Benefícios previdenciários: Uma análise acerca da tutela provisória do CPC

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária!

Lucas Moran Costa  – Bacharel em Direito pela FURG e Advogado. (L[email protected])

Gabriela Mendonça da Trindade – Graduanda em Relações Internacionais pela FURG.

 

Resumo

A presente pesquisa abordará a concessão de tutela provisória como medida processual para garantir benefícios previdenciários e suas possíveis consequências aos segurados, dentre elas a devolução de valores previamente fixados. A análise contará com pesquisa bibliográfica e jurisprudencial.

Palavras-chave: Benefícios previdenciários, tutela provisória, direito previdenciário.

 

Summary

The present research will address the granting of early protection as a procedural measure to guarantee social security benefits and their possible consequences to the insured, among them the return of previously fixed amounts. The analysis will rely on bibliographical research and jurisprudence.

Keywords: Social security benefits, early protection, social security law

 

Sumário: Introdução. I Da qualidade de segurado junto ao INSS I.I O benefício previdenciário como Direito Fundamental I.II Da relação boa-fé/má-fé do segurado frente ao INSS II Da tutela provisória III Da jurisprudência. Considerações finais.

 

INTRODUÇÃO

O presente trabalho científico encontra-se alocado na área de ciências sociais aplicadas com enfoque na prática processual do direito previdenciário e busca estabelecer uma análise dos benefícios previdenciários e o instrumento processual da tutela provisória, prevista nos artigos 294 do CPC.

Por um lado, temos uma possibilidade de garantia de recebimento de benefícios previdenciários antes da sentença. Por outro lado há quem discuta a devolução dos valores na possibilidade de não confirmação da tutela provisória na própria sentença.

A devolução dos valores pode se configurar uma situação de instabilidade tanto para o segurado beneficiado quanto para o advogado na formulação dos pedidos na peça processual, visto que a medida antecipatória pode se tornar extremamente onerosa com o passar do tempo caso seja revertida na sentença de mérito.

Nesse cálculo, quanto maior for o tempo entre a tutela provisória até a sentença, maior será o valor em tese a ser devolvido. O valor do benefício recebido também é de extrema importância, visto que se torna um indexador para cálculo do possível valor a ser devolvido.

A necessidade da reforma previdenciária urge num momento em que se debate sobre o déficit da previdência e a devolução dos valores concedidos em sede de tutela provisória pode se tornar uma medida paliativa como forma de minimizar esse suposto saldo negativo.

Diversas são as ações ou teses que podem ou foram acolhidas com fulcro nessa medida processual, sendo a desaposentação um dos exemplos a ser mencionado, ainda que a tese não tenha sido recepcionada posteriormente pelo STF no ano de 2016.

O advogado, por sua vez, diante da instabilidade por ora estabelecida, ainda que possa alertar o cliente, vive um dilema por estar entre a insegurança e a celeridade de uma medida antecipatória ou a morosidade e uma segurança maior de uma sentença de mérito. Cumpre salientar que em algumas situações de extrema necessidade não há como optar pela segunda hipótese, situações de extrema vulnerabilidade do segurado.

No capítulo I, vamos tratar sobre o surgimento da qualidade de segurante perante o INSS, situação que legitima qualquer cidadão ao pleito de um benefício previdenciário, teremos dois subcapítulos. Num primeiro subcapítulo, iremos versar sobre o Direito Fundamental do benefício previdenciário. Num segundo subcapítulo, vamos versar sobre o estudo da boa-fé / má-fé no pleito das ações junto ao INSS.

O capítulo II será destinado ao estudo da tutela provisória, surgimento no âmbito processual, inovações e sua aplicabilidade no direito previdenciário..

O capítulo III será destinado ao estudo jurisprudêncial diveregente. No capítulo IV teremos as considerações finais da pesquisa.

