Resumo: O presente trabalho visa analisar a aplicabilidade da conciliação e mediação, especialmente a conciliação prévia do CPC/15, nas demandas judiciais previdenciárias, bem como trazer à tona as portarias relativas às soluções de conflitos de forma consensual adotadas pela Procuradoria Federal.
Palavra-chave: Conciliação. Mediação. Conciliação Prévia no CPC/15. Ação judicial previdenciária.
Abstract: This paper aims to examine the applicability of the conciliation and mediation, especially prior conciliation provided for in CPC / 15, the social security litigation, as well as to bring out the ordinances regarding consensually conflict resolution adopted by the Federal Prosecutor.
Keyword: Reconciliation. Mediation. Conciliation Prior CPC / 15. pension lawsuit.
Sumário: Introdução. 1.soluções consensuais de conflitos no poder judiciário. 1.1.Conciliação e Mediação Conceitos. 1.2 Modalidades. 1.3.Conciliação prévia no CPC/15. 2.processo judicial previdenciário. 2.1.Conceito. 2.2.Tipos de ações previdenciárias. 2.3.Normatividade do direito processual previdenciário. 3.INSS AGU e legislações. 3.1.INSS. 3.2.AGU. 3.3.A Lei 9.469/1997 e as resoluções relativas a conciliação e a mediação. 4.conclusão
INTRODUÇÃO
Como é notório, o Poder Judiciário Brasileiro nos últimos anos vem fomentando a solução de conflitos de forma consensual visando a economia, a celeridade processual e desafogar o judiciário, devido ao grande número de demandas em andamento.
Por meio de Resoluções os Conselhos normatizaram a conciliação e a mediação nos tribunais, cada um com suas peculiaridades (CNJ – Resolução 125/10; CSJT – Resolução 174/16 e TRF3 – Resolução 42/16).
Este artigo, aborda tais soluções na ação judicial previdenciária, objetivando concluir sua eficácia ou ineficácia e aplicabilidade ou inaplicabilidade. Por isso, traz a análise do artigo do CPC de 2015 (obrigatoriedade da conciliação prévia) e menção as portarias aplicáveis a área previdenciária.
1. SOLUÇÕES CONSENSUAIS DE CONFLITOS NO PODER JUDICIÁRIO
1.1. Conciliação e Mediação – Conceitos
Segundo o CNJ, podemos definir e distinguir a Conciliação e a Mediação, da seguinte forma:[1]
“A conciliação é um método utilizado em conflitos mais simples, ou restritos, no qual o terceiro facilitador pode adotar uma posição mais ativa, porém neutra com relação ao conflito e imparcial. É um processo consensual breve, que busca uma efetiva harmonização social e a restauração, dentro dos limites possíveis, da relação social das partes.
A Mediação é uma forma de solução de conflitos na qual uma terceira pessoa, neutra e imparcial, facilita o diálogo entre as partes, para que elas construam, com autonomia e solidariedade, a melhor solução para o problema. Em regra, é utilizada em conflitos multidimensionais, ou complexos. A Mediação é um procedimento estruturado, não tem um prazo definido, e pode terminar ou não em acordo, pois as partes têm autonomia para buscar soluções que compatibilizem seus interesses e necessidades”.
Ambos meios de soluções de conflitos são regidos pelos princípios da informalidade, simplicidade, economia processual, celeridade, oralidade e flexibilidade processual, confidencialidade, decisão informada, competência, imparcialidade, independência e autonomia, respeito à ordem pública e às leis vigentes e validação.
1.2 Modalidades[2]
1.2.1. Extrajudicial, pré-processual ou preventiva: é aquela realizada antes da instauração do processo, por conciliadores, mediadores, defensores públicos, promotores de justiça e/ou advogados, no qual as partes entram em consenso a fim de solucionar o litígio existente. Cabe ressaltar que somente as partes têm poderes de decisão no conflito e podem solicitar a homologação por sentença ao Poder Judiciário, com o intuito de ter maior segurança jurídica.
1.2.2. Judicial, endoprocessual ou incidental: é aquela que ocorre dentro do processo judicial, ou seja, é um procedimento jurisdicional para a autocomposição das partes realizado por juízes, conciliadores ou mediadores com o fulcro de findar o litígio. Para que haja a harmonização do conflito existente pode se utilizar os seguintes institutos:
a) Renúncia do autor ao direito pleiteado, parcial ou integralmente;
b) Reconhecimento do réu quanto a procedência da ação parcial ou integralmente;
c) Transação (ocorre quando as partes realizam concessões mútuas para por fim ao litígio, é o acordo).
