Autor: Bismarque Pereira Dos Santos, Acadêmico do Curso de Direito da Universidade de Gurupi – UnirG, Email: [email protected]
Orientador:. Jorge Barros Filho, Prof. Orientador do Curso de Direito da Universidade de Gurupi – UnirG, Email: [email protected]
Resumo: O presente estudo propõe-se analisar questões relativas a instabilidade nas decisões a respeito da antecipação ou não do cumprimento de pena antes do trânsito em julgado, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, envolvendo alguns Habeas Corpus e uma Ação Direta de Constitucionalidade, e, paralelamente, alguns princípios presentes tanto na Constituição como no Código Penal e Processo Penal. O objetivo proposto no trabalho pretende trazer todo o histórico de votação da matéria no Supremo, e sucessivamente confrontar algumas ideias defendidas pelos ministros, tanto os que eram favoráveis ao cumprimento antecipado, como os contrários a essa ideia, mas a finalidade principal do trabalho é demostrar a instabilidade gerada acerca do tema, evidenciando as idas e voltas das decisões na Suprema corte, instabilidade essa que além de atingir diretamente o Ordenamento Jurídico, também causa seus estragos no sistema carcerário brasileiro e na vida dos indivíduos que respondem processos em grau de recurso. Portanto a discursão será baseada no princípio constitucional da presunção da inocência previsto no artigo 5º da CF, confrontado com o princípio da segurança jurídica e o confronto as ideias expostas pelos ministros do Supremo Tribunal Federal. É o que se pretende debater.
Palavras-chave: Instabilidade. Constituição. Ordenamento Jurídico. Presunção da Inocência. Segurança Jurídica.
INSTABILITY IN UNDERSTANDING THE STF ABOUT IMMEDIATE PRISON AFTER A CONDEMNARY DECISION IN SECOND INSTANCE.
SANTOS. Bismarque Pereira¹, FILHO, Jorge Barros². (¹Academic of the Law Course at the University of Gurupi – UnirG;) (²Professor Supervisor of the Law Course at the University of Gurupi – UnirG).
Abstract: The present study aims to analyze issues related to instability in decisions regarding the anticipation or not of serving a sentence before the final decision, within the scope of the Supreme Federal Court, involving some Habeas Corpus and a Direct Constitutionality Action, and, in parallel, some principles present both in the Constitution and in the Penal Code and Penal Procedure. The objective proposed in this work intends to bring the entire voting history of the matter in the Supreme Court, and successively confront some ideas defended by the ministers, both those who were in favor of early compliance, as well as those opposed to this idea, but the main purpose of the work is to demonstrate the instability generated on the subject, evidencing the back and forth of decisions in the Supreme Court, an instability that in addition to directly reaching the Legal Order, also causes its damage in the Brazilian prison system and in the lives of individuals who respond to lawsuits in the degree of appeal. Therefore, the speech will be based on the constitutional principle of the presumption of innocence provided for in Article 5 of the Constitution, confronted with the principle of legal certainty and the confrontation of the ideas exposed by the ministers of the Supreme Federal Court. That is what we want to discuss in this academic work.
Keywords: Instability. Constitution. Legal Order. Presumption of Innocence. Legal Security.
Sumário: Introdução. 1 Princípio Presente Na Constituição De 1988. 2 Visão Geral Do Código De Processo Penal. 3 Princípio Da Presunção Da Inocência. 4 Histórico De Habeas Corpus Votados No STF. 4.1 HC 71.723/SP, HC 79.814/SP e HC 80.174/SP. 4.2 HC 84.078/MG,4.3 HC 126.292/SP. 5 Ações Diretas De Constitucionalidade 43, 44 e 54 e PEC 5/19. 6 Divergências De Ideias Entre Os Ministros Do Stf Nas Ações Diretas De Constitucionalidade. 7 Instabilidade Jurídica A Acerca Da Prisão Em Segunda Instância. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
A discussão a respeito do cumprimento antecipado da pena teve início na década de 90 e pendurou até os dias atuais, o Supremo Tribunal Federal durante esse tempo veio analisando a matéria através de Habeas Corpus e sempre mudando de posicionamento a cada votação em pauta. Até então a matéria acima discutida era um preceito constitucional incontestável, formado pelo princípio da presunção de inocência, preceito este, que faz parte dos direitos e garantias fundamentais prevista no artigo 5° da Constituição. Os Habeas Corpus votados ao longo dos anos foram os HC 71.723/SP, HC 79.814/SP, HC 80.174/SP, HC 84.078/MG e HC 126.292/SP (BRASIL, 2016).
