender as necessidades que surgem em face das crises econômicas. Aqui se estudou, mais especificamente, o alcance de tais necessidades, através da aplicação da failing firm Defence, para a aprovação de atos de concentração, desde que observados os critérios de aplicação, em consonância com o disposto no § 6º do art. 88, da Lei Concorrencial e com os princípios constitucionais.

O nível de desenvolvimento dos mercados e os desafios cada vez mais inéditos e complexos, que surgem durante os períodos de crise, exigem que a aplicação das normas concorrenciais ocorra de forma dinâmica, rápida e com visão a longo prazo, levando em consideração os impactos da decisão nos ditames da justiça social.

Inclusive, a crise provocada pelo COVID-19 pode requerer que os procedimentos internos da Autarquia sejam modificados no que diz respeito à notificação de atos de concentração, como forma de acelerar o processo de análise envolvendo failing firms. Isso porque  as investigações em torno da FFD costumam ser muito prolongadas, e a demora na análise da operação pode acentuar o estado de deterioração em que a failing firm se encontra.

Dessa forma, vale frisar, por fim, que a aplicação da FFD não corresponde à flexibilização das normas antitruste, mas sim no cumprimento destas em consonância com os princípios constitucionais, com o objetivo de assegurar a justiça social. Até porque, os efeitos que  as operações de concentração produzem, sejam eles positivos ou negativos, irão se perpetuar ao longo do tempo, tanto em seu aspecto concorrencial quanto no social, de modo que não seria congruente ignorar este último aspecto.

 

Referências

ATHAYDE, Amanda. As três ondas do antitruste no Brasil. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/as-tres-ondas-do-antitruste-no-brasil-01112017. Acesso em: 15 de abril de 2020.

 

BRIETZKE, Paul H. The Constitutionalization of Antitrust: Jefferson, Madison, Hamilton, and Thomas C. Arthur. 22 Val. U. L. Rev. 275 (1988).

 

CADE. Guia para Análise de Atos de Concentração Horizontal. 2016. Disponível em: http://www.cade.gov.br/acesso-a-informacao/publicacoes-institucionais/guias_do_Cade/guia-para-analise-de-atos-de-concentracao-horizontal.pdf/view. Acesso em: 01 de maio de 2020.

 

CADE. Ato de Concentração nº 08012.014340/2007-75. Disponível em: http://cade.gov.br/Default.aspx?d253a473b369bd56ae60ad8da7, acesso em 29 de abril de 2020.

 

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. vol 4. 13. ed. São Paulo : Saraiva, 2012. p. 294

 

FARIA, Paulo Henrique. Os Processos de Recuperação Judicial e a Aplicação da “Failing Firm Defense Doctrine” no Brasil. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/arquivos/2020/3/9221CC092A49DD_OSPROCESSOSDERECUPERACAOJUDICI.pdf. Acesso em: 01 de maio de 2020.

 

FRAZÃO, Ana. A necessária constitucionalização do direito da concorrência. In: CLÈVE, Clèmerson Merlin; FREIRE, Alexandre (Org.). Direitos fundamentais e jurisdição constitucional. São Paulo: RT, 2014.

 

FRAZÃO, Ana. Direito da Concorrência: pressupostos e perspectivas. São Paulo: Saraiva, 2017.

 

FRAZÃO, Ana. Impactos da Covid-19 sobre o Direito Antitruste. Dispoonível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/constituicao-empresa-e-mercado/impactos-da-covid-19-sobre-o-direito-antitruste-20042020, acesso em 01 de maio de 2020.

 

GONÇALVES, Everton das Neves; DE QUEIROZ, Bruna Pamplona. A Aplicação da Teoria da Failing Firm Defence no Brasil. Percurso – ANAIS DO VIII CONBRADEC (Congresso Brasileiro de Direito Empresarial e Cidadania), vol.02, n°.29, Curitiba, 2019. pp. 1-27.

 

HOVENKAMP, Herbert. The Looming Crisis In Antitrust Economics. University of Pennysylvania Law School. Research Paper nº 20-15.

 

HOVENKAMP, Herbert. The Antitrust Enterprise Principle and Execution. London: Harvard University Press, 2005.