 

1) Da qualidade de segurado junto ao INSS

No âmbito da seguridade social temos a assistência social, saúde e a previdência social, abarcadas pela Constiuição Federal de 1988 no seu art. 194[1]. Em se tratando do gênero seguridade social, temos uma série de formas de custeio, dentre as quais o segurado assume grande importância para equalizar o cálculo[2].

Inicialmente cumpre distinguir a relação entre filiação e inscrição dos segurados junto à previdência social, ainda que detenham as mesmas consequências, não possuem o mesmo significado.

A filiação ocorre sem depender da vontade do segurado, caso clássico de um empregado contratado que passa a contar com todos os direitos previdenciários sem qualquer ato de vontade estabelecido previamente junto à autarquia do INSS.

Diferente desta, temos a inscrição como situação de determinação volitiva por parte do segurado que pretende ingressar no sistema previdenciário e o faz de maneira administrativa por ato de inscrição.[3]

Os segurados são definidos por aqueles que possuem vínculo jurídico com a previdência social, na teoria devendo contribuir para a própria previdência. É importante salientar que essa regra cabe exceção conforme se extraí da doutrina[4], visto que por vezes o segurado se coloca nessa condição em situações específicas que não dependem de carência, por exemplo.

Na situação geral, temos disposto no art 9º do Decreto n 3048/99 e na legislação previdenciária como um todo, o seguinte rol de segurados.

  1. Segurados obrigatórios: a) empregado, b) doméstico, c) contribuinte individual, d) trabalhador avulso, e) segurado especial.

 

Para esse tipo de segurado há de se asseverar duas características importantes em sua concepção. A primeira delas é a necessidade de ser pessoa física, situação elencada no art. 12 da lei 8.212/91[5]

  1. Segurados facultativos: a) Pode se filiar o maior de 16 anos que não exerça atividade remunerada, caso exerça atividade remunerada que não esteja no rol de segurados obrigatórios, b) dona de casa, c) síndico de condomínio que não exerça essa atividade com remuneração, d) estudante, e) o cidadão brasileiro que acompanha cônjuge em serviço no exterior, f) aqueles que deixaram de ser segurados obrigatórios junto à previdência social, g) membro do conselho tutelar, desde que não detenha vinculo com outro regime da previdência social, h) bolsista e estagiário, i) bolsista que se dedique em tempo integral à pesquisa, vinculados ao curso de pós-graduação (lato ou strito sensu), j) o presidiário que nao esteja realizando outra atividade com remuneração e nem esteja vinculado a outro regime da previdência social, k) o brasileiro, desde que residente ou domiciliado no exterior e não esteja vinculado a regime de previdência de país que Brasil mantenha acordo internacional.[6]

Cumpre salientar que além desses dois tipos amplos de segurados, temos os inscritos no PSPS (Plano Simplificado de Previdência Social). Em suma, tal plano, oriundo de uma alteração de maio de 2007, visa a inserção de uma contribuição com alíquota menor, atingindo uma parcela da sociedade que trabalha no “mercado informal”, consequentemente essa nova ordem,  corrobora para o crescimento dos cidadãos que atingem a qualidade de segurados.

Desse modo, pelo PSPS, temos a possibilidade de contribuição mediante pagamento de alíquota de 11% sobre o salário mínimo, diferente da contribuição da regra geral que incide em 20% sobre o salário mínimo.

 

  • O benefício previdenciário como Direito Fundamental

Após o estudo da garantia da qualidade de segurado,  vamos nos aprofundar

na importante análise do Direito Fundamental atribuído aos benefícios previdenciários. Inicialmente, devemos assverar que é necessário que entendamos os benefícios previdenciários expostos no nosso Regime Geral de Previdência Social. A doutrina aponta a subdivisão dos benefícios previdenciáros entre aquele destinado aos segurados, aos dependentes, e aos segurados e dependentes.

