Educação como instrumento de efetivação da democracia

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Resumo: Partindo da concepção delineada pela Constituição Federal de 1988, em que a federação brasileira é instituída como Estado Democrático de Direito, o presente estudo visa demonstrar a importância da educação cidadã como instrumento de efetivação dos direitos democráticos, como meio de traduzir os anseios da sociedade em políticas públicas e como forma de aproximação dos conceitos ética e política. Considerando a análise dos movimentos populares que ocorreram no Brasil em 2013 evidenciou-se que, em razão dos entraves relativos às deficiências na educação cidadã e devido à desorganização dos manifestantes, diversas conquistas do movimento se perderam ao longo do tempo. Nesse sentido, esse trabalho visa discorrer acerca da educação cidadã com enfoque na fragilidade dessa área no país. Sabe-se que o efetivo exercício dos direitos  democráticos somente ocorrerá quando os indivíduos participarem ativamente nas decisões do Estado, o que prescinde de educação jurídica política, que somente será alcançada através da reforma na educação básica, grade curricular e melhoria na alfabetização funcional.

Palavras-chave: Democracia. Estado Democrático de Direito. Política. Direito. Cidadania. Ética. Educação. Analfabetismo funcional. Participação.

Sumário: 1. Introdução; 2. O Estado Democrático de Direito; 3. Direitos fundamentais: direito político como essencial ao exercício da cidadania; 4. Educação como instrumento de efetivação da democracia; 5. A educação no Brasil; 6. Conclusão; Referências.

1. INTRODUÇÃO

A capacidade de mobilização social e a participação política são referenciais importantes para o aprimoramento e reafirmação do Estado Democrático de Direito, uma vez que os movimentos sociais constituem-se um meio de expressão dos interesses públicos e permitem a aproximação do Estado e da sociedade. Portanto, as manifestações populares que ocorreram no Brasil em 2013 podem ser consideradas um marco democrático na história do país. Nessa ocasião, milhares de brasileiros foram às ruas protestar contra as mais diversas causas: aumento das tarifas de transporte público, corrupção, educação, PEC 37, gastos com a Copa do Mundo de 2014 e etc.

Inicialmente restrito a poucos milhares de participantes, os atos dos manifestantes ganharam grande apoio popular em meados de junho, em especial após a forte repressão policial contra os grupos.  Destaca-se a ausência de articulação de uma liderança centralizada do movimento e a carência de objetivos claros nos protestos perpetrados em 2013. Na ocasião notou-se um clima de insatisfação que gerou um movimento de grandes proporções, porém realizado de maneira desfocada, devido à existência de objetivos diversos e à ausência de organização. Com o passar dos meses os ânimos se acalmaram, as eleições de 2014 ocorreram, as reinvindicações foram esquecidas e os ganhos se perderam, como quando ocorreu o aumento das tarifas de transporte público sem a respectiva melhoria no serviço prestado, observados em 2014 e 2015 em diversos municípios brasileiros.

Em uma breve análise do referido movimento, pode-se perceber que as manifestações foram o resultado de um descontentamento da população frente à gestão da coisa pública e descaso dos políticos em meio aos escândalos de corrupção, um verdadeiro “grito de socorro”. Nesse sentido, cabe asseverar que as manifestações não podem ser consideradas uma solução permanente, nem uma medida que deva ocorrer rotineiramente, e sim algo com caráter excepcional, uma vez que o envolvimento dos cidadãos e a participação efetiva dos mesmos nas decisões políticas deve se dar de forma permanente e contínua. Portanto, a despeito das garantias constitucionais existentes, mostra-se necessário promover o real engajamento dos cidadãos na política mediante a efetiva compreensão dos mesmos das questões envolvidas.

A compreensão dos direitos constitucionais e do ordenamento jurídico brasileiro exige o estudo e a interpretação que parte do pressuposto de entendimento de diversos conceitos jurídico políticos. Portanto, a efetiva participação popular demanda o conhecimento do sistema político adotado pelo país, sendo a educação cidadã imprescindível para fins de efetivação dos direitos democráticos. Desse modo, o povo deve ser capaz de compreender os preceitos da Constituição de 1988 e o sistema político para fins participar das decisões emanadas pelo poder público, que atua no sentido de alcançar o bem comum em representação dos interesses da sociedade.

2. O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, lei maior de uma sociedade ocidental politicamente organizada, instituiu o denominado Estado Democrático de Direito, in verbis:

“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL”. (Constituição Federal, 1988, grifo nosso)

O conceito descrito acima abrange a concepção de Estado, de Estado de Direito e de Estado Democrático. Conforme preceitua o ilustre filósofo Immanuel Kant (1997), o Estado pode ser designado como coisa pública (res publica) que tem por liame o interesse de todos os indivíduos de viver em sociedade. Tem-se, portanto, que o ente público originou-se da vontade do homem e da busca pelo bem comum, posto que a “sociedade natural” não detinha os mecanismos necessários para promover a paz e o bem estar de seus membros. Neste raciocínio assevera Immanuel Kant:

