Resumo: objetiva o presente artigo expor e sumariamente comentar o conflito jurisprudencial que se observa, entre o Superior Tribunal de Justiça e o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, na interpretação do caput, do artigo 475-J, inserido, ao CPC, pela polêmica Lei nº.11.232/2005.
Sumário: 01. A Proposta de Estudo. 02. O Incidente de Uniformização de Jurisprudência TJ-RJ 07/2007. 03. O Recurso Especial nº. 954859/RS. 04. O Recurso Especial nº. 1100658/SP. 05. Nossa Opinião. 06. Conclusão. 07. Bibliografia.
01. A Proposta de Estudo:
Tendo em vista as reiteradas decisões do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que não se exige uma específica intimação do devedor para a fluência do prazo previsto pelo caput, do artigo 475-J, do CPC, para o cumprimento da obrigação de pagar quantia certa, sob pena da incidência da multa de 10% (dez por cento).
E, principalmente, a recentíssima decisão, do mesmo E. STJ, no sentido de repudiar a incidência da multa, em sede de execução provisória.
Teses essas que foram renegadas pelo Órgão Especial do TJ-RJ, quando do julgamento do Incidente de Uniformização de Jurisprudência 07/2007.
Vale, em apertada síntese, expor os contornos que serviram de fundamento para as respectivas decisões judiciais, espelhando, muito resumidamente, as suas bases doutrinárias, para que possamos, ao final, tecer nossas singelas opiniões.
02. O Incidente de Uniformização de Jurisprudência TJ-RJ 07/2007:
O Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, julgando, no dia 18/08/2008, o Incidente de Uniformização de Jurisprudência 07/2007, decidiu, por maioria simples de votos, que a multa do artigo 475-J, caput, do CPC, incide, em sede de execução provisória; e que, a fluência do prazo de espera, de 15 (quinze) dias, para voluntário cumprimento da obrigação de pagar quantia certa, exige a intimação pessoal do devedor.
Invocando, como fundamento, para a necessidade de intimação pessoal, além do artigo 240 do Código de Processo Civil (segundo o qual, salvo disposição em contrário, os prazos, para as partes, serão contados da intimação), o nodal argumento de que o cumprimento da obrigação de pagar trata-se de ato material de caráter personalíssimo.
Prestigiando, expressamente, v.g., a doutrina de TERESA ARRUDA ALVIM WAMBIER[1] e de ALEXANDRE FREITAS CÂMARA[2].
E, em defesa, da incidência da multa em sede de execução provisória, notadamente, o teor do artigo 475-O do CPC, segundo o qual a execução provisória far-se-á, no que couber, do mesmo modo que a definitiva.
Se rendendo, então, no particular, a ARAKEN DE ASSIS, segundo o qual, “apesar das resistências, hauridas de bastiões reformistas, o prazo se aplicará tanto na execução definitiva, quanto na provisória”.[3]
03. O Recurso Especial nº. 954859/RS:
Desde o julgamento, no dia 27/08/2007, pela Colenda Terceira Turma, do Recurso Especial de nº. 954859/RS, que teve por relator o Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça vem decidindo, reiteradas vezes, ser desnecessária uma nova e específica intimação do devedor, para voluntário cumprimento, da obrigação de pagar quantia certa imposta em sentença.
Sustentando, expressamente, que essa etapa da Reforma da Execução Civil teve por escopo imediato tirar o devedor da passividade em relação ao cumprimento da sentença condenatória, sendo-lhe imposto o ônus de tomar a iniciativa de cumpri-la de forma voluntária e rápida.
Entendimento que, v.g., foi recentemente reiterado, pala 2ª Turma do STJ, julgando, no dia 24/03/2009, o Recurso Especial nº. 1087606/RJ, que teve por relator o Ministro CASTRO MEIRA, quando se ressaltou que a fluência do prazo para o voluntário cumprimento da condenação imposta em sentença independe de nova intimação do devedor.