Os benefícios pertencentes a primeira subdvisão são: 1) aposentadorias por idade, tempo de contribuição, invalidez ou idade, auxílio-doença, auxílio-acidente, salário-família e salário-maternidade. Dos pertencentes a segunda subdivisão são: 2) pensão por morte e auxílio-reclusão. A última subdivisão que se refere aos segurados e dependentes, temos: 3) reabilitação profissional. [7]

Em primeiro ponto para que possamos tratar da efetivação dos benefícios previdenciários enquanto Direito Fundamental, temos na leitura da Declaração Universal dos Direitos do Homem (art XXV), base de qualquer Constituição Federal democrática, oriunda de um período pós-segunda guerra mundial:

      1.Todo Homem tem direito a um produto de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez,viuvez, velhice ou outros casos da perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle.

  1. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social

No mesmo sentido da Declaração exposta, temos no artigo 6º da CF destinado aos Direitos Sociais, a proteção aos seguintes pontos:  a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade, à infância e a assistência os desamparados.

Em um entendimento doutrinário dos Direitos Sociais, aponta José Afonso da Silva:

“ A dimensão dos direitos fundamentais do homem, são prestações positivas, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida dos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais. São, portanto, direitos que se conexionam com o direito de igualdade. Valem como pressuposto do gozo dos direitos individuais na medida em que criam condições materiais mais propícias ao auferimento da igualdade real, o que, por sua vez, proporcional condição mais compatível com o exercício efetivo da liberdade[8]

Como forma de perfectibilizar essa importância dada ao tema no âmbito constitucional, seja pelo apontamento da própria norma consitucional quanto da doutrina relacionada ao assunto, temos o reflexo prático no apontamento prioritário do processo. Nesse ponto a CF/88, atribuiu como forma de recebimento de valores previdenciários, o caráter alimentar dos benefícios, estabelecendo prioridade na ordem de seu recebimento:

Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.

  • 1º Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e emindenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º deste artigo.”[9]

              Em um breve apanhado desse subcapítulo temos que a Declaração dos Dreitos do Homem de 1948 nos remete ao que fora estabelecido em nossa Constituição Democrática, mais especificadamente no que trata do Direitos Sociais. Além disso, a própria constituição trata de garantir a celeridade na forma de pagamento dos benefícios previdenciários, estipulando a prioridade em detrimento a outros pagamentos.

Outro ponto que não deve ser ignorado é a presença do Princípio basilar da Constituição Federal de 1988: Dignidade da Pessoa Humana. Nesse sentido, o neoconstitucionalismo se basea no princípio mencionado como elemento chave de uma constituição democrática.

Os benefícios previdenciários são elencados como um Direito Fundamental e que se encontra positivado na Constituição Federal em seu artigo que versa sobre os Direitos Sociais. Nesse sentido, temos que um dos elementos da Dignidade da Pessoa Humana é a proteção aos Direitos Sociais. Nos dizeres de Zeno Simm:

 “O pleno exercício da cidadania reclama o também pleno gozo dos direitos fundamentais da pessoa humana, dentre os quais os direitos sociais, especialmente aqueles que protegem o indivíduo das vicissitudes da vida. O ser humano só se aperfeiçoa como tal, só se completa como gente, só se realiza como cidadão, quando tem reconhecidos, respeitados e concretizados os seus direitos fundamentais, que são inerentes a ele como obra máxima da criação e que são mesmo anteriores e superiores ao próprio Direito e ao Estado. Sem acesso aos direitos fundamentais, seja de forma natural e espontânea, seja pela atuação judicial, não há cidadania”.(SIMM,2005,p.121).

 

  1.2) A relação da boa-fé/má-fé do segurado frente ao INSS

Avançando o estudo, temos que após a configuração já explanada do segurado junto ao Regime Geral de Previdência Social, reflete numa possibilidade de recebimento de um dos benefícios previdenciários.  Entretanto, essa relação entre segurado e autarquia pode ser calcada na boa-fé do segurado, ou a utilização da má-fé como elemento presente na relação.