“O ato pela qual um povo se constitui num Estado é o contrato original. A se expressar rigorosamente, o contrato original é somente a idéia desse ato, com referência ao qual exclusivamente podemos pensar na legitimidade de um Estado. De acordo com o contrato original, todos (omnes et singuli) no seio de um povo renunciam à sua liberdade externa para reassumi-la imediatamente como membros de uma coisa pública, ou seja, de um povo considerado como um Estado (universi). E não se pode dizer: o ser humano num Estado sacrificou uma parte de sua liberdade externa inata a favor de um fim, mas, ao contrário, que ele renunciou inteiramente à sua liberdade selvagem e sem lei para se ver com sua liberdade toda não reduzida numa dependência às leis, ou seja, numa condição jurídica, uma vez que esta dependência surge de sua própria vontade legisladora”. (KANT, 2002, p.158)

O Estado de Direito é aquele no qual o poder público encontra-se sujeito ao ordenamento jurídico e aos limites impostos por este em atenção à hierarquia das normas, separação dos poderes e aos direitos fundamentais. Pode-se afirmar que suas principais características são a soberania, a unidade do ordenamento jurídico, a divisão dos poderes estatais, o primado da lei sobre outras fontes de proteção jurídica, o reconhecimento da certeza do Direito como valor político fundamental, a igualdade formal dos cidadãos perante a lei, o reconhecimento e a proteção de direitos individuais, civis e políticos, a garantia constitucional, a distinção entre público e privado e a afirmação da propriedade privada e da liberdade de iniciativa econômica (ANJOS FILHO, 2006). 

O Estado Democrático, por sua vez, trata acerca da prerrogativa de participação popular nas decisões emanadas pelo ente estatal na condução da sociedade, de forma direta ou indireta, tendo em vista a previsão constitucional de que “todo pode emana do povo” (art. 1º, parágrafo único, da CF/88). Portanto, haja vista que a figura Estatal decorre do interesse que todos os indivíduos possuem de viver em sociedade, cabe ao poder público reger a organização social no intuito de alcançar o bem comum e atender ao interesse público. Nesse sentido, a Constituição estabelece como objetivos da República:

“Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. (Constituição Federal, 1988)

A Constituição Federal de 1988 é vista como valor-guia para arquitetura do sistema político brasileiro na medida em que, mediante suas normas programáticas, realiza a condução da sociedade e a distribuição da justiça visando o desenvolvimento social, humano e o alcance do bem comum. Desse modo, a Carta Magna representa formação jurídica que abarca os anseios da comunidade e uma série de direitos como instrumento da cidadania e dignidade humana, inaugurando um conjunto de preocupações éticas: ética da igualdade, ética da não-invasividade, ética da personalidade humana, ética do não abuso de poder, ética da liberdade intelectual, ética da tolerância e etc. (BITTAR, 2004). Por conseguinte e para fins de alcançar a convivência social pacífica e o pleno desenvolvimento do homem são assegurados constitucionalmente os denominados direitos fundamentais. 

3. DIREITOS FUNDAMENTAIS: DIREITO POLÍTICO COMO ESSENCIAL AO EXERCÍCIO DA CIDADANIA

A Constituição Federal de 1988 elenca os direitos e deveres individuais e coletivos que norteiam o ordenamento jurídico brasileiro em seu artigo 5º, sendo que os direitos fundamentais podem ser definidos como aqueles necessários à proteção do indivíduo perante a atuação do poder estatal. Os direitos fundamentais positivados podem ser divididos em três gerações ou dimensões. Essa classificação de gerações foi criada por Karel Vazak (1979) e ficou famosa no Brasil através do autor Paulo Bonavides.

A primeira geração corresponde ao direito à liberdade, na esfera civil e política, e pressupõe a separação entre Estado e Sociedade. Os direitos de 1ª geração possuem um caráter negativo, no sentido de exigir, principalmente, uma abstenção por parte do Estado no que se refere à intervenção nas liberdades individuais. Já em relação à esfera política, a liberdade se faz presente na participação política dos cidadãos. Como exemplo dos direitos fundamentais de primeira geração há os direitos à vida, à liberdade e à igualdade, previstos no caput do artigo 5º da Constituição Federal de 1988, assim como, por derivação de tais direitos, as liberdades de manifestação (art. 5º, IV), de associação (art. 5º, XVII) e o direito de voto (art. 14, caput) (PFAFFENSELLER, 2007).

Os direitos fundamentais de segunda geração são aqueles derivados do princípio da igualdade (Estado Social) como os direitos sociais, culturais e econômicos, também conhecidos como os direitos da coletividade. Esses direitos possuem um caráter positivo, vez que exigem uma participação ativa do Estado no sentido de garanti-los ou mesmo provê-los. No caso brasileiro, a Constituição de 1988 define que “são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados” e garante sua prestação no art. 5º, § 1º, ao estabelecer que “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata” (PFAFFENSELLER, 2014, 19).

