Autora: Anna Carollina Tisatto Heinzmann. Bacharela em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande (FURG), desde 24/03/2022. Pós-graduanda em Direito Penal e Criminologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). [email protected]
Resumo: Trata-se de pesquisa acerca da execução antecipada da pena no rito do júri, mediante análise constitucional, bem como a evolução histórica e a sua interpretação na atual conjuntura brasileira após a publicação do Pacote Anticrime: Lei nº 13.964/2019. Trata-se de tema especialmente relevante nas discussões acerca do direito constitucional da liberdade. Depreende-se que as decisões e interpretações judiciais vêm sendo alteradas: ora colidindo, ora se amoldando aos princípios e normas vigentes. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica documental, trazendo o posicionamento da doutrina e da jurisprudência.
Palavras-chave: Inconstitucionalidade. Execução provisória da pena. Pacote Anticrime. Tribunal do Júri.
Abstract: This is a research on the early execution of the sentence in the jury rite, through constitutional analysis, as well as the historical evolution and its interpretation in the current Brazilian conjuncture after the publication of the Anti-Crime Pack: Law nº 13.964/2019. This is an especially relevant topic in discussions about the constitutional right to freedom. It appears that judicial decisions and interpretations have been changed: sometimes colliding, sometimes conforming to current principles and norms. The methodology used was documentary bibliographic research, bringing the position of doctrine and jurisprudence.
Keywords: Unconstitutionality. Provisional execution of sentence. Anti-Crime Pack. Jury court.
Sumário: Introdução. 1. A execução provisória da pena. 1.1. A construção jurisprudencial em torno da execução provisória da pena após a Constituição Federal de 1998. 1.2. A execução provisória da pena e o texto constitucional brasileiro. 1.3. O pacote anti-crime e a possibilidade da execução provisória da pena no rito do júri. 2. O rito do júri. 2.1. Breve síntese sobre o procedimento do júri. 2.2. O peso do julgamento pelo conselho de sentença sob o viés garantista da punição. 2.3. A execução provisória da pena no rito do júri sob o filtro hermenêutico-Constitucional. Considerações finais. Referências Bibliográficas.
INTRODUÇÃO
Indubitavelmente, as mudanças legislativas e jurisprudenciais no ordenamento jurídico brasileiro são objeto de discussão na seara doutrinária. A prisão em segunda instância, por exemplo, teve a sua aplicabilidade alterada por diversas vezes desde a Constituição de 1988, tornando objeto de debate a aplicação prática do respeito aos direitos e garantias individuais, pois na hipótese em apreço, iniciar-se-ia o cumprimento da pena após a decisão pelo magistrado de primeira instância, sem o esgotamento de todos os meios recursais, de modo que a decisão poderia, ainda, ser modificada ou até mesmo revertida por um Tribunal Superior.
Outrossim, em 2019 foi publicada a Lei nº 13.964, batizada de Pacote Anticrime, responsável, entre outras alterações, pela inserção da alínea “e” ao inciso I do artigo 492 do Código de Processo Penal, que prevê a execução provisória da pena no rito do tribunal do júri. Diante dessa perspectiva, voltou a ser objeto de debate a prisão antecipada, especialmente porque as decisões do júri são proferidas pelo conselho de sentença, que é, por sua vez, formado por cidadãos comuns, em um rito com possibilidades recursais mínimas e expressas em lei.
O presente artigo procura explicitar a controvérsia instaurada a propósito da execução antecipada da pena no tribunal do júri, para fins de aferir se essa execução, estabelecida por lei ordinária, suporta uma filtragem constitucional, em uma perspectiva garantista.
- A execução provisória da pena
A prisão cautelar possui natureza pré condenatória, ou seja: ela não antecipa a pena, muito embora após uma eventual condenação criminal o período em que o indivíduo esteve segregado seja computado como pena cumprida a título de detração penal, no curso do processo de execução criminal.
Por outro lado, a prisão-pena ocorre mediante decisão proferida em processo criminal, cujo acusado tenha sido condenado à pena privativa de liberdade ou à pena restritiva de direitos. Isso porque há posições que entendem a admissibilidade, no direito brasileiro, do cumprimento da pena, em caráter provisório, até que esta passe pela fase recursal e transite em julgado. A decisão que se mantém atualmente, nesse sentido, refere-se ao HC 126.292/SP, que será abordado no item 1.1 deste capítulo.
Diante disso, passar-se-á a expor as as modificações interpretativas, após a Constituição Federal de 1988 no que tange à execução provisória da sentença penal condenatória no processo penal brasileiro. Posteriormente, tratar-se-á da inovação legislativa do pacote anti-crime acerca da execução provisória da pena no rito do júri e suas especificidades.
1.1. A construção jurisprudencial em torno da execução provisória da pena após a Constituição Federal de 1988
Em 1991, o Supremo Tribunal Federal decidiu, no bojo do Habeas Corpus nº 67.726/RJ que o cumprimento antecipado da pena, de forma provisória, constituía uma afronta ao artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal. Um ano depois, em 1992, após o julgamento do Habeas Corpus nº 69.964/RJ foi definido entendimento diverso. Desse modo, de 1992 até o ano de 2009, o entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre a presunção de inocência era de que a execução da pena poderia ser iniciada, provisoriamente, já no segundo grau de jurisdição.
Em 2009 esse entendimento mudou. Durante o julgamento do Habeas Corpus 84.078/MG, cujo relator foi o Ministro Eros Grau, foi debatida a constitucionalidade da prisão preventiva, a requerimento do Ministério Público, antes da admissão do recurso especial, interposto pelo paciente. No processo de origem, o paciente foi denunciado pela prática do crime tipificado pelo artigo 121, §2º, incisos I e IV c/c o artigo 14, inciso II, todos do Código Penal. Foi condenado pelo tribunal do júri pelo crime de homicídio privilegiado à pena de três anos e seis meses de reclusão. Posteriormente o caso foi levado a novo julgamento pelo Júri, haja vista o provimento de apelação pelo Ministério Público.
No novo julgamento, o paciente foi condenado à pena de sete anos e seis meses de reclusão, em regime fechado. Após nova decisão pelo conselho de sentença, foi acolhida a prisão preventiva. O paciente não contestou a execução da pena, tendo em vista que restava pendente de julgamento um recurso sem efeito suspensivo, mas contestou a inidoneidade dos fundamentos da prisão cautelar. Requereu, portanto, a concessão de liminar para sustar os efeitos do decreto da prisão preventiva, com a expedição de salvo-conduto.
A redação da decisão no Habeas Corpus 84.078/MG dá conta de uma prevalência do interesse do acusado sobre o interesse do Estado-acusação, à medida em que preconiza a liberdade em detrimento do cumprimento provisório da pena, que somente pode ocorrer a título de prisão cautelar, ocasião em que foi citado Tucci como fundamento: “o acusado, como tal, somente poderá ter sua prisão provisória decretada quando esta assuma natureza cautelar, ou seja, nos casos de prisão em flagrante, prisão temporária, ou de prisão preventiva” (TUCCI, 2004, p. 281 apud BRASIL, 2009, p. 11).
Através da analogia à Lei de Execuções Penais, buscou-se solucionar o conflito aparente de normas existente no caso concreto, haja vista que o referido habeas corpus julgava um delito de homicídio, de competência do tribunal do júri. Nesse sentido, o artigo 637 do Código de Processo Penal prevê que o recurso extraordinário não possui efeito suspensivo, condição em que os autos originais deveriam ser baixados junto do juízo de piso, para o fim de que fosse a pena imediatamente executada, em manifesta discordância à previsão da Lei de Execuções Penais.
No mesmo sentido, também foi citado no HC 84.078/MG o entendimento de Tourinho Filho (1992, p. 63): “enquanto não definitivamente condenado, presume-se o réu inocente”. Sendo este presumidamente inocente, sua prisão, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, somente poderá ser admitida a título cautelar”. Além disso, o texto faz menção ao artigo 147 da Lei de Execuções Penais, que aborda a execução da pena restritiva de direitos: “Transitada em julgado a sentença que aplicou a pena restritiva de direitos, o Juiz da execução, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, promoverá a execução […]” (BRASIL, 2009, p. 08-09). Isso porque o dispositivo estava sendo interpretado sob a ótica constitucional, aguardando o trânsito em julgado para o início do cumprimento.
O Relator, Ministro Eros Grau, em seu voto, referiu que em nenhuma hipótese há de ser admitida a execução da pena antes do trânsito em julgado:
“Aliás a nada se prestaria a Constituição se esta Corte admitisse que alguém viesse a ser considerado culpado — e ser culpado equivale a suportar execução imediata de pena — anteriormente ao trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Quem lê o texto constitucional em juízo perfeito sabe que a Constituição assegura que nem a lei, nem qualquer decisão judicial imponham ao réu alguma sanção antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Não me parece possível, salvo se for negado préstimo à Constituição, qualquer conclusão adversa ao que dispõe o inciso LVII do seu artigo 5º” (BRASIL, 2009, p. 10).
Posteriormente, Grau afirma que “não há nada que justifique o RE, mas ele consegue evitar a execução” e “a prevalecer o entendimento que só se pode executar a pena após o trânsito em julgado das decisões do Recurso Extraordinário e do Recurso Especial, consagrar-se-á, em definitivo, a impunidade” (BRASIL, 2009, p. 17). Após, Grau afirmou que não afasta de modo algum a possibilidade da prisão cautelar quando presentes os requisitos para a sua implementação. Contudo, não admite superpor a execução provisória utilizando-se da prisão cautelar: “a prisão cautelar não pode justificar a execução provisória” (BRASIL, 2009, p. 78).
Após o voto do Ministro Eros Grau, indeferindo o pedido de habeas corpus e cassando a liminar concedida, o Ministro Carlos Britto pediu vista dos autos. Desse modo, foi prosseguido o julgamento pela Turma que, por maioria de votos, remeteu o pedido de habeas corpus a julgamento pelo Tribunal Pleno. Desse modo, no bojo do HC 84.078/MG foi decidido, por maioria de sete votos a quatro, vencidos os votos dos Ministros Cezar Peluso e Eros Grau, pelo deferimento da ordem de habeas corpus, restando permitido ao paciente que recorra dessa condenação, aos tribunais superiores, em liberdade.
Assim, restou decidido pelo Tribunal que o princípio da presunção de inocência deveria ser aplicado em sua integralidade, de forma absoluta, de modo que a exceção a isso seria o trânsito em julgado da decisão, sendo considerada inconstitucional a execução provisória da pena (LIMA e MOTA; 2018).
