A Extinção Dos Embargos Infringentes e a Inovação do Artigo 942 do CPC

EDUARDO JUNQUEIRA FRANCO BEZERRA DE MENEZES: Advogado inscrito na OAB/MS sob o nº 21.733. Graduação em Direito pelo Centro Universitário da Grande Dourados. Pós-Graduado em Direito Público pelo Centro Universitário da Grande Dourados. Pós-Graduado em Direito Processual Civil pela Universidade Cândido Mendes.

Resumo: O presente artigo tem como escopo tratar da supressão dos Embargos Infringentes com a promulgação do Novo Código de Processo Civil em 2015. Recurso antes previsto no artigo 496, inciso III do Código Processual de 1973 que deixou de existir na atual sistemática processual em virtude do disposto no artigo 942 da Lei nº 13.105/2015. A inovação no novo código ao que parece não pois fim a metodologia utilizada pelo extinto recurso, na medida em que trouxe técnica de julgamento visando a preservação dos institutos antes assegurados pelo recurso de embargos infringentes. O artigo 942 prescreve que a nova técnica é utilizada em sede de decisões não unanimes, proferidas em grau de apelação, ação rescisória e agravo de instrumento. Consiste a técnica basicamente em suspender a sessão do julgamento até que se convoque novos julgadores em quantidade apta a alterar a decisão atacada. O dispositivo ainda garante as partes o direito de sustentar oralmente suas razões diante dos novos integrantes da sessão de julgamento. Este artigo buscou delimitar as origens do extinto recurso para que se pudesse debruçar sobre as inovações trazidas pelo novo código, ponderando sobre seus reflexos e impactos no ordenamento jurídico pátrio.

Palavras-chave: Supressão dos Embargos Infringentes. Nova técnica de julgamento do artigo 942. Novo Código de Processo Civil.

 

Abstract: This article has the purpose of dealing with the suppression of the request of reconsideration with the promulgation of the New Code of Civil Procedure in 2015. A remedy previously provided in Article 496, item III of the 1973 Code of Procedure, that seized to exist in the current procedural system due to the provisions of article 942 of Law nº 13,105/2015. The innovation in the new code does not seem to be an end to the methodology used by the extinct remedy, since it brought a trial technique aimed at preserving the institutes previously secured using the request of reconsideration. The article 942 prescribes that the new technique is used in non-unanimous decisions, rendered in terms of appeal, rescissory action and interlocutory appeal. The technique basically consists in suspending the trial session until new judges in number able to change the decision under attack. The device further guarantees the parties the right to orally sustain their reasons before the new members of the trial session. This article sought to delimit the origins of the extinct form of appeal so that it could examine the innovations brought by the new code, pondering its reflexes and impacts in the legal order of the nation.

Keywords: Withdrawal of the request of reconsideration. New technique of judgment of article 942. New Code of Civil Procedure.

 

Sumário:   Introdução. 1. Origem e evolução dos embargos infringentes.  2. Os embargos infringentes no código de 1973. 3. A supressão dos embargos infringentes no novo código de processo civil. 4. A nova técnica de julgamento disciplinada pelo artigo 942 do código processual civil. Conclusão. Referências.

 

Introdução

O presente estudo tem como principal tema a busca por uma análise pormenorizada dos Embargos Infringentes no Código de Processo Civil de 1973 e sua atual supressão ou transformação nesta nova técnica de julgamento disciplinada pelo artigo 942 da Lei nº 13.105/2015.

A escolha do assunto se deu na curiosidade do autor sobre qual seria a forma de se proceder no caso de enfrentamento a um acórdão com votação não unânime. A dúvida despertou o interesse que logo se transformou em surpresa diante da inovação trazida pelo atual código processual civil.

Através da pesquisa bibliográfica será possível analisar o caminho histórico percorrido pela espécie recursal que representava forma de combate a decisões colegiadas que não obtinham unanimidade nos votos de seus julgadores.