A partir dos três primeiros HCs citados acima, começa toda a discussão acerca da matéria, os mesmos foram levados ao plenário do Supremo, discutidos e votados, e então, foi decidido pela maioria dos ministros que o cumprimento da pena deveria ser antecipado, alguns anos depois o supremo analisou a matéria novamente e decidiu por voltar atrás e não cumprir de maneira imediata a pena, e dessa forma foi ocorrendo ao longo dos anos, várias vezes esse assunto foi discutido no plenário e sempre houve modificações na jurisprudência (OLIVEIRA, 2019).
O assunto em questão, além de discutir sobre a competência da Suprema Corte do país, mostra que ao longo dos anos foi gerado uma grande instabilidade jurídica acerca do tema, houve mudanças na jurisprudência, quatro vezes em menos de 30 anos, e essa inconstância nesse período, além de trazer prejuízos ao ordenamento jurídico, desestabilizou totalmente o sistema carcerário brasileiro, tendo em vista que, ao mesmo tempo que milhares de acusados e condenados em grau de recurso iniciam o cumprimento de pena, posteriormente em uma nova decisão do STF, já não se poderia mais ter esse cumprimento de forma imediata. Com essas mudanças de entendimento, vinha ainda, a obrigação de soltar todos os julgados e presos em segundo grau, para aguardar o esgotamento de todos os recursos cabíveis por força da nova decisão (BRASIL, 2016).
Nesse âmbito o trabalho foi desenvolvido, buscando enfatizar todo processo que ocorreu ao longo dos anos na tentativa de evidenciar os prejuízos trazidos ao ordenamento jurídico brasileiro através da instabilidade das decisões da Suprema Corte. É notório também diante dessa temática, o descumprimento do princípio constitucional da segurança jurídica, principio este que garante a estabilidade das relações consolidadas, trazendo assim uma proteção ao direito adquirido.
1 Princípio Presente Na Constituição De 1988
Promulgada em 05 de outubro de 1988 entra em vigor a nova Constituição da República Federativa do Brasil, regada de supremacia, com princípios e direitos fundamentais aos cidadãos brasileiros e naturalizados. Dispõe em seu Artigo primeiro “A República federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos: a soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, e o pluralismo político” (BRASIL,1988).
Quanto ao direito penal, dentre várias garantias fundamentais a nova constituição assegura que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, tal direito é previsto no artigo 5°, inciso LVII e trata-se do princípio da presunção de inocência, em outras palavras, a Constituição da República do Brasil assegura que todo indivíduo somente será privado de sua liberdade após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, portanto, quando esgotadas todas as vias de recursos cabíveis dentro do processo judicial (NOVO,2018).
2 Visão Geral Do Código De Processo Penal
Segundo o art. 283 do Código de Processo Penal:
Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva (BONFIM, 2010).
Dessa forma, a legislação, no referido artigo, delimitou de forma clara, que a prisão, além das outras possibIlidades citadas no texto legal, somente será efetuada em virtude de sentença penal condenatória transitada em julgado, o que garantiu o direito à liberdade em todos os graus de recurso no judiciário. Portanto, os indivíduos julgados e condenados em segundo grau somente poderão ser privados de sua liberdade quando esgotadas todas as formas de recurso (ANDRADE, AMORIM, ALENCAR, 2018).
3 Princípio Da Presunção Da Inocência
Na obra de Cesare Beccaria Dos delitos e das penas de 1764, o princípio da presunção da não culpabilidade já criava suas raízes. Advertia que “Um homem não pode ser chamado réu antes da sentença do juiz, e a sociedade só lhe pode retirar a proteção pública após ter decidido que ele violou os pactos por meios das quais ela lhe foi outorgada” (Nascimento, 2016, p.2)
Na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão feito em Paris (1789), que dispõe em seu art. 9°:
Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda de sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei (OLIVEIRA, 2017).
Posteriormente, na declaração universal do Direitos Humanos realizado na Assembleia Geral das Nações Unidas em 1948, no art. 11 dispõe que:
- 1. Toda a pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente até que sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.
- 2. Ninguém poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituíam delito perante o direito nacional ou internacional. Tampouco será imposta pena mais forte do que aquela que, no momento da pratica, era aplicável ao ato delituoso (OLIVEIRA, 2017).
