O litisconsórcio ativo no âmbito dos juizados especiais: a questão do valor da causa

Resumo: Este breve estudo aborda a problemática do valor da causa nos Juizados Especiais, mais especificamente na hipótese da ocorrência de litisconsórcio ativo. Após a necessária conceituação da temática, bem como a abordagem da previsão legal do instituto do litisconsórcio, são explanados os benefícios alcançados com a junção de partes do polo ativo da demanda. Por fim, apresenta-se a solução para o entrave, no sentido de se adotar o valor individualizado da causa, possibilitando-se a tramitação do processo pelo rito mais célere.

Palavras-chave: Litisconsórcio. Ativo. Juizados. Valor. Causa.

Abstract: This brief study addresses the issue of the amount in the Special Courts, specifically the hypothesis of active joinder of parties. After the necessary conceptualization of the theme and the approach of the legal forecast institute joinder of parties, are explained the benefits achieved with the addition of parts of the active pole of the demand. Finally, we present the solution to the obstacle, in order to adopt the individual value of the cause, allowing it to be of the proceedings by faster rite.

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Keywords: Joinder. Active. Courts. Value. Cause.

Sumário: Introdução. 1. Conceituação de litisconsórcio e previsão legal. 2. Benefícios do litisconsórcio ativo. 3. A definição do valor da causa. Conclusão. Referências.

Introdução

O acesso à Justiça, tanto em seu aspecto formal (possibilidade de demandar junto ao Poder Judiciário) quanto no aspecto material (ver o litígio solucionado de forma justa) é assunto com larga repercussão social e jurídica, notadamente em um Estado Democrático de Direito, como se autodenomina o Estado brasileiro. Nesse contexto, a presença dos Juizados Especiais, com todas as suas regras e princípios específicos, funciona como um verdadeiro marco na busca da mencionada acessibilidade.

A abordagem a seguir intenta justamente reafirmar a competência dos Juizados Especiais nos casos em que haja na demanda litisconsórcio ativo, de modo a trazer à baila a solução capaz de respeitar o limite do valor da causa e, ao mesmo tempo, permitir que os acionantes usufruam dos diversos benefícios de litigar no âmbito dos Juizados.

1. Conceituação de litisconsórcio e previsão legal

De plano, é importante asseverar que a definição de litisconsórcio é algo pacífico na doutrina. Pela simplicidade e clareza, traz-se a lume o que consigna Alexandre Freitas Câmara:

“Todas as vezes que, em um processo, mais de uma pessoa pleiteia em seu favor a tutela jurisdicional, ou referida tutela é pleiteada em face de diversos demandados, ter-se-á litisconsórcio.” (2007, p. 171).

No Código de Ritos brasileiro, o instituto do litisconsórcio possui previsão pormenorizada. Confira-se:

“Art. 46. Duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto, ativa ou passivamente, quando:

I – entre elas houver comunhão de direitos ou de obrigações relativamente à lide;

II – os direitos ou as obrigações derivarem do mesmo fundamento de fato ou de direito;

III – entre as causas houver conexão pelo objeto ou pela causa de pedir;

IV – ocorrer afinidade de questões por um ponto comum de fato ou de direito.

Parágrafo único. O juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo quanto ao número de litigantes, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a defesa. O pedido de limitação interrompe o prazo para resposta, que recomeça da intimação da decisão. (Acrescentado pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

Art. 47. Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo.

Parágrafo único. O juiz ordenará ao autor que promova a citação de todos os litisconsortes necessários, dentro do prazo que assinar, sob pena de declarar extinto o processo.

Art. 48. Salvo disposição em contrário, os litisconsortes serão considerados, em suas relações com a parte adversa, como litigantes distintos; os atos e as omissões de um não prejudicarão nem beneficiarão os outros.

Art. 49. Cada litisconsorte tem o direito de promover o andamento do processo e todos devem ser intimados dos respectivos atos.”

Mais especificamente, em relação ao litisconsórcio no âmbito dos Juizados Especiais, há dispositivo na Lei nº 9.099/95 que permite expressamente sua formação:

“Art. 10. Não se admitirá, no processo, qualquer forma de intervenção de terceiro nem de assistência. Admitir-se-á o litisconsórcio.”

2. Benefícios do litisconsórcio ativo

Dentre as várias espécies e classificações de litisconsórcio, o enfoque do presente trabalho será na modalidade ativa, aquela em que a demanda tem pluralidade de autores. Como é cediço, a junção de acionantes no polo ativo do processo coaduna-se com os princípios da economia processual e da celeridade, pois a instrução probatória a todos aproveitará. Além disso, evita-se a possibilidade de decisões teratológicas. Sobre a temática, professam Marinoni e Arenhart:

“[…] a formação do litisconsórcio poderia ser tranquilamente (e ressalvadas as situações em que a lei ou a natureza da relação jurídica impõe a formação do litisconsórcio) substituída por tantas ações quantas fossem as partes que integram o litisconsórcio. A formação do litisconsórcio, então, na grande maioria das vezes, responderá a uma conveniência de aceleração e decisão uniforme aos conflitos de interesse.” (2008, p. 166).