Fazendo coro com aqueles que, em doutrina, sustentam que o advogado, ao ser intimado da sentença, naturalmente já ficará intimado de que o devedor, a quem representa em juízo, deve pagar no prazo concedido em lei.[4]
Quadro em que o prazo para o voluntário cumprimento fluiria ope legis, sem a necessidade de uma nova e específica intimação do devedor, quer por seu advogado, mediante publicação em diário oficial, nem mesmo de sua intimação pessoal.
04. O Recurso Especial nº. 1100658/SP:
Quando do recente julgamento, em 07/05/2009, do Recurso Especial de nº. 1100658/SP, que teve por relator o Ministro HUMBERTO MARTINS, pela Colenda 2ª Turma, o E. STJ, finalmente, veio a se posicionar, sobre a polêmica questão que toca à incidência, ou não, da multa de 10% do artigo 475-J, caput, do CPC, às execuções provisórias.
Assentando que, por incompatibilidade lógica, a multa do artigo 475-J do CPC não se aplica na execução provisória.
Invocando, por fundamento, o argumento segundo o qual, compelir o litigante a efetuar o pagamento sob pena de multa, ainda pendente de julgamento seu recurso, implica em obrigá-lo a praticar ato incompatível com o direito de recorrer.
O que tornaria inadmissível o seu recurso, haja vista o que prescreve o artigo 503, parágrafo único, do CPC.
Tomando para si, então, o conhecido argumento do ilustre processualista gaúcho JOSÉ MARIA ROSA TESHEINER, segundo o qual, na espécie, “exigir o pagamento do devedor, implicaria em exigência de ato incompatível com a vontade de recorrer”.[5]
05. Nossa Opinião:
Sopesando a erudição de que se revestem os argumentos levantados pelo C. Órgão Especial do TJ-RJ e pelo E. STJ, ao enfrentar 02 (dois) conturbados aspectos concernentes à interpretação do caput, do artigo 475-J do CPC, temos para nós, s.m.j., que assiste razão a última dessas sedes pretorianas.
De um lado, por não ter sido expresso o legislador reformista ao determinar a aplicação da polêmica multa às execuções provisórias, seria, aos nossos olhos, odiosa uma interpretação extensiva em prejuízo do devedor.
Assim, não seria nem razoável impor o cumprimento da obrigação de pagar quantia certa, sob pena de multa, de uma sentença ainda possível de mudança, parecendo, com razão, ao afamado mestre CARLOS ALBERTO CARMONA, ser “excessivo se submeter o devedor ao sistema solve et repete”.[6]
De outro lado, tendo em vista os princípios que sabidamente inspiraram essa etapa da reforma da execução civil, na qual se privilegia a celeridade, temos para nós que nada justifica uma nova e específica intimação do devedor, que não aquela normal que já lhe tenha sido feita, quando da imposição, em sentença, da obrigação de pagar quantia certa.
Sendo feliz o magistério de LUIZ FUX, ao sustentar que “a prévia ciência do devedor destinatário da sentença quanto ao reconhecimento de sua obrigação dispensa nova citação ou intimação para pagamento”.[7]
Argumento esse que nos parece irrespondível.
Quadro em que, muito respeitosamente, já é o momento do mui valoroso Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro rever a posição que foi adotada por seu Órgão Especial, se curvando à autoridade do STJ, na qualidade de intérprete maior da legislação infraconstitucional, inclusive a bem da segurança jurídica das partes em juízo.
06. Conclusão:
Buscou-se, nessa singela pesquisa, expor e sumariamente comentar o conflito que vem se verificando, entre o Órgão Especial do Colendo TJ-RJ e o Egrégio STJ, na interpretação do caput, do artigo 475-J, do CPC.
Polêmica em relação à qual nos rendemos ao E. STJ e à tese que milita pela não incidência da multa de 10% em sede de execução provisória; bem como pela desnecessidade de uma nova intimação do devedor, para a fluência do prazo de espera para o voluntário cumprimento da obrigação de pagar quantia certa imposta em sentença.
Informações Sobre o Autor
Alexandre Costa de Araújo
Especialista em Direito do Consumidor e em Direito Processual Civil. Membro Honorário da Academia Brasileira de Direito Processual Civil. Advogado, no Rio de Janeiro.