Portanto, com a origem e conceituação do instituto que precedeu a atual sistemática do artigo 942, pode-se proceder a uma análise embasada da atual forma de julgamento de decisões não unânimes. Possibilitando dessa forma a discussão sobre os impactos e reflexos que o novo procedimento gerou no âmbito dos processos nos Tribunais.

Conclui-se, destarte pela relevância do tema em debate, posto que se trata de assunto recente e ainda pouco visto em prática. Desse modo importante a discussão e estudo para que ponderações e analises embasadas possam ser levantadas, visando o aperfeiçoamento de nosso sistema processual. No tocante a metodologia utilizada, trata-se de pesquisa qualitativa, através de análise bibliográfica jurídica, utilizando-se também as técnicas do referente e fichamento.

 

  1. Origem e evolução dos embargos infringentes

Através da análise e entendimento da origem histórica do instituto em estudo é que será possível iniciar o debate, visando o embasamento teórico para que as características e peculiaridades do tema possam ser delimitados. Nesse esteio se mostra necessária a pesquisa em diferentes doutrinas jurídicas nacionais, de forma a oferecer ao leitor um panorama completo sobre a ascendência desta espécie recursal, e ao fim sua conceituação.

Importante destacar os ensinamentos de Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, sobre a temática recursal, para um melhor entendimento do assunto, in verbis: “Os recursos são os meios de impugnação de decisões judiciais, voluntários, internos à relação jurídica processual em que se forma o ato judicial atacado, aptos a obter deste a anulação, a reforma ou o aprimoramento. Para caracterizar um recurso como tal, basta que exista a possibilidade de revisão do ato judicial de maneira intraprocessual e por iniciativa voluntária da parte interessada.”

Nesta mesma linha se posiciona o autor Nelson Nery Jr., para quem o recurso seria um meio de impugnar decisões sob a mesma relação jurídica processual, propiciando a reforma, invalidação, esclarecimento ou integração da decisão. (NERY JR., 2004, p. 42)

Em verdade, doutrinadores concordam que o direito de recorrer remonta a antiguidade, onde era conferido as partes a possibilidade de recorrer das decisões judiciais para a mesma autoridade que as proferiu, ou então para autoridades de grau mais elevado. De acordo com Rezende Filho a existência de meios de combate a decisões proferidas por juízes pode ser encontrada na história de egípcios, hebreus, atenienses e espartanos. (FILHO, REZENDE, 1973, p. 01)

De fato, os autores não conseguem precisar uma data para o surgimento do primeiro recurso, no entanto há concordância no sentido de que a apelação seria a forma mais antiga de recurso. Relegando aos atuais recursos de agravo, recurso extraordinário e embargos o título de formas mais recentes de se recorrer.

No que tange aos embargos infringentes o consenso é de que teria advindo do direito português. Segundo Moacyr Lobo da Costa desde os tempos da monarquia Portuguesa, existe “um meio de impugnação obstativo que guarda íntima semelhança com os embargos”, mas que não recebia a mesma denominação.

Nas palavras de Gisele Heloísa Cunha, o instituto possuía como principal objetivo a retratação do juízo que havia proferido a decisão. Era meio pelo qual a parte vencida buscava reforma da decisão, através de um novo julgamento.

Com a origem no direito lusitano, tem-se que os embargos infringentes foram objeto de constante evolução no âmbito dos acórdãos proferidos pelos tribunais portugueses. Apesar da supressão do instituto em momentos da história legislativa do direito português, nas palavras de Araken de Assis: “Evoluíram os atuais embargos infringentes do simples pedido de reconsideração oposto contra as sentenças. Essa reconsideração representava expediente criado para atalhar dificuldades práticas relacionadas ao procedimento da apelação no antigo direito português, cabível contra sentenças “ou para declará-las (embargos de declaração), ou para modificá-las, isto é, alterá-las em algum ponto, ou alguns pontos indicados em virtude de razão suficiente (embargos modificativos), ou para as revogar, no todo ou na parte principal (embargos ofensivos).”

