Resumo: Aborda-se no presente estudo a temática referente a decisões que tem negado a concessão dos benefícios da gratuidade de justiça, com a exposição de entendimento legal e jurisprudencial acerca do ponto em discussão.
Palavras-chave: gratuidade de justiça. Hipossuficientes. Pagamento de custas. Acesso à justiça. Agravo de Instrumento.
Abstract: Addresses in the present study the issue relating to decisions which have denied the grant of the benefits of free justice, with exposure of understanding about the legal and jurisprudential point of discussion.
Keywords: gratuity of justice. Inapt. Payment of costs. Access to justice. Interlocutory Appeal.
Questão tormentosa que se apresenta hoje no Tribunal de Justiça do Distrito Federal, e que certamente deve ocorrer em outros tribunais, diz respeito a negativa de alguns juízes na concessão a partes hipossuficientes dos benefícios da gratuidade de justiça, nos termos da previsão constante na Lei n. 1.060/50, logo após a distribuição da petição inicial.
Um dos argumentos utilizados para negar os benefícios da gratuidade de justiça, diz respeito ao fato de que a Lei n. 1.060/50 estaria derrogada, e desta forma, o magistrado poderia realizar o controle judicial acerca da parte ter ou não condições de arcar com o pagamento das custas processuais iniciais.
Não obstante o posicionamento de alguns operadores do direito de que a Lei 1.060/50 estaria derrogada, tem-se que este argumento não se sustenta, eis que o indeferimento dos benefícios da gratuidade de justiça logo no início do processo, sem que haja a citação da parte contrária, importa em malferir o art. 5٥, LXXIV, da Constituição Federal.
E, a própria colocação topológica do artigo 5٥, LXXIV, da Constituição Federal, indica que se trata de um direito fundamental individual, portanto cláusula pétrea, e, por sua própria natureza, deve ser compreendido à luz do princípio da máxima efetividade e da eficácia irradiante dos direitos fundamentais, bem como, do princípio do amplo acesso a justiça.
Ademais, o art. 4, da Lei n. 1.060/1950, densifica de maneira absolutamente correta o direito fundamental individual de assistência judiciária gratuita e, além disso, facilita o acesso à justiça de milhares (senão milhões) de pessoas hipossuficientes, responsáveis pela maioria das ações que tramitam no Distrito Federal, e no Brasil.
Assim, e ao contrário do posicionamento em sentido contrário, o artigo em referência, ao exigir apenas a declaração da parte de que não se encontra em condições de arcar com o pagamento das custas do processo e eventuais honorários de sucumbência, sem prejuízo próprio ou da família, vem ao exato encontro desse entendimento, ao alargar o alcance da norma constitucional e facilitar seu exercício perante os poderes constituídos.
Ainda, outro ponto a ser destacado é que a exigência de comprovação formal de não poder arcar com as custas e despesas processuais para a obtenção dos benefícios da assistência judiciária é exigida quando pessoa jurídica pleiteia o benefício, conforme vem decidindo nossos Tribunais, não podendo, por exemplo, o magistrado fazer este controle de processos ajuizados por pessoas físicas.
Assim, eventuais decisões judiciais que indeferiam a concessão dos benefícios da gratuidade de justiça, sem nem ao mesmos ocorrer a citação da parte contrária, malferem a jurisprudência reinante de nossos Tribunais, a moderna hermenêutica constitucional, e vulnera o princípio da máxima efetividade da norma constitucional, a eficácia irradiante dos direitos fundamentais.
E, corroborando a tese exposta no presente artigo, ou seja, que o art. 4º da Lei n. 1.060/1950 se encontra em plena vigência com total respaldo da denominada Constituição Cidadã de 1988, citamos os seguintes julgados:
“Para a concessão da assistência judiciária gratuita assegurada pela Carta Magna (art. 5º, inc. LXXIV) e pela Lei nº 1.060/50 (art. 4º), basta a simples declaração formal da parte no sentido de que não tem como arcar com as despesas processuais e honorários advocatícios sem o comprometimento de sua própria subsistência e de sua família, sendo dever do Estado prestar assistência judiciária integral e gratuita aos que dele se socorrem. Recurso provido. Unânime. [i]
“Considerando que para o deferimento dos benefícios da assistência judiciária gratuita, previsto na Lei nº 1.060/50, basta a simples alegação da parte requerente no sentido de não possuir condições financeiras de arcar com as despesas processuais, o mesmo deverá ser concedido aos Autores. Apelação conhecida e parcialmente provida para deferir a gratuidade de justiça e suspender a cobrança das verbas sucumbenciais. [ii]
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. DEFERIMENTO. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA APRESENTADA PELA PARTE. AUSÊNCIA DE PROVA EM SENTIDO CONTRÁRIO. 1. A simples declaração apresentada pela parte no sentido de que não possui condições de arcar com as custas e despesas processuais sem prejuízo de seu sustento ou de sua família é suficiente para a concessão da gratuidade de justiça. 2. Apenas quando constar dos autos prova contrária à afirmativa de hipossuficiência é cabível o indeferimento do pedido de justiça gratuita. 3.Agravo de Instrumento conhecido e provido.[iii]
“Pois bem. Em linha de princípio, não se vislumbra nos autos quaisquer indícios de falsidade nas informações constantes da declaração de hipossuficiência firmada pelo agravante, nem nas alegações de que esteja desempregado, de modo que não se pode deduzir, indene de dúvida, que ele possa arcar com as custas processuais sem o comprometimento de sua subsistência. Por outro lado, importa anotar que, para a não concessão de assistência judiciária cabe à parte contrária a prova de que a afirmação de pobreza não é verdadeira. Ante o exposto, CONCEDO a antecipação da tutela recursal, para que o feito em trâmite no Juízo a quo prossiga sem que o agravante recolha as custas iniciais, até o julgamento colegiado do presente recurso. [iv]
“Para a concessão do benefício da assistência judiciária, basta afirmação nos autos de que a parte não dispõe de capacidade financeira para arcar com as despesas decorrentes do processo, sem prejuízo do sustento próprio ou de família. Contudo a declaração de pobreza admite prova em contrário, cabendo à parte que impugnar o benefício. Apelações conhecidas e não providas.[v]
Desta forma, eventuais decisões que deneguem a concessão dos benefícios da gratuidade de justiça a partes hipossuficientes devem ser combatidas via Agravo de Instrumento pelos operadores de direito, eis que a hipossuficiência é presumida, cabendo a parte contrária no feito fazer prova em sentido contrário, tendo em vista a plena vigência da Lei n. 1.060/50, conjugada aos princípios constitucionais do amplo acesso ao Poder Judiciário e dignidade da pessoa humana.
Informações Sobre o Autor
Claudio Ribeiro Santana
Procurador de Assistência Judiciária do Distrito Federal em atuação no Núcleo de Atendimento Inicial – CEAJUR, do Fórum de Sobradinho-DF