Sumário: Considerações iniciais; 1 O sentido do processo constitucional; 2 A Jurisdição Constitucional Autônoma; 3 Características que definem o Supremo Tribunal Federal como uma jurisdição constitucional autônoma; 4 O contexto normativo das Leis n.(s) 9.868/99 e 9.882/99: a (tentativa de) abertura do Processo Constitucional no Brasil; Considerações finais ou início do debate acadêmico?; Referências.
Considerações iniciais
Nos dias atuais, em que a pós-modernidade permeia as relações jurídicas, propiciando a interdisciplinaridade e a flexibilidade da interpretação dos dispositivos postos, o processo constitucional se apresenta como uma das reflexões mais empolgantes que o direito constitucional experiencia na atualidade.
Evidentemente que este ensaio não pretende definir as linhas balizadoras e epistemológicas do que seja o processo constitucional! Mas se pretende, isto sim, contribuir para o debate acadêmico sobre a construção do processo constitucional no âmbito do Supremo Tribunal Federal.
O STF adota o sentido do processo constitucional? O Excelso Pretório pode ser definido como uma espécie de Jurisdição Constitucional Autônoma?
É por meio de referenciais teóricos como J. J. Gomes Canotilho, José Afonso da Silva, Paulo Bonavides e Peter Häberle que se pretende contextualizar estes questionamentos, e de certa maneira, contribuir para o fortalecimento do debate acadêmico entorno de um elemento valioso para o Estado Constitucional: o processo constitucional.
1 O sentido do processo constitucional
O estudo das estruturas de procedimento e de processo constitucionais corresponde ao interesse destas como categorias jurídicas gerais (plano teorético-jurídico), como elementos da legitimação (plano teorético-político) e como dimensões necessárias do princípio do Estado de Direito e do princípio democrático (plano jurídico-constitucional).[1]
J. J. Gomes Canotilho assevera uma distinção genérica entre os institutos do procedimento e do processo. Enquanto o primeiro cuida da concretização de competências legislativas e executivas, o último diz respeito ao modo de desenvolvimento da função jurisdicional.[2]
Com efeito, o autor lusitano conceitua o direito constitucional processual como “o conjunto de regras constitutivas de um procedimento juridicamente ordenado através do qual se fiscaliza jurisdicionalmente a conformidade constitucional de actos normativos”, ou seja, em alguns aspectos o processo constitucional são direitos material e formal concretizados, com certo grau de autonomia em relação à ordem jurídica processual geral.[3]
Por sua vez, José Afonso da Silva elenca o processo constitucional mais próximo do controle de constitucionalidade, conceituando-o como instrumento jurisdicional de solução de conflitos derivados da aplicação das normas constitucionais, sendo um conjunto de atos destinados a ativar a função da jurisdição constitucional em defesa dos princípios constitucionais, especialmente àqueles que conferem direitos fundamentais contrariados pela autoridade pública.[4]
O direito processual constitucional serve para garantir a realização do direito constitucional por meio de regras constitutivas de uma cadeia procedimental adequada ao exame e controle das questões jurídico-constitucionais. Dessa forma, o objeto e o fim do processo constitucional encontram-se associados aos da própria Justiça Constitucional.[5]
Não obstante, muitas vezes o objeto do processo constitucional se restringe à discussão e à averiguação da conformidade constitucional do procedimento. No entanto, constituem também objeto do processo constitucional “as pretensões[6], fundamentadas em normas constitucionais[7], que se deduzem perante o Tribunal Constitucional[8], solicitando um juízo de legitimidade constitucional[9] relativamente a determinados actos normativos”.[10]
Nessa perspectiva, a autonomia e a especificidade do processo constitucional estão ligadas à idéia de princípios gerais. Assim, Canotilho apresenta um rol exemplificativo, como o princípio do pedido[11], da instrução[12], da congruência ou adequação[13], da individualização[14] e do controle material[15].
Dentro desse contexto, cumpre ressaltar a crítica de Canotilho quanto à necessidade de se esclarecer a dogmática do processo constitucional, a fim de solucionar problemas procedimentais da Justiça Constitucional, especialmente no que tange a uma melhor iluminação teórica do tratamento dos fatos, que por conseqüência remete a uma análise mais adequada da distinção entre questão de fato e questão de direito, além do exame das prognoses legislativas[16], no sentido de que fatos futuros também podem ser apreciados pela jurisdição.[17]
Nesse sentido, há uma procedimentalização e processualização de todas as atividades relacionadas ao direito público no contexto do Estado Democrático de Direito, cuja relevância consiste em assegurar ao cidadão um status activus processualis[18] para conseguir garantias efetivas de realização e proteção de seus interesses e dos direitos fundamentais.[19]
O procedimento é a forma de uma função, o modo geral de desenvolvimento de poderes públicos. Conjuga-se nele, sob uma perspectiva dinâmica, os momentos formais e materiais de realização do programa normativo, captando, com rigor, a concretização das normas constitucionais (no procedimento legislativo, no administrativo e no processo jurisdicional).[20]
Nesse contexto, quanto ao modo de decidir e ao produto final, a compreensão das decisões constitucionais como decisões justas implica na idéia de vinculação constitucional de todas as atividades concretizadoras da Constituição nos vários momentos de desenvolvimento, e não apenas da decisão da Corte Constitucional.[21]
Logo, o processo constitucional pode ser entendido como um conjunto de procedimentos que conduzem à concretização de determinada situação jurídica, cujo fundamento de validade se encontra na Constituição.
