A Imponente Atuação do Ministério Público Frente à Judicialização da Saúde

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Beatriz Borges Cruvinel Capareli – Graduada em Direito pela Universidade de Rio Verde –UNIRV. Pós-graduada em Direito do Consumidor pelo Instituto Luiz Flávio Gomes – LFG. Secretária auxiliar do Ministério Público do Estado de Goiás. ([email protected])

Francine Anne Alves Chaves Passos – Graduada em Direito pela Universidade Evangélica de Anápolis. Pós-graduada em Direito Empresarial pela Faculdade Gama Filho – RJ. Assessora de Promotor na 3ª Promotoria de Justiça de Rio Verde – GO. ([email protected])

Kamilla Lima Alves – Acadêmica de Direito da Universidade de Rio Verde/GO. (e-mail: [email protected])

Resumo: A Constituição Federal de 1988, garantiu direitos básicos a toda e qualquer pessoa sem distinção. Alguns desses direitos são prestados pelo Estado, como exemplo, o direito a saúde que é intrínseco ao direito a vida. Contudo, é perceptível a falha do Estado na garantia desse direito. O judiciário tornou-se indispensável na efetivação da prestação do serviço público à saúde, por meio do Mandado de Segurança, remédio constitucional, que garante direito líquido e certo que se torna a única esperança da sociedade. Diante desse cenário, o Ministério Público atua na garantia da prestação do serviço, seja como fiscal da lei ou na defesa do direito à saúde.

Palavras-chave:Direitos do cidadão, Constituição Federal, Entes Federativos, Responsabilidade do Estado.

 

Abstract: The Federal Constitution of 1988 granted to everybody basic rights without distinction. Some of these rights are provided by the state, such as the right to health that is intrinsic to the right to life. However, the failure of the State to guarantee this right is perceptible. The judiciary became indispensable for the provision of public services to health through the Writ of Mandamus, a constitutional remedy that guarantees a clear and certain right that becomes the only hope of society. In this scenario, the Public Prosecution acts to guarantee the provision of the service, either as a law inspector or in defense of the right to health.

Keyword: Citizen rights, State responsibility, Federal Constitucion, Federative entities

 

Sumário: Introdução. 1. Direito a saúde. 2. Separação dos poderes em relação a judicialização da saúde. 3. Responsabilidade do poder público. 4. O Ministério Público como função essencial à justiça. 5. Atuação do ministério público diante da judicialização da saúde. Considerações finais. Referências.

 

Introdução

Por meio do legislador originário, a Constituição Federal de 1988, estabeleceu o direito a saúde como um direito social, sendo este garantido a todo e qualquer cidadão sem distinção. Proibindo que este seja retirado ou restringido, de acordo com o Princípio da Vedação ao Retrocesso, ou seja, o legislador derivado diante de direitos e garantias só poderá ampliá-los.

Diante disso, percebe-se a importância que o direito a saúde recebeu no ordenamento jurídico. Contudo, diante das questões sociais percebemos que inúmeras são as vezes que as pessoas têm esse direito lesionado. Em um Estado Democrático de Direito, cabe aos governantes diminuírem as desigualdades sociais por meio de políticas públicas e ações afirmativas.

Vivemos um período de instabilidade política e econômica, em que as instituições públicas perderam a credibilidade social, advinda de um colapso causado pela crescente corrupção presente no sistema brasileiro. Quando os órgãos públicos entram em instabilidade, os que mais sofrem são as pessoas que tem como única ratio o serviço prestado pelo Estado, é nesse momento que percebemos o quanto o nosso país é desigual socialmente.

Nos deparamos com hospitais interditados ou até mesmo funcionando, mas com condições totalmente indignas. Filas de espera no Sistema Único de Saúde (SUS), essas que parecem não terem fim, ocasionando óbito de várias pessoas por falta de atendimento, podemos dizer por negligência do Estado em sua função primária, garantir direitos básicos ao cidadão.

Com a inércia do poder executivo, surge inúmeras ações no judiciário objetivando que o Estado garanta o direito líquido e certo do cidadão, sendo este o direito à saúde. Esse aumento exacerbado de ações, ficou conhecido como judicialização da saúde, expressão para uma triste realidade.

O Ministério Público como órgão essencial à justiça, tem como responsabilidade manter a ordem jurídica do Estado e promover a fiscalização do ente público em várias esferas. Diante de tal autonomia garantida pela Constituição Federal de 1988, nos resta questionar: Qual a atuação do MP, diante da ineficiência da prestação do serviço de saúde pelo Estado e quais seus limites e deveres?

Sendo o direito a saúde garantido constitucionalmente, reconhecido pelos Tribunais Superiores do Brasil; como entender o limite orçamentário e o princípio da separação dos poderes, frente a questão da judicialização do direito à saúde?

Quando o Estado “falha” com o cidadão, cabe a este “bater na porta” do judiciário pedindo que seja garantido o que é estabelecido em Lei.