No Habeas Corpus 126.292/SP, cujo julgamento se deu em fevereiro de 2016, discutiu-se, novamente, a presunção de inocência após a decisão condenatória em segunda instância. Na ocasião, foi debatido em sede de habeas corpus a constitucionalidade da ordem de prisão que determinou o cumprimento da pena, após decisão em segunda instância, de paciente condenado à pena de 05 anos e 04 meses de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática de roubo majorado, nos termos do artigo 157, §2º, incisos I e II do Código Penal. Isso porque sobre o mesmo pleito já havia sido indeferido, pelo Ministro Francisco Falcão, Presidente do Superior Tribunal de Justiça, o pedido de liminar no HC 313.021/SP.
Os fundamentos que negaram o pedido liminar no HC 313.021/SP dão conta de que é incabível habeas corpus utilizados como substitutos de recursos ordinários e de outros recursos cabíveis no processo penal, sendo este o entendimento da Quinta e da Sexta Turmas do Superior Tribunal de Justiça do estado de São Paulo. Nesse sentido é que foi impetrado o HC 126.292/SP: a fim de obter a concessão da ordem de habeas corpus com o reconhecimento do direito do paciente recorrer em liberdade, haja vista que no processo de origem foi determinada a prisão com a expedição de mandado, sem que a decisão condenatória tivesse transitado em julgado.
Veja-se que no HC 126.292/SP a impetrante alegou: “a) a ocorrência de flagrante constrangimento ilegal a esejar a superação da Súmula 691/STF; b) que o Tribunal de Justiça local determinou a imediata segregação do paciente, sem qualquer motivação acerca da necessidade de decretação de prisão preventiva; c) que a prisão foi determinada “após um ano e meio da prolação da sentença condenatória e mais de três anos após o paciente ter sido posto em liberdade, sem que se verificasse qualquer fato novo” e, ainda, “sem que a decisão condenatória tenha transitado em julgado”; d) a prisão do paciente não prescinde, nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, do trânsito em julgado da condenação. Requer, por fim, a concessão da ordem com o reconhecimento do direito do paciente de recorrer em liberdade”. BRASIL, HC 126.292/SP, 2016. p. 03.
Logo, mesmo que a garantia Constitucional seja pela presunção da inocência até o trânsito em julgado, admite-se hodiernamente, em razão da referida decisão, o início do cumprimento da pena após a condenação em segunda instância, ou seja, antes que a decisão tenha transitado em julgado, caminhando em desacordo com a carta magna, e, mais uma vez, denotando a mutabilidade das interpretações dos Tribunais Superiores na interpretação dos dispositivos. Giza-se que esse julgamento – HC 126.292/SP – teve repercussão geral.
Um dos argumentos levantados dá conta de que não poderia o próprio Tribunal prejudicar o jus puniendi estatal, que acabava frustrado quando era alcançada a prescrição da pretensão punitiva ou da pretensão executória. Desse modo, também foram levantados outros pontos pertinentes, como é o caso da interposição de recursos meramente protelatórios, com o fim de postergar o trânsito em julgado e, consequentemente, a execução da pena, tendo em vista que os recursos desgastam a máquina do poder judiciário (WELKER, 2017).
Com isso, após a condenação do réu já em segunda instância – momento processual onde ocorre a preclusão da matéria fática e probatória – poderia ser determinada a execução da pena do condenado. Contudo, embora tenha sido essa a nova decisão, essa interpretação ignora a redação do inciso LVII do artigo 5º da Constituição, uma vez que não toma como necessário o trânsito em julgado.
Sendo assim, o relator, Ministro Teori Zavascki, em seu voto, utilizou-se da prevalência constitucional sobre as normas infraconstitucionais, invocando o inciso LVII do artigo 5º da Constituição Federal, referindo que “a execução provisória de acórdão penal condenatório, proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência” (BRASIL, 2016, p. 04). Referiu, ainda, que a decisão do Superior Tribunal de Justiça no HC 313.021/SP estava em desacordo com o entendimento do Supremo no julgamento do HC 84.078/MG, segundo o qual a execução da pena exige o trânsito em julgado, contudo, manifestou-se no sentido de estabelecer um limite à presunção de inocência. Desse modo, votou para denegar a ordem de habeas corpus.
Em concordância, o Ministro Edson Fachin fez menção ao inciso LVII do artigo 5º da CF/88, referindo, contudo, que a presunção não é absoluta, devendo ser fixado um limite à presunção de inocência (BRASIL, 2016). Não obstante, pontuou que deve haver um limite à presunção de inocência, para que não se acabe por gerar uma presunção de desconfiança absoluta das decisões proferidas pelos Tribunais:
“É certo que a jurisprudência desta Suprema Corte, em recursos criminais, firmou-se no sentido de determinar a certificação do trânsito em julgado com baixa imediata dos autos, independentemente de publicação do acórdão, sempre que os segundos embargos de declaração forem desprovidos, por considerá-los protelatórios. Essa jurisprudência já configura um limite imposto por essa Corte à estrita literalidade da regra do art. 5º, LVII, da CF. Defendo, da linha das razões muito bem articuladas pelo eminente Relator, que o limite deva ser maior. Não depreendo da regra do art. 5º, LVII, da CF o caráter de presunção absoluta de inépcia das instâncias ordinárias. Porque, data venia, no limite, é disso que se trata! Se afirmamos que a presunção de inocência não cede nem mesmo depois de um Juízo monocrático ter afirmado a culpa de um acusado, com a subsequente confirmação por parte de experientes julgadores de segundo grau, soberanos na avaliação dos fatos e integrantes de instância à qual não se põem limites à devolutividade recursal, reflexamente estaríamos a afirmar que a Constituição erigiu uma presunção absoluta de desconfiança às decisões provenientes das instâncias ordinárias” (BRASIL, 2016, p. 25).
Barroso, na sequência, defendeu que a execução provisória da pena após a decisão em segundo grau, como no caso em apreço, não ofende o princípio da presunção de inocência, argumentando que se trata de justiça lato sensu, de modo que o sistema de justiça deixa de selecionar os que podem arcar com os custos de uma defesa em todos os graus recursais possíveis (BRASIL, 2016).
Em razão da divergência de votos, traz-se à baila o entendimento do Ministro Celso de Mello que se deu no sentido de garantir a presunção de inocência no ordenamento jurídico brasileiro até o trânsito em julgado, à vigência do Estado Democrático de Direito em solo pátrio, conforme se extrai:
“Mostra-se evidente, Senhor Presidente, que a Constituição brasileira promulgada em 1988 e destinada a reger uma sociedade fundada em bases genuinamente democráticas é bem o símbolo representativo da antítese ao absolutismo do Estado e à força opressiva do poder, considerado o contexto histórico que justificou, em nosso processo político, a ruptura com paradigmas autocráticos do passado e o banimento, por isso mesmo, no plano das liberdades públicas, de qualquer ensaio autoritário de uma inaceitável hermenêutica de submissão, somente justificável numa perspectiva “ex parte principis”, cujo efeito mais conspícuo, em face daqueles que presumem a culpabilidade do réu, será a virtual (e gravíssima) esterilização de uma das mais expressivas conquistas históricas da cidadania: o direito do indivíduo de jamais ser tratado, pelo Poder Público, como se culpado fosse” (BRASIL, 2016, p. 83).
Do mesmo modo como Celso de Mello, os ministros Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello e Rosa Weber, também votaram pelo deferimento da ordem de Habeas Corpus, com similar entendimento acerca da extensão da presunção de inocência, contrariando os votos pela limitação do princípio. Em contrapartida, outros sete ministros, em discordância, argumentaram em favor da prisão em segunda instância, conferindo sentido diverso ao princípio e vencendo, por maioria, pela denegação da ordem do HC 126.292/SP.
Desse modo, o Tribunal Pleno decidiu, por maioria, que a execução provisória da pena não estava em desacordo com a norma magna, tendo sido vencidos os votos de quatro ministros: Menezes Direito, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa e Ellen Gracie. Logo, a ordem de habeas corpus foi denegada. Assim, o entendimento foi de que a execução provisória da pena não fere o princípio da presunção de inocência, pelo contrário: este existe até a decisão proferida em primeira instância (NUCCI, 2020).
Resumidamente, traçando uma linha do tempo a respeito do que foi abordado até então, tem-se que a decisão que foi proferida no HC 84.078/MG, pelo Supremo Tribunal Federal foi mantida até o ano de 2016, no julgamento do Habeas Corpus 126.292/SP, ocasião em que passou a ser permitida a execução da pena após decisão em segunda instância.
No estudo realizado por Fischer (2009) sobre a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal no julgamento de Habeas Corpus, foi constatado que a interpretação da norma Constitucional em sentido contrário à presunção de inocência – em favor da prisão em segunda instância -, por sua vez, remonta à inexistência de efeito suspensivo nos recursos extraordinário e especial, nos termos do artigo 637 do Código de Processo Penal (BRASIL, 1941) e no teor da Súmula 267 do Superior Tribunal de Justiça (BRASIL, 2002, p. 03).
Fischer conclui dizendo que a presunção de não culpabilidade correlaciona-se com a proteção dos direitos fundamentais, de forma garantista, não podendo o cidadão ser condenado com base em provas indevidas, situação em que se incluem as provas duvidosas e, inclusive, as ilícitas, de modo que o óbice principal a ser enfrentado não é diretamente a garantia da presunção de não-culpabilidade, mas o cumprimento do devido processo legal (FISCHER, 2009).
Posteriormente ao julgamento do HC 126.292/SP, foram propostas Ações Declaratórias de Constitucionalidade, de número 43, 44 e 54, pelo Partido Ecológico Nacional (PEN), pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), respectivamente, como reação à decisão denegatória proferida. Nas referidas ADCs, foi pleiteada através do controle de constitucionalidade concentrado, a declaração de constitucionalidade do artigo 283, do Código de Processo Penal, cuja redação foi alterada pela Lei 12.403/2011, assim como a prevalência da presunção de inocência garantida pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal (CUNHA, 2020).
Logo, no julgamento do pleito, em 2019, foi considerado que a presunção de inocência possuía sentido dinâmico (CUNHA, 2017) e novamente passou-se a discutir a constitucionalidade – e ponderação quanto à necessidade – da prisão em segunda instância em razão da execução provisória da pena violar preceito constitucional. Pertinente destacar o voto proferido pelo Ministro Dias Toffoli, que, diferentemente de seu voto no bojo do HC 126.292/SP, nessa ocasião votou no sentido de admitir que a execução provisória da pena é cabível posteriormente ao julgamento do recurso especial, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (GUIMARÃES, 2017).
Um dos argumentos desfavoráveis dá conta de que a proibição da execução provisória da pena após a condenação pelo Tribunal de Justiça poderia beneficiar mais de 190 mil condenados potencialmente perigosos, que poderiam ser postos em liberdade. Abboud (2019, p. 04) afere que essa afirmação é “equivocada e histérica”, haja vista que ignora a solução já existente no ordenamento jurídico, na figura dos institutos das prisões temporária e preventiva, que garantem a prisão cautelar dos condenados não definitivos que possam oferecer riscos à conveniência da instrução criminal ou, inclusive, à própria segurança pública.