Com efeito, o recurso em voga deixou de existir no ordenamento jurídico luso, com a manutenção da vedação em 1961, tendo sido efetivamente retirado do ordenamento em 1939 em razão do entendimento de que seria bis in idem face o recurso de apelação. (ARAGÃO, 1973, p. 33-34)

Em nosso país, os embargos foram regularmente codificados no ano de 1939, na publicação do Código de Processo Civil, especificamente no artigo 833. Posteriormente, com a chegada do Código de Processo Civil de 1973, houve alteração no cabimento do recurso para restringir sua aplicabilidade à situações em que restasse caracterizada divergência na decisão atacada. Segundo Pedro Miranda de Oliveira, a intenção dos legisladores à época visava a simplificação do sistema recursal disciplinado pelo Código anterior, tendo em vista que abundavam as dúvidas sobre qual recurso interpor para atacar determinada decisão.

Por fim, alteração recente do cabimento dos embargos infringentes se deu com a Lei nº 10.352, de 26 de dezembro de 2001, que estabeleceu a seguinte redação ao artigo 530 do Código de Processo Civil de 1973: “Art. 530. Cabem embargos infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente ação rescisória. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto da divergência.”

Tal alteração se deu na expectativa de restringir o cabimento dos embargos, visando a celeridade processual e o alivio da carga de processos nas instâncias colegiadas. Como se sabe, no entanto, o legislador não alcançou o fim almejado e o recurso foi suprimido do Código de Processo Civil de 2015.

 

  1. Os embargos infringentes no código de 1973

Este recurso disciplinado pelo Código de Processo Civil de 1973, no Título X, que aborda os Recursos, no Capítulo I – Das Disposições Gerais e no Capítulo IV que abarca especificamente os Embargos Infringentes possui, algumas peculiaridades. São elas atribuídas em razão dos embargos serem reexaminados pelo próprio tribunal que proferiu a decisão impugnada, contando inclusive com a participação dos magistrados que integraram o colegiado no qual foi proferido o acórdão recorrido.

Nesse toar, cumpre trazer à baila ensinamento do professor Vicente Greco Filho, com intuito de elucidar a finalidade e conceituação do recurso em estudo, in verbis: “Esse recurso tem por fim provocar o reexame de acórdãos proferidos em apelação e ação rescisória, no que houver divergência entre os juízes, possibilitando não só a retratação dos que anteriormente votaram, mas também a modificação da decisão pelo ingresso, quando for o caso, de outros juízes no órgão julgador.”

Diante dos esclarecimentos acima elencados, impende avultar que o conceito pode ser facilmente abstraído dos dispositivos legais que disciplinavam o recurso. Desse modo entende-se que os embargos infringentes podem ser conceituados como o recurso oportuno para o ataque de acórdão não-unânime prolatado em sede de apelação ou ação rescisória, devendo ser interposto ao mesmo tribunal que proferiu a decisão impugnada.

Do conceito, extraem-se os pressupostos para interposição dos embargos infringentes, são eles: a) que o acórdão se dê em sede de apelação ou ação rescisória; b) que a decisão não seja unanime; c) que a sentença objeto da apelação seja de mérito; d) que o acórdão tenha reformado a sentença, no caso de apelação; e) que em se tratando de decisão em ação rescisória, o acórdão tenha julgado procedente. (THEODORO JUNIOR, 2008, p. 700-701)

Com esse panorama traçado, importante o lembrete do doutrinador Nelson Nery Junior sobre a necessidade de declaração do voto vencido, tendo em vista que o objetivo dos embargos infringentes é que este voto prevaleça sobre os demais. Pontua o autor que cabem embargos declaratórios quando o voto vencido não tiver sido declarado para que a omissão seja suprida. Assenta ainda o ilustre professor em sua obra que, quando a ausência persistir, “presume-se que a divergência seja total, isto é, a matéria que pode ser objeto dos embargos infringentes é aquela que fora devolvida ao tribunal por ocasião da apelação ou da ação rescisória. ” (NERY JUNIOR, 2008, p. 902)

Quanto aos efeitos deste recurso, não figura como tema pacifico na doutrina, surgindo divergências sobre a temática. Todavia, no tocante aos efeitos em que os embargos podem ser recebidos, tem-se que não são uniformes.