Dos institutos podemos dizer que a transação é mais utilizada na conciliação. Entretanto, não se pode confundir transação com conciliação, pois a primeira é o acordo e a segunda pode ser realizada com os 3 (três) institutos acima relacionados.
1.3. Conciliação prévia no CPC/15
Com o advento do Código de Processo Civil de 2015, o novel diploma trouxe o instituto da conciliação prévia, antes mesmo da apresentação da defesa, no qual o autor deve manifestar expressamente por escrito, na inicial, se tem ou não interesse em realizar a conciliação. Já, o réu deverá se manifestar por petição se quer ou não participar de conciliação designada, consoante os termos do artigo 334 do NCPC:
“Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.
§ 1o O conciliador ou mediador, onde houver, atuará necessariamente na audiência de conciliação ou de mediação, observando o disposto neste Código, bem como as disposições da lei de organização judiciária.
§ 2o Poderá haver mais de uma sessão destinada à conciliação e à mediação, não podendo exceder a 2 (dois) meses da data de realização da primeira sessão, desde que necessárias à composição das partes.
§ 3o A intimação do autor para a audiência será feita na pessoa de seu advogado.
§ 4o A audiência não será realizada:
I – se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual;
II – quando não se admitir a autocomposição.
§ 5o O autor deverá indicar, na petição inicial, seu desinteresse na autocomposição, e o réu deverá fazê-lo, por petição, apresentada com 10 (dez) dias de antecedência, contados da data da audiência.
§ 6o Havendo litisconsórcio, o desinteresse na realização da audiência deve ser manifestado por todos os litisconsortes.
§ 7o A audiência de conciliação ou de mediação pode realizar-se por meio eletrônico, nos termos da lei.
§ 8o O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado. (…)”
Nota-se que para não haver a audiência de conciliação prévia, ambas partes do processo devem recusar expressamente por escrito esta forma de solução de conflito. Caso contrário, se uma parte quiser, a outra será obrigada a comparecer na audiência, sob pena de multa, salvo nos casos justificáveis.
2. PROCESSO JUDICIAL PREVIDENCIÁRIO
2.1. Conceito
O processo judicial previdenciário é o segmento do direito previdenciário que visa estudar e examinar as ações previdenciárias.
Lazzari e Castro destacam que para a propositura de uma ação previdenciária deve ser identificada a espécie da prestação que se pretende obter ou revisar, distinguindo-se os benefícios de natureza comum dos de natureza acidentária e assistencial.[3]
Para Serau, o processo judicial previdenciário é o ramo autônomo do direito previdenciário, dotado de um conjunto de normas e princípios próprios, relativo a gama de ações propostas perante o Poder Judiciário com o escopo de obtenção ou revisão de algum dos benefícios concedidos pela Seguridade Social. [4]
Serau ressalta que o processo judicial previdenciário deve ser norteado não em virtude da legislação processual existente, mas essencialmente em virtude do objeto a que se dedica. [5]
Para Savaris, cabe destaca que o direito material cuja satisfação se pretende é de natureza alimentar, ou seja, um direito humano e individual de relevância social fundamental. [6] Por isso, tais ações requerem urgência e celeridade do Poder Judiciário.
2.2. Tipos de ações previdenciárias
Segundo Savaris[7], existem 5 tipos de ações previdenciárias:
– Concessão;
– Revisão;
– Reestabelecimento;
– Manutenção;
– Anulação de benefício previdenciário.
Entretanto, Serau discorda de tal entendimento, pois considera que ações previdenciárias são qualquer tipo de demanda que se discuta concessão (ato de estabelecimento do benefício) ou revisão (ato de alteração). [8]
2.3. Normatividade do direito processual previdenciário
Segundo explana SAVARIS, o processo civil clássico é insuficiente ou inadequado a soluções de algumas questões de direito previdenciário, pois atende parcialmente às nuances dos litígios previdenciários, o que leva a jurisprudência a definir alguns padrões para o desenvolvimento do processo previdenciário. [9]
Em suma, o doutrinador ressalta as peculiaridades das ações previdenciárias em face do ordenamento civil vigente.