A boa-fé é percebida na relação esculpida na probidade e honestidade, se contrapõe aquilo que se define por má-fé. Nas palavras de Brunela Vieira de Vicenzi: “é regra expressa do direito processual civil brasileiro, pois proceder com boa-fé é considerado um dever das partes e de todo aquele que de alguma forma participar do processo.” Segue a autora os dizeres de que: “[ ] a regra de boa-fé faz surgir a presunção de probidade e honestidade das partes, especialmente na prática dos atos processuais. [ ] Sendo a boa-fé exigida como comportamento honesto que se contrapõe à má-fé.”[10]

            A própria legislação interna da autarquia prevê a utilização da boa-fé como preceito a ser observado. Segue abaixo a Instrução Normativa nº 45 de 2010:

Art. 564 – Nos processos administrativos previdenciários serão observados, entre outros, os seguintes preceitos:

I – presunção de boa-fé dos atos praticados pelos interessados;

V – atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé.

        Nesse ponto, a Turma Nacional de Uniformização (TNU) dos Juizados Especiais, adota o entendimento em consoante ao STJ, no sentido de que o benefício previdenciário recebido de boa-fé por erro da administração pública não enseja em sua devolução. O caráter alimentar do benefício impede que a devolução seja efetuada.

Por outro lado, a mesma medida não é tomada caso seja constada má-fe do segurado. A má-fé pode ser comprovada com a falsificação de documentos ou assinaturas para ludibriar a autarquia que poderá considerar o benefício previdenciário calcada em um documento falso.

Nesse sentido, a jurisprudência aponta para a devolução integral dos valores percebidos.

A terceira turma recursal de Pernambuco, julgou processo que versava sobre a relação de má-fé entre segurado e autarquia, quando o Relator Fábio César dos Santos Oliveira, asseverou em seu voto: “A Lei nº 8.213/91 e o Decreto nº 3048/99 dispõem que, comprovada a má-fé, a restituição de importância recebida indevidamente deverá ser feita de uma só vez ou mediante acordo de parcelamento na forma do art. 244, do regulamento.”[11]

Há também a vinculação do tema ao conceito de boa-fé objetiva que já era estampada no Código Civil de 1916.[12] Não obstante, o Código Civil de 2002 consagrou a boa-fé objetiva, bem como o Código de Processo Civil de 2015, que prevê a utilização do referido princípio nos mecanismos processuais.

O dever de probidade e lealdade é uma previsão adotada pelo Decreto 3.048/99, que aprovou o Regulamento da Previdência Social. Entre os dispositivos mencionados, temos que o desconto dos valores indevidamente pagos, não podem ser recuperados sem a devida comprovação de má-fé. Ora, pelo exposto fica evidente que o segurado goza de uma presunção relativa de boa-fé objetiva.

 

  • Da tutela provisória no CPC:

Como forma conceitual, temos que a tutela de urgência compreende a antecipação do mérito. A análise da sistemática estabelecida em diploma anterior se torna de suma importância para que tenhamos embasamento para o estudo da sistemática atual.

No âmbito do Código de Processo Civil (CPC) de 1973, em sua forma originária não se tinha estabelecido qualquer forma de antecipação do mérito, não prevendo, portanto, sequer alguma proteção aos casos que enlvolvessem “periculum in mora” e “fumus bonis iuris”[13], por exemplo. Percebendo a necessidade de uma legislação nos casos de tutela antecipada sem prejudicar o mérito da ação, que em 1994, fora sancionada a Lei 8.652, alterando o art. 273 do CPC vigente. Nesse ponto, o art. 273 esteve assim exposto:

Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou II – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.

  • 1º Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões do seu convencimento.
  • 2º Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.
  • 3º A execução da tutela antecipada observará, no que couber, o disposto nos incisos II e III do art. 588.
  • 4º A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada.
  • 5º Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento.