A terceira geração de direitos fundamentais, por sua vez, são os direitos difusos que visam à proteção da coletividade como um todo, do ser humano, sem focar no Estado ou no indivíduo, como o direito ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente, o direito de propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade e o direito de comunicação. Esses são batizados por alguns doutrinadores como direitos de fraternidade ou solidariedade, por exigirem um esforço coletivo, até em nível global, para que sua efetivação seja possível.

Bonavides (2002) remete ao lema da Revolução Francesa de “liberdade, igualdade e fraternidade” para sistematizar as três gerações dos direitos fundamentais respectivamente, afirmando que essa profetizou a seqüência histórica dos Direitos Fundamentais. Há quem defenda os direitos fundamentais de quarta geração, tidos como os direitos à democracia, à informação e ao pluralismo, sendo necessários no contexto de globalização política. Nesse sentido, Bonavides afirma que "os direitos de quarta geração compendiam o futuro da cidadania e o porvir da liberdade de todos os povos. Tão somente com eles será legítima e possível a globalização política." (Bonavides, 2002, p. 525).

Diante do exposto, podem-se conceituar os direitos fundamentais como os direitos do ser humano positivados no ordenamento constitucional de determinado Estado, frutos da luta universal pelo direito. As referidas normas possuem papel diretivo-principiológico tendo plena eficácia e não carecedora de qualquer outra. Além disso, trata-se de norma semanticamente vinculativa da decisão judicial e interpretação no caso concreto.

Considerando os pilares acima descritos, tendo em vista o princípio constitucional da democracia, os direitos políticos e as garantias fundamentais, a Carta Magna estabelece que o cidadão poderá exercer o seu poder soberano de forma direta, mediante referendo, plebiscito e iniciativa popular, e de forma indireta por meio de representantes eleitos. As formas descritas estão diretamente relacionadas ao conceito de cidadania (do latim, civitas, "cidade") que é a condição da pessoa natural que, como membro de um Estado, encontra-se no gozo dos direitos que lhe permitem participar da vida política de forma a intervir na direção dos negócios públicos do Estado, participando de modo direto ou indireto na formação do governo e na sua administração.

4. EDUCAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE EFETIVAÇÃO DA DEMOCRACIA

O exercício da cidadania é analisado por Mariá Brochado[1] em sua palestra intitulada “Ética e as relações entre estado, política e cidadania”. Na oportunidade, a autora traz do Dicionário Aurélio o conceito de cidadão sendo “aquele indivíduo no gozo de direitos civis e políticos de um Estado; é um indivíduo na fruição dos seus direitos ou no desempenho dos seus deveres para com o Estado” (BROCHADO, 2010, p. 72) para questionar, em sua exposição, a formação que se faz necessária ao cidadão para realizar reivindicações políticas afirmando que “cidadãos em maioria desconhecem o histórico e o contexto atual de seus próprios direitos fundamentais; não reconhecem o valor da conquista de uma Constituição democrática, o significado de res publica.” (BROCHADO, 2010, p.72).   

Como solução para o desconhecimento das conquistas jurídicas mencionadas, Brochado acredita na educação jurídica básica nas escolas para aquisição de, pelo menos, conhecimento sobre direitos fundamentais: uma política pedagógica.  Afinal, sem “uma política pedagógica séria de inclusão de conteúdos jurídicos nas práticas escolares, ficam inviabilizadas a prática efetiva da cidadania e a exigência de um Estado ético” (BROCHADO, 2010, p.72-73). A autora fala sobre o Núcleo de Estudos Paidéia Jurídica da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, no qual é coordenadora, que busca levar a educação jurídica em direitos humanos não apenas aos juristas, mas a todos os indivíduos visando à formação da cidadania. Nesse sentido, é citada por Brochado a iniciativa do Estado de Minas Gerais com a Lei nº 15.476 de 2005 que determina a inclusão de conteúdos referentes à cidadania nos currículos das escolas de ensino fundamental e médio, como exemplo de inserção dos direitos humanos fundamentais nas escolas da rede pública de ensino. A referida lei é pequena, possui apenas dois artigos e ainda não foi regulamentada, o que, para a autora, é prova de “descaso ético com projeto político tão sério e necessário” (BROCHADO, 2010, p.73). O trecho abaixo transcreve a mencionada Lei, in verbis:

“Art. 1° – As escolas de ensino fundamental e médio integrantes do Sistema Estadual de Educação incluirão em seu plano curricular conteúdos e atividades relativos à cidadania, a serem desenvolvidos de forma interdisciplinar.

Art. 2° – Integram os conteúdos a que se refere o art. 1° os seguintes temas:

I – direitos humanos, compreendendo:

a) direitos e garantias fundamentais;

b) direitos da criança e do adolescente;

c) direitos políticos e sociais.