Entende-se que os efeitos dos embargos em sede de ação rescisória terão sempre efeito devolutivo e suspensivo. Quando se tratar de embargos no âmbito de apelações, tem-se que os efeitos acompanham do acessório acompanham o do principal. Sendo que no caso o acessório seriam os embargos e o principal a apelação. Desse modo se a apelação tiver efeito devolutivo e suspensivo os embargos também serão recebidos com os mesmos efeitos. Por outro lado, caso a apelação possua apenas o efeito devolutivo, os embargos também somente serão recebidos com este efeito.

Por fim, imperioso a indagação sobre a quem recairia o julgamento dos embargos infringentes. Para o professor Humberto Theodoro Junior os magistrados que participaram do julgamento da decisão ora em combate não ficariam excluídos do julgamento dos embargos. (THEODORO JUNIOR, 2008, p. 702) No entanto, recomendação advinda do próprio Código de Processo Civil 1973 em seu art. 534, aponta para que a escolha do relator se dê em juiz diverso dos que participaram do julgamento embargado. Em verdade cabem aos Regimentos Internos dos Tribunais ou as Leis de organização judiciaria de cada Estado a disciplina sobre a composição deste órgão julgador que será formado para julgamento dos embargos.

 

  1. A supressão dos embargos infringentes no novo código de processo civil

Como se sabe, e já discorrido anteriormente neste estudo, os Embargos Infringentes foram duramente criticados desde o momento de sua positivação no ordenamento jurídico brasileiro. O debate acalorado, levantava questões sobre seu caráter essencialmente protelatório e desnecessário face aos outros meios recursais existentes.

Esta discussão se mostrou intensa durante todo o período que precedeu o novo código, surtindo controvérsias até os últimos instantes à votação do Código de Processo Civil de 2015. Como se sabe nenhum dos anteprojetos havia mencionado o recurso de embargos infringentes, tampouco o projeto que fora aprovado no Senado Federal. Nesta senda, elucida Cassio Scarpinella Bueno, assentando que “O Projeto da Câmara optou por transformar o que, na tradição do direito brasileiro, era recurso em técnica de julgamento, e foi neste formato que o instituto passou para o CPC de 2015.” (BUENO, 2015, p. 556)

Nesse cenário, com o advento do Novo Código de Processo Civil em 2015 apesar de haver a supressão dos Embargos Infringentes, houve a manutenção de exigência de que o julgamento não unanime em 2º grau não pode ser imediatamente objeto de recurso especial ou extraordinário. Em verdade criou-se uma nova técnica que para muitos juristas se mostrou maneira mais eficiente de combater uma decisão não unanime. (MONTENEGRO FILHO, 2016, p. 733)

Esta inovação veio estabelecida no artigo 942 do atual Código de Processo Civil, a seguir transcrito: “Art. 942.  Quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores.

