A denúncia espontânea à luz da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça

Resumo: O presente trabalho intelectual tem por escopo dissecar o instituto da denúncia espontânea de tributos, abordando as principais decisões do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema. Pretende-se apresentar à comunidade jurídica uma suma do entendimento da Corte, com vistas a facilitar a compreensão das razões que levaram à consolidação da jurisprudência e ofertar subsídios para aqueles que atuam nesse segmento do Direito Tributário.


Palavras-chave: denúncia espontânea. Superior Tribunal de Justiça. Código Tributário Nacional.


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Sumário: 1. Introdução. 2. Conceito e imprecisão terminológica. 3. Inaplicabilidade da denúncia espontânea no tocante ao descumprimento de obrigações acessórias. 4. A Súmula 360 do STJ e os tributos declarados, mas pagos a destempo. 5. O parcelamento e a denúncia espontânea. 6. A denúncia espontânea e a multa de mora. 7. Conclusões. 8. Referências bibliográficas.


1. Introdução


A denúncia espontânea de infrações é instituto consagrado no Direito Tributário Brasileiro. Está descrito no artigo 138 do Código Tributário Nacional e caracteriza-se por ser uma espécie de benesse legal para aqueles que cometeram ilícitos tributários, mas temem que a Administração Tributária venha a descobrir e punir severamente tais atos.


Trata-se da instauração de um verdadeiro conflito psicológico entre contribuinte e Fisco, de modo que, ante a possível imposição de sanção, vê-se o sujeito passivo impelido a confessar a prática das infrações e, com isso, ver-se livre das pesadas multas tributárias.


A gênese do instituto está na constatação inequívoca de que o ser humano, diante de certas regras dotadas de menor legitimidade social, só as cumpre quando ameaçados pela sanção estatal. Assim ocorre com os tributos que, face à ineficiência estatal na aplicação dos recursos, são considerados pela sociedade como verdadeiro estorvo, que deve ser tolerado e, se possível, excluído.


O presente trabalho abordará, inicialmente, o conceito e as principais características da denúncia espontânea e, em seguida, tratará das controvérsias doutrinárias e jurisprudenciais que envolvem a aplicação de referido instituto, concentrando-se na análise de quatro situações que foram bastante discutidas pelos Tribunais brasileiros, quais sejam: a inaplicabilidade da denúncia espontânea no descumprimento de obrigações tributárias acessórias; a súmula 360 do STJ e os tributos declarados, mas pagos a destempo; o parcelamento e a denúncia espontânea; e a (in)aplicabilidade da denúncia espontânea às multas de mora.


2. Conceito e imprecisão terminológica


O artigo 138 do Código Tributário Nacional estabelece a definição da denúncia espontânea:


“Art. 138. A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração.”


Inicialmente, impende destacar mais uma das inúmeras imprecisões terminológicas do Código Tributário brasileiro. Como se vê, o caput do artigo 138 aduz que a responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea. No entanto, é o próprio sujeito passivo quem avisa à Administração Tributária que cometeu ilícito tributário, o que caracteriza não uma denúncia, mas sim uma confissão. Isso porque a denúncia ocorre quando alguém aponta fato de terceiro, enquanto a confissão caracteriza a assunção de ato próprio.


Superada a questão terminológica, sem mais implicações práticas, cabe analisar amiúde o artigo 138 do CTN. Conforme se observa, o dispositivo fala em denúncia espontânea. O que significaria, portanto, essa espontaneidade? Socorrendo-se das lições do Direito Penal, quando trata da desistência voluntária e do arrependimento eficaz, é de ver-se que a espontaneidade é aquela iniciativa que parte do próprio agente, sem que seja induzido ou compelido à prática do ato. De outro lado, há a voluntariedade, que pode derivar de conselhos ou de avisos de terceiros.


Novamente, poderia o Código ter tratado da voluntariedade em vez da espontaneidade, haja vista que o que se veda é que o contribuinte, sabendo que seus ilícitos foram descobertos, antecipe-se e os confesse. Não se proíbe, por outro lado, que o sujeito passivo seja aconselhado por alguém a declarar a prática dos ilícitos. Em outras palavras, a idéia de confessar a prática da infração não precisa brotar espontaneamente do sujeito passivo, dado que outros podem aconselhá-lo a tanto, desde que não seja determinada pela notícia de que o Fisco já descobriu o cometimento dos ilícitos por parte do contribuinte.