Esse entendimento quanto a presunção da inocência está prevista em vários acordos internacionais firmados anteriormente a Constituição Federal de 88, e a mesma pacificou através de um princípio essa matéria, com previsão no art. 5º, inciso LVII, que dispõe: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória’’. (BRASIL, 1988).
Fernando Capez (2016) divide em 3 aspectos o princípio da não culpabilidade:
No momento da instrução processual, como presunção legal relativa de não culpabilidade, invertendo-se o ônus da prova; b) no momento da avaliação da prova, valorando-a em favor do acusado quando houver dúvida; c) no curso do processo penal, como paradigma de tratamento do imputado, especialmente no que concerne à análise da necessidade da prisão processual. Convém lembrar a Súmula 9 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual a prisão processual não viola o princípio do estado de inocência (CAPEZ, 2016, p.117).
4 Histórico De Habeas Corpus Votados No STF
4.1 HC 71.723/SP, HC 79.814/SP e HC 80.174/SP
Por volta da década de 90 e dos anos 2000, tiveram início a discussão sobre o cumprimento de pena, antes ou depois, do trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Na época foram impetrados alguns Habeas Corpus no Supremo Tribunal Federal, decididos pelo cumprimento imediato da pena antes do trânsito em julgado, trazendo assim, algumas divergências entre doutrinadores quanto ao princípio da presunção de inocência. Os Habeas Corpus julgados foram HC 71.723/SP, HC 79.814/SP e HC 80.174/SP, e os três seguiram no mesmo sentido, e a partir dessa decisão a corte aditou duas súmulas:
Sumula n° 716 Admite-se a progressão de regime de cumprimento da pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória.
Sumula n° 717 Não impede a progressão de regime de execução da pena, fixada em sentença transitada em julgado, o fato de o réu se encontrar em prisão especial (HARTMANN, 2017).
A partir dessa decisão iniciou-se toda a discussão a respeito da prisão imediata, a Constituição previa desde 1988 o cumprimento somente após o trânsito em julgado, e a Suprema Corte, alguns anos depois tiveram outra interpretação do artigo, votando pelo cumprimento imediato da pena.
4.2 HC 84.078/MG
No dia 05 de fevereiro de 2009, quase uma década depois de apreciar os primeiros HCs sobre a antecipação de pena, o Supremo mais uma vez julgou a matéria através do HC 84.078/MG, dessa vez votou pelo não cumprimento de pena antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória, considerando o princípio da presunção de inocência, portanto, alterou totalmente o entendimento que tinha tido nos Habeas Corpus anteriores, e como consequência houveram as mudanças jurisprudenciais (KELLER, 2018).
Nesse sentido, o Ministro Celso de Melo no julgamento deste HC dispôs acerca da tratativa:
Há, portanto, um momento claramente definido no texto constitucional, a partir do qual se descaracteriza a presunção de inocência, vale dizer, aquele instante em que sobrevém o trânsito em julgado da condenação criminal. Antes desse momento, o Estado não pode tratar os indiciados ou réus como se culpados fossem. A presunção de inocência impõe, desse modo, ao Poder Público, um dever de tratamento que não pode ser desrespeitado por seus agentes e autoridades.
Acho importante acentuar que a presunção de inocência não se esvazia progressivamente, à medida em que se sucedem os graus de jurisdição. Isso significa, portanto, que, mesmo confirmada a condenação penal por um Tribunal de segunda instância, ainda assim subsistirá, em favor do sentenciado, esse direito fundamental, que só deixará de prevalecer – repita-se – com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, como claramente estabelece, em texto inequívoco, a Constituição da República (BRASIL ,2010, p.73).
4.3 HC 126.292/SP
Quase uma década depois, precisamente sete anos, os Ministros do STF mais uma vez julgou a matéria, fato que ocorreu no ano de 2016, e novamente mudou de posição, votou pelo cumprimento de pena imediata, a votação ficou 7 (sete) votos a 4 (quatro) pela antecipação do cumprimento de pena, favoráveis a decisão foram os ministros, Gilmar Mendes, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Dias Toffoli, Barroso, Edson Fachin e Teori Zavascki, e contrários foram, Rosa Weber, Marco Aurélio, Celso de Melo e Lewandowski (BRASIL, 2009).
