A (Não) Aplicabilidade Efetiva Da Lei Brasileira De Inclusão Da Pessoa Com Deficiência Na Mobilidade Urbana No Interior Do Estado Do Amazonas

Autora: Renata da Silva Mendonça –  acadêmica do Curso de Direito pela Universidade do Estado do Amazonas – UEA. email: [email protected].

Coautora: Alice Arlinda Santos Sobral – advogada, Mestre e Doutora em Direito, Professora de Direito Penal na Escola de Direito da Universidade do Estado do Amazonas – UEA, email:[email protected]

Resumo: Este artigo tem como propósito explicitar a necessidade de conhecimento da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência no interior do Estado do Amazonas, âmbito municipal de Itacoatiara, no que se refere a efetiva aplicação do que está previsto em seu texto quanto a mobilidade urbana, bem como promover uma prática que deve ser adotada, em regra, na projeção, criação e conservação do espaço de uso coletivo, que viabilize o livre acesso da pessoa com deficiência, permitindo a todos igualdade de oportunidades e eliminando assim a perpetuação de qualquer tipo de barreira existente.

Palavras-chave: Pessoa com Deficiência. Inclusão. Igualdade. Mobilidade urbana.

 

Abstract: This article aims to clarify the need for knowledge of the Brazilian Law for the Inclusion of Persons with Disabilities in the interior of the State of Amazonas, within the municipal scope of Itacoatiara, with regard to the effective application of what is provided for in its text regarding urban mobility, as well as promoting a practice that should be adopted, as a rule, in the projection, creation and conservation of the space for collective use, which enables the free access of the person with disabilities, allowing everyone equal opportunities and thus eliminating the perpetuation of any type of existing barrier.

Keywords: Disabled Person. Inclusion. Equality. Urban mobility.

 

Sumário:  Introdução. 1. A Constituição Federal de 1988 e a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência. 2. Mobilidade Urbana: Um breve estudo sobre seu contexto histórico, previsão e aplicação segundo o ordenamento jurídico vigente. 3. Município de Itacoatiara e o descumprimento da Lei Federal: Estudo de Caso. 4. Fiscalização e penalidades aplicadas ao descumprimento da legislação de amparo à pessoa com deficiência. Conclusão. Referências.

 

INTRODUÇÃO

A tratativa do tema deste trabalho mostra-se de alta relevância no atual contexto vivenciado pela sociedade, por se tratar de um direito já amparado pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, Lei nº 13.146 de 06 de julho de 2015 e ainda com pouca visibilidade quanto a sua aplicação.

O presente estudo possibilitará o entendimento a população do município de Itacoatiara quanto a extensão dos direitos assegurados no ordenamento jurídico bem como quanto a responsabilidade e a consciência dos demais agentes da sociedade, haja vista que o desconhecimento e até mesmo a falta de uma explicitação acerca do assunto de forma clara e objetiva, resulta no desrespeito ao que está previsto na carta magna e na legislação específica, isto é, igualdade a todos sem distinção de qualquer natureza.

As desigualdades sociais perduram desde a origem da civilização moderna que sempre olhou para essa questão com uma perspectiva cultural predominantemente excludente, o que ao longo dos anos foi sendo trazida aos poucos ao debate político, culminando, posteriormente, na elaboração de normas jurídicas que amparassem os direitos dessa expressiva parcela da sociedade.

Com a promulgação da Constituição Federal do Brasil de 1967, foi dado o primeiro passo na caminhada pela busca de equidade social, uma vez que passou a tratar, em seu texto, da pessoa com deficiência, denominando-a como “excepcional”, sendo reconhecido posteriormente por meio da emenda constitucional número 12, que ampliou a extensão do rol de direitos e ainda promoveu a correção da antiga forma de tratamento passando a denominar-se como “deficiente”.

A Constituição Federal de 1988, por sua vez, demonstrou que a expressão deficiente já não era mais adequada, trocando o termo de tratamento para “pessoa portadora de deficiência”. Todavia, ficou claro que o próprio termo utilizado para classificação, majorava às diferenças, ficando demonstrado que a forma mais adequada de tratativa seria “pessoa com deficiência”, nos termos da convenção da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre os direitos das pessoas com deficiência, sendo incorporada ao texto constitucional por força do decreto legislativo nº 186/2008 e ainda o decreto nº 6.949/2009.

Com a aplicação do princípio da isonomia, o qual consiste na afirmação de que todos são iguais perante a lei sem qualquer tipo de discriminação, buscou-se o tratamento igualitário dos cidadãos, todavia, tal preceito deve sofrer a devida adequação, mesmo estando expressamente claro na carta magna, quando se tratar da pessoa com deficiência pois, todos devem ser tratados iguais na medida de suas desigualdades para que assim haja efetiva justiça e equidade de direitos buscando igualar as oportunidades, mesmo que de forma diferente para cada ser humano.

Marcelo Novelino (2013, p. 473-475) explicita que:

“A igualdade é instrumento pelo qual a obrigação de respeitar as demais pessoas deve ser distribuída de modo universal.

Os direitos de igualdade possuem uma singularidade que os diferencia dos demais direitos fundamentais. Estes possuem um âmbito de proteção no qual estão contemplados diferentes domínios (vida, liberdade, privacidade, propriedade…) cujas intervenções, para serem consideradas legítimas (restrições) devem ter uma justificação constitucional. No caso dos direitos de igualdade, não há um âmbito de proteção material e por consequência, não há o que se falar em sua restrição. O princípio da igualdade não possui um conteúdo material específico. Trata-se de um princípio que possui um caráter reacional, ou seja, pressupõe a existência de elementos de comparação para a análise da igualdade ou desigualdade de tratamento.