Acerca dos princípios da celeridade e da economia processual (previstos no art. 2º da Lei 9.099/95), disserta Oriana Piske:

“Os princípios da economia processual e da celeridade oportunizam a otimização e a racionalização dos procedimentos, objetivando a efetividade dos Juizados Especiais. Tais princípios impõem ao magistrado na direção do processo que confira às partes um máximo de resultado com um mínimo de esforço processual, bem como orientam para, sempre que possível, que haja o aproveitamento de todos os atos praticados. Vale lembrar que tal aproveitamento tem como limite apenas a ausência de prejuízo a se causar aos fins da Justiça.” (2012).

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3. A definição do valor da causa

Comprovada a notória vantagem prática da união de pretensões jurídicas em um mesmo processo – notadamente nas hipóteses em que os direitos derivem do mesmo fundamento fático –, impõe-se a análise sobre o valor da causa, tendo em mente que a legislação específica estabelece um teto pecuniário para as ações que tramitam nos Juizados Especiais.

A orientação mais associada com os objetivos do litisconsórcio e aliada aos princípios adrede mencionados é no sentido de que os Juizados Especiais são competentes para processar e julgar a lide, mesmo que o valor da causa, de maneira global, ultrapasse o teto de quarenta salários mínimos dos Juizados estaduais (art. 3o, I, da Lei no 9.099/95) ou de sessenta salários mínimos dos Juizados federais (art. 3o da Lei no 10.259/01). Considera-se, para fins de fixação de competência, dessa maneira, o valor individualizado da causa. Nesse sentido, firmou-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

“PROCESSUAL CIVIL. JUIZADOS ESPECIAIS. VALOR DA CAUSA INFERIOR A SESSENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. LITISCONSÓRCIO ATIVO. VALOR INDIVIDUAL DE CADA LITISCONSORTE. SÚMULA 83/STJ. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. Em se tratando de litisconsórcio ativo facultativo, para que se fixe a competência dos Juizados Especiais, deve ser considerado o valor de cada autor, individualmente, não importando se a soma ultrapassa o limite dos 60 (sessenta) salários mínimos. Precedentes. Súmula 83/STJ. Agravo regimental improvido.” (AgRg no REsp 1376544/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/05/2013, DJe 05/06/2013)

“PROCESSO CIVIL – JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS CÍVEIS E JUÍZO FEDERAL CÍVEL – VALOR DA CAUSA – COMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. LEI Nº 10.259/01, ART. 3º, CAPUT E § 3º. 1. O valor dado à causa pelo autor fixa a competência absoluta dos Juizados Especiais. 2. O Juizado Especial Federal Cível é absolutamente competente para processar e julgar causas afetas à Justiça Federal até o valor de sessenta salários mínimos (art. 3º, caput e § 3º, da Lei 10.259/2001). 3. A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que, na hipótese de litisconsórcio ativo, o valor da causa para fins de fixação da competência é calculado dividindo-se o montante total pelo número de litisconsortes. Precedentes. 4. Recurso especial a que se nega provimento.” (REsp 1257935/PB, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/10/2012, DJe 29/10/2012)

A título ilustrativo, portanto, numa ação em que há a formação de litisconsórcio ativo formado por um par de acionantes, o valor atribuído à causa deve ser dividido por dois, e somente depois dessa operação aritmética deve o Magistrado analisar o enquadramento da demanda na competência dos Juizados Especiais.

Conclusão

Após as explanações anteriores, é forçoso concluir que limitar o valor da causa, aprioristicamente, ao teto dos Juizados – sem levar em conta o número de componentes do polo ativo – seria punir os litigantes que se valeram do litisconsórcio, uma faculdade processual prevista em lei e sedimentada na prática forense. Adotar, portanto, para tais situações, a tese do valor individualizado da causa, é atitude judicial absolutamente coadunada com os anseios sociais de acessar plenamente a Justiça e de alcançar uma resolução plena e célere para o caso concreto.

 

Referência:
BRASIL. Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 27 set. 1995. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9099.htm>. Acesso em: 28 nov. 2013.
BRASIL. Lei nº 10.259, de 12 de julho de 2001. Dispõe sobre a instituição dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal. Diário Oficial da União. Brasília/DF, 13 jul. 2001. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil 03/leis/leis 2001/l10259.htm>. Acesso em: 29 nov.2013.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. (REsp 1257935/PB, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 18/10/2012, DJe 29/10/2012). Disponível em: <http://www.stj.jus.br/webstj/processo/justica/detalhe.asp?numreg=201101251822>. Acesso em: 27 nov. 2013.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. (AgRg no REsp 1376544/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 28/05/2013, DJe 05/06/2013). Disponível em: <http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/23357222/agravo-regimental-no-recurso-especial-agrg-no-resp-1376544-sp-2012-0214836-8-stj>. Acesso em: 27 nov. 2013.
CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil, volume 1. 16. Ed. rev. e atual. até a Lei nº 11.419/2006 – Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil, volume 2: processo de conhecimento. 7. Ed. rev. e atual. – São Paulo: RT, 2008.
NERY Jr., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 10 ed. rev. ampl. e atual. até 01 de out. 2007 –  São Paulo: RT, 2007.
PISKE, Oriana. Princípios orientadores dos Juizados Especiais. Publicado em: 20 mar. 2012. Disponível em: <http://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/artigos/2012>. Acesso em: 29 nov. 2013.

Informações Sobre o Autor

Igor Pereira Matos Figueredo

Procurador Federal lotado na Procuradoria Seccional Federal em Ilhéus/BA


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