 

JENNY, Frederic. Economic Resilience, Globalization and Market Governance: Facing the COVID-19 Test. Disponível em: https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=3563076, acesso em 13 de abril de 2020.

 

KOKKORIS, Ioannis; OLIVARES-CAMINAL, Rodrigo. Antitrust law amidst financial

crises. New York: Cambridge University Press, 2010.

 

MARKS, Julie. What Caused the Stock Market Crash of 1929?. Disponível em: https://www.history.com/news/what-caused-the-stock-market-crash-of-1929, acesso em 16 de abril de 2020.

 

MERGERS and acquisitions: supplementary guidelines on failing firms. Oct. 2009. Disponível em: http://www.comcom.govt.nz/assets/Imported-from-old-303site/BusinessCompetition/MergersAcquisitions/ContentFiles/Documents/comcom-mergersandacquisitionssupplementaryguidelinesonfailingfirms.pdf, acesso em: 11 de abril de 2020.

 

OLIVEIRA JÚNIOR, Fernando Antônio Alves. O estudo da Failing Firm Defense, a partir da Lei de Falências, nos atos de concentração submetidos ao CADE. Revista do IBRAC – Direito da Concorrência, Consumo e Comércio Internacional, São Paulo, ano 18, v. 19, jan./jun. 2011.

 

ORGANISATION DE COOPÉRATION ET DE DÉVELOPPEMENT ÉCONOMIQUES – OCDE. Global Forum on Competition. Failing Firm Defence. 2009. (Series Roundtables on Competition Policy). Disponível em: https://www.oecd.org/competition/mergers/45810821.pdf. Acesso em: 27 de abril de 2020.

 

ROMANIELO, Enrico Spini. Direito Antitruste e Crise – Perspectivas para a Realidade Brasileira. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Direito da USP. São Paulo: 2013.

 

SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito Concorrencial. São Paulo: Malheiros, 2013.

 

SHAPIRO, Carl. Competition Policy In Distressed Industries. Disponível em: https://www.justice.gov/atr/speech/competition-policy-distressed-industries, acesso em 01 de maio de 2020.

 

SHUARTZ, Luis Fernando. A Desconstitucionalização do Direito de Defesa da Concorrência. Disponível em: https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/1762/TpD%20007%20-%20Schuartz%20-%20Desconstitucionalizacao.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 01 de maio de 2020.

 

UNCTAD. Global Trade Impact of the Coronavirus (COVID-19) epidemic. Disponível em: https://unctad.org/en/PublicationsLibrary/ditcinf2020d1.pdf. Acesso em: 01 de maio de 2020.

 

[1] Acadêmica de Direito na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e intercambista da 40ª edição do PinCADE. E-mail: [email protected].

[2] Bacharel em Direito pela Universidade de Brasília. Pós-Graduado em Direito Econômico e Direito Concorrencial pela FGV. Assessor Técnico e Chefe de Gabinete Substituto do Gabinete da Presidência do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (GAB/PRES) desde 2019. E-mail: [email protected].

[3] O Dow Jones Industrial Average é um índice da bolsa de valores que acompanha o preço das ações das 30  empresas melhor avaliadas dos Estados Unidos. Analistas usam o índice para analisar a “saúde” do mercado de ações. O índice também reflete no nível de confiança dos investidores nessas empresas e na economia no geral. Para mais informações: https://www.thebalance.com/dow-jones-averages-indices-origins-3306237.

[4] Tradução nossa: “Enorme onda de vendas cria estado de quase pânico com o colapso das ações.”

[5] De acordo com o manual organizado pela UNCTAD intitulado de “The coronavirus shock: a story of another global crisis foretold and what policy makers shoud be doing about it”, a atual economia global possui como principais características o alto nível de financeirização, fragilidade e  profunda interdependência. Para mais informações: https://unctad.org/en/PublicationsLibrary/gds_tdr2019_update_coronavirus.pdf.

[6] Tradução nossa: “Os mercados de capitais globais geram os mesmos tipos de problemas que os aviões. Eles são mais rápidos, mais confortáveis e eles lhe levam aonde você está indo melhor. Mas as quedas são muito mais espetaculares.”