 

  1. Direito a saúde

Alguns fatos históricos são essenciais para a evolução da sociedade, dentre tantos, é de extrema relevância destacar no presente artigo a criação da Organização Mundial de Saúde (OMS), que ocorreu em 1946. No preâmbulo de sua constituição, a saúde foi conceituada como um estado de completo bem-estar físico, mental e social sem distinção de raça, de religião, de credo político, de condição econômica ou social. Sendo assim, traz a Constituição da Organização Mundial da Saúde (OMS/WHO) 22 de julho de 1946: “A saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade. Gozar do melhor estado de saúde que é possível atingir constitui um dos direitos fundamentais de todo o ser humano, sem distinção de raça, de religião, de credo político, de condição econômica ou social”. (CONSTITUIÇÃO DA OMS, 1946)

Ademais, precisamos lembrar da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, onde define que todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar-lhe e a sua família, saúde, bem-estar, alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis.

Todavia, esse direito no Brasil, veio mesmo com a Constituição de 1988, onde o direito a saúde está estampado no artigo 6º, que estabelece os direitos sociais, e no artigo 196, assim vejamos o que dispõe o artigo 6º da Constituição Federal: “Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. (BRASIL, Constituição Federal, 1988)

O Min. do STF Ayres Britto ao julgar a Ação Cautelar 2.83623, afirmou que “a saúde é constitucionalmente qualificada como direito fundamental de dupla face (direito social e individual indisponível)”. (BRITTO, 2012)

Para Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino os Direitos Sociais são: “Os direitos sociais constituem as liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por objetivo a melhoria das condições de vida dos hipossuficientes, visando à concretização da igualdade social”. (ALEXANDRINHO e PAULO, 2010, p. 233.)

Os doutrinadores Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino, em sua obra trazem a interpretação do escritor José Afonso da Silva, que define o direito a saúde como sendo: “Prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais”. (SILVA, 2010, p. 233)

Diante disso, de acordo com o início do artigo 196, onde diz que “A saúde é um direito de todos”, poder-se-ia pensar em um sistema sem falhas, onde engloba não só assistência hospitalar ou de unidades básicas, mas, implicaria também nos fornecimentos de todos os medicamentos sejam eles de baixo ou alto custo, tratamentos, exames, recuperação e principalmente a prevenção, entre outros procedimentos.

O artigo 196, da Constituição Brasileira, preceitua: “Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso “universal igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação”. (BRASIL, 1988)

Portanto, o reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (art. 5º, caput, e 196) representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade.

Assim, o artigo 198 da Constituição Federal, formula a estrutura geral do Sistema Único de Saúde, considerando-o uma rede regionalizada e hierarquizada, organizada de acordo com algumas diretrizes.

Vejamos o que dispõe o artigo 198 da Constituição Federal: “Art. 198. As ações e serviços público de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: I – descentralização, com direção única em cada esfera de governo; II – atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; III – participação da comunidade”. (BRASIL, 1988)

Desta forma, quando se fala em saúde para o senso geral, é normal pensar em médicos, hospitais e avanços tecnológicos. Tornando natural, assim, que o Sistema Único de Saúde brasileiro, que deu forma ao artigo 196 e cuja criação também é constitucional pelo artigo 198, confunda-se com um plano de saúde público, voltado estritamente ao atendimento médico, para aqueles que não podem pagar pelo privado, na contramão do que discorre o artigo 196 e do que sacramenta a Lei Orgânica da Saúde (8.080 e 8.142/1990), que regulamenta o SUS.

Observa se, entretanto, que são várias as normas que tratam diretamente da saúde, o que evidencia uma grande preocupação do constituinte em dar efetividade às ações e programas voltados para essa área. Além de várias normas consagrada no ordenamento jurídico, podemos destacar o direito a saúde em face aos princípios da igualdade, da proporcionalidade, e da reserva do possível.

O princípio da Igualdade sofreu várias interpretações até os dias atuais, todavia, para Aristóteles, o princípio da igualdade consistia em “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida em que eles se desigualam”. Já o Princípio da Proporcionalidade na visão do critério da estrita necessidade, também conhecido como princípio da vedação de excesso, é capaz evitar abusos que possam vir a ocorrer sob o fundamento do direito à saúde, ou seja, a proporcionalidade exige que a solução seja adequada. Por fim, tem o Princípio da Reserva do Possível, que regula a possibilidade e a extensão da atuação estatal no que se refere à efetivação de alguns direitos sociais e fundamentais, tal como o direito a saúde, que é condicionado a prestação do Estado a existência de recursos públicos disponíveis.

Contudo, é necessário fazer uma observação, pois, as alegações de negativa de efetivação de um direito social com base no argumento da reserva do possível devem sempre serem analisadas com desconfiança. Portanto, não basta apenas alegar que não há possibilidade financeira de se cumprir a ordem judicial, é preciso demonstrar.

