Litispendência e conexão no processo coletivo

Resumo: O presente trabalho objetiva analisar a adaptação das regras do tradicional processo civil, pensado e elaborado para tutelar o interesse particular. Apresentando uma nova visão coletivizada dos institutos da litispendência e conexão. Litispendência é a repetição de ação em curso. Em relação às ações coletivas, este fenômeno processual pode existir mesmo que a segunda ação seja proposta por autor diverso. Isso porque, no polo ativo da demanda coletiva, a parte está em juízo defendendo interesse alheio, de grupo determinável ou indeterminável. Então, ainda que haja legitimados diversos no polo ativo, buscando o mesmo interesse coletivo, na verdade, ambos os autores estão em juízo representando a mesma coletividade. É que, no campo da legitimação extraordinária, ainda que a ação seja proposta por autor diferente, o titular do direito material estará igualmente representado, havendo, portanto, repetição da causa em juízo. Com isso, pode-se afirmar haver litispendência dessas ações. Apesar de haver litispendência, o intuito do processo coletivo é a busca da verdade real e, por isso, seria prejudicial a extinção de uma das demandas. Portanto, o que se quer provar é que o efeito típico da conexão pode ser aqui aplicado, ou seja, o efeito de reunião das ações para julgamento conjunto. Esta é a solução que mais atende ao resultado útil do processo na tutela coletiva.

Palavras-chave: Ações Coletivas. Litispendência. Conexão. Efetividade.

Sumário: 1. Introdução. 2. Litispendência no Código de Processo Civil. 3. A conexão no código de processo civil. 4. A litispendência e a conexão no âmbito do processo coletivo. 5. Conclusões. Referências.

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1 INTRODUÇÃO

No início da década de 1970, especialmente após os trabalhos de Mauro Cappelletti (MAZZILLI, 2002), ampliou-se o reconhecimento da necessidade de uma tutela jurisdicional própria para os interesses transindividuais, cujas regras tradicionais de processo civil já não os atendiam com eficiência.

Essa necessidade de princípios processuais específicos para a tutela coletiva justifica-se pelas particularidades dos interesses difusos, coletivo (stricto sensu) e individuais homogêneos, que são interesses que transcendem a esfera particular do indivíduo, abrangendo grupos de pessoas determináveis ou mesmo indetermináveis.

Foi com Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90) que as ações coletivas passaram a ser propostas com mais frequência, pois esta lei definiu, sistematizou e operacionalizou os direitos transindividuais.

A partir deste Código, muitas outras leis foram criadas para assegurar os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos e as ações coletivas vêm obtendo cada vez mais destaque no Direito Processual Brasileiro, privilegiando os princípios da economia processual e da efetividade da jurisdição.

Em evento realizado pela Advocacia-Geral da União, em junho de 2008, formou-se uma comissão especial de juristas para estudar o aperfeiçoamento da tutela coletiva no Brasil, que culminou, em março de 2009, com o encaminhamento ao Congresso Nacional do Projeto de Lei n. 5.139/095, que reestrutura a Ação Civil Pública, objetivando a adequação das regras processuais para todo o sistema de direitos coletivos.

De fato, o processo coletivo precisa de normas que atendam satisfatoriamente às peculiaridades do direito material por ele instrumentalizado, especialmente em relação à legitimação das partes, à competência, à coisa julgada e à litispendência, que o Projeto de Lei n. 5.139/09 resolveria, em boa parte, com suas disposições bem elaboradas.

2 LITISPENDÊNCIA NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

A litispendência é um dos pressupostos processuais negativos, prevista no artigo 267, inciso V, do Código de Processo Civil, como uma das causas de extinção do processo sem resolução do mérito.

De acordo com o §1º do artigo 301 do Código de Processo Civil, verifica-se a litispendência quando se reproduz “ação anteriormente ajuizada”. Isso nos leva à conclusão de que a litispendência ocorre quando os três elementos da ação forem idênticos: partes, pedido e causa de pedir.