Para aferir a espontaneidade, o CTN erigiu um critério legal de relativa precisão, constante no parágrafo único do artigo 138. Eis sua redação:


“Parágrafo único. Não se considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração.”


De acordo com o dispositivo em comento, somente cessará a espontaneidade no momento em que se inicie procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração. Dessume-se, portanto, que deve haver procedimento formal no âmbito da Administração Tributária, delimitando especificamente os tributos e os períodos de análise de sua regularidade. Essa interpretação garante que possa o contribuinte manter situação de espontaneidade quanto a outros tributos, a par do efetivamente investigado.


Sobre o tópico, lembra Luciano Amaro:


“Por outro lado, não basta o início de qualquer procedimento ou a existência de qualquer medida de fiscalização por parte da repartição fiscal competente para apurar a infração praticada. É necessário, além disso, que a atuação do Fisco esteja relacionada com a infração, no sentido de que o prosseguimento normal dos trabalhos tenha a possibilidade (não a certeza) de identificar a prática da infração. Se a medida de fiscalização diz respeito limitadamente ao exame de determinado assunto, e a infração se refere à matéria estranha àquela que esteja sendo objeto da investigação, a espontaneidade não estará afastada.”[1]


Além da existência de procedimento formalmente instaurado, é necessária a efetiva ciência do sujeito passivo para fins de cessação da espontaneidade. Afinal, pode correr processo administrativo por longos anos sem que o contribuinte saiba ao menos de sua existência.


Novamente, o mestre Luciano Amaro ensina que:


“Não é, pois, qualquer possível motivação externa à vontade do infrator que exclui sua espontaneidade, para os efeitos do artigo em estudo: requer-se a existência de um procedimento fiscal ou medida de fiscalização que já tenha tido início; obviamente, não se pode tratar de procedimento ou medida interna corporis, que a fiscalização tenha implementado, mas de que ainda não tenha dado ciência ao infrator. A ciência deste é necessária para o efeito em análise.[2]


No âmbito federal, o legislador regulou expressamente o parágrafo único do artigo 138, de modo que há um momento exato para a exclusão da espontaneidade. Interessante observar que os demais entes federativos adotam critérios semelhantes aos da União em seus respectivos territórios. Segue o teor do artigo 7º do Decreto 70.235/1972 e seu parágrafo 1º:


Art. 7º O procedimento fiscal tem início com:


I – o primeiro ato de ofício, escrito, praticado por servidor competente, cientificado o sujeito passivo da obrigação tributária ou seu preposto;


II – a apreensão de mercadorias, documentos ou livros;


III – o começo de despacho aduaneiro de mercadoria importada.


§ 1° O início do procedimento exclui a espontaneidade do sujeito passivo em relação aos atos anteriores e, independentemente de intimação a dos demais envolvidos nas infrações verificadas.”


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Impende destacar que os atos que iniciam o procedimento, conforme o artigo 7º supra, são todos atos que, inequivocamente, geram a ciência do sujeito passivo. O parágrafo 1º reafirma, ainda, a exclusão de espontaneidade e aduz que ela se estende aos demais envolvidos nas infrações verificadas. Ora, nada mais justo, afinal não seria razoável imaginar-se que co-autor de infração tributária venha a desconhecer atividade do Fisco no sentido de investigar o cometimento de infração da qual foi protagonista. Eventual denúncia espontânea certamente estaria eivada da ciência do envolvido quanto ao conhecimento do Fisco, ressentindo-se, portanto, de verdadeira espontaneidade.


3. Inaplicabilidade da denúncia espontânea no tocante ao descumprimento de obrigações acessórias.


Alguns autores de grande quilate defendem a tese de que a denúncia espontânea é aplicável, também, ao inadimplemento de obrigações tributárias formais ou acessórias. Tais autores fundam seu entendimento, essencialmente, na interpretação literal do artigo 138 do Código Tributário Nacional, que aduz que “a responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora”.


 Segundo eles, a expressão “se for o caso” abre a possibilidade de denúncia espontânea em situações onde não há pagamento de tributo, o que corresponderia a obrigações formais.