Além disso, deve ser ressaltado que os entes federativos são solidários entre si, pois o sistema de saúde é único. Destarte, a União, o Estado e os Municípios têm como obrigação a dispensa da prestação do serviço público de saúde de forma conjunta.

 

2. Separação dos poderes em relação a judicialização da saúde

A teoria da separação dos poderes foi analisada pela primeira vez por Aristóteles, em seu livro “Política”, no período absolutista, embasado no momento histórico vivenciado, observou a existência da divisão de funções em um único poder. Posteriormente veio Montesquieu em seu livro “O espírito das leis”, que descreveu a separação dos poderes como conhecemos hoje, seria necessário existir três órgãos, onde iriam exercer funções autônomas e independentes entre si.

A Constituição Federal de 1988, estabeleceu que: “Art. 2º. São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário” (BRASIL, 1988).  Além disso, definiu como cláusula pétrea: “Art. 60; § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: III – a separação dos Poderes; ” (BRASIL, 1988).

Traz o Doutrinador Pedro Lenza, 2015: “Dimitri, com precisão, observa que “seu objetivo fundamental é preservar a liberdade individual, combatendo a concentração de poder, isto é, a tendência ‘absolutista’ de exercício do poder político pela mesma pessoa ou grupo de pessoas. A distribuição do poder entre órgãos estatais dotados de independência é tida pelos partidários do liberalismo político como garantia de equilíbrio político que evita ou, pelo menos, minimiza os riscos de abuso de poder. O Estado que estabelece a separação dos poderes evita o despotismo e assume feições liberais”. (LENZA, 2015, p. 844)

A Teoria da Separação dos Poderes, define o Poder Executivo, que tem como função administrar o ente estatal; Legislativo, responsável pela elaboração das leis; e por fim o Judiciário, responsável por dirimir os conflitos, aplicar a lei ao caso concreto. Traz a doutrina que tais funções são definidas como típicas, inerentes a cada um dos poderes, de acordo com a teoria da tripartição dos poderes. E eles podem exercer funções atípicas, essas que devem estar estabelecidas na CF/88 de forma expressa.

Alguns doutrinadores fazem críticas a denominação tripartição de poderes, pois defendem que o poder é uno, ocorrendo apenas a repartição de funções. Esclarece Lenza, 2015: “Assim, todos os atos praticados pelo Estado decorrem de um só Poder, uno, indivisível e indelegável. Esses atos adquirem diversas formas, dependendo das funções exercidas pelos diferentes órgãos. O órgão legislativo, por exemplo, exerce uma função típica, inerente à sua natureza, além de funções atípicas, ocorrendo o mesmo com os órgãos executivo e jurisdicional”. (LENZA, 2015, p. 849)

Por meio da teoria dos freios e contrapesos, possibilita que haja um controle das atividades de cada poder, ou seja, um poder limitando o outro. Como exemplo temos a possibilidade de o poder judiciário declarar a inconstitucionalidade de uma lei. Diante dessa teoria adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro, tem-se a garantia que nenhum poder irá sobrepor-se ao outro, trazendo com isso independência harmônica nas relações do Estado.

Diante disso, podemos fazer uma análise quanto ao fato de o judiciário intervir no Poder Executivo, determinando a imposições de medidas para efetivação do direito à saúde.

De acordo com o doutrinador Grandini, 2010: “Um dos argumentos relacionados com a implementação de políticas públicas por determinação do Poder Judiciário é a de que tal medida fere de morte o princípio da separação dos poderes, argumento este com o qual, diga-se de passagem, não concordamos. Explica-se. A implementação de políticas públicas por determinação judicial não representa invasão de poderes nem ofensa à Constituição Federal, pois realizada dentro das peculiaridades do caso concreto e lastreada na dignidade da pessoa humana, ou seja, pela necessidade de preservação do núcleo essencial dos direitos fundamentais, em que se inserem os chamados direitos de subsistência, quais sejam, saúde, moradia, educação e alimentação. Além disso, é preciso reconhecer que a atividade implementadora do Poder Judiciário não lhe autoriza criar políticas públicas, mas apenas implementar as já existentes”. (GANDINI, 2010, p. 76 – 77)

Está incumbido ao judiciário controlar os abusos, podendo ser por ação ou omissão, exercidos pelos demais poderes nas suas respectivas competências. Sendo assim, o poder judiciário representado por seus órgãos, deverão intervir sempre que direitos fundamentais forem negligenciados. De forma expressa traz a CF/88: “Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. (BRASIL, 1988)

Desta forma, fica evidenciado que a falta de prestação de serviço público no âmbito da saúde, a falta de medicamentos, as filas de esperas sem fim, os hospitais em situações precárias, entre outros fatos que nos deparamos, trata-se de uma lesão ao direito a saúde.