O réu pode alegar a litispendência a qualquer tempo, mesmo após a contestação, e o juiz pode conhecê-la ainda que de ofício.

Na prática processual, quem tem maior possibilidade de reconhecer a litispendência é o réu que está sendo demandado em duplicidade. Mas nem sempre é fácil identificá-la de imediato, principalmente quando uma das partes é o Ministério Público ou pessoa jurídica de direito público (ex: União, Estados), representada em juízo por diversos procuradores.

Como se não bastasse à dificuldade de se encontrar a litispendência em processos cuja identidade de elementos da ação é certa e indiscutível, há casos em que a identificação da litispendência exige um esforço maior do jurista, como nas ações coletivas. Isso porque pode haver litispendência além dos casos em que há identidade de partes processuais.

De acordo com Fredie Didier Júnior e Hermes Zanetti Júnior, “a tríplice identidade dos elementos da demanda é apenas o caso mais emblemático de litispendência. Trata-se do exemplo mais claro do fenômeno. Mas não é o único” (DIDIER; ZANETTI, 2009, p. 170).

Explicam estes autores que a litispendência ocorre quando pendem processos com o mesmo conteúdo, quando a mesma situação jurídica controvertida é posta em mais de um processo para ser resolvida pelo Poder Judiciário (DIDIER; ZANETTI 2009, p. 170). Ou seja, há litispendência quando duas ou mais ações levam ao Judiciário o mesmo problema, envolvendo os mesmos interessados.

E o exemplo que eles trazem, extraído de um brilhante texto de José Carlos Barbosa Moreira, é bastante ilustrativo: “Qualquer um dos condôminos pode propor demanda para proteger o condomínio. Se o condômino “A” e o condômino “B” propuserem demanda para a proteção do bem condominial, fundada na mesma causa de pedir, dando origem a processos diversos, haverá litispendência, mesmo sem identidade da parte autora” (BARBOSA MOREIRA, José Carlos apud DIDIER; ZANETTI, 2009, p. 171).

Nota-se que, no campo da legitimação extraordinária, ainda que a ação seja proposta por autor diferente, o titular do direito material estará igualmente representado, havendo, portanto, repetição da causa em juízo.

Sendo assim, nos casos de legitimação extraordinária, conclui-se haver litispendência sempre que houver identidade de pedido, de causa de pedir e de partes no sentido material, apesar de as partes processuais serem diversas.

Para fins de exame da litispendência nas ações coletivas é indispensável considerar que o legitimado ativo está sempre defendendo direito alheio e, por isso, o polo ativo pode ser preenchido por qualquer um dos legitimados (Ministério Público, União, Estados, associação civil,…), havendo identidade de ações se o pedido e a causa de pedir forem coincidentes.

 3 A CONEXÃO NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

A conexão está prevista no artigo 103 do Código de Processo Civil: “Reputam-se conexas duas ou mais ações, quando lhes for comum o objeto ou a causa de pedir”.

Não se deve confundir o fenômeno da conexão com a sua consequência, ou seja, com o seu efeito, que será a reunião dos processos perante um só juízo para julgamento conjunto. Como se sabe, “o conteúdo não se confunde com o efeito, até mesmo porque o efeito de um instituto é fenômeno externo a ele, enquanto o conteúdo pertence ao seu interior”.

O objetivo do processo é a composição dos conflitos de interesse, cujos elementos essenciais são os sujeitos, o objeto e a causa de pedir. O que evidencia a conexão entre as demandas é a identidade parcial dos elementos da lide deduzida nos diversos processos.

Segundo Humberto Theodoro Júnior, o código admite duas modalidades de conexão: pelo objeto comum e pela mesma causa de pedir. A primeira forma ocorre quando nas diversas lides se disputa o mesmo objeto, como, por exemplo, no caso de duas ações voltadas, separadamente, contra dois coobrigados por uma mesma dívida. A segunda forma se baseia na identidade de causa petendi que ocorre quando as várias ações tenham por fundamento o mesmo fato jurídico.