3. INSS, AGU E LEGISLAÇÕES
3.1. INSS
O Instituto Nacional do Seguro Social – INSS é uma autarquia federal instituída pelo art. 17 da Lei n.° 8.029 de 12/04/1990 e criada por meio do Decreto 99.350 de 27/06/1990 (estrutura regimental da autarquia), que foi revogado pelo Decreto 569 de 16/06/1992 e ao longo dos anos por diversos outros Decretos, sendo que hoje vigora o Decreto 7.556 de 24/08/2011.
Esta autarquia é advinda da fusão do Instituto de Administração da Previdência e Assistência Social – IAPAS e do Instituto Nacional de Previdência Social – INPS, assim foram unificadas duas autarquias previdenciárias juntando o custeio e o benefício. [10]
Segundo o próprio website do Instituto: O INSS é uma organização pública prestadora de serviços previdenciários para a sociedade brasileira, incumbindo a ele a operacionalização do reconhecimento dos direitos da clientela do Regime Geral de Previdência Social – RGPS. [11]
Por fim, o INSS é uma autarquia federal, com a função principal de gerenciar o Plano de Benefícios do RGPS, se enquadrando como entidade integrante do Poder Público, possuindo prerrogativas em juízo. As ações propostas contra ela, em regra, são de competência da Justiça Federal, por força do inciso I, do artigo 109, da Constituição Federal.[12]
3.2. AGU
A Advocacia-Geral da União (AGU) é responsável por representar judicial e extrajudicialmente a União, bem como realizar consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo e tem a natureza de Função Essencial à Justiça, pois não se vincula a nenhum dos três poderes, nos termos do artigo 131 da Constituição Federal, a saber:
"a Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo."
No que concerne a consultoria da AGU, esta ocorre através do assessoramento e orientação dos dirigentes do Poder Executivo Federal, de suas autarquias e fundações públicas, para dar segurança jurídica aos atos administrativos que serão por elas praticados.
Cabe mencionar que, ainda, realiza atividades de conciliação e arbitramento entre a União, autarquias e fundações com o fulcro de resolver os litígios administrativamente.
Quanto à atuação contenciosa ocorre por meio de representação judicial e extrajudicial da União, de suas autarquias e fundações públicas. No âmbito judicial, a AGU defende os interesses da União, de suas autarquias e fundações públicas, seja no polo ativo, passivo ou como parte interessada. Já, a representação extrajudicial é realizada perante as entidades ou entes não vinculados ao Poder Judiciário, ex. Município, Estados, etc.
São responsáveis pelo exercício das atividades de representação os Advogados da União, os Procuradores da Fazenda Nacional e os Procuradores Federais, cada qual na sua respectiva área de atuação.[13]
3.3. A Lei 9.469/1997 e as resoluções relativas a conciliação e a mediação
Na esfera judicial e extrajudicial, a AGU é representada pela Procuradoria Federal, que tem legitimidade para transacionar em prol da União, suas autarquias e fundações, tendo como a legislação principal para fins de acordos a Lei 9.469/1997 e a portaria n.º 2/2014, que regulamenta a celebração de acordos . A Procuradoria Regional do INSS tem prerrogativa de analisar a inicial e se manifestar sobre o direito ali requerido.
Ademais, segundo o Manual de Conciliação da Procuradoria-Geral Federal[14] existem outras normativas versando sobre o assunto em comento:
“A partir da supracitada legislação, foram publicadas as seguintes portarias, as quais regulamentam a conciliação no âmbito da AGU:
a) Portaria 109/2007 – trata da transação, não interposição ou desistência de recurso perante os Juizados Especiais Federais.
b) Portarias 990 e 1.156, ambas de 2009 – delegaram poderes conferidos pela Lei 9.469/1997.
c) Portaria 915/2009 – especifica as diretrizes de formalização de acordos judiciais pelos órgãos de execução da Procuradoria-Geral Federal para findar litígio judicial.
d) Portarias Conjunta 01 e 90, ambas de 2009 – delegam competências ao Presidente do INCRA, do IBAMA e do ICMBio para autorizarem a realização de acordos ou transações, em juízo, visando terminar os litígios.
e) Portaria 377/2011 – regulamenta o art. 1°-A da Lei 9.469/1997. f) Portaria 06/2011 – cuida de acordos e transações nas ações regressivas acidentárias no âmbito da Procuradoria-Geral Federal. A Portaria 58/2011 subdelega as competências para formalização de acordo.”
Como já mencionado o mundo jurídico atualmente está voltado para resoluções de conflitos de forma consensual, destaca-se na legislação o Código de Processo Civil de 2015, que faz a audiência de conciliação ser obrigatória, caso uma das partes queira a sua realização, porém, se todas as partes não quiserem, não haverá conciliação.