De acordo com Ministro Roberto Barroso: “Onde não haja lei ou ação administrativa implementando a Constituição, deve o Judiciário agir. Havendo lei e atos administrativos, e não sendo devidamente cumpridos, devem os juízes e tribunais igualmente intervir. Porém, havendo lei e atos administrativos implementando a Constituição ne sendo regularmente aplicados, eventual interferência judicial deve ter a marca da autocontenção”. (BARROSO, texto judicial, p. 22)

Com base no Princípio da Separação dos poderes, estes são independentes. Contudo, ocorrerá interferência do poder judiciário ao Poder Executivo, quanto este não cumprir seu papel de garantir os anseios básicos da sociedade, de forma intrínseca direitos fundamentais e sociais, ou seja, a efetiva prestação do serviço de saúde.

De acordo com o doutrinador Bittar, 2005: “O Poder Judiciário cumpre um determinado papel na construção, proteção e garantia da efetividade dos direitos humanos, dentro da tradicional estrutura tripartite de poderes herdada da modernidade. Se uma sociedade na qual a cidadania se realiza é aquela que tem amplo acesso aos direitos, significa afirmar que estes direitos são realizados ou respeitados, e também que, quando são violados, aos mesmos é atribuída a devida proteção e garantia jurisdicional, o que torna a questão do papel do Judiciário um ponto central das discussões sobre o tema dos direitos humanos e, ainda mais, da eficácia dos direitos humanos”. (BITTAR, 2005, p. 306).

Diante dos fundamentos apresentados, fica evidente a legitimidade de o Poder Judiciário intervir para que o direito a saúde seja garantido pelos entes público, de forma contínua e com a qualidade que coloque em proteção o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

 

3. Responsabilidade do poder público

Em uma breve explanação referente a responsabilidade do Estado à saúde, adentra-se ao rol dos direitos e garantias fundamentais do ser humano, que é a vida, e sendo a vida, esta deve ser prioridade para o Estado, onde a saúde deve ser a primeira listada dentre todas as garantias constitucionais. Vejamos o que dispõe Leny Pereira da Silva: “Vale salientar que a competência quanto à responsabilidade do poder Público é comum à União, Estados, Distrito Federal e dos Municípios e que estes deverão cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência”, conforme o artigo 23, inciso II da CF. Desta forma, todos os entes da Federação, cada qual no seu âmbito administrativo, têm o dever de zelar pela adequada assistência à saúde aos cidadãos brasileiros”. (SILVA, p. 6, S/N)

Quando falamos em responsabilidade do Estado, estamos colocando nele todo encargo de obrigação dele para com a sociedade, para assegurar o cidadão o direito a saúde no seu contexto geral, desde o fornecimento de medicamentos até uma consulta com um médico especialista. De acordo com Géssica Bergonzi: “Com o reconhecimento da saúde como um direito social fundamental, o Estado passou a ter o dever de elaborar prestações positivas em prol do cidadão por intermédio de políticas públicas sociais e econômicas destinadas à promoção, à proteção e à recuperação da saúde. Deste modo, conforme o art. 6º da Carta Magna, o direito à saúde é um direito social, exigindo do Estado prestações positivas”. (BERGONZI, 2015, p. 17-18)

O Ministro Luiz Fux no Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n° 607381, enfatizou a solidariedade dos entes federativos para a prestação de serviços de saúde, sendo eles, o fornecimento de medicamentos, prevenção de doenças, bem como a necessidade de efetivação do direito social à saúde: “A última ratio do art. 196 da CF é garantir a efetividade ao direito fundamental à saúde, de forma a orientar os gestores públicos na implementação de medidas que facilitem o acesso a quem necessite da tutela estatal à prestação de serviços médico-hospitalares e fornecimento de medicamentos, além de políticas públicas para a prevenção de doenças, principalmente quando se verificar ser, o tutelado, pessoa hipossuficiente, que não possui meios próprios para custear o próprio tratamento. Dessa forma, os artigos 23, II, e 198, § 2°, da CF impõem aos entes federativos a solidariedade na responsabilidade da prestação dos serviços na área da saúde, além da garantia de orçamento para efetivação dos mesmos (Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n° 607381/SC, Primeira Turma, Supremo Tribunal Federal, Relator: Ministro Luiz Fux, Julgado em 31/05/2011, DJ 16/06/2011, p. 116)”. (BRASIL, 2011)

Quanto ao Limite orçamentário, este deveria não existir dentro da esfera governamental, pois quando falamos de saúde, falamos de vidas, e vidas não tem preço, sendo assim, o limite orçamentário deveria ser o que a sociedade, ou, o que o cidadão necessita para ter sua saúde garantida.

Segundo o Ministro do STF, Barroso: “É na Lei orçamentária que as sociedades democráticas definem suas prioridades, realizam suas políticas e fazem suas escolhas trágicas. Esse é o momento em que se deve discutir quanto vai para a educação, para a saúde, para a previdência, para funcionalismo público, para o transporte, para a publicidade institucional… Maior transparência na elaboração e apresentação do orçamento à sociedade, bem como, melhor controle na execução poderiam impor ao Judiciário maior grau de autocontenção. Penso que nisso seria especialmente verdadeiro ao se lidar com o fenômeno identificado como a judicialização da saúde”. (BARROSO, 2018, p.25).