A interpretação desse dispositivo é dada por tais doutrinadores da seguinte forma: a responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso de obrigação tributária principal, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora. Nesse sentido, o legislador estaria abrindo oportunidade para, se for o caso de obrigação tributária formal, excluir-se, também a responsabilidade, ainda que sem pagamento do tributo devido e dos juros de mora, eis que não gerados pelo descumprimento da obrigação formal.


Encampando referida tese, o mestre Hugo de Brito Machado ministra:


“Como a lei diz que a denúncia há de ser acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido, resta induvidoso que a exclusão da responsabilidade tanto se refere a infrações das quais decorra o não pagamento do tributo como a infrações meramente formais, vale dizer, infrações das quais não decorra o não pagamento do tributo.[3]


Entretanto, data vênia, a inclusão da expressão “se for o caso”, pelo legislador, não necessariamente induz à compreensão de que se estendeu a benesse da denúncia espontânea às obrigações acessórias. Há casos em que a confissão do sujeito passivo quanto ao descumprimento de obrigação tributária principal não necessitará de pagamento do tributo devido e dos juros de mora. É o caso, por exemplo, do Imposto de Renda retido na fonte, onde a confissão posterior do sujeito passivo oportunizará apenas uma menor restituição de valores, não se exigindo nenhum pagamento posterior à denúncia espontânea. Parcela da doutrina entende, portanto, que a expressão “se for o caso” se refere a tais situações excepcionais, não autorizando a aplicação da denúncia espontânea à confissão de infração a obrigações tributárias formais.


O Superior Tribunal de Justiça consolidou sua posição no sentido de que não exclui a multa moratória e não se aplica o benefício da denúncia espontânea às responsabilidades acessórias autônomas, sem qualquer vínculo direto com a existência do fato gerador do tributo.


Das dezenas de julgados nesse sentido, pode-se destacar, por sua atualidade e clareza, o seguinte:


“TRIBUTÁRIO. MULTA MORATÓRIA. ART. 138 DO CTN. ENTREGA EM ATRASO DA DECLARAÇÃO DE RENDIMENTOS. 1. A denúncia espontânea não tem o condão de afastar a multa decorrente do atraso na entrega da declaração de rendimentos, uma vez que os efeitos do artigo 138 do CTN não se estendem às obrigações acessórias autônomas. Precedentes. 2. Recurso especial não provido.” (STJ, Segunda Turma, RESP – RECURSO ESPECIAL – 1129202, Data da Publicação: 29/06/2010)


Importante considerar que o Superior Tribunal de Justiça teve a preocupação em delimitar a exclusão do benefício do artigo 138 do CTN às obrigações acessórias autônomas. Obrigações acessórias autônomas são aquelas que estão desvinculadas da obrigação principal. É o caso, por exemplo, da obrigação de não fazer consistente na obrigação de não rasurar a escrituração fiscal. Tais obrigações não repercutem sobre o valor do tributo a ser cobrado. Por outro lado, há obrigações acessórias vinculadas, que são aquelas que interferem no valor do tributo. Exemplo dessas é a obrigação de declarar a ocorrência do fato gerador que, desrespeitada, redunda no desfalque do tributo devido.


Impende destacar, também, que, prevalecendo a tese de que a denúncia espontânea exclui a responsabilidade pelo inadimplemento das obrigações formais, os prazos para cumprimento de obrigações acessórias não seriam respeitados. Sobre o assunto, Ricardo Alexandre ensina:


“Perceba-se que, se fosse possível aplicar o benefício para tais espécies e obrigações, os prazos seriam desmoralizados, pois o contribuinte poderia deixar para entregar a declaração na semana seguinte ao termo final, visto que seria praticamente impossível ao Fisco formalizar o início de um procedimento contra todos os contribuintes em atraso.[4]


De fato, o contribuinte não se preocuparia em cumprir suas obrigações no tempo adequado, causando efeitos nefastos à organização e ao desempenho das atividades de fiscalização e cobrança por parte da Administração Tributária.