  • 1oSendo possível, o prosseguimento do julgamento dar-se-á na mesma sessão, colhendo-se os votos de outros julgadores que porventura componham o órgão colegiado.
  • 2oOs julgadores que já tiverem votado poderão rever seus votos por ocasião do prosseguimento do julgamento.
  • 3oA técnica de julgamento prevista neste artigo aplica-se, igualmente, ao julgamento não unânime proferido em: I – ação rescisória, quando o resultado for a rescisão da sentença, devendo, nesse caso, seu prosseguimento ocorrer em órgão de maior composição previsto no regimento interno; II – agravo de instrumento, quando houver reforma da decisão que julgar parcialmente o mérito.
  • 4oNão se aplica o disposto neste artigo ao julgamento: I – do incidente de assunção de competência e ao de resolução de demandas repetitivas; II – da remessa necessária; III – não unânime proferido, nos tribunais, pelo plenário ou pela corte especial.” (grifou-se)

Conforme se extrai do disposto no artigo supracitado, quando ocorre um julgamento não unanime em sede de apelação este terá prosseguimento com a designação de nova sessão onde deverão estar presentes outros julgadores, a serem determinados nos moldes do regimento interno do respectivo tribunal. Nesta nova sessão deverão estar presentes número de julgadores suficientes para possibilitarem a inversão do resultado inicial, assegura ainda o código processual às partes e a eventuais terceiros a garantia de defender mediante sustentação oral suas razões frente aos novos julgadores que integram a sessão. (NEVES, 2016, p. 2389-2390)

Com efeito, ocorre a supressão de uma espécie recursal para que aflore a nova técnica incidental de complementação do julgamento quando o resultado não for unânime. Nesse esteio o incidente desvincula-se do caráter recursal do código de processo, passando a figurar na ordem dos processos nos tribunais. Esta inovação passa a representar técnica de julgamento que visa o aumento da análise de questões controvertidas, de forma simplificada na ordem dos julgamentos dos recursos, dando-se sua aplicação de oficio, nos moldes do referido artigo 942.

 

  1. A nova técnica de julgamento disciplinada pelo artigo 942 do código processual civil

A supressão dos embargos infringentes trouxe à tona esta técnica processual, que segundo Antonio do Passo Cabral e Ronaldo Cramer preservou a tradição brasileira de uma análise colegiada, com maior número de julgadores no caso de um resultado anterior não unânime.

Ainda segundo os autores, importante frisar que o art. 942 não se mostra como técnica inovadora e inusitada, mas sim como um avanço ou evolução histórica dos embargos infringentes no Brasil. Representando passo a frente, na medida em que substitui o recurso de embargos, por uma técnica de julgamentos de menor complexidade. (CABRAL, 2015, p. 1478-1479)

Partindo desse cenário imperioso se faz a análise sobre os motivos que levaram a extinção dos embargos e seus respectivos reflexos sob a atual sistemática imposta pelo artigo 942 da Lei 13.105/2015.

Nesse sentido verifica-se os princípios norteadores do Código de Processo Civil, dentre os quais vale a menção do disposto no artigo “4º – As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.”.

Com efeito, entende-se que a celeridade processual deve compatibilizar-se com os requisitos necessários a regular prestação jurisdicional, resguardando-se desse modo o equilíbrio entre a celeridade e o devido processo legal.

No tocante ao procedimento de oficio deste novo instituto, afigura-se apropriado a ponderação sobre a supressão da participação das partes no processo por meio do contraditório. A extinção do recurso em estudo levou a uma tolhida brusca da participação das partes no processo, o que inevitavelmente leva a uma mitigação da legitimidade do mesmo.

Nesta linha, esclarecem Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, sobre a importância do exercício do contraditório no curso do processo: “O poder do Estado, que é uno, é exercido através de procedimentos, como o procedimento legislativo e o procedimento jurisdicional. Entretanto, tais procedimentos, que culminam na edição de um ato de poder, como a lei e a decisão do juiz devem ser legítimos, ou melhor, devem legitimar o exercício do poder. 

Como o poder, nas democracias, é legitimado pela participação daqueles que são atingidos pelo seu exercício, a participação no procedimento que culmina na criação da lei dá-se através da eleição de representantes capazes de criá-la, isto é, através da chamada democracia representativa. Como o juiz não é eleito, a pergunta que deve surgir é no sentido de como o exercício do poder jurisdicional é legitimado. O exercício do poder jurisdicional somente é legítimo quando participam do procedimento que terminará na edição da decisão aqueles que serão por ela atingidos. Em outros termos, somente existirá procedimento legítimo e, portanto, processo, quando dele participarem aqueles que serão atingidos pela decisão do juiz.