Os gastos com a saúde pública, cada dia que passa são desproporcionais com o que a sociedade necessita. Segundo a Emenda Constitucional nº 95 de 2016: “Que institui um teto para os gastos públicos federais vinculado à inflação. Para tanto, a análise foi realizada em três etapas:  primeiramente, simulou-se a evolução do gasto em saúde de 2016 a 2036, pressupondo que o mesmo seja corrigido pela inflação, enquanto a economia cresça 2,5% ao ano a partir de 2018; em segundo lugar, mostrou-se a trajetória passada e presente das despesas com saúde, especialmente as transferências da União para os Municípios; e por fim, avaliou-se o planejamento de 2018 que consta no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2018, aprovado no Congresso Nacional”. (CNM, artigo de internet, S/N)

Na verdade, não há um valor estipulado para gastos com ações de saúde, que seja superior ao limite da lei orçamentária e que sobrepõe a inflação: “No caso da saúde, diz-se que o “teto” é, na verdade, um “piso”, pois não há impedimento para que o gasto com ações de saúde (ao contrário do gasto global do governo federal) cresça acima da inflação. Na prática, entretanto, devido à rigidez e inércia das despesas, especialmente as previdenciárias, não há como garantir o cumprimento do teto sem que os gastos com saúde também tenham sua evolução limitada à inflação. O gasto federal com ações em saúde somou R$ 106 bilhões em 2016, o que equivaleu a 13,2% da Receita Corrente Líquida (RCL) da União. A projeção para 2017, a partir do previsto no orçamento, é que esse gasto termine o ano em R$ 125 bilhões ou 14,7% da RCL. Para realizar as previsões, supôs-se que o gasto público encerrará 2017 em tal patamar e que, a partir de 2018, seja reajustado pela inflação, enquanto a RCL seguirá crescendo em linha com o PIB a uma taxa de 2,5% ao ano, acima do IPCA. Assim é possível projetar a seguinte trajetória para a despesa da União com saúde, considerando 2017 como ano-base do início da aplicação da regra do teto. No primeiro gráfico, pode-se verificar que o gasto em saúde será reduzido de 1,89% do PIB em 2017 para 1,51% do PIB em 2026 e 1,18% do PIB em 2036”. (CNM, artigo de internet, S/N)

Deve-se frisar que o Estado, quanto as políticas públicas, sofre algumas restrições, sendo uma de caráter formal, consubstanciada nas leis orçamentárias, e de caráter prático, que é a carência de recursos. Assim diz Paulo Timponi Torrent: “No que se refere especificamente à Administração Pública, a efetivação desse direito fundamental social demanda a elaboração de políticas públicas e, por óbvio, a disponibilidade recursos financeiros para a sua execução. Com efeito, os direitos sociais, também denominados prestacionais, materializam-se a partir de utilidades concretas, como educação e saúde; por isso exigem do Estado, para sua efetiva concretização, a definição de estratégias político-econômicas que viabilizem a execução dos programas de governo voltados a essa finalidade. Não é por outro motivo que se assevera que as políticas públicas, expressão dos direitos sociais, têm uma dimensão economicamente relevante para o Estado”. (TORRENTI, 2014)

Assim, o Estado tem que desempenhar seu papel pautado sempre pela razoabilidade, sempre tendo a visão do fato de que as necessidades relacionadas aos direitos sociais fundamentais são ilimitadas e os recursos, escassos. “A questão orçamentária é um elemento determinante para a realização da ordem econômica e social. O orçamento pode ser considerado, nesse contexto, um instrumento de governo, de administração pública, do qual se vale o Estado tanto para o desenvolvimento econômico, quanto para o desenvolvimento social e político”. (MÂNICA, 2007)

A lei orçamentária dentro dos direitos fundamentais, são absolutos e encontram os seus limites na necessidade da sociedade, tendo uma solução harmoniosa do conflito do dever e de gerar a eficácia da tutela do bem jurídico, que é a vida, prestando a sociedade um serviço eficaz para saúde, nem que seja esta mediante a tutela jurisdicional.

A importância do orçamento público, na nossa Carta Magna de 1988, como instrumento de governo, é facilmente perceptível quando se examina as normas constantes dos artigos 165 e seguintes. Também tem três leis que se sucedem, se complementam e condicionam a atuação do Poder Público, a Lei do Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA).