O objetivo da norma inserta no artigo 103 é evitar contradições nas decisões proferidas pelo Poder Judiciário, por isso, a indagação sobre o objeto ou a causa de pedir deve ser interpretada de modo a permitir a decisão unificada.

A existência de decisões conflitantes em litígios que tratem de situações semelhantes é, naturalmente, motivo de descrédito e causa insegurança jurídica.

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Em outras palavras, Rodolfo de Camargo Mancuso argumenta que “os pleitos iguais, dentro de um mesmo contexto social e histórico, não devem ter soluções diferentes. A opinião leiga não compreende a contrariedade dos julgados, nem o comércio jurídico a tolera, pelo seu natural anseio de segurança.”. 

Além de evitar decisões contraditórias, essa norma tem o escopo de acolher o Princípio da Economia Processual, tornando possível resolver, de uma única vez, várias lides, inclusive podendo utilizar o mesmo material probatório.

Outra questão refere-se à obrigatoriedade ou facultatividade na reunião de processos em razão da conexão. Segundo o artigo 105 do Código de Processo civil, “o juiz, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, pode ordenar a reunião de ações propostas em separado, a fim de que sejam decididas simultaneamente”.

Observa que, em análise literal do dispositivo legal, trata-se de opção do magistrado a reunião ou não dos processos. Essa é a lição de Hélio Tornagh, que assevera ser da conveniência do julgador a adoção de tal providência.

Todavia, Luiz Manoel Gomes Júnior, afirma que ainda que não exista necessidade de reunião dos processos, sob o aspecto fático, a distribuição por dependência é obrigatória, sem qualquer margem para decisão em sentido contrário.

Em que pese celeuma, a reunião que não possa alcançar o objetivo traçado para o instituto não deve ocorrer, repudia-se, dessa forma, a reunião automática. Esse parece ser o escopo da súmula 235 do Superior Tribunal de Justiçai, que veda a reunião de processos quando um deles estiver no tribunal, vez que em um deles a prova já foi produzida e a decisão já foi prolatada, não havendo economia ou harmonização dos julgados que favoreça a reunião.

4 A LITISPENDÊNCIA E A CONEXÃO NO ÂMBITO DO PROCESSO COLETIVO

A possibilidade de serem instaurados vários processos coletivos que veiculam a mesma matéria tem se tornado cada vez mais frequente e problemático. Por exemplo, duas ações civis públicas, sendo uma delas movidas pelo Ministério Público e a outra por uma associação, onde se pleiteiam a defesa dos consumidores lesados por uma determinada empresa.

A ausência de norma que disciplina os institutos da litispendência e conexão no âmbito coletivo obriga os operadores do direito a buscarem embasamento legal no processo individual.

José Miguel Garcia Medina nota que, por um lado, a relação entre demandas coletivas se aproxima do instituto da conexão, vez que não há identidade de partes processuais, embora estejam presentes os mesmos pedidos e as causas de pedir das duas ações. Por outro lado, parece ajustar-se melhor ao instituto da litispendência, pois, a titularidade do direito material posto em juízo é a mesma nas duas ações.

De qualquer forma, é afirmado que não há um regramento específico que contorne adequadamente o problema do relacionamento entre essas demandas, principalmente por se tratar de direitos transindividuais que, por vezes, não comporta as soluções encontradas pelo legislador ao processo individual.