Nesse aspecto, o processo constitucional não é somente aquele consubstanciado no julgamento de uma Corte Constitucional. Ele se inicia com a necessidade de determinado direito fundamental ser exercido pelo cidadão.
Nesse sentido, sua origem está intimamente ligada às funções de Poder, podendo caminhar para: (a) os debates de um projeto de lei, cuja aprovação congressual, sanção presidencial e respectiva promulgação podem ser questionadas no âmbito jurisdicional; (b) se se cuidar de uma norma constitucional de eficácia plena (ou até mesmo contida), o direito fundamental pode ser requerido em um processo administrativo (que incidentalmente ou a seu término pode ser levado ao Poder Judiciário); ou (c) pode ser requerido diretamente ao Poder Judiciário, em razão do direito ao acesso à justiça (CF, art. 5º, XXXV), em que o direito fundamental, cujo conteúdo essencial se encontra em uma norma de eficácia plena ou contida, pode ser concedido pela prestação jurisdicional mediante a interpretação desses preceitos.[22]
Logo, o procedimento devido (devido processo constitucional) se torna uma garantia para evitar a tomada de decisões inconstitucionais ou injustas, mediante a previsão de procedimentos constitucionais os quais, a priori, cumprem uma exigência fundamental do princípio do Estado Constitucional de Direito.
2 A Jurisdição Constitucional Autônoma
A Jurisdição Constitucional autônoma pressupõe conceitualmente uma instituição independente frente a outros órgãos estatais e constitucionais, com determinadas competências e funções.[23] No Brasil, ela é exercida pelo Supremo Tribunal Federal, o qual constitui o guardião da Constituição (CF, art. 102, caput)[24] e protetor dos direitos fundamentais (CF, Preâmbulo), ganhando status de uma Corte Constitucional “com uma extensão e plenitude nunca dantes ocorridas”[25].
Com efeito, a jurisdição constitucional autônoma representa uma “coroação” do Estado Constitucional de sua atual fase de desenvolvimento (assim como o federalismo), dentro do contexto da teoria constitucional comparatista da ciência cultura, em razão da relatividade e da dependência de todas as normas ou instituições vivas e os mecanismos de ligação correspondentes.[26]
Assim, o juízo qualitativo de ser uma instituição como a jurisdição constitucional (um modelo de sucesso) deve realizar-se com uma perspectiva de conjunto e iuscomparativamente, de maneira abstrata e individual, a partir de critérios estabelecidos no êxito da Constituição e em sua totalidade.[27]
Nesse sentido, Peter Häberle assevera que a comparação jurídica em matéria de Estado Constitucional se desenvolve em duas dimensões que se relacionam reciprocamente: como comparação jurídica no tempo (história constitucional) e como comparação jurídica no espaço (método comparatista). Ambos levam em conta a sensibilidade científico-cultural, inserida nos contextos desde o princípio, a fim de se vislumbrar a realidade constitucional, a qual estabelece a cultura como função constitucional, colocando a Constituição como uma expressão de um estágio de desenvolvimento cultural, como meio de auto-representação do cidadão, reflexo de sua herança cultural e fundamento de suas esperanças.[28]
Nesse contexto, a jurisdição constitucional participa das funções típicas da Constituição, nos processos de produção e recepção em matéria de Estado Constitucional, como a restrição do poder no interesse da liberdade, a constituição de competências, a integração dos cidadãos e dos grupos sociais, além da importância da “educação constitucional”.[29]
Nessa perspectiva, a fiscalização do processo no âmbito da Jurisdição Constitucional pode-se dar, segundo o professor Häberle, por meio da vigilância da opinião pública, de comunidades nacionais e internacionais, pelos professores de direito constitucional, pelo Parlamento e pelos demais juízes e Tribunais (que no Brasil possuem também a competência para declarar incidentalmente a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de um ato normativo – CF, art. 97).[30]
3 Características que definem o Supremo Tribunal Federal como uma jurisdição constitucional autônoma
O professor Peter Häberle relaciona, dentro de um rol exemplificativo, sete características que uma jurisdição constitucional deve possuir para se considerar autônoma. A primeira delas diz respeito à natureza de “órgão constitucional”. As competências mais relevantes devem estar escritas no texto constitucional (por exemplo, o rol da CF, art. 102). A garantia de independência funcional (CF, art. 2º) é irrenunciável, pois necessita assegurar o Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, caput), por meio do cumprimento de suas decisões por outros órgãos.[31]
A legitimação democrática constitui a segunda característica a ser analisada. Diferentemente dos componentes do Tribunal Constitucional Federal Alemão (TCF)[32], os Ministros do STF, após escolha pelo Presidente da República, são submetidos a uma argüição pública no Senado Federal[33] e em seguida, por votação secreta, são (ou não) aprovados para o cargo e nomeados pelo Presidente. (CF, art. 52, III, a c/c art. 101, parágrafo único).