4. A Súmula 360 do STJ e os tributos declarados, mas pagos a destempo.


Na sistemática dos tributos sujeitos a lançamento por homologação, o sujeito passivo identifica a matéria tributável, efetua declaração e antecipa o pagamento do tributo sem prévio exame da autoridade administrativa que, tomando conhecimento da atividade do sujeito passivo, procede à análise e expressamente a homologa.


Nesses tributos, há declaração do contribuinte que, segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, constitui por si só o crédito tributário.


No plano fático, inúmeras são as situações onde o sujeito passivo efetua declaração, constituindo, portanto, o crédito tributário, mas não procede ao pagamento. Inobstante, requer a aplicação do instituto da denúncia espontânea, sob o argumento de que confessou a existência de obrigação tributária principal.


No entanto, tal pleito tem sido reiteradamente rechaçado pelos Tribunais pátrios, fato que levou até mesmo à elaboração de enunciado sumular da lavra do STJ, cuja redação é a seguir expressa:


“STJ 360: O benefício da denúncia espontânea não se aplica aos tributos sujeitos a lançamento por homologação regularmente declarados, mas pagos a destempo.”


Impende ressaltar o acerto da decisão, como a seguir será demonstrado.


Em primeiro lugar, foge à essência do instituto da denúncia espontânea atribuir a benesse em tais casos. Conforme visto, a denúncia espontânea se aplica naquelas situações em que o contribuinte, ciente de que cometeu infração tributária, teme ser descoberto e, em função desse temor, confessa a prática do ilícito. Em decorrência desse arrependimento, o Fisco premia o contribuinte, excluindo as multas aplicáveis ao caso.


Na situação sob análise, a Administração Tributária já sabe de antemão da existência do fato gerador, posto que o próprio contribuinte declarou a sua existência. Assim, falta a principal peculiaridade da denúncia espontânea, qual seja, propiciar, o conhecimento pelo Fisco de fatos geradores antes desconhecidos.


Além disso, não há aí a dinâmica fundamental da denúncia espontânea, que se caracteriza por ser um instrumento de pressão sobre o contribuinte que, temendo o pior, confessa que cometeu ilícitos. No caso, o fato gerador desde o início foi confessado. O contribuinte não se vê, portanto, pressionado a se autodenunciar, dado que o que seria objeto de denúncia já é de conhecimento do Fisco.


Em segundo lugar, não pode o contribuinte pleitear que a Administração Tributária premie sua mora no adimplemento de suas obrigações tributárias simplesmente porque cumpriu com sua obrigação acessória de efetuar a declaração dos seus tributos.


Isso somente ocorre nos casos de efetiva denúncia espontânea porque o Fisco ganha algo em troca: o conhecimento de fatos geradores que desconhecia.


Nesse sentido é a jurisprudência consolidada do STJ:


“TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO CONFIGURADA. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO, DECLARADO E NÃO PAGO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. 1. Não viola o artigo 535, II, do CPC, nem importa negativa de prestação jurisdicional, o acórdão que, mesmo sem ter examinado individualmente cada um dos argumentos trazidos pelo vencido, adotou, entretanto, fundamentação suficiente para decidir de modo integral a controvérsia posta. 2. O art. 138 do CTN, que trata da denúncia espontânea, não eliminou a figura da multa de mora, a que o Código também faz referência (art. 134, par. único). É pressuposto essencial da denúncia espontânea o total desconhecimento do Fisco quanto à existência do tributo denunciado (CTN, art. 138, par. único). Conseqüentemente, não há possibilidade lógica de haver denúncia espontânea de créditos tributários já constituídos e, portanto, líquidos, certos e exigíveis. 3. Segundo jurisprudência pacífica do STJ, a apresentação, pelo contribuinte, de Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais – DCTF (instituída pela IN-SRF 129/86, atualmente regulada pela IN8 SRF 395/2004, editada com base no art. 5º do DL 2.124/84 e art. 16 da Lei 9.779/99) ou de Guia de Informação e Apuração do ICMS – GIA, ou de outra declaração dessa natureza, prevista em lei, é modo de constituição do crédito tributário, dispensada, para esse efeito, qualquer outra providência por parte do Fisco. 4. A falta de recolhimento, no devido prazo, do valor correspondente ao crédito tributário assim regularmente constituído acarreta, entre outras conseqüências, as de (a) autorizar a sua inscrição em dívida ativa, (b) fixar o termo a quo do prazo de prescrição para a sua cobrança, (c) inibir a expedição de certidão negativa do débito e (d) afastar a possibilidade de denúncia espontânea. 5. Nesse entendimento, a 1ª Seção firmou jurisprudência no sentido de que o recolhimento a destempo, ainda que pelo valor integral, de tributo anteriormente declarado pelo contribuinte, não caracteriza denúncia espontânea para os fins do art. 138 do CTN. 6. Recurso especial a que se dá provimento.” (STJ, Primeira Turma, RESP – RECURSO ESPECIAL – 825135, Data da Publicação: 25/05/2006.)