Em outras palavras, a adaptação criativa do processo individual ao coletivo funciona até certo ponto, porque é indispensável a perseguição do ideal de se obter uma sistemática processual exclusiva para os processos coletivos, dadas as suas atuais singularidades, tanto em sua natureza como na finalidade, e que os afasta dos processos individuais em temas fundamentais como a coisa julgada, execução, procedimento, litispendência, conexão, dentre outros. Corroborando assevera Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart:

“A sociedade moderna abre oportunidade a situações em que determinadas atividades podem trazer prejuízos ao interesses de grande número de pessoas, fazendo surgir problemas ignorados nas demandas individuais. O risco de tais lesões, que afetam simultaneamente inúmeros indivíduos ou categorias inteiras de pessoas, constitui fenômeno cada vez mais amplo e frequente na sociedade contemporânea. Ora, se a sociedade atual é caracterizada por ser de produção e consumo de massa, é natural que passem a surgir conflitos de massa e que os processualistas estejam cada vez mais preocupados em configurar um adequado “processo civil coletivo” para tutelar os conflitos emergentes. (…) É preciso, pois, para bem operar com as ações coletivas, despir-se de velhos preconceitos (ou pré-conceitos), evitando recorrer a raciocínios aplicáveis apenas à “tutela individual” para solucionar questões atinentes à tutela coletiva, que não é, e não pode ser, pensado sob a perspectiva da teoria da ação individual. Os institutos que presidem essa ação (ao menos em sua grande maioria) são incompatíveis e inaplicáveis à tutela coletiva, simplesmente porque foram concebidos para operar em outro ambiente”.

Diante dessas peculiaridades, parcela da doutrina que tenta superar esses problemas argumenta que o melhor caminho seria a reunião das ações para privilegiar os princípios da economia processual, do acesso à justiça, dentre outros. Todavia, ainda há aqueles que defendem a extinção de tais processos, entendendo tratar-se de litispendência.

A doutrina majoritária reconhece que em causas coletivas não é exigida a identidade da parte autora para a configuração da litispendência, bastando que haja identidade de pedido e da causa de pedir. Entretanto, nem todos que a defendem reconhecem os mesmos efeitos aplicados ao processo individual, ou seja, a extinção do processo litispendente.

        Dentre os autores que asseveram a necessidade de extinção da ação estão Fredie Didier Júnior e Hermes Zaneti Júnior. Segundo eles, a litispendência no plano coletivo é igual ao que ocorre no plano individual: “não pode haver dúvidas de que a identificação dos elementos da ação, entre ações coletivas, impede o prosseguimento da ação coletiva ulterior”.

Ressalte-se, ainda, o posicionamento de Teresa Arruda Alvim Wambier, para quem: “proposta a mesma ação coletiva perante juízo prevento, este deverá verificar se está diante de causas conexas – hipótese em que as ações deverão ser reunidas, para julgamento conjunto – ou se há litispendência, e neste caso a segunda ação deverá ser extinta”.

O entendimento apresentado é coerente com o processo civil clássico de onde se busca embasamento, mas, como salientado, em alguns pontos não poderá ser transportado para o processo coletivo, principalmente diante da importância, complexidade e dos princípios específicos que o regem. É por isso que a tendência moderna refuta a extinção da ação litispendente, não só pela possibilidade de gerar prejuízos à coletividade, mas também pela busca da tutela jurisdicional adequada.

Parcela minoritária da doutrina não vislumbra a possibilidade de se aplicar o instituto da litispendência, já que não existe a presença de todos os elementos da ação, tais como as partes, a causa de pedir e o pedido. Dentre eles, encontra-se José dos Santos Carvalho Filho que dispõe:

“A litispendência é repetição de ação idêntica e exige as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido (art. 301. §§1º e 2º, do CP Civil). São, pois, pressupostos da litispendência a repetição de ação idêntica e a circunstância de estar ainda pendente o processo anterior. Ora, não havendo essa identidade, não se configura a litispendência, mas sim a conexão, devendo os feitos reunir-se para um só julgamento.”.

Através desse entendimento jamais poderá haver litispendência entre a ação civil pública e a ação popular porque os autores são diversos. A rigor, só ocorrerá em relação a duas ações civis públicas ou duas ações populares, assim mesmo com pouca probabilidade. Exemplo seria a de um cidadão propor duas ações populares idênticas ou determinada associação propor duas ações civis públicas em face do mesmo réu e com causa de pedir e pedidos idênticos.