Na ocasião, o STF decidiu, por maioria de 6 votos a 5 – devido ao empate, houve o voto de Minerva proferido pelo Ministro Dias Toffoli -, que o condenado somente poderá cumprir a pena após esgotadas todas as possibilidades recursais, com o trânsito em julgado, suspendendo a execução provisória da pena. O Ministro defendeu que muito embora entenda o princípio da inocência como cláusula pétrea, a prisão, nesses termos, não ofende o princípio. O Ministro fez menção ao artigo 283 do CPP, reformado por força da Lei 12.403/2011, deixando claro o seu posicionamento de que a vontade do legislador originário era que na seara criminal, “ninguém seria preso senão do trânsito em julgado” (VALENTE e COELHO, 2019, p. 01).
Desse modo, restou novamente alterado o entendimento consolidado anteriormente pela mesma Corte, que em 2016 garantiu a execução da pena provisoriamente. Assim, a partir de 2019, passou novamente a ser vedado o cumprimento provisório da sentença penal condenatória proferida em segundo grau de jurisdição, antes do trânsito em julgado com decisão definitiva, demonstrando a fragilidade com que o sistema de justiça atua, através de constantes alterações sobre o tema de relevante espectro social.
1.2. A execução provisória da pena e o texto constitucional brasileiro
A Constituição da República de 1988 dispõe sobre a presunção de inocência no inciso LVII do artigo 5º. O julgado mais recente do Supremo Tribunal Federal sobre o tema consiste no ADC 43, ADC 44 e ADC 54, onde o tema central da discussão foi, justamente, o princípio da presunção de inocência. Na ocasião, restou firmado que a execução provisória da pena fere o princípio da presunção de inocência. A decisão proferida possui efeito erga omnes, se estendendo a todas as instâncias do Judiciário, bem como também é vinculante, possuindo cumprimento obrigatório.
A Constituição Federal não instituiu a presunção de inocência na condição de princípio (ROCHA e LORENZONI, 2020), mas a positivou no ordenamento jurídico, não havendo razões para tentar reduzir a sua aplicabilidade, condicionando-a a uma situação processual específica, como é o caso da decisão após segunda instância pelo Tribunal. Ou a pessoa é presumidamente inocente, ou ela não é.
Tratando a respeito, especialmente, da fundamentação utilizada no HC 126.292/SP, Oliveira (2017, p. 53) entende que a execução provisória somente seria possível nos casos em que restasse comprovada a “atitude protelatória” dos recursos interpostos, através da violação de dispositivos e princípios do ordenamento jurídico. Tavares denota que a presunção de inocência, interpretada sob a ótica criminalizadora do Estado, deve atuar limitando o exercício do poder punitivo estatal:
“Esse é o sentido do princípio da presunção de inocência, que, por estar positivado na ordem jurídica, não pode ser relativizado e deve ser tomado como verdadeiro postulado normativo, de atendimento obrigatório. Dadas as características impositivas do princípio da presunção de inocência, não pode ele ser flexibilizado por força de decisão judicial. A violação desse princípio pelos tribunais constituiria nítida hipótese de usurpação de poder. A configuração constitucional dos tribunais quanto à competência de aplicarem o direito positivo não os legitima a excederem sua estrita atividade judicial e passarem a substituir o poder constituinte originário” (TAVARES, 2018, p. 83-84).
Amaral e Caleffi (2017) crava o seu posicionamento no sentido de que o clamor popular e o anseio pela punição não podem ser maiores do que a preocupação em não sujeitar uma pessoa – presumidamente – inocente a uma injusta condenação. Assim, é preferível que existam culpados em liberdade, que inocentes segregados injustamente, de modo que os recursos devem passar a ser vistos como um instrumento de cidadania e de efetivação jurisdicional da democracia, e não com o efeito meramente protelatório.
Vitale (2007) afirma que o encarceramento em massa não faz parte do estado democrático de direito, pois consiste em um confronto com a própria ideia de justiça, de modo que o Estado Constitucional de Direito deveria ser capaz de impor limites ao próprio poder punitivo estatal.
Já para David e Bonato (2018) o entendimento firmado no HC 126.292/SP fere a garantia do estado de inocência e não coaduna com o ordenamento jurídico vigente, de modo que é mais plausível que se retorne à aplicação do entendimento fixado no HC 84.078/MG, quando a execução da pena somente pode ser iniciada após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Desse modo, se estaria evitando pecar pelo excesso de poder de punição, fazendo referência a Hallsworth (2012, p. 185-209), conforme se extrai:
“Segundo Hallsworth, as “fontes das quais a punição pós-moderna deriva tem suas raízes não somente na lógica da ordem penal pré-moderna, mas especificamente na economia penal de excesso a qual ela estava vinculada”, possibilitando que clamor punitivo popular – sem qualquer senso racional crítico – migre da execução da pena para as garantias processuais, em uma verdadeira antecipação de barreiras de imputação do sistema de justiça criminal, destruindo por completo os anseios que a modernidade projetou para Estados com sistemas democráticos” (DAVID e BONATO, 2018, p. 19).
Por essa ótica, o discurso punitivista é retratado como sendo o principal responsável pelo desejo de punição, que leva para dentro do processo penal a pena como um objeto de satisfação pessoal. Em Foucault (2014) é possível visualizar, ainda que no plano imaginário, uma cena que mostra a forma como a pena era tratada pela sociedade.
Foucault inicia a obra narrando a cena de um suplício, em que os condenados eram submetidos à tortura e a tratamentos desumanos, mediante atrações consistentes em homicídios públicos e violentos, onde os acusados constantemente clamavam frases como “perdão, Senhor”, na tentativa de redimir-se por seus pecados e blasfêmias. Após a morte do torturado – e, às vezes, antes dela – os condenados eram queimados: “em cumprimento da sentença, tudo foi reduzido a cinzas. O último pedaço encontrado nas brasas só acabou de se consumir às dez e meia da noite”. (FOUCAULT, 2014, p. 09-10)
Como se não bastasse, os detentos eram submetidos a regimes rigorosos e com horários determinados, que incluíam o trabalho, a escola e a oração. Segundo o autor, esse cenário perdurou até o fim do século XVIII e o início do século XIX: “de um lado, a supressão do espetáculo punitivo. O cerimonial da pena vai sendo obliterado e passa a ser apenas um novo ato de procedimento ou de administração” […] “A punição pouco a pouco deixou de ser uma cena. E tudo o que pudesse implicar de espetáculo desde então terá um cunho negativo; e como as funções da cerimônia penal deixavam pouco a pouco de ser compreendidas, ficou a suspeita de que tal rito que dava um “fecho” ao crime mantinha com ele afinidades espúrias: igualando-o, ou mesmo ultrapassando-o em selvageria, acostumando os espectadores a uma ferocidade de que todos queriam vê-los afastados, mostrando-lhes a frequência dos crimes, fazendo o carrasco se parecer com criminoso, os juízes aos assassinos, invertendo no último momento os papéis, fazendo do supliciado um objeto de piedade e de admiração.” […] “A execução pública é vista então como uma fornalha em que se acende a violência.” (FOUCAULT, 2014, p. 11-15).
Os suplícios foram a maneira utilizada para punir até o século XVIII. Os condenados eram submetidos a tratamentos desumanos e cruéis, através de espetáculos públicos em que uma vida humana possuía o valor de um bilhete de cinema: tratava-se de uma atração humana com fins lúdicos, e continha o devido entretenimento através da espetacularização do corpo, apreciada com início, meio e fim. O fim todo mundo já conhece.
Para Wunderlich, a execução antecipada da pena somente pode ser concebida mediante fissura no texto constitucional brasileiro, pois está em desacordo com a norma. Como exemplo, cita as históricas sobreposições do interesse social sobre o interesse individual. A respeito disso, extrai-se o trecho:
“A pena só pode ser executada após o esgotamento das possibilidades de modificação do veredicto condenatório, justamente porque o recurso criminal é compreendido como um fiel instrumento de garantias, um remédio contra a arbitrariedade e o abuso judicial. Em busca de celeridade, pois outra razão não existe, não se deve admitir a violação da garantia do cidadão no seu direito de ver a prestação jurisdicional ocorrer às inteiras. Recorrer é um direito previsto em lei e não se trata, portanto, de subterfúgio ou procrastinação, mas de buscar maior segurança jurídica” (WUNDERLICH, 2019, p. 29).
Wunderlich finaliza referindo que o recurso criminal, dentro dessa perspectiva, possui fundamento normativo político-constitucional de absoluta necessidade ao sistema jurídico-constitucional estabelecido em graus de jurisdição. Em se tratando de duplo grau de jurisdição, portanto, Gomes (2016) refere que a execução provisória da pena seria possível porque não se estaria mais abordando matérias de fato e de direito.
Oliveira (2017), aborda que em razão da morosidade no processamento e conhecimento dos recursos no âmbito dos Tribunais Superiores, deveria o direito manter-se aberto à complexidade da realidade, de modo que a forma de aplicação do princípio da presunção de inocência no ordenamento jurídico poderia ser problemática.
Vieira (2021) refere que o estado de inocência e suas consequências se amortizam após a condenação em segundo grau, de modo que, após a efetiva condenação em segunda instância, a presunção de inocência fica sem forças. Nesse sentido, Sanches (apud, VIEIRA, 2021) correlaciona o conceito de trânsito em julgado, relacionando-o não ao esgotamento recursal, mas ao fim da análise fática.
Outrossim, o ordenamento jurídico brasileiro exige o trânsito em julgado para o início do cumprimento da pena, de modo que é possível aferir que é através desse momento processual que se afere a culpabilidade do acusado. Diante disso, qualquer interpretação em sentido diverso é muito distante do que o legislador originário pretendeu estabelecer quando promulgada a Constituição atual.
Ademais, a mutação interpretativa do dispositivo que prevê a presunção de inocência, realizada pelo Poder Judiciário, através do papel do Supremo Tribunal Federal, implica na invasão de um dos poderes sobre o outro, ao passo que invade o espaço jurídico reservado ao Poder Legislativo.
De outra banda, há interpretações diversas quanto à extensão da presunção de inocência para além da decisão em primeiro grau. Nesse sentido, Kurkowski e Suxberger (2016), em defesa da constitucionalidade da execução provisória da pena, aborda a prevalência dos interesses sociais em detrimento do interesse particular do condenado, à medida em que enfatiza que a segurança pública é objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, restando presente no preâmbulo e positivada nos incisos I e IV do artigo 3º da Constituição. O autor refere, ainda, que a noção de segurança é um dos pilares fundantes do Estado, de modo que a ausência do Estado causaria um colapso ou estado de guerra. Conclui fazendo menção à teoria proposta por Hobbes (1651, apud KURKOWSKI e SUXBERGER, 2016), de que a ausência do Estado faz com que os cidadãos utilizem-se da força e dos recursos disponíveis, causando, a certo modo, uma anarquia.