Se o que importa é o princípio político da participação, no processo jurisdicional essa necessidade de participação é representada pelo instituto do contraditório.” (grifou-se) (MARINONI, 2007, p. 54-55)

Dessa forma mesmo que a lei processual tenha assegurado a possibilidade de nova sustentação oral pelas partes diante dos novos julgadores, restou prejudicada a participação das partes integrantes do processo. Tendo em vista a acentuada e visível diminuição da influência dos litigantes no convencimento dos julgadores em razão da extinção do recurso de embargos infringentes. Alguns doutrinadores sustentam ainda que esta situação retardaria a mudança no entendimento jurisprudencial dos tribunais, na medida em que impediria de certo modo a discussão e divulgação do entendimento minoritário.

No entanto, não se pode olvidar que existem posicionamentos contrários. Como se sabe, os julgamentos em tribunais se dão por no mínimo 3 ou mais magistrados. Observa-se que há possibilidade de ocorrer entre eles a “…divergência sobre questões de fato e questões de direito, isto é, no modo de interpretação das normas e de outras fontes do direito aplicado na respectiva ordem jurídica”. (SANTOS, 2017, p. 686) No entanto, nos moldes do caput do art. 942 do CPC este entendimento minoritário pode vir a se tornar o vencedor, na medida em que a lei processual exige a convocação de novos julgadores “…em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial”.

Outro fator importante que se mostra de grande valia na mudança do acórdão com a acolhida do entendimento estampado no voto minoritário diz respeito ao estabelecido no § 3º do art. 941 que assevera ser o voto vencido parte integrante do acórdão e, portanto, deve ser nele declarado para fins de pré-questionamento. (PINHO, 2017, p. 676)

 

Conclusão

Os Embargos Infringentes estabelecidos nos artigos 530 até 534 do Código de Processo Civil de 1973, representavam espécie de recurso apto a combater um acórdão com divergência entre os julgadores. Esta modalidade recursal se mostrava como forma restrita de abrangência e de limitada hipótese de cabimento, na medida que se destinava a revisão de apenas parte da decisão proferida.

O instituto foi alvo de duras críticas durante os anos, levantando diversas questões sobre sua efetividade como meio de assegurar o contraditório e o devido processo legal as partes.

Com o advento do Código de Processo Civil em 2015 e a inovação trazida pelo artigo 942 implementou-se o “incidente de infringência” através do qual o tribunal, de oficio, procede a uma espécie de novo julgamento quando a decisão não se deu de forma unânime. Com este procedimento a sessão que inicialmente proferiu a decisão é suplementada por tantos julgadores quanto bastem para que se possibilite a vitória do voto vencido.

As hipóteses de cabimento foram ampliadas com a nova técnica, incluindo-se a aplicação em julgamentos não unânimes quando da interposição de agravo de instrumento.

Isso posto, e por todo o contexto exposto no presente artigo, verifica-se que o legislador buscou manter a identidade dos Embargos Infringentes no novo código, suprimindo a complexidade do recurso, mas mantendo as finalidades do mesmo. Desse modo buscou conferir maior celeridade aos processos nos tribunais, mantendo o contraditório e a possibilidade de retratação do acórdão divergente.

Cabe destacar, que parte da doutrina não concordou com a supressão do recurso, afirmando que os impactos negativos de sua extinção seriam danosos ao processo civil. No entanto, conclui-se que o momento exige cautela para que os posicionamentos e entendimentos possam ser averiguados e testados em prática através dos anos, para que somente então possa se exprimir parecer confiável sobre os reflexos desta inovação no sistema processual brasileiro.

 

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