Assim, a partir desses julgados, ficou evidente o quanto essa matéria traz grande repercussão no plenário do Supremo, votações acirradas, e divergências de entendimento entre os ministros. A ministra Carmem Lúcia votou pelo cumprimento imediato acreditando que os recursos após a segunda instância não apreciam matéria e autoria, e sim, a forma, deste modo, não estaria infringindo o princípio constitucional da presunção de inocência, ela ainda prossegue:
“[…] a mim não parecia ruptura ou afronta ao princípio da não culpabilidade penal o início do cumprimento de pena determinado quando já exaurida a fase de provas, que se extingue exatamente após o duplo grau de jurisdição, porque então se discute o direito (BRASIL, 2016, p.62).
Já o ministro Celso de Mello divergiu entendendo que:
[…] a consagração constitucional da presunção de inocência como direito fundamental de qualquer pessoa – independentemente da gravidade ou da hediondez do delito que lhe haja sido imputado – há de viabilizar, sob a perspectiva da liberdade, uma hermenêutica essencialmente emancipatória dos direitos básicos da pessoa humana, cuja prerrogativa de ser sempre considerada inocente, para todos e quaisquer efeitos, deve prevalecer, até o superveniente trânsito em julgado da condenação criminal, como uma cláusula de insuperável bloqueio à imposição prematura de quaisquer medidas que afetem ou restrinjam a esfera jurídica das pessoas em geral(BRASIL, 2016, p.84).
5 Ações Diretas De Constitucionalidade 43, 44 e 54 e PEC 5/19
Em 2019, após várias decisões instáveis a respeito da Prisão em segunda instância, a suprema corte findou a discussão, tendo em vista que todas as vezes que a matéria foi levada para votação foi pelo procedimento judicial de Habeas Corpus, e assim poderia ser discutida todas as vezes que fossem protocolados os pedidos para apreciação do Supremo. Surgindo a necessidade de uma definição jurídica quanto a essa discussão, o STF julgou a matéria através de Ações Diretas de Constitucionalidade ajuizadas pelo Partido Ecológico Nacional, pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e pelo Partido Comunista do Brasil com intenção de pacificar a decisão e acabar com a discussão. As ADCs 43, 44 e 54 foram a plenário, discutidas e votadas, e por maioria, o Supremo Tribunal Federal mais uma vez mudou de entendimento que tinha firmado em 2016 e decidiu pelo não cumprimento imediato da pena, devendo aguardar em liberdade os indivíduos culpados e condenados em segunda instância até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória (BRASIL,2019).
Foi proposta também uma Emenda à Constituição, de autoria do Senador Oriovisto Guimarães do PODEMOS/PR com apoio de vários outros Senadores, essa proposta de emenda visa alterar o artigo 93 da Constituição Federal, tendo em vista que artigo 5º da Constituição constitui cláusula pétrea, não podendo ser alterada (RAMOS,2019).
Essa mudança no artigo seria a inclusão do inciso XVI que teria o seguinte texto:
XVI – a decisão condenatória proferida por órgãos colegiados deve ser executada imediatamente, independentemente do cabimento de eventuais recursos” (BRASIL,2019, p.1).
Na proposta de emenda à Constituição os senadores justificam impunidade, insegurança e corrupção:
No sistema processual recursal brasileiro existe um excessivo número de recursos que induz a uma situação de preocupante ineficiência da aplicação na lei penal no país, dando à população uma grave sensação de insegurança e de impunidade.
Essa situação não pode mais continuar nos dias atuais. Urge a adoção de alterações legislativas (constitucionais e infraconstitucionais) a fim de dar uma resposta satisfatória à grave crise de insegurança pública vivida atualmente, bem como aos inúmeros casos de corrupção que parecem não ter fim em nosso triste noticiário (RAMOS,2019).