II – noções de direito constitucional e eleitoral;

III – organização político-administrativa dos entes federados;

IV – (Vetado);

V – educação ambiental;

VI – direitos do consumidor;

VII – direitos do trabalhador;

VIII – formas de acesso do cidadão à justiça”. (Lei nº 15.476, 2005)

Nesse viés, o ilustre autor Eduardo C. B. Bittar, estudando as relações entre a dimensão da ética, da política, da responsabilidade social e do cosmopolitismo cultural, acredita no debate filosófico como meio de alteração desse status quo. Segundo o autor, o termo "ética" vem do grego ethikos e significa aquilo que pertence ao ethos, que significava "bom costume", "costume superior", ou "portador de caráter". Ao contrário da  moral que fundamenta as ações humanas na obediência a costumes, a ética fundamenta as ações morais exclusivamente pela razão.  Ou seja, a ética visa encontrar o melhor modo de viver e conviver em sociedade através da razão. O Direito, por sua vez, tem a função de favorecer a independência ética e reequilibrar qualquer desarmonia existente em sociedade. A denominada independência ética do individuo está diretamente ligada à noção de consciência crítica e liberdade de pensamento, uma vez que no Estado Democrático de Direito o indivíduo racional possui liberdade e direito de participação nas decisões da máquina pública. Portanto, visando reequilibrar qualquer desarmonia e com o intuito assegurar a igualdade e liberdade de pensamento do individuo em conformidade com os fundamentos éticos da razão, são estabelecidos os direitos à cidadania.

O termo cidadania esta relacionado à possibilidade de participar da fruição dos benefícios trazidos pelo Direito na Constituição, no que tange à materialização dos direitos no plano do exercício de diversos aspectos da participação na justiça social: direitos civis, políticos, econômicos e sociais. Desse modo, BITTAR dispõe acerca da cidadania como condição inerente ao povo, que será realizada mediante a organização da sociedade civil, conscientização dos grupos minoritários, participação popular e etc. Corroborando esse entendimento cabe destacar que a educação visa garantir ao indivíduo o desenvolvimento na sua mais alta potência e essência racional, sendo que a razão prática tem o conhecimento como um meio para alcançar um objetivo maior, que é o agir ético no sentido de desenvolver aptidões críticas do cidadão livre. Nesse sentido, segundo BROCHADO “enquanto modo de fixação histórica do ethos, o processo educativo é o único caminho possível para uma vida ética plena. O ato moral é ao mesmo tempo do indivíduo (subjetivo), da sociedade em que ele vive (intersubjetivo), visando a um fim que é objetivo (valores, instituições), transmitido no ethos pela educação” (Brochado, 2011, v.80 – n.3). Portanto, a consciência política diz respeito ao exercício da cidadania como exigibilidade dos próprios direitos, mediante retomada de uma educação como formação ética ou moral.

 Contudo, sabe-se que a condição de vida na qual parcela da população se encontra é um fator determinante para a tomada de decisão do indivíduo e participação política, que muitas vezes desconhece informações acerca dos direitos que possui e se vê compelido pelas circunstancias a adotar determinado posicionamento (BITTAR, 2004). Nesse sentido, cabe asseverar que as condições historicamente desiguais entre os membros da sociedade ocasionam a exclusão de alguns grupos, criando déficits sociais irreparáveis.

A existência de condições desiguais entre os indivíduos desvirtua totalmente o preceito de cidadania, uma vez que o exercício dos direitos fundamentais de forma igualitária é requisito e modelo de uma vida ética-cidadã. Segundo BITTAR (2004), a ética dos direitos humanos decorre do princípio da dignidade da pessoa humana, que serve de lastro para a construção da sociedade aberta e pluralista, sendo abrigo comum da geração de todos os direitos humanos, uma vez que todos os demais direitos se curvam a este minimun dos povos. Portanto, a dignidade da pessoa humana traduz toda a carga de demanda por justiça e igualdade em torno das aflições humanas. Nesse sentido dispõe Eduardo Bittar:

“Ante a falta, se instala uma nova ordem, e uma nova concepção de cidadania precisa se modular para restabelecer certa coerência na administração dos conflitos, onde a participação direta nos processos flexíveis de articulação de decisões políticas seja possível. Diante da falência, e mesmo da ineficiência, do Estado no gerenciamento e na distribuição de bens fundamentais da vida organizada em sociedade, as alternativas aos modos tradicionais de se conceberem práticas jurídicas e práticas políticas se instalam para suprir carências”. (BITTAR, 1997)

Nesse sentido, para fins de viabilizar a efetiva participação e o exercício da cidadania, deverão se implementadas políticas públicas que visam promover a educação politica dos membros da sociedade de forma igualitária. Destaca-se que a educação é entendida como direito fundamental do ser humano e está prevista no art. 6º da Constituição Federal dentro do rol dos direitos sociais:

“Art. 6º – São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. (Constituição Federal, 1988)

Já em seu art. 205, a Carta Magna mostra a importância da educação na formação do indivíduo como cidadão, ao dispor que:

“Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. (Constituição Federal, 1988)

O direito à educação é de grande relevância, pois trata-se de um meio de acesso a outros direitos. Por meio da educação o ser humano torna-se conhecedor de seus direitos e deveres e, assim, passa a ter participação efetiva na sociedade. É a partir da educação que os indivíduos passam a adquirir uma consciência crítica acerca das questões que envolvem a sociedade estando livre de influências externas, uma vez que passam a compreender a função social e política que exercem e os direitos fundamentais que possuem, tornando-se verdadeiros cidadãos.