Finalmente, cabe ressaltar a impropriedade do argumento de que a tese adotada pelo STJ implicaria na impossibilidade absoluta de configuração da denúncia espontânea nos tributos sujeitos a lançamento por homologação.


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Na realidade, a tese aqui esposada veda apenas a denúncia espontânea naqueles casos onde o contribuinte previamente declara o tributo e não naquelas situações onde, posteriormente, o contribuinte declara e paga tributo que não constou na sua primeva declaração.


Destaca-se julgado do STJ nesse sentido:


“PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART. 545 DO CPC. RECURSO ESPECIAL. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. CTN, ART. 138. PAGAMENTO INTEGRAL DO DÉBITO FORA DO PRAZO. IRRF. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. DIFERENÇA NÃO CONSTANTE DA DCTF. POSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO DA MULTA MORATÓRIA. 1. É cediço na Corte que “Não resta caracterizada a denúncia espontânea, com a conseqüente exclusão da multa moratória, nos casos de tributos sujeitos a lançamento por homologação declarados pelo contribuinte e recolhidos fora do prazo de vencimento.” (REsp n.º 624.772/DF, Primeira Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 31/05/2004) 2. A inaplicabilidade do art. 138 do CTN aos casos de tributo sujeito a lançamento por homologação funda-se no fato de não ser juridicamente admissível que o contribuinte se socorra do benefício da denúncia espontânea para afastar a imposição de multa pelo atraso no pagamento de tributos por ele próprio declarados. Precedentes: REsp n.º 402.706/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 15/12/2003; AgRg no REsp n.º 463.050/RS, Primeira Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ de 04/03/2002; e EDcl no AgRg no REsp n.º 302.928/SP, Primeira Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ de 04/03/2002. 3. Não obstante, configura denúncia espontânea, exoneradora da imposição de multa moratória, o ato do contribuinte de efetuar o pagamento integral ao Fisco do débito principal, corrigido monetariamente e acompanhado de juros moratórios, antes de iniciado qualquer procedimento fiscal com o intuito de apurar, lançar ou cobrar o referido montante, tanto mais quando este débito resulta de diferença de IRRF, tributo sujeito a lançamento por homologação, que não fez parte de sua correspondente Declaração de Contribuições e Tributos Federais. 4. In casu, o contribuinte reconhece a existência de erro em sua DCTF e recolhe a diferença devida antes de qualquer providência do Fisco que, em verdade, só toma ciência da existência do crédito quando da realização do pagamento pelo devedor. 5. Ademais, a inteligência da norma inserta no art. 138 do CTN é justamente incentivar ações como a da empresa ora agravada que, verificando a existência de erro em sua DCTF e o conseqüente autolançamento de tributos aquém do realmente devido, antecipa-se a Fazenda, reconhece sua dívida, e procede ao recolhimento do montante devido, corrigido e acrescido de juros moratórios. 6. Exigir qualquer penalidade após a espontânea denúncia é conspirar contra a ratio essendi da norma inserida no art 138 do CTN, malferindo o fim inspirador do instituto, voltado a animar e premiar o contribuinte que não se mantém obstinado ao inadimplemento. (…)” (STJ, Primeira Turma, AGA – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO – 600847, Data da Publicação: 05/09/2005.)


Essas e outras considerações levam a crer que não se pode confundir pagamento em atraso com denúncia espontânea.


5. O parcelamento e a denúncia espontânea.


Há profunda divergência no âmbito doutrinário no tocante à aplicação da denúncia espontânea quanto àqueles tributos declarados pelo contribuinte, mas não pagos de imediato e sim parcelados.