(…)

 Os direitos de igualdade podem ser diferenciados em duas dimensões, conforme o fim ao qual se destinam. O Princípio da Igualdade Jurídica, visa a impedir que sejam adotados tratamentos diferenciados para situações essencialmente iguais ou tratamentos iguais para situações essencialmente diferentes sem uma razão legítima para tal. O Princípio da Igualdade Fática, por seu turno, tem por objetivo central a redução de desigualdades existentes no plano fático, o que exige necessariamente a adoção de um tratamento jurídico diferenciado.”

 

Hoje, depois da conquista de um rol de direitos os quais devem ser resguardados, a Constituição Federal de 1988 busca exprimir que todos são iguais independente de raça, cor, nacionalidade, gênero, religião ou ainda deficiência e busca ainda, que todos tenham uma vida digna, sem percalços, quer os oriundos de falta de políticas de mobilidade urbana, quer aqueles provenientes de uma cultura ainda pouco enraizada por parte dos próprios cidadãos.

Todavia, é comum verificar o descumprimento deste preceito fundamental em todos os estados brasileiros, em especial, no interior do Estado do Amazonas, mais especificamente no Município de Itacoatiara/AM, cidade que localiza-se a 269 Km da capital Manaus, possuindo aproximadamente 102.701 habitantes no ano de 2020, sendo classificada como a terceira maior cidade do Estado e ainda possuindo a segunda maior economia da região.[1]

Mas antes de se iniciar o estudo de caso, é necessário falar sobre a acessibilidade e mobilidade que são de grande importância para entendimento do tema aqui abordado. Conceitos estes que, em regra, deveriam caminhar lado a lado, evoluindo na mesma medida que o direito deve acompanhar as mudanças sociais, demonstrando a importância de em harmonia se construir uma sociedade com igualdade de oportunidades todavia, não é o que efetivamente acontece.

 

  1. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E A LEI BRASILEIRA DE INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

Para início do estudo, deve ser observado primeiramente as previsões legais trazidas pela Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988 atinentes ao assunto, que em seu artigo 6º explica os direitos sociais a que todos devem usufruir de forma ampla e irrestrita:

 

Art. 6º “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.”

 

Ademais, o artigo 21, da referida lei em seu inciso XX, determina que a União deve instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos sendo complementado pelo artigo 182 que imprime que a política de desenvolvimento executada pelo Poder Público Municipal, deve ter por objetivo a ordenação do pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade garantindo o bem estar de seus habitantes. Desse modo a CF/88 introduz os princípios basilares necessários para a ampliação dos direitos de forma equitativa visando a cidadania e a inclusão social.

Em seguida, a fim de deliberar acerca da integração dos meios de transporte com o rol de direitos já previstos mas ainda não especificados, foi promulgada, a Lei nº 12.587 de janeiro de 2012, que instituiu as Diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, trazendo como principal objetivo a inclusão e integração promovida nos mais diferentes tipos de transportes que possibilitem a locomoção de pessoas de forma irrestrita e contemplando a acessibilidade bem como o transporte de cargas em todo o território nacional. Esta lei foi um dos primeiros passos no desenvolvimento de políticas públicas acerca da mobilidade urbana que contemplassem pela primeira vez o interesse social atrelado ao desenvolvimento tecnológico e econômico do país.

Posteriormente, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), veio para unir todas as legislações atinentes ao assunto, conceituando em seu artigo 1º a sua finalidade que é assegurar e promover, em condições de igualdade o exercício de direitos e das liberdades fundamentais pelas pessoas com deficiência.

O referido estatuto é, sem dúvidas, um marco histórico de proteção aos direitos da pessoa com deficiência no ordenamento jurídico o qual se coaduna com os direitos defendidos pela Convenção sobre as Pessoas com Deficiência adotada pela Organização das Nações Unidas – ONU em Assembleia Geral realizada no dia 13 de dezembro de 2006, para comemorar o dia internacional dos Direitos Humanos, reunião da qual o Brasil fez parte. Na oportunidade foi deliberado a respeito da importância de se assegurar os direitos da pessoa com deficiência a nível global.

O que acabou influenciando a legislação de vários países no desenvolvimento e efetivação de políticas públicas que torna-se possível a realização de direitos tão importantes no desenvolvimento e cultura a nível mundial, dando início a um debate contínuo de busca por melhorias e acertos nas leis já implementadas. Trazendo à tona o conceito de Desenho Universal o qual surgiu para atendimento de anseios vivenciados pelo grupo de pessoas com deficiência e do grupo de arquitetos, engenheiros, urbanistas e designers que desejavam a realização da democratização ocasionada pelo uso dos espaços não com a criação de locais específicos de atendimento aos anseios mas sim comuns a todos com as mais variadas possibilidades de acesso viáveis disponíveis.[2]

A Norma Brasileira ABNT NBR 9050, validada em 30 de junho de 2004 tendo sido atualizada através da emenda 1 de 03 de agosto de 2010, dispõe sobre a Acessibilidade a Edificações, Mobiliário, Espaço e Equipamentos urbanos às condições de acessibilidade como um de seus principais objetivos, conceituando em seu teor o Desenho Universal como aquele que visa atender à maior gama de variações possíveis das características antropométricas e sensoriais da população. (2004,p. 03)[3]

A inclusão de pessoas com deficiência positivada no estatuto em estudo, assegura no seu texto a visão de correção dos atos da própria sociedade, buscando fazer com que os cidadãos enxerguem as formas de diminuir os fatores que levam a exclusão e consequentemente encontrem as melhores soluções para incluir o deficiente na comunidade proporcionando a efetivação da igualdade no exercício da capacidade jurídica e diminuindo as barreiras diárias.