A publicidade, por sua vez, é um princípio básico de organização para o status e para o processo da Jurisdição Constitucional, em virtude da associação publicidade (como direito fundamental) e Constituição (CF, art. 5º, LX, c/c art. 93, IX). Dessa forma, esse princípio tem que permanecer efetivo na prática, por meio da leitura dos votos em audiência pública ou da revisão (científica) da jurisprudência.[34]
Como quarta característica fundamental da jurisdição constitucional, a atividade jurisprudencial racional direciona-se para uma globalização política de uma comunidade[35], caracterizando-se pela aplicação da “Lei e do Direito”, como uma evolução da Constituição, racionalmente revista em seus métodos e com certa freqüência criativa.[36]
Com efeito, o pluralismo e a interação dos cinco métodos hermenêuticos de interpretação (incluindo a comparação jurídica) podem ser abertos, mas um controle sutil desses métodos pode não ser sempre “compreensivo intersubjetivamente”. Nesse sentido, a jurisprudência constitucional é uma atividade artesanalmente criada, que se estende na “arte” dos juristas, considerando a Constituição como ordem jurídica básica dos Estados e da sociedade.[37]
Nessa perspectiva, os princípios norteadores da interpretação constitucional fundamentam complementarmente a atividade jurídico-constitucional, porque os efeitos da jurisdição constitucional possuem certa natureza política (mas a jurisdição não é política em si mesma). Assim, o Tribunal Constitucional pode (e deve) criar seu próprio direito processual (caso não exista norma com o direito positivo)[38], segundo os princípios gerais do Direito.[39]
A quinta característica se refere a uma estrutura comum mínima de competências e funções, que se arranjam em determinadas formas de controvérsias, caracterizando a jurisdição como instituição necessária para a existência e desenvolvimento do Estado Constitucional. Dentre as competências e funções, destacam-se: (a) as controvérsias orgânicas, entre as funções de Poder (CF, art. 2º); (b) o processo de recurso constitucional de amparo[40]; (c) as causas e os conflitos federativos (CF, art. 102, I, f); (d) o procedimento de acusação e outros processos de proteção constitucional (as garantias constitucionais); (e) os controles normativos concreto (hipóteses do RE – CF, art. 102, III) e abstrato (ADI e ADC – CF, art. 102, I, a, e ADPF – art. 102, § 1º). O professor Peter Häberle assevera que não é preciso verificar a existência (ao mesmo tempo) de todas as competências, mas ressalta a importância política-jurídica de sua ampliação e evolução.[41]
A sexta característica detêm-se em funções específicas, como (a) a garantia evolutiva dos direitos fundamentais no contexto de pactos internacionais de direitos humanos; (b) a primazia da Constituição, com a proteção da democracia e do Estado Democrático de Direito, na forma do controle de constitucionalidade (abstrato ou concreto); (c) o equilíbrio das funções de Poder do Estado; (d) a garantia do pluralismo e a proteção das minorias; e (e) a proteção da inserção pacífica do Estado Constitucional em ambientes internacionais.[42]
Por fim, a última característica é a que mais salta aos olhos nos dias atuais. Trata-se da jurisprudencialização do Direito, na medida em que se promove a atualização (cautelosa) da Constituição, cuja conseqüência é a releitura do contrato social de uma comunidade política.[43] Assim, com esses sete aspectos se indica, segundo Häberle, uma teoria para a jurisdição constitucional, na qual o Supremo Tribunal Federal está inserido.[44]
Dentro desse contexto de características, pode-se afirmar que o método de comparação jurídica tem como finalidade fomentar o desenvolvimento de um processo constitucional (autônomo) no âmbito do STF, não obstante a doutrina jurídica e o cidadão devem criticar as decisões da Corte, não as seguindo de maneira bíblica, pois para o professor Häberle, ao se utilizar o método de comparação jurídica e enfatizar a crítica aos precedentes do Tribunal Constitucional, possibilita-se que este busque caminhos intermediários em suas decisões, por meio de uma “integração pragmática de elementos teóricos”, a fim de alcançar uma “Constituição pluralista”.[45]
4 O contexto normativo das Leis n.(s) 9.868/99 e 9.882/99: a (tentativa de) abertura do Processo Constitucional no Brasil
A jurisdição constitucional brasileira teve como primeiro passo para a democratização a promulgação da Constituição de 1988. No entanto, a interpretação do texto constitucional permaneceu restrita a uma “sociedade fechada de intérpretes”[46], na qual o cidadão é reduzido à condição de mero espectador passivo das decisões proferidas pelos Ministros do STF, pelos pareceres e informações do Procurador-Geral da República e do Advogado-Geral da União e pelas manifestações propedêuticas dos demais legitimados (no caso de eles proporem determinada ação constitucional).