5. A EDUCAÇÃO NO BRASIL

Para alcançar um nível de educação satisfatório, o indivíduo precisa ser alfabetizado e ser também capaz de ler e interpretar textos. Portanto, o simples índice de analfabetos em um Estado não traz uma real perspectiva da educação de seus cidadãos. Nesse sentido, o Instituto Paulo Montenegro e a ONG Ação Educativa, em parceria, criaram o Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf)[2]. Segundo informações do Instituto:

“O Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) revela os níveis de alfabetismo funcional da população brasileira adulta. Seu principal objetivo é oferecer informações qualificadas sobre as habilidades e práticas de leitura, escrita e matemática dos brasileiros entre 15 e 64 anos de idade, de modo a fomentar o debate público, estimular iniciativas da sociedade civil, subsidiar a formulação de políticas públicas nas áreas de educação e cultura, além de colaborar para o monitoramento do desempenho das mesmas. Dessa forma, pretende-se que a sociedade e os governos possam avaliar a situação da população quanto a um dos principais resultados da educação escolar: a capacidade de acessar e processar informações escritas como ferramenta para enfrentar as demandas cotidianas. Revela os níveis de alfabetismo funcional da população brasileira adulta. Seu principal objetivo é oferecer informações qualificadas sobre as habilidades e práticas de leitura, escrita e matemática dos brasileiros entre 15 e 64 anos de idade, de modo a fomentar o debate público, estimular iniciativas da sociedade civil, subsidiar a formulação de políticas públicas nas áreas de educação e cultura, além de colaborar para o monitoramento do desempenho das mesmas. Dessa forma, pretende-se que a sociedade e os governos possam avaliar a situação da população quanto a um dos principais resultados da educação escolar: a capacidade de acessar e processar informações escritas como ferramenta para enfrentar as demandas cotidianas.”[3]

Dessa forma, o referido indicador mede não apenas a habilidade de leitura e escrita, como também a capacidade do indivíduo adulto de interpretar textos e se relacionar com o mundo que o cerca, denominado alfabetismo funcional. Essa releitura sobre índices de analfabetismo foi vivenciada pela UNESCO, que em 1.958 definiu como alfabetizado aquele que possui habilidade de ler e escrever um enunciado simples relativo à sua rotina e, 20 anos após, passou a adotar os dois conceitos, o de analfabetismo e alfabetismo funcional. A pessoa alfabetizada funcionalmente deve conseguir aplicar a leitura, escrita e habilidades matemáticas em seu meio, desenvolvendo-as ao longo de sua vida.

O documento INAF BRASIL 2011 – Indicador de Alfabetismo Funcional – apresenta os principais resultados do estudo realizado entre dezembro de 2011 e abril de 2012:

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Considerando os resultados apresentados, verifica-se que cerca de 73% da população é alfabetizada funcionalmente, sendo que desses apenas 23% possuem capacidade crítica. Portanto, os números descritos demonstram as dificuldades inerentes à participação popular no âmbito do poder público, uma vez que grande parte da população não possui capacidade de análise critica do cenário no âmbito público. Nesse sentido, tendo em vista que parcela considerável do povo desconhece os seus direitos políticos descritos na Constituição e que grande parte, a despeito de possuir conhecimento de seus direitos democráticos, não tem capacidade para analisar o caso concreto de forma crítica e independente, como esperar que o cidadão esteja politicamente engajado? Como esperar um real envolvimento da população no processo decisório? Faz-se necessária a promoção de politicas públicas de melhoria na educação com vistas à conscientização dos cidadãos acerca dos conceitos jurídicos e políticos, visando assegurar a participação popular independente, consciente e livre de influências externas nesse processo.

Destaca-se que para educar o povo brasileiro, não basta instituir normas alterando a grade curricular escolar. A promulgação de uma lei no sentido de incluir conteúdos de cidadania nos os currículos das escolas de ensino fundamental e médio foi uma iniciativa louvável dado pelo Estado de Minas Gerais, entretanto, ainda espera-se a concretização da referida norma. Além disso, o país como um todo ainda sofre de problemas estruturais na educação, na alfabetização de seus cidadãos.

6. MÍDIA SOCIAL E A EDUCAÇÃO POLÍTICA CIDADÃ

A partir do inicio dos anos 50, a Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC’s) entraram em um sistema amplo e veloz de desenvolvimento, desencadeando consideráveis mudanças no comportamento da sociedade. Na década de 90, as TIC’s já proporcionavam a capacidade de interligação mundial através da rede de internet, possibilitando a interação de indivíduos nesse ciberespaço. Levy define ciberespaço como “O espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial de computadores e das memórias dos computadores” (LEVY, 1999). Essa definição engloba todos os sistemas de comunicação eletrônicos, que transmitem informações dentro do ambiente virtual, tendo os aparelhos de computadores como suporte.