Nesse sentido, temos que a legislação vigente na época, separava dois pontos importantes de análise de tutela provisória: As tutelas antecipadas e as tutelas cautelares. Passaremos a análise de cada ponto em específico. Os requisitos da tutela antecipada são percebidos pela presença do “fumus bonis iuris” e do “periculum in mora”[14], sendo  de sua pretensão antecipar o julgamento com fulcro na proteção ao direito subjetivo da parte, situação evidenciada pelo caráter de urgência observado no caso concreto.

Torna importante salientar que uma das características da tutela antecipada é a possibilidade de reversibilidade da decisão, sedo reversível pelo decurso do tempo ou mesmo revogada por decisão do próprio magistrado. Portanto, ainda que tenhamos o pedido de tutela antecipada na petição inicial, não é possível garantir que a tutela seja mantida na sentença. Pelo caráter de reversibilidade da medida que cabe ao magistrado fixar o depósito da caução para que se evite prejuízos futuros ao réu.

Em se tratando das tutelas cautelares eram fundamentadas pela verossimilhança da alegação e no fundado receio de dano ou abuso do direito de defesa. A proteção aqui estabelecida não é como forma de antecipação de um direito exposto, mas sim uma forma de proteção do mesmo. Além disso, cumpre salientar a  necessidade de manejar um processo autônomo de uma tutela cautelar que poderia ser concedida sob dois aspectos: visando a proteção de uma situação futura ou já ocorrida.

Nesse ponto, ainda que possua o condão de provisoriedade, tal como a tutela cautelar, não visa a garantia da tutela final.  Nos ensina Wambier (1997) que:

o principal ponto em comum entre as cautelares e a tutela antecipada é a limitação vertical da cognição em relação à profundidade do conhecimento dos fatos. Como traço distintivo predominante, aponta o pressuposto da medida cautelar (periculum in mora) e sua finalidade (evitar ou minimizar esse risco), enquanto a tutela antecipada “pressupõe direito que, desde logo, aparece como evidente

Em linhas constitucionais, a tutela provisória é uma possibilidade abarcada pela própria Carta Magna de 1988, em seu espaço destinado aos Direitos e Garantias Fundamentais, mais especificadamente em seu art. 5º, XXXV: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

            Com o adevnto do Código de Processo Civil de 2015, a tutela provisória sofreu alterações, sendo subdividida em tutela de urgência ou tutela de evidência.[15] A tutela de urgência poderá ser concedida se preenchidos os seus  dois requisitos basilares destinados a tutela antecipada do antigo Código de Processo Civil de 1973: Perigo da demora e risco ao resultado útil do processo (periculum in mora e fumus bonus iuris).[16]

Já a tutela de evidência adota uma inovação que é a dispensa do Perigo da demora (periculum in mora)

 

3) Da jurisprudência

A jurisprudência recente vinha se mostrando desfavorável ao segurado, independente da comprovação de boa-fé.

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO RECEBIDO EM RAZÃO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA.

O segurado da Previdência Social tem o dever de devolver o valor de benefício previdenciário recebido em antecipação dos efeitos da tutela (art. 273 do CPC) a qual tenha sido posteriormente revogada. REsp 1.384.418-SC, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 12/6/2013.

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. FORMA DE DEVOLUÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO RECEBIDO EM ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DE TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA.

Na devolução de benefício previdenciário recebido em antecipação dos efeitos da tutela (art. 273 do CPC) a qual tenha sido posteriormente revogada, devem ser observados os seguintes parâmetros: a) a execução de sentença declaratória do direito deverá ser promovida; e b) liquidado e incontroverso o crédito executado, o INSS poderá fazer o desconto em folha de até 10% da remuneração dos benefícios previdenciários em manutenção até a satisfação do crédito. Isso porque o caráter alimentar dos benefícios previdenciários está ligado ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, de forma que as imposições obrigacionais sobre os respectivos proventos não podem comprometer o sustento do segurado. REsp 1.384.418-SC, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 12/6/2013.”