Para melhor entendimento do conceito é indispensável observar a complementação realizada no artigo 2º da Lei nº 13.146/15:

Art. 2º. “Considera-se pessoa com deficiência aquela que possui impedimento de longo prazo seja de natureza física, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.”

Em termos técnicos é possível analisar que tal lei comporta o maior rol de proteção de direitos previstos no ordenamento jurídico brasileiro ligados as pessoas com algum tipo de incapacidade. Nela é possível tratar do direito à vida, habitação e reabilitação, saúde, educação, moradia, trabalho, cultura, esporte, turismo, previdência social e mobilidade urbana.

Resta necessária a compreensão das diferenças entre os conceitos de acessibilidade e mobilidade urbana e o que cada um engloba como forma de demonstrar a integralização do que estar previsto na Carta magna com as leis que surgiram como forma de ampliar um rol de direitos já abarcados.

A acessibilidade e a mobilidade urbana caminham juntas e são assuntos em questão desde que a área urbana era menor que a área rural. A mobilidade urbana surge a partir da necessidade de tornar possível a acessibilidade com igualdade de oportunidades eliminando-se as barreiras que já existam ou venham a surgir, sendo esta viabilizada através de serviços de transporte público e privado, veículos, terminais, estações, pontos de parada, sistema viário e a prestação do serviço.

O artigo 3º, inciso I traz a conceituação de acessibilidade, conforme segue:

Art. 3º “Para fins de aplicação desta Lei, consideram-se

I – Acessibilidade: a possibilidade de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informações e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida.”

A acessibilidade urbana possui base legal em inúmeras legislações, como na Constituição Federal, nos artigos 5º; 7º, XXXI; 23, II; 24, XIV; 37, VIII; 203, IV, V; 208, III, IV; 227, §1º, II, §2º e 244, na Lei de Acessibilidade – Decreto de lei 5.296, de 2 de dezembro de 2004, no Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei Federal nº 13.146/2015, artigo 3º) e ainda na ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) – Norma NBR9050. A mesma pode ser classificada como conjunto de meios que viabilizam a inclusão do deficiente através da igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

Sobre o tema, a jurisprudência é uníssona:

“RECURSO ESPECIAL – AÇÃO CONDENATÓRIA – ACESSIBILIDADE EM TRANSPORTE AÉREO – CADEIRANTE SUBMETIDO A TRATAMENTO INDIGNO AO EMBARCAR EM AERONAVE – AUSÊNCIA DOS MEIOS MATERIAIS NECESSÁRIOS AO INGRESSO DESEMBARAÇADO NO AVIÃO DO DEPENDENTE DE TRATAMENTO ESPECIAL – RESPONSABILIDADE DA PRESTADORA DE SERVIÇOS CONFIGURADA – REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO IMPROCEDENTE. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. Hipótese: Trata-se de ação condenatória cuja pretensão é o reconhecimento da responsabilidade civil da companhia aérea, por não promover condições dignas de acessibilidade de pessoa cadeirante ao interior da aeronave. (…) 3. O Brasil assumiu no plano internacional compromissos destinados à concretização do convívio social de forma independente da pessoa com deficiência, sobretudo por meio de garantia da acessibilidade, imprescindível à autodeterminação do indivíduo com dificuldade de locomoção.3.1. A resolução nº 9/2007 da Agência Nacional de Aviação Civil, cuja vigência perdurou de 14/06/2007 até 12/01/2014, atribuiu as empresas a obrigação de assegurar os meios para acesso desembaraçado da pessoa com deficiência no interior da aeronave, aplicando-se aos fatos versados na demanda. (…) 4. Nos termos do artigo 14, caput, da Lei nº 8.078/90 o fornecedor de serviços responde objetivamente pela reparação dos danos causados ao consumidor, em razão da incontroversa má-prestação do serviço por ele fornecido, o que ocorreu na hipótese. (…) Incidência da Súmula 7 do STJ. Verba indenizatória mantida em R$15.000,00 (quinze mil reais) 6. Recurso parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido.”[4]

Ao conceituar acessibilidade, faz-se necessária o entendimento quanto ao significado de barreira, conforme o artigo 3º do Estatuto da Pessoa com Deficiência:

Art. 3º. “Para fins de aplicação desta Lei, consideram-se:

(…)

IV – Barreiras: qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que limite ou impeça a participação social da pessoa, bem como o gozo, a fruição e o exercício de seus direitos à acessibilidade, à liberdade de movimento e de expressão, à comunicação, ao acesso à informação, à compreensão, à circulação com segurança, entre outros.”

É de suma importância falar das barreiras existentes, pois através delas é que pode-se chegar ao entendimento final do que infere na mobilidade urbana e acessibilidade no todo. As barreiras encontradas pela pessoa com deficiência podem ser classificadas de vários tipos, dentre elas:

“I – Caráter arquitetônico – projeção de edifícios públicos ou privados que não atentem para a acessibilidade;

II – Nos transportes – tipos de transportes e as devidas adaptações bem como as vias de trânsito.