O Superior Tribunal de Justiça recentemente consolidou sua posição no sentido de que o parcelamento não pode ser equiparado ao pagamento para efeitos de gozo dos benefícios da denúncia espontânea.


Referido entendimento, corroborado por parcela da doutrina, baseia-se, fundamentalmente, na literalidade do dispositivo que versa sobre a denúncia espontânea.


 “Art. 138 – A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração.”


Como se vê, realmente, a exegese literal do dispositivo dá a impressão de uma relação de contemporaneidade entre a confissão do contribuinte e o pagamento do tributo, o que se nota pela inclusão da palavra “acompanhada”. Ademais, afirma o legislador que, quando o tributo depende de apuração, deve a autoridade administrativa arbitrar a importância para que o sujeito passivo possa depositar. Ora, é razoável entender que o arbitramento por parte do Fisco se dá para que o contribuinte possa, desde logo, depositar a quantia, o que redunda na impossibilidade de adimplemento postergado.


Outro argumento bastante convincente é o decorrente da leitura do §1º de artigo 155-A do CTN, incluído pela Lei Complementar nº 104/2001, que aduz que: “salvo disposição em contrário, o parcelamento do crédito tributário não exclui a incidência de juros e multas”.


Dessa forma, se o parcelamento, por si só, não exclui a incidência de juros e multas, fica evidente que se diferencia do pagamento imediato, como também leva a crer que o fato de o parcelamento ter sido requerido juntamente à declaração não teria o condão de elidir os juros e multas.


Há, ainda, segundo aqueles que defendem a inaplicabilidade da denúncia espontânea nesse caso, a incerteza de que o contribuinte irá honrar com as demais parcelas, de modo que poderia o contribuinte se valer de má-fé e requerer o parcelamento com o intuito de eximir-se das penalidades e, logo após, deixar de pagar as parcelas.


Para ilustrar o entendimento ora esposado, colaciona-se o entendimento do STJ:


“RECURSO ESPECIAL – ALÍNEAS “A” E “C” – TRIBUTÁRIO – PARCELAMENTO DE DÉBITO TRIBUTÁRIO – EXCLUSÃO DA MULTA MORATÓRIA – IMPOSSIBILIDADE – ALÍNEA “A” – PRETENSA VIOLAÇÃO AO ARTIGO 138 DO CTN – NÃO-OCORRÊNCIA – SÚMULA 208 DO TFR – § 1º DO ARTIGO 155-A DO CTN (ACRESCENTADO PELA LC 104/01) – DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL CONHECIDA, PORÉM IMPROVIDO O RECURSO PELA ALÍNEA “C”. O instituto da denúncia espontânea da infração constitui-se num favor legal, uma forma de estímulo ao contribuinte, para que regularize sua situação perante o Fisco, procedendo, quando for o caso, ao pagamento do tributo, antes do procedimento administrativo ou medida de fiscalização relacionados com a infração. Nos casos em que há parcelamento do débito tributário, não deve ser aplicado o benefício da denúncia espontânea da infração, visto que o cumprimento da obrigação foi desmembrado, e só será quitada quando satisfeito integralmente o crédito. O parcelamento, pois, não é pagamento, e a este não substitui, mesmo porque não há a presunção de que, pagas algumas parcelas, as demais igualmente serão adimplidas, nos termos do artigo art. 158, I, do mencionado Codex. Esse parece o entendimento mais consentâneo com a sistemática do Código Tributário Nacional, que determina, para afastar a responsabilidade do contribuinte, que haja o pagamento do devido, apto a reparar a delonga do contribuinte. Nesse sentido o enunciado da Súmula n. 208 do extinto Tribunal Federal de Recursos: “a simples confissão de dívida, acompanhada do seu pedido de parcelamento, não configura denúncia espontânea”. A Lei Complementar n. 104, de 10 de janeiro de 2001, que acresceu ao Código Tributário Nacional, dentre outras disposições, o artigo 155-A, veio em reforço ao entendimento ora esposado, ao estabelecer, em seu § 1º, que “salvo disposição de lei contrário, o parcelamento do crédito tributário não exclui a incidência de juros e multas”. Recurso especial não-conhecido pela alínea “a”, e conhecido mas improvido pela alínea “c”. (STJ, Primeira Seção, RESP – RECURSO ESPECIAL – 378795, Data da Publicação: 21/03/2005)


Impende destacar, como já referido pelo julgado supra, que o Tribunal Federal de Recursos editou a súmula 208, que corrobora o entendimento ora explanado. Eis seu teor: “a simples confissão de dívida, acompanhada do seu pedido de parcelamento, não configura denúncia espontânea”.