Com efeito, esse modelo de certa maneira impossibilita a interpretação da Constituição pelo cidadão e por setores mais amplos da sociedade civil, dificultando o desenvolvimento e o fortalecimento da posição do amicus curiae. Todavia, com o amadurecimento das instituições e o fomento do debate acerca da democratização da jurisdição constitucional, permite-se o processo de abertura da hermenêutica constitucional, com a evolução de práticas inovadoras, como as diversas formas de manifestação (dentre elas o amicus curiae).[47]
A fim de se evitar que a jurisdição constitucional se torne uma instância autoritária de Poder, Gustavo Binenbojm observa:
“(…) há que se fomentar a idéia de sociedade aberta de intérpretes da Constituição, formulada por Peter Häberle, segundo a qual o círculo de intérpretes da Lei Fundamental deve ser elastecido para abarcar não apenas as autoridades públicas e as partes formais nos processos de controle de constitucionalidade, mas todos os cidadãos e grupos sociais que, de uma forma ou de outra, vivenciam a realidade constitucional”.[48]
Uma das tentativas de pluralizar o processo de interpretação constitucional foi com o advento das Leis n.(s) 9.868/99 e 9.882/99, as quais tentaram permitir com que o cidadão pudesse ingressar diretamente com uma ação constitucional perante o Supremo Tribunal Federal. Por essa razão, é fundamental analisar os contextos normativos dessas leis que representam parte do processo constitucional brasileiro.
No primeiro momento, uma comissão de juristas foi constituída pelo Ministro da Justiça para formular estudo acerca da reforma das leis da ação popular, da ação civil pública, do mandado de segurança e da representação interventiva, além da criação dos projetos de lei sobre mandado de injunção, habeas data, ação direta de inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade, cujo intuito era o de modernizar a ordem jurídica brasileira e iniciar a abertura racional do STF por meio das idéias pluralistas de Peter Häberle sobre a sociedade aberta de intérpretes da Constituição.[49]
Dentro desse contexto, a sociedade para a qual se destina a norma deve participar do seu processo de conformação, a fim de que o Direito não se esvazie em si mesmo, pois o mito da imparcialidade dos juízes não pode se sobrepor à legitimação da sociedade e a seu direito de ser ouvida acerca do conteúdo do processo democrático de tomada de decisão, em razão de o texto constitucional também representar o complexo de forças sociais que atuam como sujeitos (potências públicas) do processo de interpretação constitucional, não sendo possível estabelecer um elenco fechado de intérpretes da Constituição.[50]
Entretanto, foi apresentado um anteprojeto de lei (o Projeto de Lei n. 2.960, de 1997, enviado pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional), o qual fora limitado substancialmente pelo histórico da jurisprudência regressiva do próprio STF, não se permitindo a intervenção de terceiros nas ações constitucionais de controle (ADI e ADC) e vetando-se disposições que franqueavam maior acesso à Jurisdição Constitucional, cuja conseqüência seria observada na abertura e pluralidade do debate constitucional.[51]
Nesse sentido, é importante esclarecer que a interpretação constitucional deve partir de um paradigma democrático, tornando-se possível se existir uma abertura procedimental para viabilizar as intervenções da sociedade civil organizada na formação do intérprete oficial da norma jurídica (a vontade geral).[52]
Assim sendo, as leis em destaque são meios de racionalizar com transparência os argumentos formadores do âmbito de proteção dos direitos fundamentais, os quais levarão à conformação desses direitos no contexto social[53], conferindo um caráter pluralista ao processo objetivo de controle abstrato de constitucionalidade.[54]
Mesmo que nessas leis se encontrem a maior e a mais importante abertura do processo de controle abstrato de constitucionalidade, cumpre ressaltar a importância de técnicas de decisões adequadas, a fim de que o STF – ao ser alertado sobre as conseqüências de suas decisões – adote uma jurisprudência com fundamento no interesse social, para concretizar o caminho da sociedade aberta de intérpretes da Constituição.[55]
Não obstante a efetividade dessas leis estarem sendo alcançadas de maneira progressiva, o que se observa é um avanço para o processo constitucional brasileiro, no sentido de se possibilitar a abertura dos julgamentos do controle abstrato a elementos externos que podem contribuir para a análise adequada da verificação de (in)constitucionalidade dos atos normativos, como o pedido de informações aos órgãos que emanaram o ato normativo (Lei n. 9.868/99, art. 6º), as informações adicionais, a solicitação de peritos, a fixação de audiências públicas ou a consulta aos demais tribunais sobre a aplicação do ato normativo no âmbito da respectiva jurisdição (Lei n. 9.868/99, art. 9º, §§ 1º, 2º, 3º).
Nesse sentido, inúmeros exemplos de nível procedimental podem expressar as conseqüências do caráter público processual da interpretação constitucional.[56] Destaca-se, sobretudo no Brasil, o papel do STF nessa função, na medida em que promove a abertura de cunho plural a intérpretes para a construção de sua jurisprudência constitucional, conforme as hipóteses previstas nas Leis n.(s) 9.868/99 e 9.882/99.[57]
Considerações finais ou início do debate acadêmico?