III – Nas comunicações – dificuldades para transmissão de mensagens;

IV – Atitudinais e tecnológicas – ações discriminatórias sejam via internet ou pessoal.” (TORQUES, Ricardo, 2019, p.06)

Cada uma destas, de maneira isolada, prejudica o deficiente de diversas formas, seja na locomoção, transporte, psicologicamente ou até mesmo na interação social o que pode ocasionar danos irreversíveis.

 

2. MOBILIDADE URBANA: UM BREVE ESTUDO SOBRE SEU CONTEXTO HISTÓRICO, PREVISÃO E APLICAÇÃO SEGUNDO O ORDENAMENTO JURÍDICO VIGENTE.

Segundo Gomide & Galindo (2015, p.01), considera-se mobilidade urbana como sendo “as condições de deslocamento humano e de bens pela cidade, independente da forma de transporte empregada: coletiva ou individual, motorizado ou não; tal conceito atrela-se ainda ao plano diretor de cada cidade/estado aos quais, através de uma política de planejamento, devem estudar as formas de proporcionar a melhor oportunidade e atendimento a este direito a cada indivíduo.

O conjunto de Diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, instituída pela Lei nº 12.587 em 03 de janeiro de 2012, por sua vez, conceitua mobilidade urbana em seu artigo 4º, inciso II, como “condição em que se realizam os deslocamentos de pessoas e cargas no espaço urbano”. A acessibilidade, por outro lado é caracterizada, como “facilidade disponibilizada às pessoas que possibilite a todos autonomia nos deslocamentos desejados, respeitando-se a legislação em vigor”, conforme o inciso III também do referido artigo.

Tal política tem como um de seus fundamentos a acessibilidade universal bem como a equidade de todos os cidadãos ao acesso do transporte público coletivo e ainda no uso do espaço público de circulação, vias e logradouros.

A Lei número 10.257 de 10 de julho de 2001, regulamenta as Diretrizes Gerais das Políticas Urbanas, em seus artigos 39 e 40, trazendo a conceituação expressa de plano diretor, conforme segue:

Art. 39. “A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no art. 2o desta Lei.

Art. 40. O plano diretor, aprovado por lei municipal, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana.

  • 1º. O plano diretor é parte integrante do processo de planejamento municipal, devendo o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual incorporar as diretrizes e as prioridades nele contidas.
  • 2º. O plano diretor deverá englobar o território do Município como um todo.
  • 3º. A lei que instituir o plano diretor deverá ser revista, pelo menos, a cada dez anos.
  • 4º. No processo de elaboração do plano diretor e na fiscalização de sua implementação, os Poderes Legislativo e Executivo municipais garantirão:

I – a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade;

II – a publicidade quanto aos documentos e informações produzidos;

III – o acesso de qualquer interessado aos documentos e informações produzidos.”

Com base no §3º da lei acima, o plano diretor de cada cidade deverá repassar por revisão a cada 10 (dez) anos; em Itacoatiara, o plano diretor em vigor começou sua efetividade pela Lei Municipal número 76, de 27 de setembro de 2006, tendo o mesmo passado por mais 2 revisões, uma no ano de 2008 (Lei nº 119 de 2 de dezembro e ainda em 2011 (Lei nº 182, de 25 de maio de 2011).

Ao realizar-se leitura e análise da lei municipal, vislumbra-se que seu texto possui lacunas ao tratar do tema de acessibilidade no âmbito da mobilidade urbana, vez que em seus títulos tal como no corpo de seu texto o único momento que aborda o tema é o artigo 96, inciso VI, que versa:

Art. 96. “As normas aplicáveis às obras e às edificações, regulamentadas por Lei Municipal específica, devem sempre tem por escopo precípuo:

(…)

VI – aos princípios de acessibilidade universal.”

A partir de então surgem os seguintes questionamentos, será que realmente está sendo observado tal princípio? Se observado os cidadãos possuem acesso a todas as informações e orientações? Quais medidas estão sendo tomadas pela gestão do município para acabar com a desigualdade social e reforçar a inclusão de todos? Essas e muitas outra dúvidas permanecem muitas das vezes sem respostas, por negligência dos cidadãos que esperam as coisas acontecerem em vez de lutarem por seus direitos, por autoridades que se aproveitam do desconhecimento de seu eleitorado para prática daquilo que beneficia a maioria e não uma parcela da população.

Em Itacoatiara um dos órgãos que busca defender os direitos da Pessoa com Deficiência é a Associação dos Deficientes Físicos de Itacoatiara (ADEFITA), fundada desde 1985 é uma entidade sem fins lucrativos, localiza-se na Rua Álvaro França, nº 1928, bairro Colônia. Possui como compromisso a defesa dos direitos da Pessoa com deficiência física, no intuito de promover a inclusão social, através da inserção em grupos de socialização, programas sociais e atividades desportivas.

Segundo dados fornecidos e atualizados do ano de 2020, levando-se em consideração apenas o número de associados à ADEFITA, tem-se o quantitativo de deficientes cadastrados por tipo de deficiência sejam elas físicas, intelectuais, auditivas, motoras ou múltiplas, incluindo moradores da zona urbana e rural, como segue na tabela abaixo:

Dados Estatísticos, Associação dos Deficientes Físicos de Itacoatiara (ADEFITA), 2020.[5]

É de suma importância, ressaltar que embora o número total de deficientes levantados nos dados estatísticos acima pareça expressivo, nem de longe chega a caracterizar a totalidade populacional dos munícipes que de fato possuem alguma deficiência e por conseguinte alguma necessidade especial, haja vista muitos, desconhecerem seus direitos bem como os órgãos de amparo.