Entretanto, é possível ocorrer o fenômeno da conexão entre a ação civil pública e a ação popular, mesmo que possuam pedidos diversos, desde que haja identidade da causa petendi. Nos moldes do artigo 103 do Código de Processo Civil, é suficiente a identidade de causa de pedir ou de pedido para que seja reconhecida a conexão, cuja consequência será a reunião das ações.

Ao contrário da parcela da doutrina que entende pela necessidade de extinção da ação litispendente com fulcro no processo civil clássico, outros autores, por sua vez, defendem a necessidade da reunião das ações, mesmo estando presentes os elementos identificadores nas duas demandas, o que evidencia a litispendência. Fundamentam tal posição na finalidade social do processo coletivo, bem como nos princípios que o regem.

Luiz Manoel Gomes Júnior, com razão, argumenta que “é impossível ignorar a existência de uma “fobia” com relação às Ações Coletivas, contudo, os tempos são outros e tais tipos de demandas não podem ser analisados como se fossem demandas de natureza individual”.

Quando ocorrer a litispendência com partes diversas, a resolução da questão não pode ser a extinção de um dos processos, mas a reunião deles para processamento simultâneo. Afinal, “de nada adiantaria extinguir um dos processos, pois a parte autora, como colegitimada, poderia intervir no processo supérstite, na qualidade de assistente litisconsorcial.”

Luiz Manoel Gomes Júnior também afirma que havendo identidade de pedidos e causa de pedir entre ação popular e ação Civil Pública os processos devem ser reunidos para decisão conjunta, não justificando a extinção pelo fenômeno da litispendência.

José Miguel Garcia Medina e Teresa Arruda Alvim Wambier, ao enfrentarem o tema, reconhecem que as causas deverão ser reunidas para julgamento conjunto:

“De qualquer forma, em casos como o ora analisado, notando-se que as sentenças a serem proferidas nas duas ações coletivas terão a mesma abrangência, deverão necessariamente as causas ser reunidas, para julgamento conjunto, nos termos acima referidos, sob pena de se criar um conflito prático intransponível”.

Marcelo Abelha Rodrigues questiona a possibilidade de ação popular proposta pelo cidadão ser extinta quando seus elementos forem rigorosamente idênticos aos de uma ação civil pública proposta por qualquer dos legitimados previsto da lei, vez que ambas estão constitucionalmente previstas. Além disso, questiona-se a viabilidade, pois existe a necessidade de se prestigiar o amplo acesso à justiça.

Em casos tais, Teresa de Arruda Alvim Wambier leciona que o modelo articulado no Código de Processo Civil para a constatação de conexão e litispendência não serve para regular o confronto entre duas demandas coletivas, salvo se for aplicado de outro modo, observando as peculiaridades dessas ações. Com razão, afirma que “não é adequado aplicar integralmente e acriticamente critérios estabelecidos pelo CPC para a solução de ações individuais para dirimir dilemas relativos às ações coletivas”.

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Esse posicionamento funda-se no fato da sociedade de massa exigir do interprete uma nova visão, posto que os instrumentos disponíveis surgissem em um momento em que o fenômeno dos conflitos de massa eram socialmente menos incidente e, portanto, tornaram-se hoje insuficientes.

É por isso que a reunião dos processos de natureza coletiva para serem julgados conjuntamente demonstra-se mais adequado, principalmente por propiciar o fortalecimento da proteção do interesse social contido nessas ações, e não, a simples aplicação das normas estabelecidas no processo individual. Além disso, não restringe a possibilidade de defesa dos interesses em jogo por aquele que foi mais rápido na propositura da demanda, até porque nem sempre aquele que propõe primeiramente o fez de forma adequada e com densidade probatória para futura sentença de procedência. Tudo isso evidencia a possibilidade de, não reunindo os processos, acarretar sérios prejuízos à coletividade.