 

4. O Ministério Público como função essencial a justiça

O doutrinador Pedro Lenza (2014, p. 921), em sua doutrina traz que o surgimento do Ministério Público se deu da seguinte forma: “Há muita divergência doutrinária sobre o surgimento do Ministério Público, chegando alguns a apontar, há mais de quatro mil anos, no Magiaí, funcionário real no Egito Antigo, que tinha o dever de proteger os cidadãos do bem e reprimir, castigando os “rebeldes”. Outros, ainda, identificam o surgimento do Ministério Público na Antiguidade Clássica, na Idade Média ou até no direito canônico. Divergências à parte, a maioria da doutrina aceita, com mais tranquilidade, o seu surgimento na figura dos Procuradores do Rei do direito francês (Ordenança de 25.03.1302, de Felipe IV, “o Belo”, Rei da França), que prestavam o mesmo juramento dos juízes no sentido de estarem proibidos de exercer outras funções e patrocinar outras causas, senão as de interesse do rei”. (LENZA, 2014, 921)

São vários as questões históricas que retratam o surgimento do Ministério Público, contudo no direito brasileiro, o mesmo recebeu sua importância funcional por meio da Constituição Federal de 1988, consagrando como instituição permanente e independente de todos os outros poderes (Judiciário, Executivo e Legislativo). Traz o art. 127 da CF/88: “Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. § 1º – São princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional”. (BRASIL, 1988)

Com o advento de um Estado Democrático de Direito, surge a necessidade de órgãos que protegem direitos fundamentais, que possa atuar em prol daqueles que não possuem capacidade, garantir que o Estado esteja cumprindo com as suas funções, dentre outros fatores. O art. 129 da CF/88, trouxe as funções do Ministério Público, de forma expressa elencou como a atribuição garantir os direitos previstos na própria CF. “Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: II – Zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias à sua garantia”. (BRASIL, 1988)

Desta forma, o constituinte originário definiu expressamente as funções do Ministério Público, de forma a garantir a efetividade dos direitos fundamentais e sociais, tendo como ideal que o referido órgão seria guardião de tais direitos. Alexandre de Moraes esclarece em sua doutrina a função do Ministério Público diante do status constitucional: “Assim, não podemos nos esquecer que a proteção ao status (Jellinek) constitucional do indivíduo, em suas diversas posições, hoje, também é função do Ministério Público, que deve preservá-lo. Assim, uma das posições do status constitucional corresponde à esfera de liberdade dos direitos individuais, permitindo a liberdade de ações, não ordenadas e também não proibidas, garantindo-se um espectro total de escolha, ou pela ação ou pela omissão. São os status negativos. Outra posição coloca o indivíduo em situação oposta à da liberdade, em sujeição ao Estado, na chamada esfera de obrigações; é o status passivo. O status positivo, por sua vez, permite que o indivíduo exija do Estado a prestação de condutas positivas, ou seja, reclame para si algo que o Estado estará obrigado a realizar. Por fim, temos o status ativo, pelo qual o cidadão recebe competências para participar do Estado, com a finalidade de formação da vontade estatal, como é o caso do direito de sufrágio. Conclui-se, portanto, que a teoria dos status evidencia serem os direitos fundamentais um conjunto de normas jurídicas que atribuem ao indivíduo diferentes posições frente ao Estado, cujo zelo também é função do Ministério Público”. (MORAES, 2006, p. 552)

Por meio do legislador constituinte originário, que entendeu ser fundamental fortalecer a instituição, possibilitando que esta possa garantir ao indivíduo a fruição de todos os status constitucionais.

 

5. Atuação do ministério público diante da judicialização da saúde

O ordenamento jurídico brasileiro diante das lacunas legislativas, em relação a abertura constitucional de garantias de direitos e deveres, levantou questionamento doutrinário e nos tribunais superior, a respeito da legitimidade de o Ministério Público atuar em defesa dos direitos individuais e indisponíveis. Neste sentido é a lição de Watanabe (2011, p. 86): “Somente a relevância social do bem jurídico tutelando ou da própria tutela coletiva poderá justificar a legitimação do Ministério Público para a propositura de ação coletiva em defesa de interesses privados disponíveis.”.