Suxberger e Amaral (2017) defende que embora a presunção de inocência seja indispensável no Estado Democrático de Direito, inviabilizar a execução provisória da pena a partir do encerramento da instância ordinária é romper com a lógica do sistema acusatório, pois o processo penal já teria transcorrido com a observância das garantias constitucionais, assim como a prova já estaria produzida.
Paulino, em similar interpretação, faz menção ao equilíbrio de forças necessário ao bom andamento do processo penal:
“O processo penal deve ser visualizado como um instrumento que garanta ao Estado uma eficiente persecução criminal e ao acusado mecanismos para exercer sua defesa de maneira eficiente. Em suma, não haverá processo penal eficiente sem garantismo, bem como não há garantismo sem um processo eficiente. Deve-se evitar um contexto de hipergarantismo ou mesmo de excesso de repressão” (PAULINO, 2017, p. 218).
Nesse sentido, Paulino enfatiza que para a eficácia do garantismo penal, deve-se evitar uma desproporcionalidade entre os direitos e garantias fundamentais, defendendo que a concepção do garantismo integral não viola a presunção de inocência quando da execução provisória da pena. Isso porque vige o princípio da proporcionalidade, diante do qual também se condiciona o direito de punir (PAULINO, 2017).
De volta ao pensamento garantista, tem-se do estudo de Furtado o questionamento sobre a execução provisória da pena possuir o caráter de prisão cautelar ou de prisão-pena. Nesse sentido, refere que não está evidente o propósito da execução firmada no HC 126.292/SP, concluindo, ao final, que a natureza parece ser sui generis, que decorre da autoridade do Supremo Tribunal Federal, tornando-a arbitrária. Refere, em desenlace da análise, que o direito comparado aos demais países não favorece a execução provisória da pena no Brasil. Isso porque, segundo a pesquisa realizada pelo autor, em mais de quatorze países também é exigido o trânsito em julgado para que seja iniciado o cumprimento da pena (FURTADO,2019).
Outrossim, no mesmo contexto, é pertinente destacar a discussão acerca do uso de algemas, outra “polêmica” que permeia a inocência e denota resquícios de culpabilidade sobre o acusado (AVENA, 2016). Havendo um processo penal em trâmite onde o acusado está sob a custódia preventiva do Estado, somente é lícito, segundo a atual redação da Súmula Vinculante 11, o uso de algemas nos casos em que há perigo à integridade física, ameaça de resistência ou iminência de fuga. Desse modo, diante da necessidade de utilização de algemas em um procedimento do júri, por exemplo, é vedado às partes mencionarem este fato em juízo, sob a justificativa de estarem prejudicando ou beneficiando o réu.
Desse modo, resta cristalino que a parcela da doutrina e do âmbito científico que defende a inexigibilidade da execução provisória da pena, aborda um aspecto não só processual, mas humanitário da pena, no sentido de conferir maior amplitude à presunção de inocência devido à rigidez da norma Constitucional e sua positivação quanto ao estudado princípio. Ainda assim, a última posição firmada pelo Supremo Tribunal Federal é que não é possível a execução provisória da pena privativa de liberdade.
1.3. O pacote anti-crime e a possibilidade da execução provisória da pena no rito do júri
O artigo 283 do Código de Processo Penal teve a sua redação alterada pela Lei 12.403 /2011, que consagrou no referido diploma o que a Constituição Federal já previa em seu texto, de modo que foi fixado, em ambos os diplomas, que a prisão no curso do processo, que se admite em sede cautelar, somente poderia ocorrer mediante prisão cautelar. A redação assim dispunha: “Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou preventiva”. Veja-se que continha a expressão “sentença condenatória transitada em julgado”.
Com o advento da Lei 13.964/2019, o pacote anticrime, a redação do artigo 283, mais uma vez, mudou. A alteração, nesse momento, foi com relação à parte final do artigo, que anteriormente falava em “sentença condenatória transitada em julgado” e, com a nova redação, passou a ler-se “condenação criminal transitada em julgado” (NUCCI, 2020, p. 78).
O artigo passou a viger, portanto, com a seguinte redação: “ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de prisão cautelar ou em virtude de condenação criminal transitada em julgado”. A execução da pena, por sua vez, ficaria adstrita ao trânsito em julgado da sentença penal, em igual conformidade ao artigo 5º, inciso LVII da Constituição.
Igualmente possível, no rito do júri, assim como no procedimento comum ordinário, o instituto das prisões cautelares. Desse modo, os acusados pelos delitos de competência do tribunal podem cumprir medidas de segregação cautelar, aguardando o julgamento em estabelecimento prisional ou, resguardadas as devidas hipóteses, em prisão domiciliar, com ou sem monitoramento eletrônico. Outrossim, também podem responder ao processo em liberdade, cumprindo medidas alternativas ou não.
Após o julgamento do HC 126.292/SP, foram julgados outros Habeas Corpus, nos quais o STF já permitiu o cumprimento imediato da pena no rito do júri, imediatamente após o encerramento do procedimento nas instâncias ordinárias, como é o caso da decisão monocrática proferida na petição avulsa proposta no bojo do HC 118.039/MA e nas decisões monocráticas nos Habeas Corpus 147.957/RS, 148.720/AL e 145.496/RS, todas de 2017 (KURKOWSKI, 2019).
Antes mesmo da publicação da nova lei, alguns pontos já eram contestados, senão, vejamos:
“A Constituição garante a instituição do Júri e o sigilo das votações. Porém, não garante a íntima convicção. Se da decisão do Júri que condena cabe recurso por nulidade e manifesta contrariedade à prova dos autos, por qual razão o Júri esgota a faticidade? É difícil compreender esse ponto. Como afirmar que a decisão dos jurados significa trânsito em julgado e determina a prisão? Assim, à pergunta “Decisão de jurado equivale a trânsito em julgado”, respondemos: Não. Não equivale. Por quê? Porque é inconstitucional essa posição que justifica a imediata execução da pena. Se a prisão antecipada decorrente do HC 126.292 já é inconstitucional por ferir clara disposição legal e constitucional, o que diremos da prisão antecipada decorrente de um Tribunal que, em primeira instância, decide por intima convicção, por “sim” ou “não”? A Constituição garante a soberania das decisões proferidas pelo Júri. Isto não significa que o Júri pode tudo ou pode qualquer coisa. Tanto não pode que cabe recurso contra suas decisões. O STF tem restringido estas hipóteses de recursos a casos de condenação. Ou seja, a soberania dos vereditos é uma garantia do réu e não algo que possa ser invocado contra ele. O próprio tribunal do Júri existe para dar maior proteção aos acusados, tanto que está previsto no artigo 5º, o qual elenca os direitos e garantias individuais de todo cidadão” (CARVALHO et al., 2019, p. 06).
Na sequência, Carvalho et al. faz menção, especialmente, no que tange à soberania do veredicto dos jurados, quando sopesado ao interesse recursal do acusado, referindo, inclusive, que o júri condena arbitrariamente. Carvalho et al. diz, por fim, que se é possível haver execução provisória diante da decisão de primeiro grau proferida pelo tribunal do júri, então sequer deveria haver possibilidade recursal (CARVALHO et al.,2019) haja vista que se está tratando a decisão como imutável, elevando-a ao patamar de decisão em segundo grau de jurisdição.
Sendo assim, em 24 de dezembro de 2019 foi publicada a Lei nº 13.964, que entre outras alterações, trouxe consigo uma alteração significativa no âmbito da decisão pelo tribunal do júri, através do artigo 492, inciso I, alínea “e” e § 3º ao Código de Processo Penal, através da seguinte redação:
“e) mandará o acusado recolher-se ou recomendá-lo-á à prisão em que se encontra, se presentes os requisitos da prisão preventiva, ou, no caso de condenação a uma pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão, determinará a execução provisória das penas, com expedição do mandado de prisão, se for o caso, sem prejuízo do conhecimento de recursos que vierem a ser interpostos; § 3º O presidente poderá, excepcionalmente, deixar de autorizar a execução provisória das penas de que trata a alínea e do inciso I do caput deste artigo, se houver questão substancial cuja resolução pelo tribunal ao qual competir o julgamento possa plausivelmente levar à revisão da condenação. § 4º A apelação interposta contra decisão condenatória do Tribunal do Júri a uma pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão não terá efeito suspensivo. § 5º Excepcionalmente, poderá o tribunal atribuir efeito suspensivo à apelação de que trata o § 4º deste artigo, quando verificado cumulativamente que o recurso: I – não tem propósito meramente protelatório; e II – levanta questão substancial e que pode resultar em absolvição, anulação da sentença, novo julgamento ou redução da pena para patamar inferior a 15 (quinze) anos de reclusão. § 6º O pedido de concessão de efeito suspensivo poderá ser feito incidentemente na apelação ou por meio de petição em separado dirigida diretamente ao relator, instruída com cópias da sentença condenatória, das razões da apelação e de prova da tempestividade, das contrarrazões e das demais peças necessárias à compreensão da controvérsia.”
Desse modo, deixou de ser exigido o trânsito em julgado para o início do cumprimento da pena no âmbito do tribunal do júri nos casos em que a pena for igual ou superior a quinze anos de reclusão. Na verdade, deixou-se de permitir que o condenado recorresse em liberdade, haja vista que da decisão do júri cabe recurso de apelação, nos termos do artigo 593 do CPP, ainda que as hipóteses sejam taxativas.
Na regra antiga, havendo sentença condenatória pelo conselho de sentença, o juiz presidente mandava recolher o condenado à prisão se presentes os requisitos da prisão preventiva (NUCCI, 2020). A partir da vigência da nova alínea, havendo condenação a pena igual ou superior a quinze anos, o condenado “deve” ser recolhido à prisão, não sendo, portanto, uma faculdade do juiz presidente diante da presença dos requisitos da prisão preventiva.
Um dos principais argumentos favoráveis à decisão dá conta da soberania do Tribunal Popular, haja vista que em excepcionais circunstâncias o Tribunal contestaria a decisão. Nucci ainda expõe que:
“No mais, existem paliativos, não convincentes. Por exemplo, o § 3º estipula que “presidente poderá, excepcionalmente, deixar de autorizar a execução provisória das penas que trata a alínea e do inciso I do caput deste artigo, se houver questão substancial cuja a resolução pelo tribunal ao qual competir o julgamento possa plausivelmente levar a revisão da condenação”. Esse dispositivo é muito aberto e irregular. Alguns juízes podem achar que o recurso do réu pode ter provimento e muitos outros que não. Trata-se de fórmula a gerar insegurança jurídica. Não bastasse, o § 4º estipula que “a apelação interposta contra decisão condenatória do tribunal do júri a uma pena igual ou superior a 15 anos de reclusão não terá efeito suspensivo”. Cuida-se de uma norma sem base lógica. O condenado a 14 anos e 11 meses poderia ficar em liberdade, mas o que foi apenado a 15 anos seria preso. O critério deve ser uniforme, sempre” (NUCCI, 2020, p. 87-88).