Segundo estudo desenvolvido pelo TCU (Tribunal de Contas da União), publicado em seu portal, no ano de 2010 a mobilidade urbana possui quatro pilares, quais sejam:

“1) integração do planejamento do transporte com o planejamento do uso do solo;

2) melhoria do transporte público de passageiro;

3) estímulo ao transporte não motorizado;

4) uso racional do automóvel.”[6]

Com uma simples análise dos tópicos aqui elencados, insta salientar que existem muitas dificuldades vivenciadas diariamente pela população, das quais pode-se destacar a baixa qualidade das vias urbanas e calçadas em Itacoatiara. Ao atrelar tal problemática à pessoa com deficiência, faz-se essencial a ampliação desse campo de proporção vez que uma pessoa usuária de cadeira de rodas, por exemplo, necessita para sua locomoção de ruas e estabelecimentos com rampas, vias largas e bem asfaltadas, de modo que possibilitem as manobras que terão de ser realizadas diariamente.

O artigo 46 do Estatuto da Pessoa com deficiência versa que:

Art. 46. “O direito ao transporte e à mobilidade da pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida será assegurado em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, por meio de identificação das vias de acesso e de eliminação de todos os obstáculos e barreiras aos mesmos.”

Quando se trata de explorar o tema “igualdade de oportunidades”, como alude o artigo acima, observa-se um conflito com a realidade vivenciada pelos deficientes físicos, a exemplo do serviço de transporte público fornecido a esta parcela da população, em que quando não falta a adaptação necessária dos veículos para o transporte de pessoas usuárias de cadeira de rodas, deixa a desejar no preparo de funcionários aptos a lidar com as limitações naturalmente inerentes àqueles indivíduos. A partir daí inicia-se uma das formas de manifestação diária de desigualdade.

Proporcionar o acesso irrestrito ao transporte público torna-se uma das mais importantes formas de demonstrar a aplicação efetiva da lei de inclusão bem como a de mobilidade urbana.  Outro ponto importante e que não pode passar despercebido, é quanto a disponibilidade de estacionamentos, pois, são previstos pela Lei de Acessibilidade e a Norma NBR 9050 da ABNT que hajam vagas preferenciais, demarcadas de acordo com as normas técnicas as quais possibilitem o acesso aos locais necessários, como bancos, escolas, padarias, farmácias e supermercados, a exemplo, sem encontro de barreira a cada esquina fazendo com que haja o desestímulo da participação em sociedade.

Os prédios públicos e privados já pré-existentes devem sofrer adaptações que obedeçam ao princípio do desenho universal enquanto que os novos já devem ser projetados obedecendo o referido princípio.

A democracia se concretiza na medida em que o exercício da cidadania é resguardado. O ato de votar, a exemplo, não inclui apenas o deslocamento aos locais de votação, mas também o investimento e análise prévia do que é necessário ser feito para criar condições mínimas para uma votação ao deficiente de forma igualitária. Assim como nas escolas, que independente de possuírem alunos com algum tipo de incapacidade devem estar preparadas para recebe-los quando procuradas, como forma de incentivo a inclusão e melhor desenvolvimento da criança e do adolescente.

A garantia ao lazer bem como o exercício da cidadania andam juntos pelo cumprimento daquilo que está previsto na Constituição Federal. Existem cidades onde há a promoção de incentivo fiscal para as empresas que realizarem as adaptações necessárias rampas, elevadores, meio alternativo para o não uso das escadas. Todavia ainda é comum encontrar locais que não efetuaram as devidas adequações ou que ainda estão em processo para a sua aplicação, o que além de retardar e prejudicar a consumação de direitos adquiridos ainda podem ocasionar danos irreparáveis a quem depende de um simples acesso adequado, o que demonstra que ainda existem muitos avanços a serem conquistados para que a desigualdade não continue se perpetuando.

É notório que em todos os quesitos aqui elencados, é possível vislumbrar os avanços realizados. Todavia, a maior entrave para efetivar cada direito é a ignorância da sociedade em respeitar o direito de outrem, o direito ao qual não faz uso e ainda, do descaso dos gestores municipais e estaduais, levando em conta não ser um problema que atinja grande parte de seu eleitorado e por último mas não menos importante, a lentidão de cumprimento da lei em vigência, principalmente em cidades menores e afastadas onde a fiscalização e punição pelo descumprimento não prepondera.

Em um panorama internacional[7] vale a pena destacar países que podem ser considerados verdadeiros modelos de acessibilidade de pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida por meio da projeção de espaços públicos e privados bem como no transporte público que são contemplados por desenhos universais orgânicos e intuitivos. A exemplo, pode-se falar do Japão que por ser considerado o país com a maior população de idosos, já possui uma estrutura de acessibilidade para esta população o que muito se pode aproveitar para a outra parcela da cidadãos com tanta ou mais mobilidade reduzida, como é o caso das pessoas com deficiência. Neste país podemos encontrar banheiros amplos, carrinhos elétricos para utilização na locomoção dentro de supermercados, lojas e ainda nas ruas, semáforos que emitem sinal sonoros e calçadas rebaixadas que facilitam o acesso por pessoa usuária de cadeira de rodas.