6 Divergências De Ideias Entre Os Ministros Do STF Nas Ações Diretas De Constitucionalidade
Em 24 de outubro de 2019 o Supremo Tribunal Federal iniciou a discussão das Ações Diretas de Constitucionalidade, e a matéria foi apreciada pelos ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Roberto Barroso, Luiz Fux, Marco Aurélio (relator), Rosa Weber e o Ministro Ricardo Lewandowski. A sessão teve que ser remarcada para novembro, tendo em vista a complexidade do tema e a impossibilidade dos votos de todos os ministros em uma mesma sessão, dessa forma o julgamento foi retomado, e os Ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello, Carmém Lúcia, e o Ministro Dias Toffoli, votaram a matéria em questão. Por 6 votos a 5, votação apertada, a maioria decidiu pelo não cumprimento imediato da pena, entendendo os ministros por respeitar e cumprir o texto do princípio constitucional da presunção da inocência. O ministro relator Marco Aurélio votou pela constitucionalidade do texto, pediu a suspensão provisória da pena, e ainda defendeu a liberdade de todos os presos que tivessem privados de sua liberdade devido o Habeas Corpus votado anteriormente, ele argumentou que o texto do princípio constitucional e o texto do artigo 312 do código de processo penal é claro e não abre lacunas para outra interpretação (BRASIL, 2019).
A Ministra Rosa Weber seguiu o relator e destacou que a constituição traz de forma clara o prazo para a formação de culpa do acusado, e em seu entendimento esse prazo é o transito em julgado de sentença penal condenatório, ela destaca que os togados devem obedecer o texto constitucional, aplicando somente o que é devido, e finalizou seu voto ressaltando que os problemas, como, tempo de abertura de processo, morosidade processual é algo que não se pode resolver retirando direitos e garantias, a maneira correta de resolver, é aperfeiçoando a legislação (BRASIL, 2019).
O Ministro Luiz Fux divergiu do relator, no entendimento dele a execução imediata da pena não fere o princípio constitucional da presunção da inocência, ele defende esse ponto dizendo que o princípio só estabelece o direito ao acusado de ser considerado inocente no decorrer de todo o processo, o ministro destaca também que após segunda instancia não analisa mais, autoria e materialidade, portanto o cumprimento de pena deve ser imediato (BRASIL, 2019).
O Ministro Ricardo Lewandowski acompanhou o relator e foi enfático ao dizer que não se deve criar interpretações além para o texto constitucional, a legislação no entendimento dele é clara, e os juízes devem cumprir rigorosamente o que está descrito, ele ainda criticou as decisões dos Habeas Corpus julgados pela casa, dizendo que o cumprimento imediato decidido anteriormente é um retrocesso judicial, e a lei é para ser cumprida a qualquer tempo, não devendo se basear em momentos políticos (BRASIL, 2019).
Alexandre de Moraes acompanhou o Ministro Luiz Fux pela antecipação do cumprimento de pena, para o ministro o devido processo legal e o julgamento em duas instâncias quanto autoria e materialidade no entendimento dele afasta totalmente o princípio constitucional em questão, ele ainda frisou que existe medidas judiciais, o Habeas Corpus e Medida Cautelar, caso necessárias, em situações de abuso ou infração a lei, e finaliza dizendo que instâncias ordinárias estariam sendo enfraquecidas caso o STF tome decisão contraria ao cumprimento imediato da pena (BRASIL, 2019).
Luiz Roberto Barroso, seguiu os ministros Alexandre e Luiz Fux, e destacou que o STF deve acompanhar a realidade atual do país, argumentando que sem cumprimento imediato da pena o sistema estaria abrindo as portas para impunidade, ele ainda confronta o texto de que ninguém será considerado culpado até o transito em julgado de sentença penal condenatória com a ideia de que a prisão será decretada através de ordem descrita e fundamentada pela autoridade competente, em seu entendimento a ordem descrita e fundamentada pela autoridade competente prevalece sobre o princípio, devendo assim respeitar o referido texto legal (BRASIL, 2019).
7 Instabilidade Jurídica A Acerca Da Prisão Em Segunda Instância
Apesar de ter sido entendimentos firmados na suprema corte do país, ficou evidente a instabilidade dentro da própria corte acerca do tema, com divergência de ideias entre os próprios ministros, sem contar que todas as vezes que a meteria foi a plenário teve alteração da jurisprudência, esse é só um dos parâmetros que solidificam a instabilidade quanto ao tema proposto (BRASIL,2016).
A sociedade em geral defendeu o posicionamento do cumprimento antecipado da pena, é do conhecimento de todos , como o sistema judiciário brasileiro é moroso, com relatos de crimes que prescrevem sem ao menos transitar e julgar, crimes que passaram mais de 20 anos e não foram concluídos dentro das instâncias no judiciário, sem falar que por todo esse período a maioria dos indivíduos processados respondem em liberdade, aguardando a sentença definitiva, e tudo isso para a população acaba sendo motivos de revolta, mas é meramente problemas do sistema judiciário, e a solução não é a criação de outro, e sim o modelando do atual , e através do legislativo procurar medidas para o melhor funcionamento (BRASIL,2016).