Nucci conclui dizendo que não pode haver distinção em função do montante da pena, bem como que enquanto o STF mantiver a posição de que a prisão-pena somente tem cabimento após o trânsito em julgado da decisão condenatória, torna-se irregular determinar a prisão do réu de pronto, independentemente do montante da pena (NUCCI, 2020).
Diferentemente da possibilidade recursal existente contra as decisões proferidas por juiz singular, em que é possível impugnar todos os pontos constantes na sentença, o recurso de apelação contra as decisões do júri é restrita às hipóteses expressas no artigo 593 do CPP. Contudo, a Súmula 713 do Supremo Tribunal Federal preceitua: “o efeito devolutivo da apelação contra decisões do júri é adstrito aos fundamentos da sua interposição”. Não obstante, a vinculação da fundamentação recursal do júri não impede a modificação pelo Tribunal.
Consoante informado anteriormente, a decisão proferida pelo júri diz respeito ao primeiro grau de jurisdição. Todavia, o direito ao duplo grau de jurisdição é um princípio que garante ao condenado uma segunda avaliação, podendo obter uma redução de pena ou, inclusive, uma absolvição, através de uma hierarquia jurídica superior (DIDIER JR. e CUNHA, 2017).
Essa garantia está presente na Constituição Federal, implicitamente, no artigo 5º, inciso LV através da expressão “com os recursos a ela inerentes”. Assim como no artigo 9º, §4º do Pacto de Nova Iorque, através da redação “qualquer pessoa que seja privada de sua liberdade por prisão ou encarceramento terá direito de recorrer a um tribunal […]”, que através do §2º do art 5º da CF, possui influência no ordenamento jurídico brasileiro (AMADO, 2011, p. 01).
Igualmente, tem-se na Convenção Americana de Direitos Humanos, no artigo 8º, inciso II, alínea “h”: “Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: h) direito de recorrer de sentença para juiz ou tribunal superior”. Enquanto isso, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos afirma, no artigo 14, inciso V, que toda pessoa terá direito a recorrer em instância superior. Muito embora a positivação de normas no âmbito internacional em tratados ratificados pelo Brasil, vê-se que no país a interpretação da norma muda constantemente de sentido, metaforicamente falando, a interpretação dança conforme a música.
- O RITO DO JÚRI: A INCONSTITUCIONALIDADE DA EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA
O tribunal do júri é formado pelo conselho de sentença que é, por sua vez, composto por cidadãos comuns, que atuam na condição de julgadores, constituindo o juiz natural deste procedimento. Sendo assim, ao conselho de sentença compete apreciar as provas e elementos informativos constantes no procedimento, em plenário, objetivando julgar os seus iguais, que figuram na condição de réus.
Ocorre que a decisão proferida pelo júri é considerada absoluta relativamente à matéria, “ratione materiae” (SOUZA, 2020, p. 09), podendo ser alterada somente em hipóteses taxativas por razões processuais, quando são admitidos recursos. Outrossim, muitos autores discordam do caráter absoluto da decisão do júri, especialmente porque do jurado não é exigido prévio conhecimento jurídico, de modo que a decisão passa a ser menos jurídica e mais pessoal, podendo carregar diversos aspectos íntimos, inclusive, o desejo de punir.
No que diz respeito à execução da pena, sobreveio a Lei 13.964/2019 que adicionou ao inciso I do artigo 492 do Código de Processo Penal a alínea “e”, prevendo a imediata execução da pena, de forma provisória, quando proferida decisão pelo conselho de sentença cuja pena aplicada for igual ou superior a quinze anos de reclusão, conforme se extrai da parte final da alínea.
Diante disso, passar-se-á a expor, inicialmente, os atributos do procedimento do júri. Posteriormente, serão abordados posicionamentos doutrinários acerca do rito, assim como os aspectos constitucionais – e inconstitucionais – presentes na aplicação prática do referido dispositivo, consistente na novidade trazida pelo Pacote Anticrime acerca da execução provisória da pena igual ou superior a quinze anos de reclusão.
2.1. Um panorama geral sobre o funcionamento do procedimento do júri
O tribunal do júri é uma instituição jurídica implementada no país no século XVIII. Foi consolidada oficialmente no ordenamento jurídico brasileiro somente em 1824, através da Constituição Federal do Império de Dom Pedro Primeiro, mediante a influência britânica, norte-americana e francesa. No âmbito internacional, o objetivo da instituição era remontar a um ideal de justiça popular, visando combater a arbitrariedade estatal que ocorria pelo julgamento do juiz criminal (STRECK, 2001).
Trata-se de uma garantia Constitucional, afirmada no artigo 5º, inciso XXXVIII, alínea “d”, da Constituição Federal de 1988 que determina que ao referido tribunal compete o julgamento dos crimes dolosos contra a vida e também os delitos conexos, através da seguinte redação: “é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;”.
O rol dos crimes julgados pelo tribunal estão no § 1º do artigo 74 do Código de Processo Penal, conforme pode-se extrair da seguinte redação: “Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes previstos nos arts. 121, §§ 1º e 2º, 122, parágrafo único, 123, 124, 125, 126 e 127 do Código Penal, consumados ou tentados.” Trata-se, portanto, dos delitos de homicídio, induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, infanticídio e aborto. Ainda, havendo outros crimes em concurso formal, a regra de competência é que o júri delibera sobre os crimes conexos também.
Além disso, o procedimento é composto de três fases: o judicium accusationis, a fase de preparação e a fase de deliberação pelo júri (NUCCI, 2010). Com divergências doutrinárias quanto à estrutura, pode ser dividido, também, duas fases: a primeira, judicium accusationis, compreende a fase de instrução, ocasião em que é feito, também, o Juízo de admissibilidade pelo juiz singular, quando lhe é facultado, da análise do processo, pronunciar, impronunciar, desclassificar ou absolver o acusado. Já a segunda fase, judicium causae, diz respeito à preparação para o plenário de julgamento (GOMES, 2010).
A pronúncia, prevista pelo artigo 413 do Código de Processo Penal, encerra o juízo de admissibilidade da acusação (GRECO, 2017), e consiste na decisão, pelo juiz de direito, da competência do tribunal do júri para o julgamento. Daí em diante iniciar-se-á a segunda fase, que será a preparação para o plenário, e, por fim, o plenário de julgamento (SOUZA, 2017). Bonfim (2018, p. 369), orquestrando um plenário de julgamento, citou Magarinos Torres, que definiu que “a pronúncia é o juízo provisório da culpa”.
Capez (2016, p. 234) define a impronúncia como uma “decisão de rejeição da imputação para o julgamento perante o Tribunal do Júri, porque o juiz não se convenceu da existência do fato ou de indícios suficientes de autoria ou de participação”. Isso porque a peça acusatória não dispõe de elementos mínimos para que se discuta aquele pleito. O referido está disposto no artigo 414 do Código de Processo Penal, que dispõe: “não se convencendo da materialidade do fato ou da inexistência de indícios suficientes de autoria ou de participação, o juiz, fundamentadamente, impronunciará o acusado”.
Távora e Araújo (2012) refere que na impronúncia não se tem um juízo de certeza necessário a justificar uma absolvição sumária. Já Nucci (2015) aponta que não pode haver juízo de mérito na decisão que impronuncia o réu, assim como deve seguir o caminho inverso da pronúncia: não havendo prova segura da materialidade ou indícios suficientes de autoria, extingue-se o processo sem a resolução do mérito.
A desclassificação, por sua vez, ocorre quando o magistrado se convence, em dissonância à denúncia ou queixa, da existência de crime diverso dos descritos no § 1º do artigo 74 do CPP, fazendo com que outro juízo seja competente para apreciar o processo (SOUZA;SOUZA, 2006). Enquanto isso, a absolvição sumária coloca um fim definitivo ao processo (NUCCI, 2015).
O procedimento é similar ao rito ordinário até a decisão de pronúncia, proferida pelo juiz de direito, que deve se restringir às provas e elementos informativos colacionados aos autos, sem que seja realizado juízo de valor por parte do magistrado, sob pena de nulidade. A pronúncia, portanto, define que o acusado será submetido ao tribunal popular.
No ponto, ainda na fase judicium accusationis, verifica-se a impossibilidade da pronúncia com base somente nos elementos informativos presentes no inquérito policial, fulcro no informativo no 638 do STJ, no artigo 155 do Código de Processo Penal Brasileiro e no teor do REsp 1.740.921, julgado pela Quinta Turma, conforme se extrai: “impossibilidade de se admitir a pronúncia de acusado com base em indícios derivados do inquérito policial” (BRASIL, 2018, p. 04). Isso porque o Inquérito Policial, por possuir viés inquisitivo, não possibilita ao acusado o exercício do contraditório e da ampla defesa, de modo que também inexiste o respeito à presunção de inocência, de modo que a decisão de pronúncia feita nos moldes expostos, está em desacordo com as garantias previstas pela Constituição Federal no artigo 5º, inciso LV.
Ocorre que o próprio princípio da presunção de inocência é, por muitas vezes, mitigado no procedimento do júri, pois havendo dúvidas acerca da autoria delitiva, a medida mais adequada a ser adotada é a imediata absolvição, em observância ao in dubio pro reo, o que na prática, não ocorre.
Masson (2015), por outro lado, refere que a desclassificação, no iudicium accusationis a dúvida não favorece os acusados, de modo que incide a regra do in dubio pro societate. Contudo, a pronúncia quando fundamentada no dito princípio in dubio pro societate, que não se encontra em nenhum dispositivo jurídico (BRETAS, 2010), é um afronte não só ao princípio in dubio pro reo, como ao próprio Estado Democrático de Direito, violando, inclusive, as normas supralegais, pois o primeiro não se trata sequer de um princípio, mas mera justificativa para, mediante dúvida, pôr nas mãos de juízes leigos o poder de decidir (GOMES, 2010).
O tribunal do júri é composto, portanto, pelo juiz de direito, que figura na condição de presidente e não de julgador, e por vinte e cinco jurados, sorteados dentre as pessoas alistadas, conforme o artigo 447 do CPP. O quórum de instalação exige a presença de, no mínimo, quinze jurados (artigo 463 do CPP). Instaurado o plenário de julgamento, são sorteados sete jurados, os quais comporão o conselho de sentença.