Diante de tantos questionamentos, o STJ no Recurso Especial: 1681690 SP 2017/0160213-7, definiu alguns parâmetros: “ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SOB A SISTEMÁTICA DOS REPETITIVOS. DEMANDAS DE SAÚDE COM BENEFICIÁRIOS INDIVIDUALIZADOS INTERPOSTAS CONTRA ENTES FEDERATIVOS. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. (…) 3. A fronteira para se discernir a legitimidade do órgão ministerial diz respeito à disponibilidade, ou não, dos direitos individuais vindicados. É que, referindo-se a direitos individuais disponíveis e uma vez não havendo uma lei especifica autorizando, de forma excepcional, a atuação do Ministério Público (como no caso da Lei nº 8.560/1992), não se pode falar em legitimidade de sua atuação. Todavia, se se tratar de direitos ou interesses indisponíveis, a legitimidade ministerial já decorreria da redação do próprio art. 1º da Lei nº 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público). 4. Com efeito, a disciplina do direito à saúde encontra na jurisprudência pátria a correspondência com o próprio direito à saúde encontra na jurisprudência pátria a correspondência com o próprio direito à saúde encontra na jurisprudência pátria a correspondência com o próprio direito à vida, de forma que a característica da indisponibilidade do direito já decorreria dessa premissa firmada. 5. Assim, inexiste violação dos dispositivos do art. 6º do CPC/1973, já que a atuação do Ministério Público, em demandas de saúde, assim como nas relativas à dignidade da pessoa humana, tem assento na indisponibilidade do direito individual, com fundamento no art. 1º da Lei nº 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público). 6. Tese jurídica firmada: O Ministério Público é parte legítima para pleitear tratamento médico ou entrega de medicamentos nas demandas de saúde propostas contra os entes federativos, mesmo quando se tratar de feitos contendo beneficiários individualizados, porque se trata de direitos individuais indisponíveis, na forma do art. 1º da Lei nº 8.625/1993 (Lei Orgânico Nacional do Ministério Público). (STJ – Resp: 1681690 SP 2017/0160213-7, relator: Ministro OG FERNANDES, Data de Julgamento: 25/04/2018, s1 – PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Julgamento: DJe 03/05/2018)”. (BRASIL, 2018)

Pode-se concluir quanto a legitimidade de o Ministério Público atuar em defesa de quaisquer direitos e interesses transindividuais de grande repercussão social, sendo indiscutível a competência na atuação em face da garantia do direito à saúde.

O Conselho Nacional do Ministério Público em 18 de dezembro de 2018, expediu a Recomendação nº 68, em que foram definidos parâmetros para atuação do MP, dentre eles encontra-se a responsabilidade perante o direito a saúde: “Art. 1º. Os membros do Ministério Público, incumbidos do dever de zelar pelo direito fundamental à saúde, de relevância pública constitucional, respeitadas suas especificidades regionais e sua independência funcional, empreenderão esforços na execução das atividades da Ação Nacional em defesa do direito à saúde, por meio de projetos ou ações coordenadas, assegurada a formação de parcerias e de trabalho em rede de cooperação com setores público e privado, com a sociedade civil organizada e com a comunidade em geral”. (BRASIL, 2018)

Percebe-se desta forma, a legitimidade do Ministério Público em atuar na esfera judicial em face dos entes federativos, para que seja garantido o direito a saúde. Pois a CF/88 designou como atribuição, que o mesmo deve agir em defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Por sua vez, a Lei nº 8.625, de 12 fevereiro de 1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público dos Estados), no seu art. 32, inciso I, comanda, in verbis: “Art. 32 – Além de outras funções cometidas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e demais lei, compete aos Promotores de Justiça dentro de suas esferas de atribuições: I – Impetrar HARBEAS CORPUS e MANDADO DE SEGURANÇA e requerer correição parcial inclusive perante os Tribunais locais competentes”.

Mediante a impetração de Mandados de Segurança, instituto que garante direito líquido e certo, o Ministério Público atua como parte para pleitear a garantia do recebimento de um tratamento adequado a recuperação do paciente. O Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, tem entendimento consolidado quanto a responsabilidade dos Entes Federativos e legitimidade do MP: “REMESSA NECESSÁRIA. MANDADO DE SEGURANÇA. GARANTIA CONSTITUCIONAL À SAÚDE. DIABETES MELLITUS TIPO 1. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ATO OMISSIVO DA AUTORIDADE IMPETRADA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO CONFIGURADO. SENTENÇA CONCESSIVA DA SEGURANÇA CONFIRMADA. FIXAÇÃO DE PRAZO PARA RENOVAÇÃO DA PRESCRIÇÃO MEDICAMENTOSA. 1. O Ministério Público é parte legitima para pleitear tratamento médico ou entrega de medicamentos nas demandas de saúde propostas contra os entes federativos, mesmo quando se tratar de feitos contendo beneficiários individualizados, porque se refere a direitos individuais indisponíveis, na forma do art. 1º da Lei nº 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público). 2. O fornecimento de medicamentos, terapias e tratamentos imprescindíveis à saúde do enfermo trata-se de direito social cuja prestação é imposta à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, solidariamente, não podendo sofrer embaraços por autoridades administrativas no sentido de reduzi-lo ou de dificultar-lhe o acesso. (TJ – GO – Reexame Necessário: 01972883520168090012, Relator: SEBASTIÃO LUIZ FLEURY, Data de Julgamento: 02/05/2019, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 02/05/2019)”. (GOIÁS, 2019)

O órgão como fiscal da lei, desenvolve suas funções garantindo que direitos positivados, expressos na CF/88, sejam efetivados no plano da realidade. Estabelece a Resolução nº 68: “Art. 2º. As unidades do Ministério Público devem empreender esforços para remessa das informações dos resultados das atividades desenvolvidas na Ação Nacional, em especial das fiscalizações e/ou inspeções da gestão pública de saúde, para sistematização e publicação pela Comissão de Planejamento Estratégico (CPE) e pela Comissão de Defesa dos Direitos Fundamentais (CDDF)”. (BRASIL, 2018)