Atualmente, fala-se em uma Revolução Tecnológica, processo capaz de manifestar novas formas de sociabilidade através de ferramentas online de comunicação, como as denominadas redes sociais. Nesse sentido, Recuero dispõe que “uma rede é definida como um conjunto de nós conectados por arestas. Assim, uma rede social é definida como um conjunto de dois elementos: atores (pessoas, instituições ou grupos) e suas conexões (Wasserman e Faust, 1994, Degenne e Forsé, 1999).” (RECUERO;RAQUEL, 2007, , p.2). A partir dessa perspectiva as redes sociais podem ser definidas como um meio de criação, interação e difusão de informações no qual os atores interconectados ocupam as posições de emissores e receptores de mensagens. Existem diversas denominações para esse novo formato comunicacional que, a partir de sua interferência, desencadeia importantes transformações no modo em que a sociedade contemporânea se comunica, não sendo preciso mais ter contato físico e conhecimentos sobre a pessoa na qual esta se relacionando, basta uma apresentação de “perfis virtuais” e, em virtude de uma afeição entre os dois atores (donos de tais perfis), é estabelecida uma relação virtual. Nesse sentido dispõe Recuero:

(…) “ É importante que se distinga o que são as redes sociais na Internet. Elas são constituídas de forma diferente das redes offline, justamente por conta da mediação. As redes sociais online, por exemplo, são apresentadas através de representações dos atores sociais. Ou seja, ao invés de acesso a um indivíduo, tem-se acesso à uma representação dele. Do mesmo modo, as conexões entre os indivíduos não são apenas laços sociais constituídos de relações sociais. No meio digital, as conexões entre atores são marcadas pelas ferramentas que proporcionam a emergência dessas representações. As conexões são estabelecidas através dessas ferramentas e mantidas por elas.” (RECUERO, 2012, p.2).

As redes sociais foram as principais ferramentas de comunicação utilizadas para divulgar as manifestações que aconteceram no ano de 2013. A propagação das informações desse movimento foi feita por meio do Facebook, Twitter, blogs entre outras, sendo que milhares de pessoas formaram grupos e comunidades virtuais para reivindicar a redução da tarifa de transporte público. Cabe asseverar que Recuero define as redes sociais online como associativas, afirmando que as mesmas possuem a tendência de serem muito mais amplas e interconectadas que as redes off-line. Essas ferramentas possuem um alcance rápido de indivíduos que estão interconectados, acarretando uma rápida propagação das informações e, com isso, torna-se possível a reunião de uma extensa massa popular que, além de manifestarem dentro das próprias redes sociais, foram as ruas de todo o Brasil reivindicar seus direitos. Com a expansão das divulgações via redes virtuais, houve uma extensa divulgação e expansão do número de pessoas a aderir esse movimento, até mesmo em outros países, brasileiros e estrangeiros mostraram seu apoio manifestando-se dentro do ciberespaço através de postagens de fotos, vídeos, tuítes e compartilhamentos de diversos tipos de informações. Entretanto, após a vitória da reivindicação do Passe Livre, outras demandas geradas pela insatisfação popular começaram a surgir entre os manifestantes. Com a massiva dispersão do movimento evidenciada, a “falta de foco” dos manifestantes foi uma característica bastante discutida pelas agências mediáticas. Notava-se que as reivindicações não eram mais específicas, o que estava sendo percebido era a generalização da problemática em meio a várias solicitações simultâneas por parte dos manifestantes. Nesse diapasão dispõe Ávila:

(…) “ A medida que os protestos se tornavam maiores, eventos criados nas redes sociais incitavam as pessoas à adesão a luta, mas agregavam particularidades: pautas diversas começaram a surgir. “Gritos de guerra” como “o gigante acordou” entoaram as manifestações virtuais e físicas. Ativistas reforçaram a onda de indignação generalizada com os serviços públicos do país e colocaram em pauta reivindicações contra leis específicas em processo de votação pelo poder legislativo. As ruas passaram a “abrigar” uma massa de milhares em marcha, mas com propósitos próprios, que não necessariamente convergiam uns com os outros” (ÁVILA, 2013, p.2).

O movimento durou cerca de 3 meses, acontecendo nos meses de março, maio e junho. Após o seu término pouco se ouviu falar sobre as manifestações e seus efeitos nas redes sociais, “a bola da vez” passava ser algum assunto que estava “na moda” dentro das ferramentas online, como o campeonato brasileiro de futebol que inicia-se geralmente no mês de agosto. O engajamento dos indivíduos para lutar por seus direitos durante as manifestações de 2013 foi intenso, mas não duradouro. Muitas pessoas aderiram a causa sem conhecerem a fundo o que estavam reivindicando e como realmente é conduzido o processo político brasileiro. A partir de mensagens absorvidas nas redes sociais os indivíduos se engajaram de maneira imediatista e líquida, gerando um grande fluxo de informações absorvido e disseminado dentro do ciberespaço, sendo que na maioria das vezes a veracidade dessas informações não era verificada. A autora Marilena Chauí nomeia como “Pensamento Mágico” a disseminação de informações pelas redes sociais e a adesão dos atores virtuais a esse propósito. Nesse sentido dispõe:

(…) “Assume gradativamente uma dimensão mágica, cuja origem se encontra na natureza do próprio instrumento tecnológico empregado, pois este opera magicamente, uma vez que os usuários são, exatamente, usuários e, portanto, não possuem o controle técnico e econômico do instrumento que usam – ou seja, deste ponto de vista, encontram-se na mesma situação que os receptores dos meios de comunicação de massa.(CHAUI, 2013, P.?)