Os jurados decidirão sobre o futuro do réu através de voto secreto, haja vista que lhes é assegurado o sigilo das votações. Giza-se que o legislador, na reforma realizada em 2011 através da Lei 12. 403/2011, no intuito de conferir maior grau de importância aos jurados (MINAGÉ, 2011), lhes garantiu a presunção de idoneidade moral, conforme a redação do artigo 439 do Código de Processo: “o exercício efetivo da função de jurado constituirá serviço público relevante e estabelecerá presunção de idoneidade moral”.
Realizado o julgamento pelo conselho de sentença, a dosimetria da pena será aplicada pelo juiz presidente, que, na ocasião, poderá mandar o réu recolher-se à prisão, quando preenchidos os requisitos ensejadores da prisão cautelar, que será explorado com maiores detalhes no item 4.3.
Destarte, apontado não só o funcionamento do procedimento do júri, mas também parte das irregularidades nele existentes envolvendo a mitigação do princípio da presunção de inocência, passar-se-á a discutir, sob a ótica garantista, o peso do julgamento pelo tribunal popular.
2.2. O peso do julgamento pelo conselho de sentença sob o viés garantista da punição
“Quase todos os homens conseguem superar a adversidade, mas se quer conhecer o caráter de um homem, dê-lhe poder”. Essa frase foi dita por Ingersoll a respeito de Abraham Lincoln, em 1883, referindo que nada é capaz de revelar tanto o caráter como o uso do poder (INGERSOLL, 1883).
Ainda que em um contexto bastante politizado, Rousseau, no século XVIII fez questão de separar um tópico para abordar a possibilidade da vontade geral errar. Nesse sentido, pontua que a vontade do povo é divergente da vontade geral, pois uma se trata da vontade coletiva, e outra, das particularidades de cada um. “Jamais se corrompe o povo, mas com frequência se ludibria, e é somente então que ele parece desejar o que é mal” (ROUSSEAU, 2015, p. 31). Conclui dizendo que para o alcance da vontade geral, não pode haver sociedade parcial dentro do Estado.
Partindo do pressuposto do ideal de Rousseau, pode-se extrair, analogicamente, que a própria deliberação pelo júri será divergente a depender de quais serão os indivíduos que comporão o conselho de sentença. Com a devida vênia no eventual caso de essa expressão já ter sido utilizada, trata-se de uma roleta russa, em que o tambor é composto de projéteis dos quais não há como deliberar sobre o juízo de valor, tampouco sobre a bagagem individual, o que pode resultar em uma condenação ou em uma absolvição.
Sendo assim, considerando diversos conselhos de sentença formados em diferentes Comarcas, deliberando sobre o mesmo fato, seriam responsáveis por proferir decisões absolutamente divergentes, ainda que fossem apresentadas as mesmas provas e realizados idênticos debates orais.
Logo, resguardadas as devidas proporções, antes de ser um jogo do processo penal cujas regras são seguidas a fim de resguardar os princípios garantidores, não deixa de ser um jogo de azar, em que o réu pode sair condenado ou livre, independentemente do conteúdo probatório constante no processo que instruiu o fato.
Baratta (2016, p. 57), analisando as teorias psicanalíticas da criminalidade e da sociedade punitiva entende que “comportamento criminoso e reação punitiva são expressões da mesma realidade psicológica”, remetendo a um antagonismo entre indivíduo e sociedade. É necessário que o público, quando da análise dos fatos, busque a verdade, reduzindo as proporções do que existe de exagero e de maldade dentro do processo penal, para que se apreciem fatos, e somente fatos (FERRI, 1856-1929).
Nucci afere as particularidades observadas através da sua própria experiência em plenário, a respeito do juízo de valor realizado pelos jurados, conforme passagem extraída:
“Por experiência pessoal, verificamos que os jurados mais preparados intelectualmente sempre tiveram maior disposição em captar a essência das teses jurídicas, embora fossem leigos, realizando julgamentos mais próximos à letra da lei. Os jurados incultos tinham a tendência de abstrair as teses e julgar o ser humano, tal como ele se apresentava. Ilustrando, o jurado de melhor nível intelectual esforçava-se a entender o significado de princípios constitucionais fundamentais, como a presunção de inocência ou o direito ao silêncio. Outro, mais limitado, com menor instrução, apresentava a tendência de levar em consideração os antecedentes do acusado, além de se filiar ao entendimento de que quem cala consente, desprezando, pois, o direito constitucional, que todos possuem, de não produzir prova contra si mesmo” (NUCCI, 2015, p. 157).
Evidentemente, a análise do jurado depende não só do seu grau de instrução, mas também da bagagem que carrega consigo. Nesse sentido, a sujeição do acusado ao julgamento pelos olhos de juízes leigos é ineficaz em se tratando de uma sociedade com viés punitivista, que anseia por punição por não ser capaz de olhar para o outro da mesma forma como olha para si (CARNELUTTI, 1957). Em razão disso, deve-se observar as circunstâncias da decisão proferida, para que não se faça da punição uma Lei de Talião, mitigando princípios instituídos em âmbito internacional, e tornando a sanção pelos crimes dolosos contra a vida, circunstância disponível ao julgamento social carregado de pessoalidade e pré-conceito.
Marques (1963) afere que o processo penal do júri é de natureza condenatória porque tem por causa finalis o julgamento de uma acusação. Nesta senda, a decisão proferida pelo júri, em primeiro grau de jurisdição, é válida e plena, sob o ponto de vista positivo-jurídico do ordenamento jurídico brasileiro. Contudo, quando verificadas as circunstâncias por detrás do voto de cada jurado, extrai-se muito mais do que as provas colacionadas aos autos conseguem demonstrar.
Diante disso, muito embora as constantes evoluções legislativas no sentido de conferir maior garantia ao acusado, principalmente em âmbito internacional, é evidente que o conselho de sentença, ao proferir uma decisão baseada em sua íntima convicção – a qual, veja-se, é princípio reservado ao julgamento pelo juiz togado – é impedir que o acusado tenha o direito a uma justa condenação, proferida sob a ótica positivista e jurisprudencial. É tolher do réu a garantia da presunção de inocência, que lhe é assegurada pela própria Constituição Federal e pela gama de Tratados ratificados pelo Brasil, que a garantem no mesmo sentido.
É pertinente evidenciar as falhas que permeiam a prática processual penal no Brasil. Embora exista um ordenamento de normas positivadas na finalidade de garantir o andamento adequado dos sistemas de justiça, vê-se que inclusive em um sistema democrático e acusatório existem raízes obsoletas nada misericordiosas, que punem por mera presunção ou capricho, objetivando a satisfação de quem quer que seja, tornando a vida do réu um mero fantoche das atuações judiciárias, mediante o inestimável peso da ineficiência do direito frente à Justiça (CARNELUTTI,1945).
Na seara filosófica e sociológica de Nietzsche, em um profundo conceito sobre culpa, castigo e vingança, os homens são entendidos como possuidores de um espírito de vingança, capaz de associar a ela o castigo, diante da insuficiência da própria existência humana somada do ato praticado e da culpa que o indivíduo carrega não ser, por si, um castigo:
“O espírito de vingança: meus amigos, essa foi até agora a melhor reflexão dos homens; e onde havia sofrimento, deveria haver sempre castigo. Castigo: eis o nome da própria vingança – com uma palavra mentirosa ela simula para si uma boa consciência. […] As coisas encontram-se ordenadas moralmente, segundo direito e castigo. Ó, onde estará a redenção do fluxo das coisas e do castigo chamado “existência”? assim pregava a loucura. […] Nenhum ato pode ser aniquilado: como poderiam eles ser desfeitos por meio do castigo? E isto, isto é o que há de eterno no castigo chamado “existência”, que a existência precise também eternamente ser novamente ato e culpa!” (NIETZSCHE, 2019, p. 169).
O homem vê a si mesmo como aquele que determina os valores, assim como aquele que não tem a necessidade de aprovação sobre os demais, pois é ele quem julga (NIETZSCHE, 2015). Embora exista uma gama de posicionamentos em sentido contrário – a exemplo disso, pode-se citar Bonfim, em Prefácio para GOMES (2010, p. 14): “Nenhum dos órgãos do Judiciário representa tão notavelmente a democracia, como o Júri ao dar ao próprio povo o direito de julgar” – , pretende-se demonstrar que o julgamento pelo júri já é, por si só, viciado, pois sob os olhos dos julgadores, o indivíduo que senta no banco dos réus é analisado por si e por sua história, não unicamente pelo seu delito, especialmente pelas palavras colacionadas alhures de Nucci.
Nos ensinamentos de Carnelutti, tem-se que ele ainda demonstrou em sua obra que o ser humano não é capaz de julgar o outro colocando-se em seu lugar, mas observando-o e julgando-o tão somente na situação de “coisa”, deveras distante do que pensa sobre si. Por si só, o julgamento pelo júri, composto de cidadãos iguais, porém diferentes, acaba sendo ineficiente e parcial:
“Eu pensava – em um dia de setembro passado, durante a projeção de um filme mexicano, no qual era admiravelmente descrito o estado de ânimo do público bestializado contra o toureiro, porque não demonstrava um desprezo suficiente ao perigo – quem era mais bestial, o público ou o touro? Aquele comportamento não se pode explicar senão com um destaque entre quem assiste e quem age, tal qual o gladiador, antes que um homem, é considerado uma coisa. Considerar o homem como uma coisa: pode-se ter uma forma mais expressiva da incivilidade? Mas é aquilo que acontece, infelizmente, nove entre dez vezes no processo penal. Na melhor das hipóteses, aqueles que se vão ver, fechados nas jaulas como os animais do jardim zoológico, parecem homens de mentira ao invés de homens de verdade, parece-lhe que são homens de uma outra raça ou, quase, de um outro mundo. Este não lembra, quando sente assim, a parábola do publicano e do fariseu, nem suspeita que a sua é justamente a mentalidade do fariseu: eu não sou como este.” (CARNELUTTI, 1957, p. 08).
Carnelutti conclui dizendo que o ser humano somente será capaz de julgar um ao outro quando for capaz de desenvolver compaixão pelos seus equivalentes, analisando-o como um de seus iguais. Metaforicamente falando, sem as lentes que o cegam de seu próprio caráter em detrimento do julgamento que faz sobre o outro, e somente sobre o outro:
“Quando, através da compaixão, cheguei a reconhecer nos piores dos encarcerados um homem como eu; quando se diluiu aquela fumaça que me fazia crer ser melhor do que ele; quando senti pesar nos meus ombros a responsabilidade do seu delito; quando, anos faz, em uma meditação na sexta-feira santa, diante da cruz, senti gritar dentro de mim: “Judas é teu irmão”, então compreendi não somente que os homens não se podem dividir em bons e maus, tampouco em livres e encarcerados, porque há fora do cárcere prisioneiros mais prisioneiros do que os que estão dentro e há, dentro do cárcere, mais libertos, assim da prisão, do que estão fora. Encarcerados somos todos, mais ou menos, entre os muros do nosso egoísmo; talvez, para se evadir, não há ajuda mais eficaz do que aquela que possam nos oferecer esses pobres que estão materialmente fechados entre os muros da penitenciária.” (CARNELUTTI, 1957, p. 90).