Viver a Constituição nos dias atuais representa captar todo o processo complexo que envolve a sociedade. Participar politicamente de forma democrática pressupõe presumir que o cidadão possua capacidade para refletir sobre questões de interesse da comunidade a qual pertence.[58]
Com este espírito, o presente ensaio não pretendeu responder a todos os alentos e perguntas que surgem da observação do processo constitucional brasileiro. Na verdade, o objetivo foi o de aumentar um pouco a “complexidade do sistema”, na medida em que se buscou iluminar os caminhos teóricos por onde permeia a construção do processo constitucional no Brasil.
Visualizar o sentido do processo constitucional tem sua razão de ser. A doutrina de J. J. Gomes Canotilho ilustra as premissas básicas na qual o processo constitucional iniciou o seu desenvolvimento.
Com a Jurisdição Constitucional Autônoma de Peter Häberle, pretendeu-se demonstrar a evolução que o Supremo Tribunal Federal alcançou em termos de status de Corte Constitucional. Verificou-se, pela proposta de Häberle, que o Excelso pretório pode ser caracterizado como uma autêntica Jurisdição Constitucional.
Todavia, a apresentação do contexto normativo das leis que definem o processo constitucional no Brasil constitui uma tentativa de alerta: o desenvolvimento do processo constitucional necessita de um debate acurado e sofisticado, no que diz respeito à funcionalidade de nosso Estado Constitucional.
Espera-se, por oportuno, que se possa iniciar o debate constitucional sobre a necessidade de aperfeiçoamento e concretização das instituições. E que esse debate possa ser aberto e pluralista, na linha proposta pelo professor Peter Häberle.
Referências
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Notas:
[1] Cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000, p. 935-936.
[2] Cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000, p. 939.
[3] Cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000, p. 939.
[4] Cf. SILVA, José Afonso da. El proceso constitucional. In: BAZÁN, Víctor (org.).
Defensa de la constitución: garantismo y controles. Buenos Aires: Ediar, 2003, 753 e 759-760.
[5] Cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991, p. 1043.
[6] Consiste na declaração de vontade da parte com legitimidade processual ativa (cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991, p. 1044).
[7] Fundamentando, com normas da Constituição, as declarações feitas perante o Tribunal Constitucional (cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991, p. 1044).
[8] Se refere a autonomia do processo constitucional em feitos principais perante o Tribunal Constitucional (cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991, p. 1044).
[9] Qualquer que seja a pretensão, a legitimidade constitucional é necessária para se proferir determinada decisão acerca da (des)conformidade constitucional de um ato normativo (cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991, p. 1044).
[10] Cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991, p. 1039 e 1044.
[11] Semelhante ao princípio dispositivo, presente do direito processual civil, o início do processo constitucional apenas se dá com o impulso oficial das pessoas ou entidades com legitimidade ativa (cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991, p. 1045).
[12] Embora não se trate de processo inquisitivo, tal princípio fundamenta a busca da verdade – de ofício – pelo juiz constitucional (cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991, p. 1046), como a solicitação de informações (a título de diligências), prevista nos §§ 1º e 2º do art. 9º da Lei n. 9.868/99.
[13] A análise da inconstitucionalidade não se restringe ao pedido formulado inicialmente (cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991, p. 1046-1047).
[14] Observa-se a mitigação desse princípio, em função de uma análise mais abrangente das questões impregnadas com inconstitucionalidade material e formal (cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991, p. 1047-1048).
[15] Diz respeito à releitura da apreciação das questões de fato e de direito no âmbito do processo constitucional, a fim de aproximar a norma à realidade (cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991, p. 1048-1049).
[16] Sobre o tema, cf. MENDES, Gilmar Ferreira.
Jurisdição Constitucional: o controle abstrato de normas no Brasil e na Alemanha. São Paulo: Saraiva, 1996.
[17] Cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1991, p. 1042.
[18] Cf. HÄBERLE, Peter.
Hermenêutica Constitucional. A sociedade aberta de intérpretes da Constituição: contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1997; HÄBERLE, Peter.
Pluralismo y constitución: estudios de teoria constitucional de la sociedad abierta. Trad. Emilio Milkunda-Franco. Madrid: Tecnos, 2002.
[19] Cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000, p. 935.
[20] Cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000, p. 935.
[21] Cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000, p. 935.
[22] José Afonso da Silva possui entendimento contrário ao defendido no âmbito dessa pesquisa. Para o autor, o processo constitucional não possui conexão com o processo político (processo constituinte, de formação da Constituição ou de (re)constitucionalização), tão pouco com o processo legislativo, cuja competência é do parlamento. Entretanto, o próprio autor admite a extensão do conceito de processo constitucional, compreendendo não só os instrumentos de caráter estritamente jurisdicional, mas também sistuações de natureza política ou de caráter parajudicial, como se depreende do entendimento do professor Héctor Fix-Zamudio, para o qual o conceito de processo constitucional “se impõe com firmeza, para compreender a análise de todos os meios de resoluções de controvérsias de caráter constitucional e de tutela dos direitos fundamentais, ou quando não são estritamente processuais, como ocorre, por exemplo, com o
Ombudsman” (cf. SILVA, José Afonso da. El proceso constitucional. In: BAZÁN, Víctor (org.).