Por sua vez, o Canadá encara a inclusão como ponto importante a ser observado em suas políticas públicas. Considerado como um dos países que mais possuem prédios públicos acessíveis, além de um transporte público 100% inclusivo, onde há a implantação de um serviço público no qual através de uma ligação se torna possível que o cadeirante seja buscado em sua casa para realização de suas atividades o que diminui as barreiras de socialização.

Já na Alemanha é possível encontrar ruas, em sua maioria, sem tantas ladeiras, além de passagens gratuitas para pessoas com deficiência nos transportes públicos e ainda a existência de um cartão que permite o acesso e fornecimento de descontos para ir a lugares e eventos o que motiva a inclusão através da cultura.

Se houver uma análise completa quanto a realidade brasileira no tema aqui abordado e ainda com o panorama de países que são modelos a serem seguidos, como Alemanha, Japão e Canadá, será possível notar que ainda há uma longa jornada em busca do respeito e efetivação do direito basilar de inclusão previsto na legislação vigente, estando o Brasil muito longe da realidade já vivenciada em outros países o que se é admirável tendo em vista que o mesmo possui um dos tributos mais caros do mundo, porém, não demonstra retorno através de projetos inclusivos nos estados, capitais e municípios.

 

3. MUNICÍPIO DE ITACOATIARA E O DESCUMPRIMENTO DA LEI FEDERAL: ESTUDO DE CASO

Após a conceituação e explanação realizadas, resta haver um redirecionamento da análise para os descumprimentos. Embora no Brasil, haja uma cultura pré-estabelecida de desrespeito à lei vigente, onde as necessidades especiais alheias passam despercebidas, é necessário observar a forma com que cada um dos agentes podem interagir em favor da desconstrução dessa cultura de modo que a responsabilidade seja no somente de um governo, mas de toda uma sociedade.

Os gestores estaduais e municipais por sua vez, não disponibilizam meios de fiscalização necessária, o que dá mais ênfase de que a sociedade faz o que quer pois não haverá uma punição efetiva.

No município de Itacoatiara, composto por mais de 100 mil habitantes, não seria diferente. A cultura de não observância e desrespeito é diariamente observada, constatando a afirmação de que a lei não possui vigor efetivo facilmente pois, é comum encontrar ruas sem o asfaltamento correto, sem precisar de muito esforço ver-se calçadas irregulares ou até mesmo inexistentes, falta de sinalização nas principais vias de acesso e quando tem são desrespeitadas por ultrapassagens perigosas e irregulares que se tornam comum por não haver fiscalização.

O transporte público já devia ter se tornado realidade em um município com mais de 100 mil habitantes e em sua maioria de baixa renda, pois, em virtude de Itacoatiara ser a terceira maior cidade do Estado do Amazonas e ainda por estar próximo à Capital deveria ser uma dos exemplos ao se falar em desenvolvimento no interior do Estado do Amazonas, proporcionando assim a diminuição de desigualdades que privam pessoas diariamente de serem inseridas no contexto social em que vivem realizando suas atividades da vida civil sem ter que passar por qualquer tipo de diferenciação em razão de uma limitação pré-existente ou ocasionada.

Ao falar em respeito ao deficiente, não se pode apenas responsabilizar a gestão do município, pois, apesar da maior parcela de contribuição ser responsabilidade do poder público, os próprios habitantes, por desconhecimento das leis e até mesmo negligenciando o cumprimento ao pensar apenas no interesse próprio e não no bem comum, promovem a desigualdade por meio atitudes impensadas e injustificáveis, das quais é possível evidenciar abaixo:

Os pontos elencados são poucos diante da grande extensão de descaso vivenciada constantemente por pessoas que iguais na medida de suas desigualdades buscam apenas ter uma vida digna onde possam exercer sua cidadania de forma digna e justa sem precisarem estar constantemente passando por adaptações que muitas das vezes pessoas com total capacidade física e motora não precisam passar.

Resta claro portanto, que enquanto não houver uma fiscalização efetiva do cumprimento do que está em lei pela iniciativa pública, social e privada, Itacoatiara continuará parada no tempo aguardando que o melhor aconteça enquanto a evolução dos seus direitos permanece sem garantias.

 

4. FISCALIZAÇÃO E PENALIDADES APLICADAS AO DESCUMPRIMENTO DA LEGISLAÇÃO DE AMPARO À PESSOA COM DEFICIÊNCIA

            Existem formas pré-definidas de como penalizar àqueles que descumprem as leis em vigência, abaixo é possível verificar alguns tipos de infrações classificados por cada tipo de lei.

O Estatuto da Pessoa com Deficiência, traz em seus artigos 88 a 91 a relação de crimes que sempre irão ter como agente passivo a pessoa com deficiência bem como as medidas administrativas e penalizações que devem ser tomadas caso ocorram em casos específicos, como segue:

Art. 88. “Praticar, induzir ou incitar discriminação de pessoa em razão de sua deficiência:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

  • 1º Aumenta-se a pena em 1/3 (um terço) se a vítima encontrar-se sob cuidado e responsabilidade do agente.
  • 2º Se qualquer dos crimes previstos no caput deste artigo é cometido por intermédio de meios de comunicação social ou de publicação de qualquer natureza:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.”

O artigo 89 e 91, por sua vez, especificam em seu teor penalizações ligadas aos cuidados essenciais da Pessoa com deficiência bem como a sua manutenção:

Art. 89. “Apropriar-se de ou desviar bens, proventos, pensão, benefícios, remuneração ou qualquer outro rendimento de pessoa com deficiência:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Parágrafo único. Aumenta-se a pena em 1/3 (um terço) se o crime é cometido:

I – por tutor, curador, síndico, liquidatário, inventariante, testamenteiro ou depositário judicial; ou

II – por aquele que se apropriou em razão de ofício ou de profissão.