Por outro lado, Bretas, embora não acredite que o jurado consiga olhar para o réu e presumi-lo inocente, afirma que o júri deve funcionar como garantia absolutória, assim como a sua intenção é perdoar o acusado, ainda que ele não esteja amparado por nenhuma excludente, apelando, assim, para a sensibilidade humanística do jurado leigo. Pontua que é em razão disso que foi introduzido o § 2º ao artigo 483 do CPP: para que o jurado possa absolver “por perdão, por comiseração, por misericórdia, por compaixão ou, ainda, por outras razões que fogem ao alcance do homem jurídico, não obstante o acusado seja o autor de um crime. É para isto que existe o júri!” (BRETAS, 2010, p. 39-4).
Diante de todo o exposto, depreende-se que no âmbito do tribunal do júri, as decisões proferidas pelo conselho de sentença são instáveis e carregadas de âmago pessoal. Embora na condição de garantia individual esteja elencada no rol das cláusulas pétreas do artigo 60, § 4º, alínea “d” da Constituição Federal, por diversas razões a instituição não agrada a parcela dos processualistas penais e advogados criminalistas.
O conteúdo apresentado serve de alicerce para o tópico seguinte, à medida em que será confrontada a inovação trazida pelo Pacote Anticrime, em razão da execução provisória da pena ser admitida, hodiernamente, nas condenações cuja pena for igual ou superior a quinze anos, no procedimento do júri. Ou seja, caso o indivíduo tenha sido condenado a uma pena inferior a quinze anos, mesmo que a condenação seja a 14 anos e 11 meses de reclusão, e ainda que tenha respondido ao processo em liberdade, será imediatamente mandado à prisão. Desse modo, aguardará segregado, inclusive, o retorno de eventuais recursos.
Não se discutirá, em vista disso, quanto à viabilidade de uma prisão cautelar após a condenação pelo júri. Isso porque o júri é primeira instância, não se aplicando sequer a discussão quanto à possibilidade da prisão em segundo grau de jurisdição. Cabendo prisão cautelar, o condenado poderá ser sujeito a cumprir, independentemente da nova alínea.
2.3. A execução provisória da pena no rito do júri sob o filtro hermenêutico-Constitucional
Inicialmente, pertinente destacar, ainda que de forma sucinta, os ensinamentos de Ferrajoli no que tange o garantismo penal, que correlaciona que o garantismo seria um modelo normativo fundado sob o princípio da legalidade, possibilitando o limite do poder exercido pelo Estado. Logo, é caracterizado como um sistema de poder mínimo, consistente em uma técnica capaz de diminuir o grau de violência e aumentar a garantia da liberdade. Juridicamente, o garantismo seria um sistema de proteção com a finalidade de limitar o poder do estado enquanto garante direitos ao povo. Sob essa perspectiva, esse sistema propõe um máximo de bem-estar social, permitindo um equilíbrio entre a liberdade individual e o poder estatal (FERRAJOLI, 2010, apud LIMA e PEDROSA, 2021).
A existência de fases e mutações jurisprudenciais em torno do tema da execução provisória da pena, pode ser definida como uma tensão entre eficiência e garantismo no processo penal, haja vista que os movimentos históricos que trouxeram ideais de segurança social vai de encontro à eficiência repressiva do Estado, de modo que se vive em uma “eterna busca de equilíbrio entre o ideal de segurança social e a imprescindibilidade de se resguardar o indivíduo em seus direitos fundamentais (FERNANDES, 2010, apud MAIA, 2018).
Nesta senda, se a Constituição Federal prevê uma expansão da presunção de inocência, não cabe ao Supremo Tribunal Federal , tampouco às normas de cunho infraconstitucional a possibilidade de previsão de uma aplicação diversa do princípio no sentido de restringi-lo (SABOYA e SILVA, 2020).
Antes da reforma de 2019, Nucci fez apontamentos acerca da diferença da prisão cautelar para o réu preso em comparação ao réu que responde ao processo em liberdade. Nesse sentido, defende que a prisão cautelar após a decisão pelo conselho de sentença deve existir, no caso do réu solto e de bons antecedentes, somente quando restarem preenchidos os requisitos necessários ao seu recolhimento cautelar:
“Uma das relevantes deliberações do juiz presidente, em caso de sentença condenatória, é a decisão em relação à mantença ou revogação de prisão cautelar existente, bem como a eventual decretação da prisão provisória em virtude de condenação, caso esteja solto o réu. Há dois enfoques para analisar: a) o acusado encontra-se preso, durante a fase da formação da culpa; b) o réu está solto e dessa forma compareceu para ser julgado em plenário do Tribunal do Júri. Na primeira hipótese, como regra, a prisão cautelar deve ser mantida, embora, sempre, com fundamentação. Se o acusado aguardou a fase de formação da culpa detido, cautelarmente, com maior razão, se for condenado a uma pena elevada, deve continuar preso. […] A segunda situação – réu solto durante a instrução – merece maior cautela. Se o acusado for considerado primário, com bons antecedentes, o montante da condenação (seis, doze, trinta ou mais anos de reclusão) não é elemento determinante para fundamentar a prisão provisória. A única motivação razoável para decretar a prisão em decorrência da condenação em plenário deve resultar dos requisitos do art. 312 do CPP. Caso não estejam presentes, é direito do acusado aguardar solto o julgamento de seu recurso” (NUCCI, 2015, p. 356-357).
O instituto da prisão cautelar, desse modo, serve para manter o indivíduo sob a custódia do Estado após a decisão, independentemente do montante da pena, inversamente ao que propõe a nova alínea. A parte inicial do dispositivo que dá conta da prisão provisória no rito do júri, consistente no artigo 492, inciso I, alínea “e” do Código de Processo Penal, não possui utilidade. Isso porque o instituto da prisão preventiva já se encontra positivado no artigo 312 do mesmo código, podendo ser decretada, cautelarmente, em qualquer momento processual (CARMO e BARBOSA, 2020).
Lopes Jr. e Rosa referem que a decisão pela prisão em segunda instância já é inconstitucional e, considerando que a decisão dos jurados é proferida em primeira instância, esta seria ainda mais violadora dos preceitos da Constituição Federal. Além disso, pontua que o legislador cometeu equívocos, especialmente porque viola a presunção constitucional de inocência e eleva a instituição do júri a um patamar de absolutez que ela não possui. Questiona, por fim, os limites quanto à “íntima convicção” do jurado (LOPES JR.; ROSA, 2020, p. 03).
Oportunamente, o princípio da íntima convicção é a oportunidade e a faculdade de o julgador, na figura do juiz de direito, decidir conforme suas próprias convicções. Os jurados embora constituam o juiz natural na posição do conselho de sentença do tribunal do júri, não são juízes de verdade, mesmo que estejam atuando como se assim fossem. Nesse sentido, não cabe – ou não deveria caber – ao jurado a faculdade de utilizar-se de suas próprias convicções, mas tão-somente de julgar segundo as provas apresentadas na instrução processual. Araújo (2017, p. 03), inclusive, refere que nos casos midiáticos, a mídia influencia no julgamento pelos jurados, causando um sensacionalismo exacerbado e podendo interferir no julgamento. Um julgamento sob influências externas ao conteúdo processual é um julgamento manchado e, por conseguinte, deixa de ser imparcial.
Corroborado a isso, Carmo e Barbosa pontuam que na nova norma há uma violação à exigência de fundamentação das decisões judiciais, haja vista que somente a fundamentação permite avaliar se a racionalidade da decisão foi predominante sobre o poder exercido pelo conselho de sentença e, especialmente, se foram observadas as normativas do devido processo penal (LOPES JR., 2014, apud CARMO e BARBOSA, 2020).
Intuitivamente, o ato de conferir maior grau de segurança jurídica às normas Constitucionais é inerente aos defensores do garantismo penal, pois as normas jurídicas “só serão genuinamente éticas e políticas quando a norma jurídica e a ação estatal forem garantistas e afirmadoras dos direitos fundamentais” (LOPES e RIBEIRO, 2014, p. 12).
No júri, a decisão que condena o réu a uma pena superior a quinze anos, quando somada à novidade legislativa da execução provisória da pena, tolhe do condenado o direito ao duplo grau de jurisdição, ferindo o artigo 8.2.h da Convenção Americana de Direitos Humanos: “direito de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior”. Isso porque o júri é primeira instância, de modo que nesse momento processual, sequer se está falando a respeito da decisão já mantida pelo Tribunal, em segundo grau. Assim, independentemente do montante da pena, a decisão dos jurados é passível de recurso quando encontra óbice nas disposições do artigo 593 do Código de Processo Penal.
Partindo do pressuposto que a decisão proferida pelo júri é primeira instância, não se está falando, inicialmente, de interposição de recurso extraordinário e especial, conforme se depreende das razões arguidas para conferir maior fiabilidade às decisões de segundo grau. Trata-se tão somente de apelação e, veja-se: efeito suspensivo da apelação é a regra, de maneira que a inovação do pacote anticrime não somente mitigou a presunção de inocência do condenado à pena igual ou superior a quinze anos de reclusão, mas também o tolheu o efeito suspensivo do recurso cabível, tornando a execução da pena imediata e, também, inconstitucional, haja vista as violações aos preceitos Constitucionais e Internacionais.
Isso porque o teor do § 4º determina que a apelação contra decisão do júri não terá efeito suspensivo. Logo, esse efeito deixou de ser a regra e passou a ser exceção, conforme se extrai do § 5º do mesmo artigo, segundo o qual, somente mediante a cumulação de requisitos, é que se pode conferir a suspensão dos efeitos da decisão. Senão, vejamos:
“§ 5º Excepcionalmente, poderá o tribunal atribuir efeito suspensivo à apelação de que trata o § 4º deste artigo, quando verificado cumulativamente que o recurso: I – não tem propósito meramente protelatório; e II – levanta questão substancial e que pode resultar em absolvição, anulação da sentença, novo julgamento ou redução da pena para patamar inferior a 15 (quinze) anos de reclusão.”
Ocorre, contudo, que as hipóteses levantadas pelos incisos delineados, imperiosas à concessão do efeito suspensivo, bem como as possibilidades de reverter a decisão para que se obtenha uma absolvição ou, inclusive, um novo julgamento, estão adstritos à soberania do conselho de sentença, logo, não é passível de questionamento o mérito da causa. Assim, o dispositivo torna a apelação no júri ineficaz, de modo a ferir materialmente o duplo grau de jurisdição (SILVA, 2019).