Além disso, a Lei n.º 12.154/2009 instituiu a Previc que tem competência e legitimidade para conciliar ou mediar conflitos previdenciários. O Decreto n.º 7.075, de 26 de janeiro de 2010 e a Portaria nº 183, de 26 de abril de 2010, do Ministério da Previdência Social (à época) conferiram a Procuradoria Federal a competência para mediar, conciliar ou realizar arbitragem no âmbito da Previc, conforme o regulamento de mediação, conciliação e arbitragem.
Para que haja a conciliação e mediação frutífera, o procurador não pode contrariar as manifestações e orientações da AGU, da PGF ou da procuradoria ligada a autarquia, seguindo ainda, todos os termos das Portarias: Portaria AGU nº 109/2007 e Portaria PGF 915/2009.
O art. 3° da Portaria AGU n.º 109/07, traz as hipóteses para celebração de acordos:
“Art. 3° A transação ou a não interposição ou desistência de recurso poderá ocorrer quando:
I – houver erro administrativo reconhecido pela autoridade competente ou, quando verificável pela simples análise das provas e dos documentos que instruem a ação, pelo advogado ou procurador que atua no feito, mediante motivação adequada; e
II – inexistir controvérsia quanto ao fato e ao direito aplicado.
§ 1° A inexistência de controvérsia quanto ao fato deve ser verificável pelo advogado ou procurador que atua no feito pela simples análise das provas e dos documentos que instruem a ação, e a inexistência de controvérsia quanto ao direito aplicado deve ser reconhecida pelo órgão consultivo competente, mediante motivação adequada em qualquer das situações.
§ 2° Os valores envolvidos nas conciliações e transações não poderão exceder ao teto previsto no art. 3°, § 2.º, da Lei n.° 10.259, de 12 de julho de 2001, observado o disposto no art. 260 do Código de Processo Civil.”
Até mesmo naqueles casos que não haja o pedido administrativo, o procurador com as devidas cautelas de praxe, pode suspender o processo para que a autarquia analise o caso.
“§ 5° Na ausência de prévio requerimento administrativo objetivando a concessão de benefícios previdenciários ou outros direitos, o advogado ou procurador poderá solicitar ao juízo a suspensão da ação pelo prazo necessário para a administração analisar o pedido, o qual, se deferido, deve ser comunicado ao Poder Judiciário”.
Existe ainda, a Lei de Mediação, Lei n.º 13.140/2015, no seu artigo 35, no qual aborda que litígios envolvendo a administração pública federal direta, suas autarquias e fundações poderão ser objeto de transação por adesão, cujas condições e requisitos serão normatizados por resolução administrativa. Mas até o momento, não há previsão da edição desta norma administrativa.
4. CONCLUSÃO
A solução de conflitos de forma consensual, atualmente, é uma realidade salutar ao Poder Judiciário, que infelizmente está sobrecarregado com as inúmeras ações judiciais em andamento. Portanto, esse é o meio eficiente para extinguir os litígios com celeridade e segurança jurídica para todas as partes.
Nota-se que a legislação vigente visa fomentar a conciliação e mediação nesses conflitos, objetivando a celeridade, economia processual e financeira (redução dos custos dos Tribunais).
É cediço, que os acordos seriam celebrados em casos de baixa complexidade e com elementos fundados (provas) que deixassem evidente o direito. Nestes casos se excluiriam as causas que dependessem de produção de provas, por exemplo: perícia.
Portanto, a mediação e a conciliação são plenamente aplicáveis a área previdenciária, mas em virtude do sucateamento da máquina pública (déficit de servidores, falta de infraestrutura, etc), não são devidamente exploradas, pois para a sua realização necessitam de mais servidores do INSS, Procuradores Federais e Defensores Públicos e Advogados a fim de analisarem caso a caso, proporcionando assim a tão esperada segurança jurídica em prol do segurado, da autarquia, da Procuradoria e do erário público.
Por fim, a conciliação prévia do CPC/15, no tocante à complexidade da ação e/ou a necessidade da constituição de provas nos autos, torna-se ineficaz e inaplicável a realidade das demandas judiciais previdenciárias em decorrência da explanação acima.
Informações Sobre o Autor
Geovane de Barros Amoroso
Advogado pós-graduado em Direito Imobiliário pela FMU e pós-graduando em Seguridade Social pela Faculdade Legale