Deve ser ressaltado que no âmbito administrativo, o MP tem responsabilidades e funções a serem desenvolvidas, traz a Resolução nº 68: “Art. 3º. Recomenda-se, ao Ministério Público da União e dos estados, a adoção de efetivas providências que fortaleçam a atuação constitucional dos órgãos de execução na tutela do direito à saúde, em especial: I – Criar unidades especializadas na defesa da saúde, inclusive do trabalhador, observadas as peculiaridades de cada instituição; II – Criar Centros de Apoio Operacional de Defesa da Saúde, ou órgãos equivalentes, para proporcionar o devido suporte técnico aos órgãos de execução; III – Regulamentar a atuação prioritariamente na tutela coletiva, observadas as peculiaridades de cada instituição”. (BRASIL, 2018)

No âmbito do Ministério Público Estadual, visando maior atuação e efetivação das suas atribuições, encontra-se promotorias e procuradorias especializadas na matéria, que atuam em prol do cidadão e que tem como dever, a defesa do direito à saúde, assim, o cidadão busca apoio nestas, para que tenha o seu direito a saúde garantido.

Contudo, mesmo com a atuação incisiva ministerial, com várias Promotorias e Procuradorias, e até mesmo com a abertura de Centro de Apoios Operacionais, inclusive com Centro de Apoio a Saúde, muitas vezes, o paciente fica à mercê da burocracia administrativa exigida pelos Entes Federativos.

Diante desse fato, mesmo o Ministério Público sendo um órgão atuante, na maioria das vezes não tem êxito nos casos concretos, necessitando então, recorrer as vias judiciais, para que o cidadão não fique desamparado diante de um direito constitucional que lhe é assegurado.

Ademais, cumpre salientar, que o Ministério Público órgão com independência funcional, autônomo, estabelecido constitucionalmente, não pertencente a nenhum dos poderes federativos da União, exerce função de fiscalização e proteção aos direitos indisponíveis, não tendo assim capacidade para interferir no âmbito do poder executivo, porém faz com que se cumpra os direitos e garantias do cidadão.

 

Considerações finais

Diante da analise realizada no presente artigo, foi possível definir parâmetros que norteiam o direito a saúde, sendo de fundamental importância para compreensão do contexto social, a historicidade da evolução da sociedade e de suas necessidades cotidianas, deixando evidente a responsabilidade do Estado perante a população, seja em que área for, saúde, segurança, moradia, entre outras.

A saúde é um dos direitos sociais da pessoa, expressa na Constituição Federal brasileira de 1988, direito individual indisponível e homogêneo, sendo um serviço de relevância pública do Estado, que tem o dever de promover, proteger, resguardar e recuperar a saúde do paciente. Concomitantemente um direito líquido e certo da pessoa, que repercute veementemente na sociedade como um todo.

Portanto, com a separação dos Poderes, sendo Poder Executivo, Legislativo e Judiciário, onde o primeiro administra, o segundo elabora as leis e o último aplica a lei ao caso concreto, trouxe uma organização onde possibilitou a administração estatal de forma efetiva e imparcial.

No que se refere especificamente ao direito a saúde, na responsabilidade do Estado, nos direitos e garantias fundamentais do ser humano, que é a vida, e sendo a vida, esta deve ser prioridade para o Estado, onde a saúde deve estar em primeiro lugar dentre todas as garantias constitucionais, a efetivação desse direito fundamental social demanda a elaboração de políticas públicas e, por óbvio, a disponibilidade recursos financeiros para a sua execução. No que diz respeito aos recursos financeiros que podem ser destinados à execução das diretivas relacionadas às diversas áreas de interesse da sociedade, diretivas essas que, em última instância, materializam os direitos previstos nas leis e na Constituição Federal, tem-se que a sua limitação pode representar óbice à ampla disponibilização dos serviços de saúde.

Com o advento de um Estado Democrático de Direito, surgiu a necessidade de órgãos que protegem direitos fundamentais, atuarem em prol daqueles que não possuem capacidade, garantir que o Estado esteja cumprindo com as suas funções, dentre outros fatores. O art. 129 da CF/88 elencou atribuições ao Ministério Público, dando capacidade e legitimidade para exercer as referidas funções.

Assim, pode-se concluir que a legitimidade do Ministério Público é atuar em defesa de quaisquer direitos e interesses transindividuais de grande repercussão social, sendo indiscutível a competência na atuação em face da garantia do direito à saúde, visando maior atuação e efetivação das suas atribuições, onde atua em prol do cidadão e que tem como dever, a defesa do direito à saúde, alcançando uma solução justa e que garantirá, dentro do possível, a máxima efetividade desses direitos.

 

Referências

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