Art. 90. Abandonar pessoa com deficiência em hospitais, casas de saúde, entidades de abrigamento ou congêneres:

Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa.

Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem não prover as necessidades básicas de pessoa com deficiência quando obrigado por lei ou mandado.

Art. 91. Reter ou utilizar cartão magnético, qualquer meio eletrônico ou documento de pessoa com deficiência destinados ao recebimento de benefícios, proventos, pensões ou remuneração ou à realização de operações financeiras, com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Parágrafo único. Aumenta-se a pena em 1/3 (um terço) se o crime é cometido por tutor ou curador.”

Observa-se que em todas as espécies de crimes elencados na Lei 13.146/15 existe a previsão de agravamento em até 1/3 caso sejam cometidas por tutor ou curador ou ainda por quem de alguma forma deva resguardar os direitos da pessoa com deficiência.

Além das tipificações penais, é importante salutar que o Estatuto da Pessoa com Deficiência alterou a Lei nº 7.853 de 24 de outubro de 1989, que dispõe sobre o apoio a pessoas com deficiência, para prever como crime punível com reclusão de 2 a 5 anos e multa as condutas elencadas em seu artigo 8º, tendo suas penas agravadas, conforme §1º ao 4º, em 1/3 quando for praticada contra menor de 18 anos e quando praticado em atendimento de urgência e de emergência.[8]

No trânsito é comum diariamente serem visualizadas as maiores infrações e discriminações à pessoa com deficiência, situações estas vexatórias que muitas das vezes ceifam a vida de várias pessoas ou ainda ocasionam danos irreversíveis. Segundo dados fornecidos pelo Jornal Acrítica em matéria publicada em Julho de 2019, 11 vidas foram ceifadas nas rodovias do Estado do Amazonas, pelos fatores de excesso de velocidade, condições estruturais das estradas e a desobediência às normas de trânsito.[9]

O Código de Trânsito Brasileiro, Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, enumera em seu artigo 181 e incisos, alguns tipos de infrações que podem vir a serem cometidas no trânsito como: estacionar em vagas destinadas ao deficiente,  impossibilitar a utilização das rampas disponíveis nos estabelecimentos por estacionarem em lugares proibidos, não respeito a devida utilização das faixas de pedestres e ainda elenca a penalização aplicada a cada uma das condutas podendo ser multa e anotação de infração caracterizadas como leve, grave e gravíssima.

A Lei nº 10.048 de 08 de novembro de 2000 foi promulgada para regulamentar a Priorização de Atendimento a Grupos de Pessoas Específicos (Lei das Filas) que merecem algum tipo de atenção/facilitação. Em seu texto classifica que pessoas com deficiência, idosos com idade igual ou superior à 60 anos, gestantes, lactantes, pessoas com crianças de colo e os obesos deverão ter atendimento prioritário nas filas, repartições públicas, empresas concessionárias de serviços públicos e instituições financeiras.

Tal lei versa ainda em seu artigo 3º que:

Art. 3º. “As empresas públicas de transporte e as concessionárias de transporte coletivo reservarão assentos, devidamente identificados, aos idosos, gestantes, lactantes, pessoas portadoras de deficiência e pessoas acompanhadas por crianças de colo.”

São inúmeros os pontos elencados restando demonstrado que em simples atividades diárias com a colaboração do poder público, gestores municipais e ainda de toda a sociedade é possível tornar o dia à dia de quem possui algum tipo de limitação melhor.

Mas diariamente, não é o que ocorre no todo, a ignorância e ainda o descaso dispensado por aqueles que estão na busca apenas de seus anseios gera um rol de desigualdades que podem ser citadas facilmente, a exemplo, pessoas que sentam em vagas prioritárias e mesmo na presença de pessoas a quem a vaga é destinada não sedem o lugar, que procuram tirar vantagens em filas pouco importando se a pessoa que está mais próxima de ser atendida é alguém com algum tipo de incapacidade ou mobilidade reduzida, banheiros que não proporcionam a devida adaptação, prédios sem rampas de acesso e elevadores  o que impede o acesso a serviços essenciais fazendo assim, com que estas passem por um desgaste ainda maior ao tentarem vivenciarem suas rotinas de forma equitativa.

A Lei das Filas, dispõe em seu artigo 6º quais apenas aplicadas a quem descumprir o que estar previsto:

Art. 6º “A infração ao disposto nesta Lei sujeitará os responsáveis:

I – no caso de servidor ou de chefia responsável pela repartição pública, às penalidades previstas na legislação específica;

II – no caso de empresas concessionárias de serviço público, a multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) a R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), por veículos sem as condições previstas nos arts. 3º e 5º;

III – no caso das instituições financeiras, às penalidades previstas no art. 44, incisos I, II e III, da Lei no 4.595, de 31 de dezembro de 1964.

Parágrafo único. As penalidades de que trata este artigo serão elevadas ao dobro, em caso de reincidência.”

A Política Nacional de Mobilidade Urbana, institui em seu artigo 15 os meios de fiscalização a serem usados para verificação da efetiva aplicação do que está prescrito em lei, abarca como soluções a participação conjunta da sociedade e do Poder Público com a criação de órgãos colegiados que debatam sobre as questões pertinentes ao assunto, instituição de ouvidorias que realizem a verificação e cumprimento das especificações ligadas à Mobilidade Urbana, bem como a realização de audiência públicas que integralizem os anseios da sociedade com o poder de mudar dos seus governantes.