5 CONCLUSÕES

A evolução da sociedade e a massificação dos conflitos evidenciaram a necessidade de inovações no direito processual brasileiro, sob pena de perder sua eficácia social. As regras contidas no processo civil clássico para tutelar os direitos individuais não se mostraram adequadas quando estiveram em disputa direitos transindividuais, entendidos como aqueles que repercutem na esfera individual de um grande número de pessoas, muitas vezes não identificáveis, como no caso do direito a um meio ambiente sadio.

Os institutos da litispendência e conexão no âmbito coletivo, foco principal desse estudo, tiveram seus conceitos extraídos do processo individual, diante da omissão do microssistema coletivo.

A doutrina se divide ao apresentar soluções. Alguns entendem que, se ocorrer identidade entre as partes, causa de pedir e pedidos, deve ser reconhecida a litispendência, com a consequente extinção do processo ajuizado posteriormente. Todavia, assegura que esse posicionamento não tem validade se as partes forem diversas.

Esse posicionamento recebe severas críticas, pois não há dúvidas que em se tratando de demanda onde se pleiteia Direito Coletivo não há que ser levado em conta a figura do autor para fins de reconhecimento de identidade de ações, já que o autor, em tais casos, atua como verdadeiro substituto processual, pleiteando não em direito próprio, mas direito alheio, direito de toda a coletividade.

Outra parcela da doutrina assevera que as ações coletivas ajuizadas com igualdade de elementos, ainda que por entes diversos, deve ser extinta com fundamento na litispendência, vez que a coletividade já está sendo representada em juízo.

No entanto, a extinção do processo litispendente ofenderia o direito fundamental de acesso ao judiciário, como estabelecido no artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal. Ademais, há uma razão de ordem prática, evitar o ajuizamento de uma demanda mal proposta com o escopo de impedir os demais legitimados de agir.

Ao contrário das correntes que exigem a extinção da ação litispendente com fulcro no processo civil clássico, a posição doutrinaria que mais se coaduna com a finalidade social do processo coletivo é aquela que permite a reunião das ações para julgamento conjunto, aproveitando as provas e argumentos apresentados nas diversas ações. Esse posicionamento não busca unicamente perfeição científica, mas também a máxima eficiência e facilidade de aplicação. Além disso, as peculiaridades situadas no plano substancial impõem a adoção de técnicas diversas, sem o que não é possível atingir os resultados desejados pelo sistema.

 

Referências
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DIDIER JUNIOR, Fredie; ZANETI JUNIOR, Hermes. Curso de direito processual civil: Processo coletivo. 3. ed. Bahia: Podivm, 2008.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instrumentalidade do processo. São Paulo:RT, 1990.
GRINOVER, Ada Pellegrini. A problemática dos interesses difusos. In: GRINOVER, Ada Pellegrini (Coord.). A tutela dos interesses difusos. São Paulo: Max Limonad, 1984.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense. 2003.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do Processo de Conhecimento. 2 ed. São Paulo: RT, 2003.
MASSON, Nathalia. Manual de direito constitucional. Bahia: JusPodvm, 2013.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Litispendência em Ações Coletivas. In: MAZZEI, Rodrigo; NOLASCO, Rita Dias. Processo civil coletivo. São Paulo: Quartier Latin, 2005.
ALVIM, Eduardo Arruda. “Coisa julgada e litispendência no Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos”. Disponível: <www.arrudaalvim.com.br/pt/artigos/15.asp?id=artigos&lng=pt>. Acesso em dez. 2014.
OLIVEIRA, Marcelo Henrique Matos. “Litispendência e conexão o processo coletivo brasileiro”. Disponível em: <http://www.seer.ufu.br/index.php/revistafadir/article/view/18547>. Acesso em dez. 2014.

Informações Sobre o Autor

Luciana Gomes do Nascimento da Costa

Advogada formada pelo Centro Universitário Luterano de Santarém – CEULS/ULBRA


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