A classe jurídica, na sua grande maioria formada por advogados, era totalmente contrária ao cumprimento antecipado da pena, com alegação de que o supremo tribunal federal estava descumprimento a norma positivada, argumentaram que a função da entidade é julgar e não legislar, a norma poderia até sofrer alteração, mas o caminho correto era pelo legislativo, e não pelo judiciário como o STF estava fazendo. E assim foi a discussão no pleito da tratativa da prisão em segunda instância, uma divisão geral dentro e fora do Supremo (BRASIL,2016).
Entretanto, a instabilidade que essa discussão gerou não foi somente no âmbito do processo, a repercussão maior, foram as idas e vindas das decisões, ao mesmo tempo que poderia prender os julgados e condenados em segunda instância, já não poderia mais devido a alteração na jurisprudência, por quatros vezes o supremo alterou seus julgados e isso ocasionou muita insegurança jurídica no sistema judiciário (GALVÃO,2019).
Umas das críticas maiores ao supremo foi a questão de envolver o momento político para se tomar uma decisão, a operação lava-jato deflagrada a alguns anos atrás, teve seus condenados julgados em segunda instância, inclusive o ex presidente da República Luiz Inácio, e isso gerou uma grande pressão no judiciário, mais precisamente no supremo, que quis de alguma maneira responder a altura do clamor da população e do sucesso da operação e mudou novamente a jurisprudência na época para o cumprimento imediato da pena.
Para José Luiz Galvão, advogado Especialista em Direito Penal e membro da Comissão de Direito Penal da OAB/PE.
Há um paradoxo: a sociedade clama pelo fim da impunidade, mas a Justiça, ao invés de resolver o problema de sua morosidade, prefere violar garantias constitucionais do cidadão que tem um processo penal contra si, usando de uma visível e perigosa manobra, a fim de permitir uma satisfação popular, por assim dizer, “inconstitucional”(GALVÃO,2019, p.2).
Ante exposto, a um descumprimento ao princípio da segurança jurídica, previsto na constituição, principio este que tem o Estado Democrático como elemento primordial, quando se fala em direito é automático a necessidade de segurança para que se tenha estabilidade e clareza nas relações sociais, porém tudo que foi discutido acaba infringindo totalmente esse preceito legal.
CONCLUSÃO
É notório que o brasil alguns anos vem passando por problemas nas instituições ligadas aos poderes da união, seja o executivo, legislativo e judiciário, interesse individual de pessoas que somente se preocupam em se manter no poder, e que para conseguir isso ultrapassam os limites da ética e da moral.
Apresentado isso, o mínimo que se espera da suprema corte do país é a postura ilibada quanto as questões que lhe são impostas, não admitindo de maneira alguma que o estado democrático de direito seja ameaçado e pressionado pelas constantes instabilidades que o país tenha passado, seja no âmbito administrativo, político ou qualquer um de outra natureza, o papel do supremo e ser guardião da constituição, não admitindo em hipótese alguma ceder à pressão de momento político.
Após apresentadas todo o contexto da tratativa relacionada ao cumprimento ou não antecipado da pena após segunda instância, ficou evidente, como o supremo tribunal federal conduziu de maneira errônea a questão, é sabido por todos que a divisão de competência previsto na constituição federal, marco importante, a divisão dos poderes, devem ser respeitados, a matéria discutida desde do início era de competência do poder legislativo, o princípio constitucional da não culpabilidade é claro e não abre precedentes, a alteração de entendimento não pode partir do judiciário, este somente é competente para julgar o texto legal.
Analisando profundamente a questão, o mais preocupante é quantidade de vezes que o supremo alterou a jurisprudência, fazendo com que o sistema ficasse totalmente frágil e instável, um retrocesso ao sistema judiciário, somente trinta anos depois, se tomou uma decisão definitiva e reconheceu que a matéria deveria ser proposta através de uma emenda constitucional, e não decidida através de interpretações esparsas acerca dos preceitos constitucionais.
Foram anos e anos de discussão, dentro e fora do Supremo, mudanças e mudanças na jurisprudência, instabilidade no sistema judiciário, no sistema prisional, nas relações sociais, e o descumprimento constitucional ao princípio da inocência, e da segurança jurídica.
REFERÊNCIAS
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