Ademais, a vedação ao acesso ao duplo grau de jurisdição rompe com todos os preceitos do sistema de justiça no que tange o devido processo legal. Isso porque viola, também, a presunção de inocência, na medida em que manda segregar e iniciar o cumprimento da pena antes do trânsito em julgado, em desacordo com o entendimento firmado quando do julgamento das Ações Diretas de Constitucionalidade 43, 44 e 54, fazendo com que o júri atue como um procedimento sumário e, acima de tudo, absoluto.
Mas não só: sujeita o condenado em primeira instância a uma pena ainda mais severa do que os condenados já em segunda instância, à medida em que torna absoluto o julgamento proferido pelo conselho de sentença e tolhe do condenado o direito de recorrer em liberdade, especialmente porque as suas hipóteses de recurso são extremamente limitadas ao que prevê e taxa o Código de Processo Penal. Logo, não é possível sequer que exista uma reanálise da matéria probatória, cujo mérito foi julgado por cidadãos comuns, e não por um juiz de direito.
Assim, em caso a decisão proferida pelo conselho de sentença tenha conferido ao condenado uma pena superior a quinze anos de reclusão, este deverá iniciar o cumprimento da pena imediatamente, sujeitando-se aos institutos da execução penal, não podendo recorrer em liberdade. Por óbvio, constitucionalizada a soberania dos veredictos do júri, esta deve ser respeitada. No entanto, não se pode presumir que a decisão do júri é tão absoluta que nem uma apelação a possa modificar ou reverter, afinal, se está falando de um procedimento acusatório que respeita o devido processo legal, e não de um viés inquisitivo e punitivista, remontando aos tribunais populares do século XVIII. Desse modo, na hipótese de o réu ter ido a julgamento enquanto respondia ao processo em liberdade, pode sair do Plenário sendo mandado diretamente a estabelecimento prisional após a decisão em primeira instância: um absurdo jurídico!
É nesse sentido que quando observada a redação da já transcrita alínea “e” do artigo 492 do Código de Processo Penal verifica-se que o legislador passou por cima do principal diploma jurídico do país. Tem-se, portanto, quatro expressas violações constitucionais:
- a) à presunção de inocência, positivada por força do inciso LVII da CF/88: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”;
- b) aos princípios do contraditório e da ampla defesa, em razão do inciso LV do mesmo diploma legal: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa”;
- c) ao direito ao duplo grau de jurisdição, implicitamente presente no mesmo inciso LV, dessa vez na parte final: “com os meios e recursos a ela inerentes”; e
- d) ao princípio do devido processo legal, constante no inciso LIV da Constituição, que prevê que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.
Não obstante, considerando também os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, vislumbra-se violações ao artigo 7º e ao artigo 8.2 do Pacto de San José da Costa Rica, cujas redações preveem, respectivamente, o direito à liberdade e o direito a que seja presumida a inocência. Este último, por conseguinte, também está previsto no artigo 14.2 do Pacto sobre Direitos Civis e Políticos. Como se não bastasse, o direito ao duplo grau de jurisdição também encontra violação no artigo 14.5 do mesmo diploma, através da redação: “Toda pessoa declarada culpada por um delito terá o direito de recorrer da sentença condenatória e da pena a uma instância superior, em conformidade com a lei”.
Considerações Finais
Através da pesquisa bibliográfica documental realizada, depreende-se que o ordenamento jurídico brasileiro, na sua atual conjuntura, não contempla a possibilidade da execução provisória da pena no âmbito do tribunal do júri, no que tange a redação trazida à nova alínea do artigo 492 do Código de Processo Penal. Isso porque há mitigação não só da presunção de inocência, como também do devido processo legal e do duplo grau de jurisdição, especialmente porque se trata de decisão proferida em primeiro grau de jurisdição, ainda que o júri esteja protegido sob a soberania dos veredictos, constante na alínea “d” do inciso XXXVIII artigo 5º da CF/88.
Indubitavelmente, o processo penal brasileiro apresenta falhas, especialmente no que diz respeito à inconsistência do Supremo Tribunal Federal nos posicionamentos tomados quanto à prisão em segundo grau de jurisdição, tornando a norma brasileira frágil, mutável e contraditória. Outrossim, a inovação trazida pelo Pacote Anticrime no âmbito das decisões do tribunal do júri, remonta às práticas que vão de encontro ao procedimento acusatório, pois confere ao júri um grau de absolutez que ele não possui, nem por força da própria Constituição.
As discussões doutrinárias e jurisprudenciais a respeito do tema remontam a uma ineficácia do próprio sistema de justiça no que diz respeito à punição. Isso porque muito embora a Constituição federal preveja a presunção de inocência não só como princípio, mas como norma norteadora de direitos e garantias, a ampla interpretação, as dúvidas e divergências quanto à extensão da presunção de inocência fazem com que a cada momento político vivenciado, a interpretação da norma seja alterada.
Isso ocorreu em 1991, no julgamento do HC 67.726/RJ, que determinou que não poderia haver execução provisória da pena após a condenação em segunda instância, sendo posteriormente alterado em 1992, no julgamento do HC 69.964/RJ, que decidiu o oposto. Após, somente em 2009, no julgamento do HC 84.078/MG, foi novamente vedada a execução provisória da pena em segunda instância; em 2016, no julgamento do HC 126.292/SP, foi revertida a decisão anterior e determinado que era possível o cumprimento provisório da pena; e, por fim, a última alteração foi em 2019, no julgamento das Ações Diretas de Constitucionalidade 43, 44 e 54, onde restou firmado, portanto, que não é permitida a execução provisória da pena após decisão em segundo grau de jurisdição.
Como é possível que diante de tantas alterações interpretativas quanto à prisão em segunda instância – que no atual cenário, por força das ADCs 43, 44 e 54 não pode ocorrer -, seja possível que uma Lei nova determine o cumprimento da pena do júri, quando igual ou superior a quinze anos, sabendo que o júri é primeiro grau de jurisdição? Não cabe uma eventual justificativa quanto aos delitos que são julgados pelo júri, haja vista que se for essa a alegação, se estaria punindo duas vezes: uma pelo delito em si, e outra por sua natureza, à medida em que cabe nesse rito – e somente nele, resguardadas as hipóteses previstas – a excepcionalidade do cumprimento imediato da sentença penal condenatória, ainda que sejam cabíveis recursos.
Desse modo, a execução da pena em primeira instância após decisão pelo júri, viola a Constituição Federal, o Pacto de San José da Costa Rica e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos. Resta demonstrado que a aplicabilidade da nova norma necessita ser revista, sob pena de estar passando por cima, dentre tantos princípios positivados, do próprio direito humano e constitucional à liberdade, além da evidente mitigação da presunção de inocência, seja ela norma ou princípio norteador.
A inconsistência interpretativa das normas que norteiam o processo penal colocam em dúvida a eficácia das garantias constitucionais no que tange o direito à liberdade e ao cumprimento do devido processo legal, assim como o cumprimento dos princípios e regramentos que dele decorrem. Não só a redação do artigo 283 do Código de Processo Penal possui comportamento dúplice, mas também a nova alínea do inciso I do artigo 492 do mesmo diploma repressivo contribui para que a inocência não seja, sequer, presumida. Desse modo, se estaria sob a vigência de um estado de presunção de não-culpabilidade – ou seria de presunção de culpabilidade?
O condenado em sentença proferida em sessão do tribunal do júri cuja pena for igual ou superior a quinze anos, no presente momento da norma jurídica, inicia o cumprimento da pena imediatamente, em primeira instância, mesmo podendo recorrer da decisão, nas hipóteses previstas pelo artigo 593 do CPP, quando for caso de apelação. Desse modo, se está violando o direito ao recurso em duplo grau de jurisdição, mitigando a inocência não em segunda instância, mas em primeira, pois não se aguarda sequer uma reanálise da causa sob o pretexto de que a decisão dos jurados é soberana. Logo, faz-se imperativa uma nova discussão acerca da prisão, dessa vez, em primeira instância, haja vista a elevação a nível de supremacia arbitrária e indelével do conselho de sentença.
Outrossim, a execução provisória da pena nesse rito fere, mais uma vez, a norma pátria. Não só pela separação em razão do montante da pena, mas também por ser o júri uma instituição composta por julgadores desprovidos de douto estudo jurídico e, portanto, tido por muitos autores como relativamente incapazes de apreciar a prova, reservando o juízo de valor que têm sobre o acusado, assim como o grau de reprovabilidade que possuem quanto à conduta supostamente perpetrada pelo pronunciado. Logo, as suas decisões teriam um caráter mais emocional do que racional. É em razão disso que a inovação abordada é tão equivocada.
No ponto, restaram configuradas as violações do apontado dispositivo jurídico não só aos incisos LVII e LIV e LV, ambos do artigo 5º da Constituição Federal, violando, além da presunção de inocência, o contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal, mas também ao artigo 8.2.h. da Convenção Americana Sobre Direitos Humanos, no que tange o direito de recorrer da decisão do juiz a um tribunal superior.
Diante do exposto, fica cristalino que o sistema jurídico brasileiro não suporta a alteração feita pelo Pacote Anticrime, que trouxe consigo a previsão expressa da execução antecipada da pena no rito do júri. Isso porque no mesmo ano em que foi publicada a nova alínea, também foi definido, pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento das Ações Diretas de Constitucionalidade, que não é possível iniciar o cumprimento da pena de forma antecipada, antes do trânsito em julgado. Veja-se que trata-se de duas normas opostas: uma liberta enquanto a outra segrega. Como se não bastasse, essa segregação é seletiva, haja vista que impõe o cumprimento provisório da pena apenas aos casos cuja pena aplicada for igual ou superior a quinze anos. É sob essa perspectiva que se faz imperativa outra discussão, – não abordada em virtude de pertinência temática e extensão da pesquisa -, desta vez acerca da dosimetria da pena, que pode ser aplicada em patamares altos em razão do enquadramento à referida norma.
Logo, resta evidente o cerceamento de defesa perpetrado pelo cenário jurídico atual, uma vez que não estão sendo cumpridas as normas nacionais, tampouco os Tratados Internacionais dos quais o Brasil é signatário, ao passo em que a inocência deixa de ser presumida e a possibilidade recursal de efeito suspensivo é tolhida, fazendo com que o direito à liberdade seja reduzido ao negativo. Mas não só: a já apontada mitigação da presunção de inocência remonta, inclusive, às práticas inquisitoriais, restando à Constituição Cidadã o marco histórico da mutabilidade interpretativa e descumprimento dos preceitos a ela mesma inerentes.
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