A legitimidade da defensoria pública para ajuizar ação civil pública

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A nação brasileira sempre lutou para que o Estado assegurasse alguns direitos fundamentais, que eram constantemente violados até mesmo com o respaldo constitucional.


Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que proclamou o Brasil como um Estado Democrático de Direito, institui-se postulados, a fim de assegurar os tão desejados direitos, bem como as garantias fundamentais de cada cidadão, sendo que, a criação da Defensoria Pública materializou tais preceitos constitucionais.


A Defensoria Pública, de acordo com o art. 134 da Constituição Federal, é uma instituição essencial à justiça encarregada de garantir aos necessitados o acesso à justiça, direito fundamental que não se limita apenas ao Judiciário e suas Instituições, mas a promoção da ordem jurídica criadora de sentenças socialmente justas.


Dessa feita, é a Defensoria Pública incumbida de conferir acesso à justiça para a grande maioria da população brasileira, privada das mínimas condições de vida digna. Como se trata de uma instituição nova, ainda sofre equívocos que a impede de exercer o seu papel de inserção social, imprescindível à efetivação da Justiça.


Neste Contexto, a fim de, conferir proteção aos interesses e direitos difusos e coletivos a Lei n. 11.448/2007, alterou o art. 5º da Lei n. 7.347/85 aumentando o rol dos legitimados, isto é, a Defensoria Pública passou a ter legitimidade concorrente para propor tal ação.


A Lei n. 7.347/85 (LACP) introduziu no ordenamento jurídico brasileiro um importante mecanismo de proteção aos interesses difusos e coletivos, a Ação Civil Pública, que segundo o doutrinador Gianpaolo Poggio Smanio contém uma impropriedade em seu nome, pois toda ação civil é pública, sendo que, a expressão pública não é por causa do Ministério Público, visto que, este não é o único legitimado para entrar com a ação, dessa forma, a ação civil pública tem por objetivo a tutela dos interesses difusos, transindividuais, ou metaindividuais, proposta por qualquer dos legitimados. [1]


No Brasil existem outras leis em que Ação Civil Pública incide, quais sejam: Lei n. 7.853/89, que trata da Ação Civil Pública em favor das pessoas portadoras de deficiência; Lei n. 7.913/89, que dispõe sobre o ajuizamento da Ação Civil Pública no caso de responsabilidade por danos causados aos investidores no mercado de valores mobiliários; Lei n. 8.069/90 (ECA); Lei n. 9.494/97, que limita o alcance da coisa julgada na ação civil pública; e a Lei n. 11.448/2007, que acrescentou a Defensoria Pública no rol dos legitimados do art. 5º da LACP.


Cumpre destacar que após a alteração supramencionada tanto o Ministério Público, quanto a Defensoria Pública, União, Estados, Distrito Federal, Municípios, Autarquias, Empresas Públicas, Fundação, Sociedade de Economia Mista e Associações, desde que cumpridas as exigências legais, estarão legitimadas a propor Ação Civil Pública em favor dos interesses transindividuais.


A Constituição Federal em seu art. 5°, LXXIV, estabelece que o “Estado prestará assistência judiciária integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”.


Essa garantia constitucional é assegurada através da atuação da Defensoria Pública que de acordo com a Carta Magna, em seu art. 135, caput, é uma instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa em todos os graus, dos necessitados.


Além disso, a Lei n. 1.060/50 também garante aos necessitados, na forma da lei, os benefícios da justiça gratuita.


A garantia da gratuidade da justiça aos necessitados deriva do princípio da igualdade que tem por fim impedir distinções, discriminações e privilégios arbitrários, preconceituosos, odiosos ou injustificados.[2]


“O papel da lei não é outro senão o de implantar diferenciações”[3], com isso, o elemento discriminador aqui adotado tem uma justificativa racional e está de acordo com o fim constitucionalmente consagrado, isto é, o direito ao acesso à justiça a todos. Ademais, tal direito está inserido no rol dos objetivos da República Federativa do Brasil que constituem, entre outros, erradicar a pobreza e diminuir as desigualdades, construindo uma sociedade livre, justa e solidária.


Dessa forma, a Defensoria Pública, a fim de, fazer valer os direitos das pessoas que realmente necessitam está desempenhando seu importante papel com brilhantismo e determinação.


Ocorre que, em decorrência da evolução e da estruturação da Defensoria Pública no atendimento aos necessitados e, principalmente, com o advento da Lei n. 11.448/2007, que alterou o art. 5º da Lei n. 7.347/85, legitimando esta Douta Instituição a propositura da Ação Civil Pública, iniciou-se uma discussão a respeito dessa mais nova atribuição, tendo, inclusive, a Associação Nacional do Ministério Público (CONAMP) ajuizado perante o STF uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI n. 3.943), sob o fundamento de que tal inclusão afronta os arts. 5º, LXXIV e 134, da Constituição Federal, pois argumentam que a Defensoria Pública foi criada para atender, gratuitamente, aos necessitados, aqueles que possuem recursos insuficientes para defender judicialmente ou que precisem de orientação jurídica, sendo que, com essa legitimidade extraordinária conferida pela nova lei não se pode individualizar ou identificar se realmente a pessoa atendida pela Instituição não possui recursos suficientes para ingresso em Juízo.