Defensa de la constitución: garantismo y controles. Buenos Aires: Ediar, 2003, p. 753 e 754).
[23] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 117.
[24] O professor Peter Häberle rechaça a idéia de “guardião da Constituição”, pois para o professor a proteção da Carta Magna é confiada a todos os cidadãos e a todos os órgãos estatais na mesma medida, sendo a democracia cidadã do Estado Constitucional contrária a estilizar um órgão como “supremo”, ou indicar um intérprete constitucional “autêntico” (Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 120).
[25] Cf. BONAVIDES, Paulo.
Curso de Direito Constitucional. 13. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 550.
[26] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 114-115.
[27] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 129.
[28] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 116.
[29] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 129.
[30] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 129.
[31] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 120-121. Cumpre ressaltar que no Brasil as decisões proferidas pelo STF possuem eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e para a Administração Pública das três esferas da Federação (no que se refere à ADC e às espécies de ADI – CF, art. 102, § 2º, c/c art. 28, parágrafo único, da Lei n. 9.868/99). Em relação à ADPF, o efeito vinculante e a eficácia da decisão contra todos se dirige aos demais órgãos do Poder Público (excetuando o STF e incluindo o Congresso Nacional), consoante a redação do art. 10, § 3º, da Lei n. 9.882/99. A súmula de efeito vinculante em matéria constitucional, a ser editada pelo STF, tem sua previsão no
caput e nos parágrafos do art. 103-A da Constituição, e conforme o entendimento do plenário do STF, precisa de lei ordinária para ser editada.
[32] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 121.
[33] O Senado Federal é o órgão competente para argüir publicamente os cargos relevantes da República, em razão de seus membros (pela idade mínima de 35 anos) possuírem experiência política e cultural (CF, art. 14, § 3º, VI,
a), por serem eleitos pelo voto majoritário (representantes diretos do povo) além de representarem, de forma isonômica, a vontade dos Estados-membros e do Distrito Federal (CF, art. 46,
caput e § 1º), mantendo (em tese) com sua função institucional o equilíbrio na apreciação da escolha dos ocupantes dos cargos republicanos.
[34] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 121-122.
[35] A esse respeito, Paulo Bonavides promove a globalização política da teoria dos direitos fundamentais, a fim de universalizá-los no campo institucional, de modo a auferir humanização e legitimidade. Nesse sentido, são as palavras do professor Bonavides: “A globalização política na esfera da normatividade jurídica introduz os direitos de quarta geração, que, aliás, correspondem à derradeira fase de institucionalização do Estado social. São direitos de quarta geração o direito à democracia, o direito à informação e o direito ao pluralismo. Deles depende a concretização da sociedade aberta do futuro, em sua dimensão da máxima universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as relações de convivência. A democracia positivada enquanto direito da quarta geração há de ser, de necessidade, uma democracia direta. Materialmente possível graças aos avanços da tecnologia de comunicação, e legitimamente sustentável graças à informação correta e às aberturas pluralistas do sistema. Desse modo, há de ser também uma democracia isenta já das contaminações da mídia manipuladora, já do hemertismo da exclusão, de índole autocrática e unitarista, familiar aos monopólios do poder. Tudo isso, obviamente, se a informação e o pluralismo vingarem por igual como direitos paralelos e coadjutores da democracia; esta, porém, enquanto direito do gênero humano, projeto e concretizado no último grau de sua evolução conceitual.” (Cf. BONAVIDES, Paulo.
Curso de Direito Constitucional. 17. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 571).
[36] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 122.
[37] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 122.
[38] O STF utiliza dessa prerrogativa, por meio de sua jurisprudência, para a criação do processo constitucional e de procedimentos referentes ao instituto do
amicus curiae.
[39] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 122.
[40] A Reclamação Constitucional ou o Recurso Constitucional de Amparo não possui hipótese semelhante no ordenamento brasileiro. Esta ação autônoma é um acesso ao TCF alemão gratuito e sem intervenção obrigatória de advogado a todos os cidadãos, mas apenas quando todos os recursos ordinários se esgotarem e desde que o cidadão tenha sido afetado pelo Poder Público em um dos seus direitos fundamentais ou equiparados (Cf. HÄBERLE, Peter. O Recurso de Amparo no Sistema Germânico de Justiça Constitucional.
