Resumo: Na verdade o proposto aqui à uma atualização monetária da execução penal pela demora na prestação jurisdicional isto à uma compensação seca e na mesma moeda sem que se cogite qualquer outra variável. Frise-se que não há dúvidas do cabimento da reparação cível quando se interpreta o art. 5º, inciso LXXV, da CF/88 inclusive outras formas de compensações como a utilização do período das saídas temporárias pretéritas não gozadas a título de remição de pena ou cômputo como pena efetivamente cumprida. Porém o que se propõe nesse momento à uma reparação conservadora imediata e sem tergiversações tudo sob a ética do adquirido, dignidade da pessoa humana, vetores ressocializadores do sistema individualização da pena e do ato jurídico perfeito
A saída temporária é um benefício previsto nos arts. 122 a 124 da Lei de Execução Penal que confere ao apenado possibilidade de inserção periódica ao meio aberto, por período limitado, desde que cumpridas condições legais, como legítimo modo de efetivação do princípio da ressocialização. O art. 122 da LEP estabelece que os condenados que cumprem pena em regime semiaberto poderão obter autorização para saída temporária do estabelecimento, sem vigilância direta, desde que apresentem bom comportamento e tenham cumprido o lapso temporal de 1/6 da pena para os primários e ¼ da pena para os reincidentes.
A jurisprudência e doutrina vêm admitindo a concessão da benesse para os condenados em regime semiaberto, independentemente do cumprimento do requisito objetivo, bem como àqueles em regime aberto, como ferramenta eficaz de ressocialização do reeducando, assentada em uma noção ontológica, sistemática e teleológica do sistema de cumprimento de pena, que se assenta primordialmente na progressividade paulatina, individualização da pena, firme convicção da resocialização e dignidade da pessoa humana.
Dito isto, a questão que se põe em tela é a possibilidade de concessão de saídas temporárias devidamente adquiridas e não gozadas, em razão da demora atribuída exclusivamente ao aparelho estatal, que inviabilizou a apreciação e concessão tempestiva do benefício importando, portanto, em frustração indevida de direito adquirido.
As saídas temporárias, como regra, seguem o calendário festivo nacional. Dessa forma, o magistrado, conforme precedente do STF, pode, em uma única decisão fundamentada e, sem prejuízo da análise contemporânea dos requisitos, conceder, em um único decisum, todas as saídas temporárias do ano, de modo a autorizar a visita ao lar duas vezes por mês, no aniversário, na Páscoa, no Dias dos Pais, das Mães, no Natal e no Ano Novo.
Todavia, muitas vezes, em razão da sobrecarga de trabalho dos ofícios judiciais, ausência de cálculo de pena atualizado, ou outra causa relevante não imputável ao apenado, não se torna possível a apreciação tempestiva deste benefício resultando, destarte, na supressão de direitos do apenado, que deixa de gozar de saída temporária legitimamente adquirida no momento adequado.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), embora não tenha dito expressamente, reconheceu a natureza de direito adquirido da comutação de pena retroativa, desde que os requisitos para concessão, tenham sido devidamente consolidados no passado, não sendo possível condicionar a comutação da pena a requisitos não previstos no Decreto Presidencial, cuja competência para a definição é privativa do Presidente da República.[i] Em outro julgado[ii], o STJ consignou como direito subjetivo do apenado obter a concessão de benefício, desde que preenchidos os requisitos do indulto. Assim, quem pode o mais, pode o menos.
Logo, se o apenado já possuía todas as condições para gozo do benefício estabelecidas, por condição inalterável a arbítrio de outrem, nos termos da lei, cabe, assim, o deferimento do benefício sempre que for observado que a pessoa condenada, preencheu os requisitos e não lhe foi concedida a benesse a tempo.
Vale ressaltar que por ser adquirido, mesmo que o apenado cometa falta grave, fora do período aquisitivo, este direito não poderá ser suprimido, o que ocorrerá é o seu diferimento, até que volte preencher novamente as condições, uma vez que ele foi devidamente adquirido e deveria ter sido gozado anteriormente e não o foi.
Raciocínio diverso, feriria os institutos do direito adquirido e o ato jurídico perfeito que se nutrem do princípio da segurança jurídica, baliza central do nosso ordenamento jurídico, que visa atenuar as tensões e afastar a eternização dos conflitos. É cristalino que a inércia do arcabouço estatal não pode prejudicar o apenado, nesse sentido, mutatis mutandis, é a súmula 106 do STJ, que afasta quaisquer ônus aos jurisdicionados, pela demora do aparelho estatal.
Como já dito alhures, o direito adquirido não pode ser tolhido arbitrariamente, sob pena de afronta aos princípios da tempestividade, dignidade da pessoa humana, ato jurídico perfeito, efetividade da tutela jurisdicional e legalidade.
Na verdade, o proposto aqui é uma “uma atualização monetária da execução penal”, pela demora na prestação jurisdicional, isto é, “uma compensação seca” e na mesma moeda, sem que se cogite qualquer outra variável. Frise-se que não há dúvidas do cabimento da reparação cível, quando se tem em mira o art. 5º, inciso LXXV, da CF/88, inclusive, outras formas de compensações, como a utilização do período das saídas temporárias pretéritas não gozadas, a título de remição de pena, ou cômputo como pena efetivamente cumprida. Porém, o que se propõe, nesse momento, é uma reparação conservadora, imediata e sem tergiversações, tudo sob a ótica do adquirido, dignidade da pessoa humana, vetores ressocializadores do sistema, individualização da pena e do ato jurídico perfeito.
Concluo rememorando que a frustração de benefícios consolidados, decorrente da inércia estatal, constitui verdadeiro excesso de execução, no sentido da palavra, por negar, a quem de direito, o que é seu, clara violação da concepção de justiça sendo, portanto, a “atualização monetária da execução penal” um vigoroso instrumento de efetivação de direitos fundamentais e forte instrumento de ressocialização.
Informações Sobre o Autor
Bruno Joviniano de Santana Silva
Defensor público. Pós-graduado em direito público pela Universidade Anhanguera UNIDERP