[7] FRAZÃO, Ana. Impactos da Covid-19 sobre o Direito Antitruste. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/constituicao-empresa-e-mercado/impactos-da-covid-19-sobre-o-direito-antitruste-20042020, acesso em 01 de maio de 2020.

[8] Para mais: FRAZÃO, Ana. A necessária constitucionalização do direito da concorrência. In: CLÈVE, Clèmerson Merlin; FREIRE, Alexandre (Org.). Direitos fundamentais e jurisdição constitucional. São Paulo: RT, 2014. p. 139-158.

[9] Essa abordagem ignora, porém, que, embora as concentrações horizontais reduzam o número de players e facilitem a coordenação entre eles, elas podem também resultar em economias de escala que podem ser redistribuídas aos consumidores e ampliar o potencial de dinâmica e de eficiências inovadoras no mercado, fatores essenciais, sobretudo, em tempos de crise.

[10] Tradução nossa: “O controle de atos de concentração tem um papel fundamental na economia atualmente, caracterizada pelo sempre crescente número de fusões. A racionalidade de tais normas é identificar operações que possam gerar efeitos anticompetitivos na estrutura do mercado.”

[11] De acordo com Kokkoris e Caminal (2010, p. 103), reestruturação é o ato de total ou parcialmente desagregar para depois reorganizar a estrutura de um empresa.

[12] A FFD tem origem na jurisprudência estadunidense por volta da década de 1930, como reflexo da crise de 1929, podendo ser aplicada em qualquer situação macroeconômica, prevendo somente a situação microeconômica das empresas envolvidas. Para mais: ROMANIELO, Enrico Spini. Direito Antitruste e Crise – Perspectivas para a Realidade Brasileira. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Direito da USP. São Paulo: 2013. p. 110.

[13] Vale destacar que há autores, como Hovenkamp, que vão além da posição aqui adotada, justificando a FFD ainda em casos em que essa resulte em monopólio.

[14] Disponível em: https://www.oecd.org/competition/mergers/45810821.pdf, acesso em 01 de maio de 2020.

[15] Nesse ponto, a autoridade antitruste deve ter especial atenção em relação ao mercado de big tech, que, de acordo com previsões realizadas pela revista The Economist, tenderá a sair da crise do COVID-19 ainda mais concentrado, com o poder de mercado concentrado nas mãos de grandes plataformas digitais, como a Amazon, Apple e o Facebook. Matéria disponível em: https://www.economist.com/leaders/2020/04/04/big-techs-covid-19-opportunity, acesso em 01 de maio de 2020.

[16] Ato de Concentração nº 08012.014340/2007-75 disponível em: http://cade.gov.br/Default.aspx?d253a473b369bd56ae60ad8da7, acesso em 29 de abril de 2020.

[17] A jurisprudência do CADE não deixa claro se, nos casos em que houve menção da FFD, o ato foi aprovado em razão da FFD ou de outros critérios baseados na análise econômica.

[18] Nesse contexto, o impacto da manutenção dos ativos de uma empresa em deterioração não ocorrerá apenas no nível de seu mercado relevante, mas, provavelmente, essa manutenção poderá garantir a manutenção de toda uma cadeia de mercado de bens essenciais, como é o caso das cadeias de alimentação. Alguns economistas, como é o caso de Frederic Jenny, têm chamado esse fenômeno de resiliência econômica dos mercados. Para mais: JENNY, Frederic. Economic Resilience, Globalization and Market Governance: Facing the COVID-19 Test. Disponível em: https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=3563076, acesso em 13 de abril de 2020.

[20] A preocupação acima ventilada se mostra real na medida em que uma das soluções  propostas pelo Congresso para lidar com os efeitos do COVID-19 na seara concorrencial foi a de suspender a eficácia do inciso IV, do art. 90, da Lei 12.529/2011, através do Projeto de Lei nº 1.179/2020. Esse tipo de flexibilização das normas concorrenciais em tempos de crise abre caminho para que operações oportunistas sejam efetivadas, acarretando efeitos concorrenciais que podem se projetar por muito tempo depois delas, tendo em vista o baixo nível de reversão dos atos de concentração.

[21] Conforme o Guia de 2016, os benefícios gerados pelos atos de concentração sejam proporcionais aos danos produzidos sobre a livre competição.

logo Âmbito Jurídico