Direito Público. Porto Alegre: Síntese; Brasília: Instituto Brasiliense de Direito Público, a. 01, n. 02, p. 83-137, out./dez. 2003, p. 88). No Brasil, os seus fundamentos estão espalhados pelas garantias constitucionais do
Habeas Corpus, em razão de não se exigir capacidade postulatória para o impetrante (CF, art. 5º, LXVIII, c/c CPP, art. 647 e 654), do Recurso Extraordinário, por contrariar direito fundamental contido na Constituição (CF, art. 102, III,
a), do Mandado de Segurança, em razão do direito líquido e certo (CF, art. 5º, LXIX) e dos institutos vetados pelo Presidente da República (cujas previsões legais estariam no art. 7º, § 1º, da Lei n. 9.868/99 e no art. 2º, II, da Lei n. 9.882/99), que permitiriam ao cidadão postular diretamente na qualidade de
amicus curiae ou de propor, sem a intervenção de advogados, uma Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), o que transformaria esse instituto em uma hipótese semelhante à Reclamação ou Recurso Constitucional de Amparo alemão. Com efeito, já existe a iniciativa parlamentar (Projeto de lei n. 6.543/06) para alterar a Lei n. 9.882/99, no sentido de permitir ao cidadão – cujo preceito fundamental fora lesado – o acesso ao STF para discutir a proteção ou reparação desse preceito.
[41] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 123-124.
[42] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 124-125.
[43] Nesse sentido, o STF possui “A Constituição e o Supremo”, uma iniciativa muito rica no sentido de editar um compêndio eletrônico (a Constituição Federal interpretada por sua jurisprudência) a fim de ser útil e acessível a todos, permitindo uma maior aproximação pelos cidadãos do conteúdo da Constituição.
[44] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 125-126.
[45] Cf. HÄBERLE, Peter. El Tribunal Constitucional Federal como modelo de una jurisdicción constitucional autónoma. Trad. Joaquín Brage Camazano.
Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 09, p. 113-139, 2005, p. 130, 135 e 139.
[46] Cf. BINENBOJM, Gustavo. A dimensão do
amicus curiae no processo constitucional brasileiro: requisitos, poderes processuais e aplicabilidade no âmbito estadual.
Direito Federal:
revista da Associação dos Juízes Federais do Brasil, v. 22, n. 78, p. 141-166, out./dez. 2004, p. 153.
[47] Cf. SILVA, Luiz Fernando Martins da. Amicus Curiae, Direito e Ação Afirmativa.
Revista Jurídica. Brasília, vol. 07, n. 76, dez. 2005/jan. 2006. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/ revistajuridica/index.htm>. Acesso em: 27.03.2006.
[48] Cf. BINENBOJM, Gustavo. A dimensão do
amicus curiae no processo constitucional brasileiro: requisitos, poderes processuais e aplicabilidade no âmbito estadual.
Direito Federal:
revista da Associação dos Juízes Federais do Brasil, v. 22, n. 78, p. 141-166, out./dez. 2004, p. 149.
[49] Cf. COELHO, Inocêncio Mártires. As idéias de Peter Häberle e a abertura da interpretação constitucional no Direito brasileiro.
Revista de Informação Legislativa, a. 35, n. 137, p. 157-164, jan./mar. 1998, p. 160. Nesse sentido, um exemplo de concretização das expectativas criadas perante as idéias de Peter Häberle para o contexto normativo das Leis n.(s) 9.868/99 e 9.882/99 parecem ter se consubstanciado no Código de Processo Constitucional do Peru – o CPCP, pois Pertencem ao âmbito de regulação do presente Código os processos constitucionais de
habeas corpus, habeas data, ação popular, de inconstitucionalidade, de amparo e de cumprimento, além dos conflitos de competência, todos previstos nos artigos 200 e 202 da Constituição peruana (cf. PERÚ. Ley n. 28.237, de 31.05.2004. Código Procesal Constitucional.
Comisión Andina de Juristas, Lima, 2006. Disponível em: <http://www.cajpe.org.pe/rij/legisla/peru/CPC.PDF>. Acesso em: 20.04.2006). Luís F. Castillo Córdova assevera que a principal virtude do CPCP é ter reunido em um único corpo legislativo a regulação referida a todas as garantias constitucionais, pois a cada vez que se deseja iniciar um processo constitucional se terá que aplicar os princípios gerais juntamente com os procedimentos específicos de cada processo. No mais, o conteúdo constitucional dos direitos fundamentais também é objeto de proteção das garantias, não tutelando fatos que não se relacionam diretamente com esse conteúdo material (cf. CASTILLO CÓRDOVA, Luis F. Primer Código Procesal Constitucional de alcance nacional en Latinoamérica: comentarios a la ley 28237.
Cuestiones constitucionales, n. 14, enero-junio 2006, p. 297-311. Disponível em: <http://www.ejournal.unam.mx/cuestiones/cconst14/CUC1413 .pdf>. Acesso em: 20.04.2006).
[50] Cf. SILVA, Christine Oliveira Peter da. Lei n. 9.868/99: uma proposta hermenêutica democraticamente adequada.
Estudos de Direito Público: homenagem aos 25 anos do mestrado em Direito da UnB. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p. 86-89.
[51] Cf. COELHO, Inocêncio Mártires. As idéias de Peter Häberle e a abertura da interpretação constitucional no Direito brasileiro.