Em outro julgado, do mesmo ano, o STF se pronunciou da seguinte forma:

 

A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado em virtude de decisão judicial não está sujeito à repetição de indébito, dado o seu caráter alimentar.”

 

AI nº 829651-MG, de Relatoria da Ministra Rosa Weber, julgado em 02/09/2013.

 

Cumpre salientar que em outro julgado mais recente, o próprio STJ, negou a devolução do valores obtido previamente. Nessa situação, o INSS havia constatado o pagamento da pensão por morte para um filho/dependente maior de 21 anos, situação vedada pela própria lei e consagrada na jurisprudência.

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA. PENSÃO POR MORTE. DEPENDENTE DE SEGURADO. FILHA MAIORDE 21 ANOS DE IDADE. PERDA DA QUALIDADE DE BENEFICIÁRIA. EXTINÇÃO DO BENEFÍCIO. CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

  1. O Tribunal a quo, ao analisar os embargos declaratórios do INSS, apreciou todas as questões relevantes para o deslinde da controvérsia. Ademais, não há confundir decisão contrária ao interesse da parte com a falta de pronunciamento do órgão julgador.
    2. É cediço que a concessão de benefício previdenciário rege-se pela norma vigente ao tempo em que o beneficiário preenchia as condições exigidas para tanto. Na esteira desse raciocínio, vê-se que o fato gerador para a concessão da pensão por morte é o óbito do segurado, instituidor do benefício. 
    3. O art. 16 da Lei 8.213/91, em sua redação original, não admite, como beneficiários, na condição de dependentes de segurado, indivíduos maiores de 21 anos e menores de 60 anos, exceto se comprovadamente inválidos.
    4. Não há falar, portanto, em restabelecimento da pensão por morte à beneficiária, maior de 21 anos e não-inválida, uma vez que, diante da taxatividade do diploma legal citado, não é dado ao Poder Judiciário legislar positivamente, usurpando função do Parlamento.
    5. A Terceira Seção desta Corte, no âmbito da Quinta e da Sexta Turma, firmou entendimento no sentido da impossibilidade da devolução, em razão do caráter alimentar dos proventos percebidos a título de benefício previdenciário. Aplica-se, in casu, o princípio da irrepetibilidade dos alimentos.
    6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido.” (REsp 771.993/RS)

 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A tutela provisória prevista no código de processo civil é um mecanismo no direito previdenciário de busca da garantia e efetividade de um direito fundamental e uma garantia processual estabalecida constitucionalmente. Em detrimento da busca na equalização dos gastos com a seguridade social como um todo, a autarquia busca o ressarcimento dos valores pagos da tutela que possuem uma reversão na sentença.

Ocorre que, analisando unicamente a devolução dos valores por sí, carece de argumentos jurídicos, tendo em vista o caráter alimentar dos benefícios previdenciários se sobrepõe aos argumentos de devolução. Outra situação bem diferente percebida é quando o segurado age de má-fé, visto que sua intenção clara é obter um benefício pelo qual não teria direito.

Nesse ponto, a relação boa-fé, má-fé é crucial para que tenhamos argumentos jurídicos mais sólidos para uma possível devolução. A doutrina aponta para essa análise.

A jurisprudência, por sua vez, ainda é bastante conflitante, sendo que a falta de uma legislação específica ou de orientação jurisprudencial (súmulas, súmulas vinculantes, IRDR) dificulta ainda mais um posicionamento específico.

Entretanto, não pode se admitir que um segurado seja limitado processualmente de buscar uma verba alimentar por receio de devolução de valores.

 

 

Referências

CASTRO E LAZZARI. Manual de direito previdenciário / . – 20. ed. rev., atual. e ampl.– Rio de Janeiro: Forense, 2017.

SIMM, Zeno. Os direitos fundamentais e a seguridade social. São Paulo: LTR, 2005.