Além disso, inferem que a nova lei ao conferir legitimidade à Defensoria Pública para propor, sem restrições, ação civil pública, afeta diretamente a atribuição do Ministério Público, pois, é ele, entre outros, o legitimado para tal propositura.


É comezinho que o papel fundamental da Defensoria Pública é o atendimento de forma gratuita aos necessitados, dessa forma, não poderá ser diferente com relação ao ajuizamento da Ação Civil Pública, assim como bem preleciona o doutrinador Pedro Lenza: “Entendemos que a ação civil pública ajuizada pela Defensoria Pública deverá se adequar à sua finalidade constitucional específica, qual seja a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV”. [4]


Nesse sentido o STF decidiu no julgamento da ADI 558, que limitou o ajuizamento de ação civil pública pela Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro em favor das associações que incluam entre suas finalidades estatutárias a proteção ao meio ambiente e a de outros interesses difusos e coletivos (art. 179, § 2º, V, “e”, CE/RJ), bem como estabeleceu como função institucional da Defensoria Pública o patrocínio dos direitos e interesses do consumidor lesado, desde que economicamente hipossuficiente, na forma da lei. [5]


No entanto, com relação à alegação de que a legitimidade da Defensoria Pública em ajuizar Ação Civil Pública impede o Ministério Público de exercer suas atividades não deve prevalecer, visto que, a Constituição Federal não dispõe entre as funções institucionais do Ministério Público a promoção exclusiva da Ação Civil Pública, com bem se verifica no art. 129, III da Constituição Federal, in verbis.


Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:


I – promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;


II – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;


III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; […] (negritamos)”


Assim, de acordo com o preceito constitucional foi elaborada a LACP, que originalmente, em seu art. 5º colocou ao lado do Ministério Público, como legitimados ao ajuizamento da Ação Civil Pública, a União, os Estados, os Municípios, as Autarquias, as Fundações, as Sociedades de Economia Mista, as Empresas Públicas e as Associações.


Cumpre destacar que, a legitimação de uma instituição não afasta a da outra, assim como verifica-se na lição de Pedro Lenza: “Lembrar que a legitimação acima referida para a ação civil pública não impede a dos outros legitimados, conforme se observa pelo art. 5º da Lei n. 7.347/85 (Lei da ação civil pública)”. [6]


Nesse contexto, observa-se que há legitimidade extraordinária ativa concorrente entre a Administração Direta e Indireta, Associações, Defensoria Pública e Ministério Público para ajuizar a ação civil pública, em proteção aos direitos transindividuais.


Dessa feita, com todas as discussões levantadas, faz-se necessário, aguardar como o STF vai interpretar a modificação trazida pela Lei n. 11.448/2007.


 


Referências bibliográficas

ABELHA, Marcelo. Ação Popular. Ações Constitucionais. Organizador: Fredie Didier Jr. Salvador: Jus Podium, 2006.

BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 1995.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.

_______. Lei n. 7.347, de 24 de julho de 1985. “Disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagismo e dá outras providências.” Disponível em <www.planalto.gov.br> Acesso em 20 de julho de 2008.

_______. Lei n. 11.448, de 15 de janeiro de 2007. “Altera o art. 5º da Lei n. 7.347/85, que disciplina a ação civil pública, legitimando para a sua propositura a Defensoria Pública.” Disponível em <www.planalto.gov.br> Acesso em 2º de julho de 2008.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 18 ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 11 ed. São Paulo: Método, 2007.

___________. Teoria Geral da Ação Civil Pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.

NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 2 ed. São Paulo: Método, 2008.

SMANIO, Gianpaolo Poggio. Interesses Difusos e Coletivos. São Paulo: Atlas, 1998.

SOUZA, Silvana Cristina Bonifácio. Assistência Jurídica. São Paulo: Método, 2003.

 

Notas:

[1] SMANIO. Gianpaolo Poggio. Interesses Difusos e Coletivos. São Paulo: Atlas, 1998. p. 95.

[2] NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 2 ed. São Paulo: Método, 2008. p. 292.

[3] BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p.169.

[4] LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 11 ed. São Paulo: Método, 2007. p. 623.

[5] ADI-MC 558/RJ – Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 16.08.1991, Pleno; DJ 26.03.1993, p. 5001.

[6] LENZA, Pedro. Op cit. p. 596.


Informações Sobre o Autor

Ana Paula Gilio Gasparotto

Assessora de Defensor Público, Defensoria Pública do estado de Rondônia, Núcleo de Ji-Paraná


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