Revista de Informação Legislativa, a. 35, n. 137, p. 157-164, jan./mar. 1998, p. 160. Dentre as disposições vetadas em razão da celeridade processual e da funcionalidade administrativa do STF estão os dispositivos da atual Lei n. 9.868/99 que determinavam a apresentação de informações pelos legitimados do art. 103 da CF, além do inciso II do art. 2º da Lei n. 9.882/99, que permitia a qualquer pessoa lesada ou ameaçada pelo Poder Público propor a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF).
[52] Cf. SILVA, Christine Oliveira Peter da. Lei n. 9.868/99: uma proposta hermenêutica democraticamente adequada.
Estudos de Direito Público: homenagem aos 25 anos do mestrado em Direito da UnB. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p. 85.
[53] Cf. SILVA, Christine Oliveira Peter da. Lei n. 9.868/99: uma proposta hermenêutica democraticamente adequada.
Estudos de Direito Público: homenagem aos 25 anos do mestrado em Direito da UnB. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p. 85.
[54] Cf. COELHO, Inocêncio Mártires. As idéias de Peter Häberle e a abertura da interpretação constitucional no Direito brasileiro.
Revista de Informação Legislativa, a. 35, n. 137, p. 157-164, jan./mar. 1998, p. 161.
[55] Cf. COELHO, Inocêncio Mártires. As idéias de Peter Häberle e a abertura da interpretação constitucional no Direito brasileiro.
Revista de Informação Legislativa, a. 35, n. 137, p. 157-164, jan./mar. 1998, p. 163-164; SILVA, Christine Oliveira Peter da. Lei n. 9.868/99: uma proposta hermenêutica democraticamente adequada.
Estudos de Direito Público: homenagem aos 25 anos do mestrado em Direito da UnB. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p. 89.
[56] Cf. HÄBERLE, Peter.
Pluralismo y constitución: estudios de teoria constitucional de la sociedad abierta. Trad. Emilio Milkunda-Franco. Madrid: Tecnos, 2002, p. 97.
[57] A esse respeito, há uma expectativa para a continuação do julgamento da ADPF n. 54. Trata-se de discussão acerca da possibilidade de se efetuar a “antecipação terapêutica do parto” de fetos com má formação ou ausência de cérebro (anencéfalos). Além da contribuição de peritos sobre a questão técnica e conceitual acerca de quando se inicia a vida humana, figuram como
amici curiae a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, a Associação Nacional Pró-Vida e Pró-Família – PRÓ-VIDA-FAMÍLIA, a Associação UNIVIDA, a Associação de Desenvolvimento da Família – ADEF, a Advocacia Cidadã pelos Direitos Humanos – ADVOCACI, a Conectas Direitos Humanos e Centro de Direitos Humanos – CDH, a Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, a Sociedade Brasileira de Genética Clínica, a Sociedade Brasileira de Medicina Fetal, o Conselho Federal de Medicina – CFM, a Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sociais e Direitos Representativos, a Escola de Gente, a
Igreja Universal, o Instituto de Biotécnica, Direitos Humanos e Gênero (cf. CARVALHO, Paulo Gustavo Medeiros.
O instituto do amicus curiae
como política pública de acesso ä justiça. Texto enviado por meio eletrônico [
[email protected]], recebido por [
[email protected]] em 25.03.2006). Cada uma das entidades contribui para a interpretação constitucional segundo os interesses das categorias que representam. Assim, as entidades religiosas ressaltam o direito à vida e buscam a improcedência do pedido, em razão dos fundamentos jurídico-religiosos que estabelecem o início da vida com a concepção. Outras entidades, como as de direitos humanos, dividem seus pontos de vista entre a vida do feto e o sofrimento dos pais em ter toda uma gestão e ver a criança falecer com pouco tempo de vida. A seu turno, as associações de pesquisadores e trabalhadores da saúde, além de defenderem a isenção dos profissionais na realização desse procedimento terapêutico, buscam viabilizar a possibilidade de utilização dos fetos para pesquisas, a fim de acelerar o encontro da solução desse problema. Por fim, há também as entidades que defendem a liberdade de escolha da mulher em relação à prosperação da gestação. Dentro desse contexto, ressalta-se que os
amici curiae não irão decidir o tema, mas contribuirão com seus pontos de vista para a construção de uma decisão plural dentro do âmbito normativo do processo constitucional.
[58] Cf. GUERRA FILHO, Willis Santiago.
Autopoiese do Direito na Sociedade Pós-Moderna: introdução a uma teoria social sistêmica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997, p. 21.
Informações Sobre o Autor
André Pires Gontijo
Bacharel em Direito pelo UniCEUB (1º/2002-2º/2006), Aluno do Programa de Mestrado em Direito das Relações Internacionais do UniCEUB (1º/2007), pesquisador do Núcleo de Estudos Constitucionais – NEC (UnB/UNICEUB) e do grupo de pesquisa Internacionalização dos Direitos (UniCEUB), aluno-pesquisador do 3º PIC/UniCEUB/CNPq (2º/2004-1º/2005), Servidor Público do Superior Tribunal de Justiça, lotado no Gabinete da Ministra Maria Thereza de Assis Moura (STJ)