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Da liberdade do juiz na concessão de liminares e a tutela antecipatória. In: ______ (Coord.).Aspectos polêmicos da antecipação de tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.a.

VINCENZI, Brunela Vieira de. A boa-fé no processo civil. São Paulo: Atlas, 2003, em sua obra a autora retrata a positivação da boa-fé objetiva entre o Código Civil e o Código de Processo Civil.

SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo, 9ª ed.São Paulo:Malheiros, 1993,p.258

LEMES, Emerson Costa. Manual dos Cálculos Previdenciários: Benefícios e Revisões. Curitiba: Juruá Editora, 2016. P. 69-70

COSTA, José Ricardo Caetano. Direito do Trabalho e Direito Previdenciário: Subsídios ao Trabalho Social. Jundiaí: Paco Editorial, 2013 .

 

[1]              Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

[2]              Todas as formas de custeio podem ser percebidas no art. 195:. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais. I –  do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei.  II –  do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201.  III –  sobre a receita de concursos de prognósticos. IV –  do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar.

[3]              A diferença entre filiação e inscrição consta na obra de José Ricardo Caetano Costa: Do Direito do Trabalho e Direito Previdenciário: Subsídios do trabalho social. Ano: 2013. Pg 115

[4]                (…)ainda que não tenha ocorrido contribuição, mas estando o indivíduo enquadrado em atividade que o coloca nesta condição, terá direito a benefícios e serviços: são os casos em que não há carência de um mínimo de contribuições pagas. Manual de direito previdenciário / Carlos Alberto Pereira de Castro, João Batista Lazzari. – 20. ed. rev., atual. e ampl.– Rio de Janeiro: Forense, 2017.

[5]              Art. 12. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas (grifo nosso)

[6]              Todos os tipos de segurado foram baseados na doutrina de José Ricardo Caetano Costa: Do Direito do Trabalho e Direito Previdenciário: Subsídios do trabalho social. Ano: 2013

[7]              A classificação mencionada é exposta na seguinte referência: LEMES, Emerson Costa. Manual dos Cálculos Previdenciários: Benefícios e Revisões. Curitiba: Juruá Editora, 2016. P. 69-70

[8]              José Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional Positivo, 9ª ed.São Paulo:Malheiros, 1993,p.258.

[9]              O § 2º do art. 100 (CF) vai nos dizer que: § 2º Os débitos de natureza alimentícia cujos titulares, originários ou por sucessão hereditária, tenham 60 (sessenta) anos de idade, ou sejam portadores de doença grave, ou pessoas com deficiência, assim definidos na forma da lei, serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, até o valor equivalente ao triplo fixado em lei para os fins do disposto no § 3º deste artigo, admitido o fracionamento para essa finalidade, sendo que o restante será pago na ordem cronológica de apresentação do precatório.

[10]            VINCENZI, Brunela Vieira de. A boa-fé no processo civil. São Paulo: Atlas, 2003, p.166.

[11]            Processo nº: º 0508732-04.2016.4.05.8300

[12]            VINCENZI, Brunela Vieira de. A boa-fé no processo civil. São Paulo: Atlas, 2003, em sua obra a autora retrata a positivação da boa-fé objetiva entre o Código Civil e o Código de Processo Civil.

[13]            Os termos em latim traduzidos ao português: “fumaça do bom direito” e “perigo da demora”.

[14]            Disciplinada no inciso I do art. 273 do CPC de 1973: ““I. haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação”.

[15]            Art. 294  A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.

Parágrafo único.  A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.

[16]            Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária!

Desafios enfrentados no reconhecimento da qualidade de segurados especiais…

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária! Challenges faced...
Equipe Âmbito
34 min read

Seguridade Social – Regulamentação Atual

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária! GIACHETTO, Silvio...
Equipe Âmbito
22 min read

Reforma da previdência e dignidade da pessoa humana: uma…

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária! Claudia Aparecida...
Equipe Âmbito
26 min read

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *