Direito processual civil constitucional: o papel dos princípios constitucionais e sua aderência ao processo civil

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1. Conceito de princípios constitucionais do processo.


Sem sombra de dúvidas, há princípios que orientam a elaboração legislativa, a interpretação e consequentemente a aplicação do direito processual.


Nesse sentido, Uadi Lammêgo Bulos afirma que:


“ele é o enunciado lógico extraído da ordenação sistemática e coerente de diversas disposições normativas, postando-se como uma norma de validez geral, cuja abrangência é maior do que a generalidade de uma norma particularmente tomada” (BULOS; 2002, p. 37).


Ora, é sabido que princípios nada mais são do que “regras” abstratas com baixo teor semântico, generalizante, que propõe preceitos sui generis à interpretação e a aplicação do direito. Assim, conforme preleciona Luiz Rodrigues Wambier, princípios são “normas que fornecem coerência e ordem a um conjunto de elementos, sistematizando-o” (Curso Avançado de Processo Civil I, 8ª. Ed., RT, 2006, pág. 66).


Nada mais sábio de elencar que princípios são normas “fundantes” do ordenamento jurídico, onde sua aplicabilidade é inerente aos preceitos das normas infraconstitucionais.


Em suma, os princípios constitucionais do processo são, por assim dizer, preceitos de elevada importância, posto que estejam esculpidos na Constituição Federal e predispõe uma forma de aplicação constitucional, ou seja, o respeito aos princípios constitucionais faz-se mister para a validade do processo, sendo que sua não aplicação gerará nulidade processual.


Para a escola do pós-positivismo, os princípios constitucionais nos lindes da nossa Constituição são os vetores normativos que embasam e constituem a razão essencial das normas jurídicas, logrando posição destacada no sistema jurídico, e por isso, desempenham uma função retórica-argumentativa, onde o enquadramento se daria por standards que colimam reclamos de justiça, lastreando-se na idéia de direito (vide ALEXY, Robert; DWORKIN, Ronald).


2. Dos Princípios Constitucionais do Processo


2.1. O Devido Processo Legal


Devido processo legal, para Antonio Carlos De Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover, e Cândido Rangel Dinamarco “entende-se (…) o conjunto de garantias constitucionais que, de um lado, asseguram às partes o exercício de suas faculdades e poderes processuais e, do outro, são indispensáveis ao correto exercício da jurisdição” (Teoria Geral do Processo, 23ª. Ed., Malheiros, 2007, pág. 88).


Em complemento à idéia, ensina-nos Nelson Nery Jr. que “genericamente, o princípio do due process of law caracteriza-se pelo trinômio vida-liberdade-propriedade, vale dizer, tem-se o direito de tutela àqueles bens da vida em seu sentido mais amplo e genérico. Tudo o que disser respeito à tutela da vida, liberdade ou propriedade está sob a proteção da due process of law” (Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 8ª. Ed., RT, 2004, pág.63).


Com efeito, pela junção dos conceituados doutrinadores poder-se-ia dizer que a expressão “devido processo legal” significa o processo onde os atos procedimentais e as conseqüências são previstas em lei, dando-lhe maior expressão de seguridade no que concerne a decisões, e consequentemente um prestação estatal devida, onde se perfaz importantíssima a consonância com os valores embutidos na Constituição Federal ( axiologia constitucional).


O princípio ora descrito é, na denominação da maioria da doutrina processualista, um “macro princípio”. Tal motivo para a conceituação tem o escopo de prelecionar que o princípio do “devido processo legal” alberga todos os demais princípios constitucionais, no que tange a aplicabilidade de princípios constitucionais do processo, v.g., o princípio da publicidade, do juiz natural, etc.


Historicamente, o intróito de utilização do termo em ordenamento jurídico é datado de 1215, na Magna Charta de João Sem Terra, na Inglaterra. Preceito histórico de reivindicações quanto à seguridade da propriedade, em conseqüência, do processo.


No Brasil, com o advento da Constituição Federal de 1.988, o assunto passa a ser tratado no art. 5º., inciso LIV, onde se diz que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.


2.2. Ação


O princípio da ação indica o preceito da atributividade onde cabe as partes (bilaterais, no mínimo) provocarem o exercício funcional da jurisdição. Assim, nos ensinamentos de Cintra, Grinover e Dinamarco (op. Cit.) “denomina-se ação o direito (ou poder) de ativar os órgãos jurisdicionais, visando à satisfação de uma pretensão” (Pág. 64). Importante lembrar que, no dizer de Fernando Capez “a impossibilidade de o juiz tomar providências que superem ou sejam estranhas aos limites do pedido ‘ne eat iudex ultra petita oartium’” (Curso de Processo Penal, 8ª. Ed., Saraiva, 2004, pág. 20).


Incontinenti, a jurisdição é inerte perante os atos, isto é, é preciso uma série de provocações onde o interessado possa estabelecer suas pretensões resistidas pela outra parte (bilateralidade processual).


Portanto, cabem aos litigantes as devidas investiduras para que seu direito de ação seja plenamente atribuído, mediante a propositura de medidas que visam sua pretensão satisfatória.


2.2.1. Processo Inquisitivo


É aquele onde as funções de acusar, defender e julgar encontram-se num único órgão, sendo esse órgão, o juiz. Assim, é o juiz quem inicia o processo (de ofício), colhe as provas, e que ao final, julga proferindo uma sentença. Doravante, o processo inquisitivo apresenta como características peculiares a maneira secreta, não apresentando o contraditório, e por via de regra, escrito.


Provou-se com o passar os tempos que, por ser o próprio juiz o instaurador do processo há uma ligação psicológica, porque esta ligação está peremptoriamente ligada a sua pretensão, colocando-se em propensão a seu julgo.


2.2.2. Processo Acusatório


Tem suas raízes em Roma e Atenas. Seu escopo é de igualdade, com a imparcialidade do juiz, de um amplo contraditório e da publicidade processual. Consta o determinado processo de partes processuais, ou seja, a bilateralidade processual, onde há um acusador e um acusado, em igualdade, tendo assim, um processo de ação.


Importante citar que o ordenamento jurídico brasileiro adota o processo acusatório, no que tange ao Código de Processo Penal (arts. 24,28 e 30) e ao Código de Processo Civil (arts. 2º., 128 e 262).


Nesse modelo processual, o juiz não propõe ação de ofício, a contrario sensu do processo inquisitivo, pois visa o embate técnico entre defesa e acusação, onde o juiz apenas proferirá a sentença, mantendo um juízo de valor.


2.3. Do Contraditório e da Ampla Defesa


Princípio constitucional que estatui uma defesa digna ao acusado, assim como a audição perante um tribunal.


Numa definição clássica, Wambier (op. Cit.) descreve que “pode ser identificado como princípio da paridade de tratamento ou princípio da bilateralidade da audiência” (pág. 68).


Importante notar que esse princípio (assim como os demais, em regra) possui liames para com os demais princípios constitucionais do processo, v.g., duplo grau de jurisdição.


Com efeito, o constituinte originário preferiu colocar o princípio como uma garantia fundamental, e em simbiose com um preceito de individualização, ou melhor, um direito garantidor do indivíduo enquanto ser humano (art. 5º., LV,LXXIV, da CF).


No que condiz a matéria da ampla defesa, ensina-nos o saudoso mestre Celso Ribeiro Bastos, juntamente com Ives Gandra Martins que:


“por ampla defesa deve-se entender o asseguramento que é feito ao réu de condições que lhe possibilitem trazer para o processo todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade (…) basta salientar o direito em pauta como um instrumento assegurador de que o processo não se convergirá em uma luta desigual em que ao autor cabe a escolha do momento e das armas para travá-la e ao réu só cabe timidamente esboçar negativos” (Comentários à Constituição do Brasil, vol.2, Saraiva, 1.989, pág.266).


Em suma, o contraditório é a relação bilateral entre os envolvidos no processo, onde depois de ouvida uma das partes, a outra deverá também ser ouvida, perante um juiz de Direito eqüidistante das partes, dando-lhes maiores possibilidades de decisões fundamentadas em provas colhidas de ambas as partes, com fito de uma justiça eqüitativa. A ampla defesa reúne qualidades biunívocas com o contraditório, ou seja, ao Estado cabe proporcionar a todo acusado a mais ampla e completa defesa (na medida do possível).


2.4. Do Juiz Natural


O juiz natural, nas palavras de Alexandre de Moraes é “somente aquele integrado no Poder Judiciário, com todas as garantias institucionais e pessoais previstas na Constituição Federal” (Constituição do Brasil Interpretada, Atlas, 2002, pág. 304)


Cabe agora explicitar sobre a diferenciação que a norma constitucional fez para que o princípio do juiz natural fosse aplicado em contrário do determinado sobre os Tribunais de Exceção.


O princípio do juiz natural é o oposto de um juízo de exceção (tribunal). Lembremos-nos que juiz de exceção é aquele que sua criação adveio após o fato ocorrido, isto é, a criação do juízo de exceção é arbitrariamente constituída por sujeitos com interesses numa condenação sem um julgamento plausível de defesa, sendo assim, um julgamento onde os indivíduos já são, de per si, julgados antes mesmo de serem ouvidos.


Assim, preleciona Fernando Capez (op. Cit.) que “juiz natural é aquele previamente conhecido, investido de garantias que lhe assegurem absoluta independência e imparcialidade” (pág. 25).


Tal norma tem-se como principiologica (art. 5º. XXXVII e LIII, da CF), e assim sendo, é de maior relevância, pois sua interpretação é dada de maneira extensiva, e com isto pode-se afirmar que o princípio do juiz natural deve ser interpretado não somente como uma barreira coibitiva à instauração de Tribunais de Exceção, mas sim, exigência de respeito para com as normas que estabelecem a denominação de competências, para que não haja afetação da independência do órgão julgador.


Obs: As justiças especializadas não são tribunais de exceção, mas sim, ramificações de justiças especializadas em determinados temas.


2.5. Duplo Grau de Jurisdição


“Esse princípio indica a possibilidade de revisão, por via de recurso, das causas já julgadas pelo juiz de primeiro grau (ou primeira instância), que corresponde à denominada jurisdição inferior. Garante, assim, um novo julgamento, por parte dos órgãos da ‘jurisdição superior’, ou de segundo grau (também denominada segunda instância)” (ARAÚJO CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO. Op. Cit. Pág. 80).


O princípio do duplo grau de jurisdição não se encontra expressamente consignado na Constituição Federal (art. 5º.; LIV), mas decorre, nos ensinamentos de Gilson Delgado Miranda, do devido processo legal (Processo Civil: Recursos; 2002, pág. 22)


Observe-se, outrossim, que a subjetividade do princípio implica sua não explicitação na Constituição Federal, como ocorre com o devido processo legal. Portanto, menciona-se que o princípio é decorrente, também, do art. 92 da Constituição, sendo implicitamente correlacionado aos tribunais.


Deveras, em composição de um sentido lato, o princípio do duplo grau de jurisdição é aquele que em que há a possibilidade de provocar (já dissemos que a jurisdição é inerte) o reexame da matéria apreciada e decidida por um determinado tribunal, isto é, de pleitear, mediante a interposição de um recurso em um órgão jurisdicional hierarquicamente superior, onde haverá um novo julgamento.


2.6. Inafastabilidade da Jurisdição


A inafastabilidade da jurisdição é o princípio onde todos têm o direito de obter do Poder Judiciário a tutela jurisdicional adequada. Ora, aplicar a tutela jurisdicional adequada é suportar o ônus de explicitar o ajuizamento da ação como fundamento de uma pretensão resistida e que, ao final, dar-se-á a razão a uma das partes em litígio (bilateralidade da ação; litisconsórcio; etc).


Para Alexandre de Moraes, o direito à tutela jurisdicional:


“é o direito que toda pessoa tem de exigir que se faça justiça, através de processo onde são reconhecidas as garantias mínimas. O acesso dos cidadãos aos tribunais de justiça, à procura de uma resposta jurídica fundamentada a uma pretensão ou interesse determinado, realiza-se pela interposição perante os órgãos jurisdicionais, cuja missão exclusiva é conhecer e decidir as pretensões, que são submetidas ao conhecimento do órgão judicante, tendo em vista os direitos fundamentais da pessoa” (p. 292)


Sendo assim, de fácil similitude tornar-se-á a compreensão de que o preceito constitucional está subjetivamente ligado ao art. 5º. ; XXXV da CF. O princípio da ação (2.b.) rechaça a idéia de ter como um direito fundamental o ajuizamento de uma pretensão junto a um órgão jurisdicional, sendo de maior valia o princípio Democrático de Direito.


É necessário mencionar que tal princípio não alberga somente questões de direitos individuais, mas além de tudo, direitos meta-individuais (difuso, coletivo ou individual homogêneo). No mundo modernizado são crescentes os anseios para a defesa de direitos da coletividade como pretensão à justiça.


Mister é mencionar que o fito do princípio da inafastabilidade da jurisdição é a preservação de um aspecto subjetivo do sujeito, qual seja, a justiça.


Neste sentido, Nery Jr. leciona que “não pode o legislador e ninguém mais impedir o que o jurisdicionado vá a juízo deduzir pretensão” (Op. Cit. p. 130).


2.7. Imediata Comunicação do Flagrante


A prisão em flagrante é aquela realizada quando a infração penal está sendo praticado pelo deliquente-infrator, em sentido lato.


A matéria é regulada pelo Código de Processo Penal em seu art. 302, incisos I, II, III e IV.


Denota-se que para a materialização da efetiva prisão em flagrante a autoridade policial não necessita de um mandado de prisão, expedida por órgão do Judiciário, competente. Tem-se tal motivação porque a prisão se efetua no momento do ato delituoso (I), logo após o término do ato (II), após o término com conseqüente perseguição (III), ou ainda, por presunção de uma série factual de ações ou omissões (IV).


Para tanto, é necessário não olvidar-se que a Lei Suprema ampara o delinqüente, sendo este uma pessoa humana, na (in)aptidão exata do termo jurídico (art. 1º., III) e em combinação com o art. 5º., incisos LXII, LXIII e LXIV, que concedem plena identificação da feitura da prisão, tem por escopo a identificação do crime por ele cometido e consequentemente, seus direitos garantidores de defesa, direitos estes inerentes a pessoa.


Assim, mediante o fato da prisão em flagrante, é necessário a comunicação para o juiz competente, à família do preso ou à pessoa por ele indicada; e em consonância, é dever da autoridade policial, comunicar ao preso todos seus direitos e garantias (direito de permanecer calado, assistência da família, assistência judiciária gratuita, etc.); de mister faz-se que a autoridade que efetuar a prisão identifique-se como tal, para não haver o chamado “abuso de autoridade”.


Portanto, torna-se claro a luz da lei que mesmo praticando atos de delinqüência, ao preso é necessário a relativização de seu estado, pondo como preceito constitucional seu direito a dignidade, em interpretação extensiva, findando assim, o escopo do Estado de Direito.


2.8. Da Motivação


O mau vezo no qual alguns magistrados ocorriam (e ainda incorrem) ao sentenciar casos onde o princípio da motivação não era argüido fez com que o constituinte originário preponderasse pela justificação do ato sentencial, até porque o período vivido anteriormente a atual Constituição estava repleto de exemplos (Período Militar – 1964.1985).


Nos dizeres de Nery Jr. “a motivação das decisões judiciais surge como manifestação do Estado de Direito” (Op. Cit. Pág. 215).


A importância maior de uma sentença motivada se dá pelo fato dela ocorrer de pleno direito, pois ao contrário uma sentença sem as motivações que a levaram a tona seus raciocínios lógicos tem seus efeitos designados “ex tunc”, isto é, efeitos nulos (art. 5º. LX ; art. 93, IX).


Assim, sua importância reside no fato dela (sentença) gerar efeitos erga omnes quando justificada de maneira plausível aos olhos da lei, mas também, beneficiando a comunidade como um todo.


Como bem salienta Antonio Scarance Fernandes:


“(…) no intuito de ter condições de verificar se o juiz e por conseqüência a própria justiça, decide com imparcialidade e com conhecimento da causa. É através da motivação que se avalia o exercício da função jurisdicional” (FERNANDES, 1.999).


Dessa maneira, a motivação das decisões judiciais é vista como uma garantia entre as partes, com o fito de uma possível impugnação para uma advinda decisão reformatória. Outrossim, modernamente, não só suporta o pensamento tradicional sobre o tema, e por isso, hoje, a motivação das sentenças judiciais tem conotação política, onde qualquer um do povo pode tomar conhecimento da imparcialidade (ou não!) do juiz e a justiça das decisões de mérito.


2.9. Da Publicidade


Consiste no ato jurisdicional onde se torna público os atos e procedimentos da ação empreendida na jurisdição, com escopo de legitimidade às partes, e consequentemente, das decisões proferidas pela autoridade competente.


Tal princípio tem o fito, grosso modo, de integrar as pessoas (leigos) conjuntamente com a autoridade judiciária. Em outras palavras, a finalidade do princípio torna-se imprescindível à justiça social, posto que, ao povo julgam-se os atos necessários à justiça, e por meio da publicidade dos atos processuais é que se tem a exteriorização dos efeitos jurisdicionais.


Sendo assim, a célebre frase perfaz o significado do princípio, eis que “o povo é o juiz dos juízes”. Reafirma-se, assim, que aos atos cuja publicidade vem à tona os tornam conhecidos pelos leigos (ou não) para uma maior acepção do conhecimento da justiça, ratificando-os de maneira popular.


O bojo do princípio da publicidade tem-se conjuntamente com o da motivação (art. 93, IX), vista que para que um ato informativo jurisdicional se faz mister a justificativa da argumentação do juiz. Portanto, ambos possuem relações biunívocas inerentes à aplicação no caso concreto (art. 93, IX; CF).


Necessário é afirmar que nem todos os processos são conformes ao princípio da publicidade, haja vista que em se tratando de assunto onde possua interesses onde a imprescindibilidade do sigilo torna-se obrigatória, havendo respeito à intimidade das partes litigantes. Quanto a esse aspecto, leciona Arruda Alvim Netto que:


“O Código de Processo Civil abre taxativamente duas exceções: correm em segredo de justiça os processos em que o exigir o interesse público (aqui tem-se um caso de interpretação de conceito vago, devendo o juiz avaliar caso a caso, concretamente considerado) e os que dizem respeito a casamento, filiação, separação dos cônjuges, conversão desta em divórcio, alimentos e guarda de menores que, em ultima ratio também seriam casos em que o interesse público autoriza o segredo de justiça” (ALVIM NETTO, 2002; p. 39).


2.10. Respeito à Coisa Julgada


Por conceito, entende-se que coisa julgada é a externalização de uma ação judiciária onde não cabe mais às partes do processo (re)discutir a matéria atingida pelo efeito formal e material do princípio.


Em suma, há um esgotamento de recursos quanto à matéria tratada, onde não mais se pode questionar a eficácia jurídica da sentença.


Assim, coisa julgada é elemento de existência do Estado Democrático de Direito, pois visa dar fim a uma pendência e declara o direito das partes, não sendo mais interpelada.


O princípio é tema constitucional enunciado no art. 5., inciso XXXVI da Constituição, e tem a maioria da doutrina constitucional que o presente artigo e inciso são cláusulas pétreas, ou seja, não podem ser modificadas pelo poder reformador. A justificativa para a acepção do raciocínio se dá pelo fato de o princípio pleitear como garantia do indivíduo o respeito à coisa julgada, pondo fim à lide (art. 60, §4º., IV).


Em conformidade com a doutrina processualista, coisa julgada tem característica holística, porém, é dividida em duas categorias, onde são apenas aspectos de uma única coisa julgada, subdividindo-se em coisa julgada formal e coisa julgada material.


Coisa julgada formal é aquela que visa por um fim à lide, tendo características de imutabilidade da decisão proferida no mesmo processo em que ela fora emitida, não cabendo mais recursos quanto à sentença, seja ela de um juiz (singular; monocrático), de um desembargador (órgão colegiado), ou de um ministro (no caso, dos tribunais superiores, v.g., STF).


Por oposto, “coisa julgada material (auctoritos rei indicatae) é a qualidade que torna imutável e indiscutível o comando que emerge da parte dispositiva da sentença de mérito não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário” (NERY JR. 2004, pág. 38). Em complemento, pode-se dizer que a coisa julgada material estrutura efeitos jurídicos a priori que regularão não somente o presente momento, mas sim fatos futuros com indistinta durabilidade (estabilidade e permanência dos efeitos da sentença), não podendo mais ser (re)discutida em outras ações e processos.


2.11. Indenização do Erro Judiciário


Preliminarmente, não há de se olvidar que, para que haja algum direito à indenização é necessário um erro, e que consequentemente esse erro gere um dano, um prejuízo.


Assim, preleciona Daniel Baggio Maciel que:


“a jurisdição configura serviço público específico e singular na prática, isto é, diretamente voltado às partes da lide, e deve ser desenvolvida de modo a não causar danos àqueles que a ele se submetem, soluntariamente ou não” (MACIEL, 2006; p. 151).


Nas lições na ilustre jurista Maria Helena Diniz, “o dano, ou prejuízo, é o ponto nuclear da responsabilidade patrimonial, porque o objeto desta se exaure na reparação daquele. Por isso, é correto afirmar que não se pode pensar em indenização sem que o dano exista” (DINIZ, 2002; p. 61). Historicamente, o erro judiciário não era considerado verdadeiramente uma responsabilidade jurisdicional. Ora, diversos administrativistas colocavam-se peremptoriamente contra a idéia de culpa na jurisdição. De sorte que hodiernamente a visão tornou-se contraria, assumindo assim, a característica da falibilidade do ato jurisdicional por conta de erro (na acepção do ser humano) de um servidor público.


Assim, nos dias atuais, a responsabilidade do Estado por atos jurisdicionais falhos é maioria em doutrina, e em certa medida, também na jurisprudência.


Como bem observa o feito, “a tese da irresponsabilidade estatal está, na verdade, perdendo terreno, paulatinamente, não só em razão do princípio da igualdade dos encargos sociais, segundo o qual o lesado fará jus a uma indenização toda vez que sofrer um prejuízo causado pelo funcionamento do serviço público, mas também porque os argumentos em que se baseia não são convincentes” (DINIZ, 2002; p. 553).


Assim, é de se justificar o porquê da matéria ser aplicada em ambos os ramos processuais, isto é, tanto no direito processual civil como também no direito processual penal.


O único caso onde a responsabilidade do Estado por erro judiciário não se aplica está encabeçado no Código de Processo Civil, em seu art. 485, inciso III.


2.12. Da Disponibilidade da Ação e da Indisponibilidade da Ação


Disponibilidade é a liberdade que as pessoas têm de exercer ou não seus direitos (art. 5º., inciso LIX , da CF/88).


No Direito Processual Civil é quase unânime a esta disponibilidade, já que as únicas limitações decorrem da natureza indisponível de certos direitos materiais, por prevalecer o interesse público sobre o interesse privado.


No Direito Processual Penal é inverso o entendimento, posto que não haja a renúncia do direito de punir do Estado para com seus cidadãos, sendo o crime uma lesão irreparável ao interesse coletivo, onde a pena é um reclame social, com fito a restauração da ordem jurídica violada.


Assim, o poder dispositivo inerente as pessoas, que podem exercer ou não seus direitos, apresentam-se nas possibilidades de apresentarem ou não sua pretensão em juízo, bem como de apresentá-la da maneira como melhor lhe convier, ou ainda, a renúncia, em determinadas situações fático-processuais, em sua grande maioria, no que tange a direitos disponíveis (direito processual civil). A contrario sensu, a disponibilidade da ação não gera efeitos na seara do direito processual penal, vista que o jus puniendi é matéria imprescindível para a manutenção da ordem social, incontinenti que o crime preceitua, em seu cerne, um desrespeito para com o a coletividade, logrando a desordem a impotência do organismo estatal. Para tanto, a indisponibilidade da ação penal cabe exceções, como no caso da ação penal pública condicionada (condicionada à vontade da vítima de representar ação movida pelo Ministério Público) e na ação penal privada (condicionada diretamente a vítima, onde esta tem o direito de representar de per si).


2.13. Da Presunção de Inocência


O Estado precisa comprovar a culpabilidade do indivíduo, que é constitucionalmente presumido inocente, sob pena de voltarmos ao total arbítrio do Estado (art. 5º., LVII, CF).


A presunção de inocência é uma presunção juris tantum que exige para ser afastada a existência de um mínimo de provas produzidas por meio de um devido processo legal e com garantia de ampla defesa, onde historicamente foi pautada na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789.


O princípio ora tratado constitui-se de quatros pilastras basilares; a) limitação da atividade legislativa; b) critério condicionador das interpretações das normas vigentes; c) critério de tratamento extraprocessual em todos os seus aspectos (inocente); d) obrigatoriedade de o ônus da prova prática de um fato delituoso ser sempre do acusador (MORAES, 2002).


Assim, consubstancia-se no direito de não ser declaro culpado senão mediante sentença judicial com trânsito em julgado, ao término do devido processo legal (art. 5º., LIV), em que o acusado pode-se valer do contraditório, onde se tenta destruir da credibilidade das provas apresentadas pela acusação, e por meios de provas pertinentes (convincentes) para a defesa, isto é, a ampla defesa. Não se pode olvidar que, não somente esses princípios citados possuem relações biunívocas para com o princípio do estado de inocência, mas sim, vários outros, v.g., do juiz natural, do devido processo legal, onde todos fazem parte do liame de uma seqüência de atos processuais com um único intuito, a obtenção de uma decisão condenatória.


2.14. Da Individualização da Pena


Para a plena aplicação do princípio ora tratado, faz-se necessário a correlação entre a responsabilização da conduta do agente e a sanção a ser aplicada, de maneira que a pena atinja seu fito, haja vista, a prevenção e a repressão (art. 5º., XLVI, CF).


Assim, a imposição da pena depende da conduta individualizada do agente praticante, e a posteriori, do juízo individualizado da culpa do agente, onde a reprovação concerne à censura da conduta do ato praticado.


A Constituição enumera o rol de penas a serem previstas pela legislação ordinária: a) privação ou restrição de liberdade; b) perda do bem; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos.


Portanto, a pena só cabe ser cumprida pelo agente que a praticou, não sendo assim, transmitida para descendentes ou ascendentes. Por excelência, cabe apenas uma exceção quanto ao assunto; no aspecto civilista, a pessoalidade da pena é transmitida para ascendentes ou descentes quando esta (a pena) se valorar em indenização. Ora, se o praticante do ato criminoso tem o dever de indenizar a quem quer que seja a ação cometida, passasse para seus ascendentes ou descentes a mesma obrigação, mas com limite no que é estabelecido por lei, ou seja, aos ascendentes e/ou descendentes cabe o pagamento de dívida do agente praticante até o montante dele recebido.


2.15. Vedação da Prisão Administrativa


As prisões administrativas estão previstas no art. 5º, LXI da Constituição, c.c. o art. 329 do Código de Processo Penal, e em leis especiais, tal como o Estatuto do Estrangeiro (Lei 6.815/80), na Lei de Falência (Decreto-Lei 7.661/45).


Ressalte-se que, tanto as hipóteses ensejadas no Código de Processo Penal, quando previstas em leis especiais, foram recepcionadas pela Constituição de 1.988, mas nos casos em que a legislação previa o poder de sua decretação à autoridade administrativa, houve intima modificação quanto à titularidade, constitucionalmente deferida ao Poder Judiciário.


Assim, a autoridade administrativa está taxativamente proibida de decretar a prisão administrativa, devendo representar à autoridade judicial (competente) com o intuito de que esta analise a eventual decretação da prisão.


A hipótese permissiva da antiga prisão administrativa decretada pelo Ministro da Justiça nos procedimentos extrajudiciais foi recepcionada pela Constituição Federal de 1.988, tornando-se, outrossim, hipótese de prisão preventiva para extradição, decretada somente pelo ministro-relator do Supremo Tribunal Federal (STF).


 


Referências

ALEXY, Robert. Derecho y Razón Práctica. Fontamara, 1.998, México.

ALVIM NETTO, José Manoel Arruda. Manual de Direito Processual Civil. v.1, 7ª. Ed., Revista dos Tribunais, 2000, São Paulo.

ARAÚJO CINTRA, Antonio Carlos; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 23ª. ed., Malheiros, 2007, São Paulo.

BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil. v.2, Saraiva, 1.989, São Paulo.

BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. Saraiva, 2002, São Paulo.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Processual Penal. 8ª. Ed. Saraiva, 2002, São Paulo.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Responsabilidade Civil. v.7, 16ª.ed. Saraiva, 2002, São Paulo.

DWORKIN, Ronald. Uma Questão de Princípio. Trad: Luis Carlos Borges. Martins Fontes, 2001, São Paulo.

FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. Revista dos Tribunais, 1.999, São Paulo.

MACIEL, Daniel Baggio. Responsabilidade Patrimonial do Estado pela Atividade Jurisdicional. Boreal, 2006, Birigui.

MIRANDA, Gilson Delgado; PIZZOL, Patrícia Miranda. Processo Civil: Recursos. 3ª. Ed. Atlas, 2002, São Paulo.

MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada. Atlas, 2002, São Paulo.

NERY JR., Nelson. Princípios de Processo Civil na Constituição Federal. 8ª. Ed. Revista dos Tribunais, 2004, São Paulo.

WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil. v.1. Revista dos Tribunais, 2006, São Paulo.


Informações Sobre o Autor

Lucas Carlos Vieira


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