A filósofa faz o comparativo entre as redes sociais e os meios de comunicação de massa (MCM), uma vez que ambos os meios são capazes de alcançar milhares de indivíduos e incitá-los a absorver determinados assuntos. Desse modo, a sociedade civil conta, agora, não apenas com os Meios de Comunicação de Massa (MCM) mas, também, com Plataformas Comunicativas Multimidiáticas Ciberespaciais (PCMC). As habilidades inerentes ao meio digital (como sincronia, hipertextualidade, entre outras) propiciam o surgimento de competências comunicativas que favorecem um processo de construção de opinião, minimizando interferências. Constatamos que as PCMC abrigam desde fóruns de debate público, como exemplificam as listas de discussão, até formatos inéditos de jornalismo como o colaborativo, os quais subvertem processos excludentes, próprios dos MCM (Brittes, 2007, p. 2). A professora Juçara Gorski Brittes (2013) também compara as Plataformas Comunicativas Multimidiáticas Ciberespaciais (PCMC) aos Meios de Comunicação de Massa (MCM), mas enfatizando uma diferença entre eles. Segundo a professora, os MCM são excludentes, pois não há interação direta com o receptor, a exemplo o jornal que produz uma matéria política impressa em que os seus leitores não conseguem exercer uma interferência direta e imediata sobre aquela matéria. Entretanto, se a mesma matéria for publicada em um jornal digital os leitores terão a possibilidade debater diretamente e exatamente no momento da sua publicação. Esse é o formato utilizado pelas redes sociais, os atores recebem a todo momento diversos tipos de informações e podem optar por exprimir suas opiniões sobre elas e repassar a respectiva informação, o que como  já dito acima os coloca na posição de destinatários e receptores de mensagens.

A respeito do tema Recuero (2012) dispõe acerca do efeito cascata definido por Kleinberg e Easley:

“A rede proporciona aos indivíduos influenciarem-se uns aos outros. Parte dessa influência dá-se pela informação disponível que circula na rede. Quando essa informação consegue impactar a decisão de diversos indivíduos e gerar um comportamento de massa na sua difusão, há uma epidemia”. (KLEINBERG E EASLEY, 2010)

Os autores Kleinberg e Easley (2010) chamam a esse comportamento “cascata”, tendo em vista que as redes sociais são capazes de atingir rapidamente os seus usuários e esses ainda podem exprimir suas opiniões, tirar suas dúvidas e disseminar as informações que entendem convenientes. Desse modo, esse meio agrega a capacidade de ser um novo formato educacional, ajudando os indivíduos a formar senso crítico perante as notícias que recebem de diversos meios de comunicação, pois não mais ocupam apenas o lugar de receptores passivos de mensagens. Esse talvez seria o tão almejado formato de esfera pública definido por Habermas (2003), um espaço no qual os indivíduos se encontrariam para discutir sobre questões de interesse público formando argumentos e opiniões visando o bem comum (Habermas,1984). Entretanto, o que se observa, como no caso das manifestações de 2013, é que não há um efetivo interesse na criação de senso crítico, os indivíduos recebem as informações advindas das redes sociais, relutam sobre elas ou as propagam sem analisar qual é verossimilhança das mesmas. O que parece existir é um interesse em participar do momento que esta acontecendo dentro do ambiente virtual. O indivíduo refuta ou concorda com alguma informação que está em pauta, mas não parece se importar ou ao menos cogitar se possui entendimento e engajamento suficiente para estar presente naquele debate e também não é realizada uma busca por maiores informações acerca do assunto.  O professor da Universidade Federal do Rio Grande Sul Lucas Casa Grande, relata em seu artigo “As Manifestações de 2013 no Brasil e as Organizações Imediatistas”, um fato ocorrido durante esse acontecimento, in verbis:

“Quero relatar um caso breve: enquanto professor de uma Universidade, um grupo de alunos se aproximou ao final de uma aula e me perguntou o que eles deveriam escrever nas faixas e cartazes que levariam às manifestações. Perguntei, então, por que iriam à manifestação. A resposta foi de que achavam que o que ocorria no país naquele momento era "fantástico", "diferente de tudo" e queriam tomar parte disso. No entanto, também queriam se sentir úteis e, por isso, pensavam sobre o que deveriam manifestar. Dei algumas sugestões sobre os cartazes – todas aceitas, porém não convincentes. Ao final, concluímos que o mais importante era estar lá, experienciar o que aquele momento poderia gerar, do que reivindicar algo ao estado. Não se tratava de buscar uma solução externa à manifestação: naquele momento, a manifestação era a solução.”