A despeito de a orientação jurisprudencial dominante ser a acima exposta, qual seja, no sentido da inaplicabilidade da denúncia espontânea no tocante ao parcelamento, cabe ressaltar que parcela qualificada da doutrina, dentre ela o mestre Hugo de Brito Machado, entende de forma diversa.


Para os defensores da tese da aplicabilidade da denúncia espontânea ao parcelamento, a literalidade do artigo 138 do CTN, na verdade, não diferencia pagamento imediato de pagamento parcelado. Dessa forma, seria possível o pagamento parcelado. Além disso, aduzem ser injusto igualar a situação daquele que, apesar de não ter dinheiro para adimplir sua obrigação, a confessa, com a daquele que, demonstrando desprezo às regras tributárias, simplesmente deixa de confessar, e após descoberto, pede parcelamento.


É importante trazer à tona a lição de Hugo de Brito Machado que, após interessantes considerações a respeito de justiça, arremata:


“Assim, em muitos casos, negar a aplicação do artigo 138 aos que, em vez de pagar, pedem o parcelamento do débito implica dar a estes o mesmo tratamento que é dado aos que preferiram permanecer na situação irregular até que a Fiscalização, constatando-a, lavrasse o auto de infração respectivo, formulando a exigência. E isto, evidentemente, contraria de modo flagrante o princípio da isonomia.[5]


Ademais, a adoção da tese da inaplicabilidade da denúncia espontânea caracterizaria, também, má-política fiscal, pois, igualando a situação daquele que confessa com o de que não confessa, acaba por tornar mais atrativa ao sujeito passivo a escolha de não declarar e torcer para que o Fisco nunca descubra seus ilícitos.


Sobre o tema, Ricardo Alexandre afirma:


“Trata-se de uma infeliz interpretação literal do artigo 138 do CTN, pois acaba por estimular que os infratores que queiram se livrar dos riscos de uma punição, mas não tenham recursos para adimplir integralmente a obrigação, apostem no acaso, torcendo para que a irregularidade não seja descoberta. Afinal, se a confissão não o livra da multa, pode parecer mais interessante esperar. Se o Fisco descobrir o ilícito, o sujeito passivo parcela e paga o tributo e a multa; se não, o passar do tempo e o instituto da decadência resolverão seu problema.[6]


Inobstante o peso da opinião dos que assim entendem, reafirma-se que a atual orientação do Superior Tribunal de Justiça é a de que não se aplica o artigo 138 do CTN na hipótese de parcelamento.


6. A denúncia espontânea e a multa de mora.


Tema de acesos debates na doutrina e na jurisprudência é o referente à aplicação do artigo 138 do Código Tributário Nacional às multas de mora.


Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça parece ter consolidado sua jurisprudência no sentido da plena aplicabilidade da denúncia espontânea no que toca às multas moratórias.


Referido raciocínio baseia-se em duas premissas que serão abordadas neste tópico.


A primeira delas é fundada na própria literalidade do artigo 138 do Código Tributário Nacional. Senão vejamos:


“Art. 138. A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração.”


Como se vê, o dispositivo legal aduz que, em ocorrendo a denúncia espontânea, o contribuinte efetuará o pagamento apenas do tributo e dos juros de mora. Não há aí qualquer alusão genérica ou específica a multas de qualquer natureza. O silêncio da lei seria então eloqüente e intencional, no sentido da exclusão tanto das multas punitivas quanto das moratórias.


Outra premissa parte da indiscernibilidade entre as multas moratórias e as multas de ofício, posto que ambas são repercussões da prática de ilícitos tributários e evidenciam o aspecto sancionador da Administração Tributária, no exercício da supremacia e indisponibilidade do interesse público. Na realidade, as multas de mora não teriam caráter indenizatório (para isso, servem os juros de mora), mas sim feição punitiva.