A partir das análises, positivadas em lei, é possível a visualização de um extenso rol de penalidades que devem ser aplicadas a nível nacional, não só no município de Itacoatiara. Todavia, trazendo a questão ao meio social vivenciado, será possível verificar que existem órgãos especializados em cada campo demonstrado em Itacoatiara que podem realizar a devida organização, incentivo e fiscalização através de implantação de projetos e políticas públicas ligadas ao tema o que não extinguirá as irregularidades mas diminuirá drasticamente os percentuais de descumprimento pelos cidadãos influenciando em um desenvolvimento social coerente.

 

CONCLUSÃO

Após a elucidação dos fatos trazidos ao presente estudo, pode-se inferir que não há a aplicabilidade efetiva da integralidade dos direitos assegurados na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, que muito embora tenha apresentado uma significativa evolução histórica, permanece subutilizada em muitos momentos por uma série de fatores enraizados na cultura sociológica de cada região.

Constatou-se ainda, que a inclusão da pessoa com deficiência atrelada a mobilidade urbana é sem sombra de dúvidas um dos temas que merece atenção e prioridade de todos. Pois, além de trazer à tona uma reflexão sobre a desigualdade social que é ampliada pela dicotomia existente entre as leis em vigor e o que realmente é colocado em prática também demonstra a importância da dignidade da pessoa humana em sentido material por meio da acessibilidade e da inclusão social igualando-se o cidadão na medida de suas desigualdades.

É possível ainda verificar-se que o problema em questão pode ser solucionado de forma preventiva por meio de programas educacionais de cunho informativo e inclusivo, quais sejam, palestras, amostras, seminários a fim de aproximar a escola deste debate social, bem como por meio da criação de projetos a serem desenvolvidos em coparticipação pela gestão municipal, escolas, empresas e toda sociedade itacoatiarense, além de medidas corretivas que deverão ser adotadas após os diversos setores econômicos, educacionais e fiscalizadores passarem pela devida capacitação.

Há de se falar ainda da criação e estudo de parcerias com as associações de amparo, empresas públicas e privadas na implementação de melhorias nas vias de acesso aos mais diversos estabelecimentos, como também a realização de manutenção dos acessos já existentes na cidade, os quais deverão ser acessados através da implementação de transporte público adaptado observando-se as normas previstas pela ABNT e pelo desenho universal.

Portanto, resta claro o entendimento de que ainda há muito a ser galgado na busca pelo cumprimento efetivo da lei, o qual deverá ser priorizado através da observância pela gestão pública com participação da sociedade dos princípios fundamentais que devem nortear a elaboração de projetos e planos diretores garantindo assim a inclusão da pessoa com deficiência atrelada a mobilidade urbana com o intuito de se ter uma cidade construída por todos e para todos.

 

 REFERÊNCIAS

BARBOSA, Adriana Silva, Mobilidade Urbana para Pessoas com Deficiência no Brasil: um estudo de blogs. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/urbe/2015nahead/2175-3369-urbe-2175-3369008001AO03.pdf. Acesso em: 01/09/2020.

 

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BRASIL. Lei número 12.587, de 03 de janeiro de 2012, Promulga a Política Nacional de Mobilidade Urbana, Diário Oficial da União, Brasília. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12587.htm. Acesso em: 01/10/2020.

 

BRASIL. Lei número 10.048, de 08 de novembro de 2000, Promulga a Lei Prioridade de Atendimento às Pessoas que Especifica, Diário Oficial da União, Brasília. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l10048.htm. Acesso em: 17/10/2020.

 

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[1] Segundo estimativas baseadas no último senso realizado pelo IBGE no ano de 2010. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/am/itacoatiara/panorama

[2] SERRA, José. Desenho Universal – Habitação de interesse Social – Cartilha do Governo do Estado de São Paulo, PDF. Disponível em: www.mpsp.mp.br. Acesso em: 18/10/2020.

[3] ABNT NBR 9050:2004, Disponível em: http://www.turismo.gov.br/sites/default/turismo/o_ministerio/publicacoes/downloads_publicacoes/NBR9050.pdf. Acesso em: 17/10/2020.

[4] STJ – Resp: 1611915 RS 2016/0085675-9, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data do Julgamento: 06/12/2018, T4 – Quarta Turma, Data de Publicação: Dje 04/02/2019

[5] Associação dos Deficientes Físicos de Itacoatiara (ADEFITA), Amazonas, dados estatísticos atualizado no ano de 2020 conforme cadastro dos associados.

[6] Áreas Temáticas – TCU – Mobilidade Urbana, 2010. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/tcu/paginas/contas_governo/contas_2010/fichas/Ficha%205.2_cor.pdf

[7] GARCIA, Vera, 2020. Desafios da Acessibilidade no Brasil: um comparativo com outros países. Disponível em: https://www.deficienteciente.com.br/desafios-da-acessibilidade-no-brasil-um-comparativo-com-outros-paises.html

[8] Art. 8º da Lei nº7.853/1989 disponível na íntegra em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7853.htm.

[9] Matéria completa publicada no dia 26/07/2019, disponível em: https://www.acritica.com/channels/manaus/news/acidentes-de-transito-no-amazonas-ja-tiraram-onze-vidas-somente-em-2019.

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