Em sua obra Modernidade Líquida Bauman (2001) discute acerca da relação existente entre a modernidade sólida e a modernidade líquida ou fluída, na qual dispõe que “a modernidade “sólida” era uma era de engajamento mútuo. A modernidade “fluída” é a época do desengajamento, da fuga fácil e da perseguição inútil. Na modernidade “líquida” mandam os mais escapadiços, os que são livres para se mover de modo imperceptível”(BAUMAN, 2001). Portanto, a modernidade líquida parece estar presente no desengajamento ou na falta de engajamento em relação às questões debatidas dentro das redes sociais, tornando frágil o interesse em manter discussões sobre importantes questões que devem ser debatidas.

Nesse sentido, conclui-se que para que as redes sociais se tornem formatos educacionais efetivos é necessário que haja um estudo aprofundado das questões debatidas, um filtro de informações e um real interesse em se engajar sobre o assunto que esta sendo tratado, para que assim seja criado a perspectiva de senso crítico em relação às mensagens recebidas. Ou seja, a real participação prescinde de educação política. Portanto, não basta apenas se envolver de forma imediatista e momentânea sobre determinado assunto pois, assim como nas Manifestações de 2013, passado o “boom” das discussões no meio virtual o assunto é deixado de lado e trocado pelo próximo que terá mais compartilhamentos, comentários, tuítes ou curtidas.

7. CONCLUSÃO

Os movimentos populares evidenciados no Brasil em 2013 demonstraram que o povo brasileiro busca a cada dia promover uma atuação direta na política e nas decisões que determinam o rumo a ser seguido pelo Estado. Todavia, a participação efetiva nas medidas tomadas pelo ente público exige que o indivíduo tenha conhecimento daquilo que reivindica, do sistema político vigente e de seus direitos fundamentais como cidadão. As manifestações foram um grito de socorro da população, contudo, sem educação, mobilização social e organização diversas conquistas se perderam nos anos subsequentes.

Nesse sentido, autores renomados como Mariá Brochado e Eduardo C. B. Bittar apontam a educação como instrumento de efetivação da democracia, como meio de se traduzir os anseios da sociedade em garantias reais e políticas públicas, como forma de aproximação da ética e da política e do Estado e cidadão. Contudo, a educação no Brasil ainda se mostra muito frágil. Apesar da melhora dos índices educacionais de analfabetismo, o país convive agora com o analfabetismo funcional, no qual o indivíduo sai da escola alfabetizado mas não desenvolve a capacidade de interpretar textos, de distinguir fato de opinião e, assim, seu senso crítico não é aprimorado.

A partir destas reflexões torna-se válido o questionamento acerca da inclusão das TIC's, enfatizando as redes sociais, em um formato educacional, sendo o espaço virtual possivelmente uma estratégia eficaz para a criação de maior senso crítico entre os cidadãos, visto que atualmente os ambientes virtuais são os locais com maior número de indivíduos interconectados, recebendo e disseminando diversos tipos de informações a todo momento. Contudo, para que essa estratégia de integração funcione, é preciso que haja um processo prévio de conscientização e educação da população. 

Portanto, resta claro que a efetivação da democracia ocorrerá quando os indivíduos participarem ativamente nas decisões do Estado, participação esta que somente será plena quando os cidadãos se tornarem seres políticos conscientes e se engajarem politicamente. Tal consciência prescinde uma educação jurídica política que somente será alcançada com uma reforma na educação básica, na grade curricular, associada a uma melhora na alfabetização funcional. Ou seja, é preciso resgatar a ética e a capacidade crítica para que o povo possa definir pela razão os rumos do Estado e assim alcançar o interesse público em sua plenitude.

 

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Notas
[1] Mestre e doutora em Filosofia do Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais, professora dos cursos de Graduação e Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, professora da Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e Coordenadora do Núcleo de Estudos Paideia Jurídica: educação em direitos humanos-fundamentais, da Faculdade de Direito da UFMG.


Informações Sobre os Autores

Gabriela Costa Xavier

Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Bacharel em Administração Pública pela Fundação João Pinheiro. Pós-graduação em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica PUC/MG em curso. Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental lotada na Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais. Atualmente ocupa este cargo na Secretaria Extraordinária da Copa do Mundo do Estado de Minas Gerais

Flavia Fatima Barroso Otoni Silva

Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Bacharel em Administração Pública pela Escola de Governo Professor Paulo Neves de Carvalho da Fundação João Pinheiro. Pós-graduação em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica PUC/MG (em curso). Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, lotada na Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais, em exercício na Coordenação Especial da Copa do Mundo na Secretaria de Estado de Turismo e Esporte

Thaísa Ferreira Amaral Gomes Espínola

Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Bacharel em Administração Pública pela Escola de Governo Professor Paulo Neves de Carvalho da Fundação João Pinheiro. Pós-graduação em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica PUC/MG (em curso). Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, lotada na Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais, em exercício na Coordenação Especial da Copa do Mundo na Secretaria de Estado de Turismo e Esportes.

Camila Costa Xavier

Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Especialista em Direito Administrativo e Direito de Família. Advogada civilista


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