Nesse sentido, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:


“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART. 544 DO CPC. RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. CTN, ART. 138. TRIBUTO NÃO PAGO. IMPOSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO DA MULTA MORATÓRIA. (…)12. Inegável, assim, que engendrada a denúncia espontânea nesses termos, revela-se incompatível a aplicação de qualquer punição. Memorável a lição de Ataliba no sentido de que: “O art. 138 do C.T.N. é incompatível com qualquer punição. Se são indiscerníveis as sanções punitivas, tornam-se peremptas todas as pretensões à sua aplicação. Por tudo isso, sentimo-nos autorizados a afirmar que a auto-denúncia de que cuida o art. 138 do C.T.N. extingue a punibilidade de infrações (chamadas penais, administrativas ou tributárias).” (Leandro Paulsen, Direito Tributário, p. 979, 6ª Ed. cit. Geraldo Ataliba in Denúncia espontânea e exclusão de responsabilidade penal, em revista de Direito Tributário nº 66, Ed. Malheiros, p. 29) (…) 14. Precedentes: REsp n.º 511.337/SC, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 05/09/2005; REsp n.º 615.083/MG, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 15/05/2005; e REsp n.º 738.397/RS, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 08/08/2005). 15. Agravo Regimental desprovido.” (STJ, Primeira Turma, AGEDAG – AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO – 755008, Data da Publicação: 18/09/2006)


Impende destacar que, a despeito de ter o Superior Tribunal de Justiça se manifestado no sentido da exclusão da multa moratória pela denúncia espontânea, praticamente a totalidade das Administrações Tributárias sustenta o entendimento oposto, baseando seu entendimento na assertiva de que a multa de mora tem caráter indenizatório e não punitivo. Há, ainda, o argumento de que o fato de a denúncia espontânea não abranger as multas de mora não esvaziaria de validade do instituto, dado que ainda seria vantajoso para o contribuinte confessar a prática do ilícito tributário, considerando o alto valor das multas de ofício.


7. Conclusões


Ante o exposto, conclui-se, num esforço de síntese, que:


1. A denúncia espontânea é um instituto legal benéfico tanto para o Fisco quanto para o contribuinte, eis que permite ao Fisco o conhecimento de infrações tributárias de que dificilmente teria conhecimento e propicia ao sujeito passivo a exclusão das pesadas multas tributárias a que estaria sujeito.


2. Referido instituto atua exercendo pressão psicológica no contribuinte que, vendo crescer a possibilidade de ter suas infrações tributárias descobertas e arcar com pesadas multas tributárias, se vê tentado a confessar e obter o perdão legal de seus desvios.


3. O Superior Tribunal de Justiça entende pela inaplicabilidade do artigo 138 do Código Tributário Nacional ao descumprimento de obrigações tributárias acessórias autônomas.


4. O Superior Tribunal de Justiça entende que, nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, declarados pelo contribuinte, mas recolhidos fora do prazo de vencimento, não se aplica a denúncia espontânea.


5. O Superior Tribunal de Justiça entende que a confissão do débito fiscal acompanhada de pedido de parcelamento não tem o condão de propiciar a aplicação do instituto da denúncia espontânea, eis que parcelamento não pode ser confundido com pagamento.


6. O Superior Tribunal de Justiça entende que a denúncia espontânea atinge tanto as multas punitivas quanto as multas moratórias.


 


Referências bibliográficas.

ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado. 4. ed. São Paulo: Método, 2010.

ALEXANDRINO, Marcelo e PAULO, Vicente. Direito tributário na Constituição e no STF. 7. Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2004.

AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

PAULSEN, Leandro. Direito tributário. Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.

 

Notas:

[1] AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2006., p. 452.

[2] AMARO, Luciano. Ob. cit., p. 452.

[3]  MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 161.

[4] ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado. 4. ed. São Paulo: Método, 2010. p. 361-362.

[5] MACHADO, Hugo de Brigo, Ob. cit., p. 164.

[6] ALEXANDRE, Ricardo, Ob. cit., p. 360.


Informações Sobre o Autor

Fernando Braz Ximenes

Graduado em Direito pela Universidade Federal da Paraíba. Pós-graduando em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Advogado


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